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1
A antropologia do design:
observações sobre as apropriações da prática antropológica pelo design hoje1
Zoy Anastassakis, Prof. Adj. ESDI/UERJ
Resumo
No campo do design, há quase trinta anos vem ocorrendo um forte investimento de
aproximação com conceitos e ferramentas relacionados à prática antropológica. Esse
movimento expandiu-se de tal forma que hoje é possível encontrar antropólogos
contratados por escritórios de design, em diversas regiões do mundo, bem como dois
programas de mestrado em ‘design anthropology’ - no Departamento de Antropologia
da Universidade de Aberdeen, Escócia, e no Departamento de Design da Universidade
de Swinbourne, Austrália. É fácil, também, adquirir publicações sobre antropologia
aplicada ao design. No Brasil, em cursos de graduação em design como o da PUC-Rio,
nas fases de projeto em que precisam ir a campo coletar informações e travar contato
com aqueles para quem eles desenvolvem os produtos, os alunos são acompanhados e
orientados por antropólogos. No Rio Grande do Sul, alunos da especialização em design
estratégico da UNISINOS também são apresentados à antropologia, e praticam
exercícios que envolvem pesquisa etnográfica de campo. Nessa comunicação, a partir
de uma rápida revisão histórica de tal aproximação, pretendo discutir algumas
implicações das apropriações da antropologia pelo campo do design, e, assim, contribuir
para o debate sobre as demandas, definições e recortes que incidem sobre a antropologia
na contemporaneidade.
Palavras-chave: antropologia – design – interdisciplinaridade
1
Trabalho apresentado na 28a
Reunião Brasileira de Antropologia, realizada entre os dias 02 e 05 de
julho de 2012, em São Paulo, SP, Brasil.
2
Em 2011, a editora austríaca Springer-Verlag publicou a coletânea de artigos
“Design anthropology: object culture in the 21st century”, organizada pela professora
de história e teoria do design na Universidade de Artes Aplicadas de Viena, Alison J.
Clarke. Além de lecionar, a editora do livro, mestre em história do design pelo Royal
College de Londres, doutora em antropologia social pela Universidade College London,
é diretora de pesquisa de Fundação Victor Papanek. Autora do livro “Tupperware: the
promise of plastic in 1950s America”, Alison Clarke também organizou, no Royal
College, em 2005, a conferência internacional “Interior Insights: design, ethnography
and the home”.
O termo ‘design anthropology’, que dá nome à coletânea publicada em 2011,
nomeia também dois cursos de mestrado strictu sensu, um deles na Escócia, o outro na
Austrália. O curso australiano, coordenado pela antropóloga norte-americana Dori
Tunstall, é oferecido pela Swinburne University of Technology, em seu departamento de
design. O curso escocês é oferecido pela Universidade de Aberdeen, em seu
departamento de antropologia. Sob coordenação do antropólogo James Leach, o
programa tem parceria com o Participatory Innovation Research Centre, do Mads
Clausen Institute for Product Innovation, University of Southern Denmark, que, por sua
vez, foi parceiro da Danish Design School e de outras seis organizações no
desenvolvimento da publicação “Rehearsing the future”, de 2010, que apresenta os
resultados de um projeto-piloto que buscava colocar em prática o que foi ali nomeado
de Design Anthropological Innovation Model (DAIM).
Variações do termo ‘design anthropology’ são encontradas em inúmeros outros
trabalhos, resultados de pesquisas acadêmicas e de práticas correntes no mercado,
ligados ambos ao campo profissional-acadêmico do design, em diversos contextos.
Citemos alguns exemplos, ligados à universidade: em 2011, na Nordic Design Research
Conference, Tau Ulv Lenskjold, da Danish Design School, apresenta o artigo “Accounts
of a critical artefacts approach to design anthropology”. Em 2009, Leslie MacNeil
Weber apresenta, na divisão de design da Universidade de Washington, EUA, a
monografia de conclusão da graduação “Design ethnography: strategy for visual
communications”. Dois anos antes, em 2007, na University of Southern Denmark, no já
citado Mads Clausen Institute for Product Innovation, Brendon Clark apresenta a tese
de doutorado intitulada “Design as sociopolitical navigation. A performative framework
3
for action-oriented design”, que tem um capítulo inteiramente dedicado à conceituação
do que o autor nomeia de “action-oriented design ethnography”.
No mesmo ano, durante o curso “Introduction to Design Anthropology”,
ministrado pela antropóloga Christina Wasson, na University of North Texas, o aluno
Jen Cardew Kersey organiza uma bibliografia comentada sobre o tema do curso. No ano
anterior, Bruce M. Tharp, do Departamento de Antropologia da Universidade de
Chicago, compila o volume “Ethnography and design: resources for teaching and
research”. Em 2002, é publicada a coletânea de artigos, “Design and the social
sciences: making connections”, organizada pelo designer Jorge Frascara, referência
importante para a consolidação de algumas tendências que iriam se espraiar pelo campo
do design, em diversos contextos nacionais, nos anos seguintes.
Professora associada do departamento de antropologia da University of North
Texas, Christina Wasson é autora de um artigo citado em vários dos trabalhos
mencionados acima. Publicado em 2000 pela revista “Human Organization”, produzida
pela Society for Applied Anthropology, o artigo “Ethnography in the field of design”
comenta alguns (dos considerados) episódios-chave para a aproximação do design com
conceitos e práticas identificadas por aquela comunidade acadêmico-profissional como
próprias da antropologia.
Os trabalhos acima citados, todos eles produzidos a partir de universidades,
tem em comum o investimento em traçar o histórico das relações entre design e
antropologia, o que, no campo do design - seja na academia seja no mercado -, vem
cada vez mais ganhando espaço. Investigando o que Clarke identifica como uma
transformação do design, via antropologia (Clarke, 2011: 10), vários desses autores
localizam entre as décadas de 1970 e 1980 o início de uma aproximação mais
sistemática, em meio à comunidade de design, com as questões e os procedimentos
associados, por eles, à antropologia.
Dessa forma, segundo Clarke, o livro “Design anthropology” descreve
a seismic shift in the way experts and users conceptualize, envisage, and
engaje in object culture. As the output of contemporary design becomes
evermore diverse, the term design itself is increasingly redundant in its
capacity to capture the sheer heterogeneity of the processes, practices, and
materialities involved in the making of stuff. Designers are now as likely to
engaje in social research as they are in making of form: once an intuitive
4
process, gauging cultural relevance has become part of a burgeoning área –
design anthropology (2011: 09).
Na coletânea organizada por Clarke (2011), a editora assina um artigo que
propõe explorar a relação histórica do design com a antropologia (Clarke, 2011: 74), a
partir da década de 1970, onde entende haver um ponto de inflexão crucial para a
profissão do design, que passa a questionar, naquele momento, seu papel social e
ecológico na produção de mercadorias (idem). Segundo a autora, a emergência de uma
cultura crítica no campo do design, que questionava a própria prática da disciplina em
suas relações com a sociedade, chama a atenção dos seus praticantes para a
antropologia, que, naquele momento, parece oferecer um modelo alternativo de uma
criatividade ‘não-capitalista’ (idem). Nesse movimento, haveria, nos anos 1970,
a move towards anthropology as a source of pre-modern promise. The
vernacular and anthropological object was a remnant of a world as yet
untouched by wanton commercialism, applied aesthetics, and alienating
commodity culture. As a source, the objects of other cultures offered
designers the opportunity to re-enchant society and free themselves from the
stigma of being the ‘handmaidens’ of capitalism (idem: 77).
Nesse contexto, teve papel fundamental o livro “Design for a real world”, de
Victor Papanek, publicado em 1971. Segundo Clarke, no livro, o autor aponta para a
antropologia como um antídoto para a condição alienada da qual toda uma geração de
designers desiludidos (idem: 78) sentia estar aprisionada. Assim, as proposições de
Papanek, no livro, explicitavam o que seria um dos grandes dilemas dos designers no
século XX, a saber: sua inconsciência quanto às responsabilidades morais e sociais
envolvidas na prática profissional. Em busca de ecologias alternativas de design (idem:
79), ele reuniu uma considerável bibliografia de antropologia, bem como fez diversas
incursões em campo, em meio a vários grupos sociais, dentre eles os esquimós, tema do
artigo “Os melhores designers do mundo?”, publicado no livro “Arquitectura e Design.
Ecologia e Ética” (Papanek, 1995).
É importante ressaltar, como faz Clarke, que o interesse de Papanek (que se
expande rapidamente pelo campo do design) por antropologia é parte de uma ampla
popularização desse campo de estudos no correr dos anos 1970 (idem). Segundo a
autora, o que fez do interesse de Papanek pela antropologia uma influência tão efetiva
em meio a comunidade de designers é sua habilidade de aplicar princípios de análise
dos objetos e da cultura material em sua cultura, assim como nas demais. Ou seja,
Papanek combinava uma compreensão nuançada das culturas materiais nativas com
5
uma fascinação informada pelo exoticismo de sua própria cultura. Dessa forma,
segundo Clarke, ele conseguia revelar, em suas observações, as idiossincrasias do
design. Destacando o papel fundamental de Papanek na popularização da antropologia
entre os designers, Clarke sublinha que “there has been a seismic shift in the design
culture in the last decades, whereby ‘users’ and methods of anthropological inquiry
have emerged as the key means of deciphering the nuances of object/subject relations”
(idem: 86).
Em 1976, o austríaco Victor Papanek e o alemão Gui Bonsiepe se encontraram
na conferência “Design for need”, organizada pelo International Council of Societies of
Industrial Design (ICSID), no Royal College of Art, Londres. Nesse encontro,
discutiram o papel do design em países periféricos, e, embora com perspectivas
divergentes, concordaram que a construção de economias periféricas deveria ser um
compromisso entre os designers socialmente responsáveis.
Em artigo publicado no ano de 2000, Christina Wasson discorre sobre como a
etnografia se tornou parte do vocabulário de designers, seja na universidade, seja nas
empresas. Para a autora, o interesse pela antropologia, e, mais especificamente pelo que
ela nomeia de métodos antropológicos (Wasson, 2000: 377), nasce da necessidade,
estrutural ao design, de identificar e atender as necessidades e desejos daqueles que
usam os objetos projetos pelos designers, a saber, os consumidores ou usuários (2000:
idem). Afinal, segundo ela, “a successfully designed item is one that is easily adopted
by consumers. This may be because the product’s use fit with existing behavior patterns
or because it signals a new use in a clear and compelling way” (idem).
Para Wasson, a busca pela identificação de padrões de comportamento dos
usuários ganha novos contornos e significados entre os anos 1980 e 1990, quando
alguns pesquisadores de design iniciam estudos que atentam para a necessidade de
situar os usos dos produtos em seus contextos sócio-culturais (idem: 380). Segundo a
autora, esses trabalhos criaram um ambiente mais receptivo para a subseqüente onda de
pesquisa etnográfica que tomou o campo do design (idem). Tal onda teria invadido o
campo a partir de dois temas entrelaçados: de um lado, o surgimento de uma série de
abordagens teórico-metodológicas, e, de outro, o desenvolvimento de redes de relações
sociais que conectaram profissionais dos campos da antropologia, da computação e do
design.
6
Quanto aos marcos históricos do uso de abordagens antropológicas e/ou
etnográficas no design, Wasson identifica nos anos 1980 o início da onda de pesquisa
etnográfica (idem: 380), com os estudos de computer-supported cooperative work
(CSCW) (idem), área de pesquisa interdisciplinar dedicada ao entendimento de como os
seres humanos interagem com os programas computacionais nas suas estações de
trabalho (idem). Segundo a autora, os pesquisadores nessa área são cientistas sociais
que estudam os usuários de tecnologia em suas práticas de trabalho, cientistas
computacionais e desenvolvedores de programas que projetam os sistemas, e
especialistas de mudanças organizacionais que guiam as transformações nas práticas de
trabalho que seguem a adoção de novas tecnologias (idem). Nesse quadro,
“anthropologists have been prominent members of the CSCW community from the start.
Their contribuition has been to highlight the importance of empirically examinig the
everyday practices of computer users” (idem).
Entretanto, Wasson ressalta que, antes de a etnografia entrar em cena, para
compreender os usuários, os designers costumavam fazer uso de um outro tipo de
ciência social, a saber, a psicologia cognitiva, e, em particular, a pesquisa de fatores
humanos (idem: 377). Essa área de estudos, segundo a autora, investiga que tipos de
produtos são mais fáceis de usar, os mais naturais para os consumidores (idem). Apesar
da considerável aceitação do uso de procedimentos próprios da psicologia cognitiva no
campo do design, “ethnography has been so intuitively appealing to designers (and
their clients) because it promises to reveal a whole new dimension of “the user” (idem:
378).
Assim, Wasson considera que a etnografia faz sucesso, entre os designers,
porque propõe investigar não apenas o que os consumidores dizem fazer, mas o que eles
fazem, de fato (idem). Além disso, ou por causa disso, os estudos etnográficos teriam
trazido à tona significativas discrepâncias entre o que os designers intencionavam para
os usos dos produtos por ele projetados e os comportamentos cotidianos dos
consumidores. Assim, “such discoveries had a strong impact on the design field,
highlighting the importance of learning about the product use “in the wild”” (idem).
Nesse sentido, a análise de Wasson se alinha à de Clarke: para ambas, a antropologia
(ou etnografia) causa tanto impacto no campo do design porque aponta para toda uma
nova dimensão do usuário (idem) e suas questões.
7
Tal aproximação entre design e antropologia foi explorada, de forma pioneira,
no Centro de Pesquisa da XEROX, em Palo Alto, Estados Unidos. No Xerox Palo Alto
Research Center (PARC), reuniu-se uma série de antropólogos colaborando diretamente
com designers e engenheiros, na utilização de abordagens etnográficas a serviço do
desenvolvimento de programas computacionais (idem: 381). A partir de então, tornou-
se prática corrente em empresas de design a contratação de antropólogos, não apenas na
América do Norte, mas também no Brasil, onde nos últimos anos é possível encontrar
antropólogos colaborando com pesquisa e desenvolvimentos de produtos e serviços, na
área do design, em nível empresarial.
Nesse contexto de ações a nível corporativo, se atribui à colaboração da
antropóloga Lucy Suchman no XEROX Parc o desenvolvimento do grande botão verde
que até hoje compõe o visor das fotocopiadoras. A partir dessa experiência, se criou o
que Clarke nomeia de mito do poder mágico da antropologia corporativa (Clarke, 2011:
10), o que, para ela, não é tão relevante quanto a mudança em direção à conscientização
da responsabilidade social do design, que nasce a partir do surgimento de uma
sensibilidade em direção aos aspectos culturais, estimulada pelo contato com
antropólogos e as teorias e abordagens oriundas dessa disciplina (2011: 11).
Em outra esfera de discussão, o designer e pensador do design brasileiro Pedro
Luiz Pereira de Souza aponta para a importância da entrada em cena, no campo do
design, da idéia de relativismo cultural, até então condenada e posta de lado pela
disciplina. Segundo ele, essa idéia se faz presente, no design, através da ergonomia e
dos estudos do antropólogo americano Gordon W. Hewes (1917-1997), que,
interessado, pelos aspectos culturais e antropológicos das posições corporais, chamou a
atenção dos designers para a necessária consideração da diversidade dos hábitos
corporais no desenho de objetos dentro de uma civilização tecnológica. Assim, “o
conceito de relativismo cultural fez, através da ergonomia, uma entrada triunfal no
universo do design moderno acostumado ao autoritarismo ocidental” (Souza, 2008: s/p).
Em comum nessas narrativas, a vontade de identificar as origens da
aproximação do design em relação à antropologia - movimento que, para alguns desses
autores, é responsável por consideráveis transformações na forma como se pratica o
design, hoje. Se interessa, àqueles mais explicitamente situados no campo do design,
compreender o que move essa vontade de aproximação - seja em termos históricos, seja
8
em termos conceituais -, é porque a chamada ‘design anthropology’ vem se afirmando
como um sub-campo do design com características teórico-metodológicas e localizações
institucionais específicas, e que ganha cada vez mais espaço, naquele campo
profissional-disciplinar.
Se aqueles envolvidos com pesquisas e projetos de ‘design anthropology’ tem
tanto formação em design ou em antropologia, quanto (fenômeno mais recente)
formação híbrida entre as duas disciplinas, e se existe hoje (como é o caso de Aberdeen)
um mestrado de ‘design anthropology’ dentro de um programa de antropologia, deve-se
cogitar sobre as implicações desse sub-campo também para esta ciência social. Ou seja,
é preciso que a antropologia perceba como ocorrem fenômenos como esse,
considerando que neles se encontra a oportunidade de discutir, também, e a partir de
renovadas perspectivas, algumas definições e recortes que incidem sobre a disciplina na
contemporaneidade.
Bibliografia
CARDOSO, Rafael. Uma introdução à história do design. São Paulo: Blucher, 2008.
CLARK, Brendon. Design as sociopolitical navigation. A performative framework for
action-oriented design. PhD Thesis. Apresentada ao Mads Clausen Institute for Product
Innovation, University of Southern Denmark, 2007.
CLARKE, Alison J. (Ed.). Design anthropology. Object culture in the 21st century.
Viena: Springer-Verlag, 2011.
CLARKE, Alison J. “The anthropological object in design: from Victor Papanek to
Superstudio”. In: Design anthropology. Object culture in the 21st century. Viena:
Springer-Verlag, 2011, p. 74-87.
FRASCARA, Jorge. Design and the social sciences: making connections. Londres e
Nova York: Taylor & Francis, 2002.
KERSEY, Jen Cardew. Final Paper/Annotated Bibliographies. Trabalho de conclusão
do curso “Introduction to design anthropology”, ministrado por Christina Wasson na
University of North Texas, verão de 2007.
9
LENSKJOLD, Tau Ulv. “Accounts of a critical artefacts approach to design
anthropology”. Comunicação apresentado ao Nordic Design Research Conference,
2011. www.nordes.org
PACHECO, Heliane Soneghet. O design e o aprendizado. Barraca: quando o design
social deságua no desenho coletivo. Dissertação de Mestrado em Design. Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, 1996.
PAPANEK, Victor. Design for the real world. Chicago: Academy Chicago Publishers,
2000.
PAPANEK, Victor. Arquitectura e design. Ecologia e ética. Lisboa: Edições 70, 1995.
SOUZA, Pedro Luiz Pereira de. “Design moderno: a Natureza”. Texto inédito
disponibilizado para os alunos do curso “Design moderno: a Natureza”, realizado no
Centro de Design de Recife, 2008.
THARP, Bruce M. (Ed.). Ethnography and design: resources for teaching and
research. Department of Anthropology, University of Chicago, march 2006.
WASSON, Christina. “Ethnography in the field of design”. In: Human Organization, v.
59, n. 4, winter 2000, p. 377-388.
WEBER, Leslie MacNeil. Design ethnography: strategy for visual communications.
Graduate Thesis, Visual Communication Design, Division of Design, University of
Washington, 2009.

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  • 1. 1 A antropologia do design: observações sobre as apropriações da prática antropológica pelo design hoje1 Zoy Anastassakis, Prof. Adj. ESDI/UERJ Resumo No campo do design, há quase trinta anos vem ocorrendo um forte investimento de aproximação com conceitos e ferramentas relacionados à prática antropológica. Esse movimento expandiu-se de tal forma que hoje é possível encontrar antropólogos contratados por escritórios de design, em diversas regiões do mundo, bem como dois programas de mestrado em ‘design anthropology’ - no Departamento de Antropologia da Universidade de Aberdeen, Escócia, e no Departamento de Design da Universidade de Swinbourne, Austrália. É fácil, também, adquirir publicações sobre antropologia aplicada ao design. No Brasil, em cursos de graduação em design como o da PUC-Rio, nas fases de projeto em que precisam ir a campo coletar informações e travar contato com aqueles para quem eles desenvolvem os produtos, os alunos são acompanhados e orientados por antropólogos. No Rio Grande do Sul, alunos da especialização em design estratégico da UNISINOS também são apresentados à antropologia, e praticam exercícios que envolvem pesquisa etnográfica de campo. Nessa comunicação, a partir de uma rápida revisão histórica de tal aproximação, pretendo discutir algumas implicações das apropriações da antropologia pelo campo do design, e, assim, contribuir para o debate sobre as demandas, definições e recortes que incidem sobre a antropologia na contemporaneidade. Palavras-chave: antropologia – design – interdisciplinaridade 1 Trabalho apresentado na 28a Reunião Brasileira de Antropologia, realizada entre os dias 02 e 05 de julho de 2012, em São Paulo, SP, Brasil.
  • 2. 2 Em 2011, a editora austríaca Springer-Verlag publicou a coletânea de artigos “Design anthropology: object culture in the 21st century”, organizada pela professora de história e teoria do design na Universidade de Artes Aplicadas de Viena, Alison J. Clarke. Além de lecionar, a editora do livro, mestre em história do design pelo Royal College de Londres, doutora em antropologia social pela Universidade College London, é diretora de pesquisa de Fundação Victor Papanek. Autora do livro “Tupperware: the promise of plastic in 1950s America”, Alison Clarke também organizou, no Royal College, em 2005, a conferência internacional “Interior Insights: design, ethnography and the home”. O termo ‘design anthropology’, que dá nome à coletânea publicada em 2011, nomeia também dois cursos de mestrado strictu sensu, um deles na Escócia, o outro na Austrália. O curso australiano, coordenado pela antropóloga norte-americana Dori Tunstall, é oferecido pela Swinburne University of Technology, em seu departamento de design. O curso escocês é oferecido pela Universidade de Aberdeen, em seu departamento de antropologia. Sob coordenação do antropólogo James Leach, o programa tem parceria com o Participatory Innovation Research Centre, do Mads Clausen Institute for Product Innovation, University of Southern Denmark, que, por sua vez, foi parceiro da Danish Design School e de outras seis organizações no desenvolvimento da publicação “Rehearsing the future”, de 2010, que apresenta os resultados de um projeto-piloto que buscava colocar em prática o que foi ali nomeado de Design Anthropological Innovation Model (DAIM). Variações do termo ‘design anthropology’ são encontradas em inúmeros outros trabalhos, resultados de pesquisas acadêmicas e de práticas correntes no mercado, ligados ambos ao campo profissional-acadêmico do design, em diversos contextos. Citemos alguns exemplos, ligados à universidade: em 2011, na Nordic Design Research Conference, Tau Ulv Lenskjold, da Danish Design School, apresenta o artigo “Accounts of a critical artefacts approach to design anthropology”. Em 2009, Leslie MacNeil Weber apresenta, na divisão de design da Universidade de Washington, EUA, a monografia de conclusão da graduação “Design ethnography: strategy for visual communications”. Dois anos antes, em 2007, na University of Southern Denmark, no já citado Mads Clausen Institute for Product Innovation, Brendon Clark apresenta a tese de doutorado intitulada “Design as sociopolitical navigation. A performative framework
  • 3. 3 for action-oriented design”, que tem um capítulo inteiramente dedicado à conceituação do que o autor nomeia de “action-oriented design ethnography”. No mesmo ano, durante o curso “Introduction to Design Anthropology”, ministrado pela antropóloga Christina Wasson, na University of North Texas, o aluno Jen Cardew Kersey organiza uma bibliografia comentada sobre o tema do curso. No ano anterior, Bruce M. Tharp, do Departamento de Antropologia da Universidade de Chicago, compila o volume “Ethnography and design: resources for teaching and research”. Em 2002, é publicada a coletânea de artigos, “Design and the social sciences: making connections”, organizada pelo designer Jorge Frascara, referência importante para a consolidação de algumas tendências que iriam se espraiar pelo campo do design, em diversos contextos nacionais, nos anos seguintes. Professora associada do departamento de antropologia da University of North Texas, Christina Wasson é autora de um artigo citado em vários dos trabalhos mencionados acima. Publicado em 2000 pela revista “Human Organization”, produzida pela Society for Applied Anthropology, o artigo “Ethnography in the field of design” comenta alguns (dos considerados) episódios-chave para a aproximação do design com conceitos e práticas identificadas por aquela comunidade acadêmico-profissional como próprias da antropologia. Os trabalhos acima citados, todos eles produzidos a partir de universidades, tem em comum o investimento em traçar o histórico das relações entre design e antropologia, o que, no campo do design - seja na academia seja no mercado -, vem cada vez mais ganhando espaço. Investigando o que Clarke identifica como uma transformação do design, via antropologia (Clarke, 2011: 10), vários desses autores localizam entre as décadas de 1970 e 1980 o início de uma aproximação mais sistemática, em meio à comunidade de design, com as questões e os procedimentos associados, por eles, à antropologia. Dessa forma, segundo Clarke, o livro “Design anthropology” descreve a seismic shift in the way experts and users conceptualize, envisage, and engaje in object culture. As the output of contemporary design becomes evermore diverse, the term design itself is increasingly redundant in its capacity to capture the sheer heterogeneity of the processes, practices, and materialities involved in the making of stuff. Designers are now as likely to engaje in social research as they are in making of form: once an intuitive
  • 4. 4 process, gauging cultural relevance has become part of a burgeoning área – design anthropology (2011: 09). Na coletânea organizada por Clarke (2011), a editora assina um artigo que propõe explorar a relação histórica do design com a antropologia (Clarke, 2011: 74), a partir da década de 1970, onde entende haver um ponto de inflexão crucial para a profissão do design, que passa a questionar, naquele momento, seu papel social e ecológico na produção de mercadorias (idem). Segundo a autora, a emergência de uma cultura crítica no campo do design, que questionava a própria prática da disciplina em suas relações com a sociedade, chama a atenção dos seus praticantes para a antropologia, que, naquele momento, parece oferecer um modelo alternativo de uma criatividade ‘não-capitalista’ (idem). Nesse movimento, haveria, nos anos 1970, a move towards anthropology as a source of pre-modern promise. The vernacular and anthropological object was a remnant of a world as yet untouched by wanton commercialism, applied aesthetics, and alienating commodity culture. As a source, the objects of other cultures offered designers the opportunity to re-enchant society and free themselves from the stigma of being the ‘handmaidens’ of capitalism (idem: 77). Nesse contexto, teve papel fundamental o livro “Design for a real world”, de Victor Papanek, publicado em 1971. Segundo Clarke, no livro, o autor aponta para a antropologia como um antídoto para a condição alienada da qual toda uma geração de designers desiludidos (idem: 78) sentia estar aprisionada. Assim, as proposições de Papanek, no livro, explicitavam o que seria um dos grandes dilemas dos designers no século XX, a saber: sua inconsciência quanto às responsabilidades morais e sociais envolvidas na prática profissional. Em busca de ecologias alternativas de design (idem: 79), ele reuniu uma considerável bibliografia de antropologia, bem como fez diversas incursões em campo, em meio a vários grupos sociais, dentre eles os esquimós, tema do artigo “Os melhores designers do mundo?”, publicado no livro “Arquitectura e Design. Ecologia e Ética” (Papanek, 1995). É importante ressaltar, como faz Clarke, que o interesse de Papanek (que se expande rapidamente pelo campo do design) por antropologia é parte de uma ampla popularização desse campo de estudos no correr dos anos 1970 (idem). Segundo a autora, o que fez do interesse de Papanek pela antropologia uma influência tão efetiva em meio a comunidade de designers é sua habilidade de aplicar princípios de análise dos objetos e da cultura material em sua cultura, assim como nas demais. Ou seja, Papanek combinava uma compreensão nuançada das culturas materiais nativas com
  • 5. 5 uma fascinação informada pelo exoticismo de sua própria cultura. Dessa forma, segundo Clarke, ele conseguia revelar, em suas observações, as idiossincrasias do design. Destacando o papel fundamental de Papanek na popularização da antropologia entre os designers, Clarke sublinha que “there has been a seismic shift in the design culture in the last decades, whereby ‘users’ and methods of anthropological inquiry have emerged as the key means of deciphering the nuances of object/subject relations” (idem: 86). Em 1976, o austríaco Victor Papanek e o alemão Gui Bonsiepe se encontraram na conferência “Design for need”, organizada pelo International Council of Societies of Industrial Design (ICSID), no Royal College of Art, Londres. Nesse encontro, discutiram o papel do design em países periféricos, e, embora com perspectivas divergentes, concordaram que a construção de economias periféricas deveria ser um compromisso entre os designers socialmente responsáveis. Em artigo publicado no ano de 2000, Christina Wasson discorre sobre como a etnografia se tornou parte do vocabulário de designers, seja na universidade, seja nas empresas. Para a autora, o interesse pela antropologia, e, mais especificamente pelo que ela nomeia de métodos antropológicos (Wasson, 2000: 377), nasce da necessidade, estrutural ao design, de identificar e atender as necessidades e desejos daqueles que usam os objetos projetos pelos designers, a saber, os consumidores ou usuários (2000: idem). Afinal, segundo ela, “a successfully designed item is one that is easily adopted by consumers. This may be because the product’s use fit with existing behavior patterns or because it signals a new use in a clear and compelling way” (idem). Para Wasson, a busca pela identificação de padrões de comportamento dos usuários ganha novos contornos e significados entre os anos 1980 e 1990, quando alguns pesquisadores de design iniciam estudos que atentam para a necessidade de situar os usos dos produtos em seus contextos sócio-culturais (idem: 380). Segundo a autora, esses trabalhos criaram um ambiente mais receptivo para a subseqüente onda de pesquisa etnográfica que tomou o campo do design (idem). Tal onda teria invadido o campo a partir de dois temas entrelaçados: de um lado, o surgimento de uma série de abordagens teórico-metodológicas, e, de outro, o desenvolvimento de redes de relações sociais que conectaram profissionais dos campos da antropologia, da computação e do design.
  • 6. 6 Quanto aos marcos históricos do uso de abordagens antropológicas e/ou etnográficas no design, Wasson identifica nos anos 1980 o início da onda de pesquisa etnográfica (idem: 380), com os estudos de computer-supported cooperative work (CSCW) (idem), área de pesquisa interdisciplinar dedicada ao entendimento de como os seres humanos interagem com os programas computacionais nas suas estações de trabalho (idem). Segundo a autora, os pesquisadores nessa área são cientistas sociais que estudam os usuários de tecnologia em suas práticas de trabalho, cientistas computacionais e desenvolvedores de programas que projetam os sistemas, e especialistas de mudanças organizacionais que guiam as transformações nas práticas de trabalho que seguem a adoção de novas tecnologias (idem). Nesse quadro, “anthropologists have been prominent members of the CSCW community from the start. Their contribuition has been to highlight the importance of empirically examinig the everyday practices of computer users” (idem). Entretanto, Wasson ressalta que, antes de a etnografia entrar em cena, para compreender os usuários, os designers costumavam fazer uso de um outro tipo de ciência social, a saber, a psicologia cognitiva, e, em particular, a pesquisa de fatores humanos (idem: 377). Essa área de estudos, segundo a autora, investiga que tipos de produtos são mais fáceis de usar, os mais naturais para os consumidores (idem). Apesar da considerável aceitação do uso de procedimentos próprios da psicologia cognitiva no campo do design, “ethnography has been so intuitively appealing to designers (and their clients) because it promises to reveal a whole new dimension of “the user” (idem: 378). Assim, Wasson considera que a etnografia faz sucesso, entre os designers, porque propõe investigar não apenas o que os consumidores dizem fazer, mas o que eles fazem, de fato (idem). Além disso, ou por causa disso, os estudos etnográficos teriam trazido à tona significativas discrepâncias entre o que os designers intencionavam para os usos dos produtos por ele projetados e os comportamentos cotidianos dos consumidores. Assim, “such discoveries had a strong impact on the design field, highlighting the importance of learning about the product use “in the wild”” (idem). Nesse sentido, a análise de Wasson se alinha à de Clarke: para ambas, a antropologia (ou etnografia) causa tanto impacto no campo do design porque aponta para toda uma nova dimensão do usuário (idem) e suas questões.
  • 7. 7 Tal aproximação entre design e antropologia foi explorada, de forma pioneira, no Centro de Pesquisa da XEROX, em Palo Alto, Estados Unidos. No Xerox Palo Alto Research Center (PARC), reuniu-se uma série de antropólogos colaborando diretamente com designers e engenheiros, na utilização de abordagens etnográficas a serviço do desenvolvimento de programas computacionais (idem: 381). A partir de então, tornou- se prática corrente em empresas de design a contratação de antropólogos, não apenas na América do Norte, mas também no Brasil, onde nos últimos anos é possível encontrar antropólogos colaborando com pesquisa e desenvolvimentos de produtos e serviços, na área do design, em nível empresarial. Nesse contexto de ações a nível corporativo, se atribui à colaboração da antropóloga Lucy Suchman no XEROX Parc o desenvolvimento do grande botão verde que até hoje compõe o visor das fotocopiadoras. A partir dessa experiência, se criou o que Clarke nomeia de mito do poder mágico da antropologia corporativa (Clarke, 2011: 10), o que, para ela, não é tão relevante quanto a mudança em direção à conscientização da responsabilidade social do design, que nasce a partir do surgimento de uma sensibilidade em direção aos aspectos culturais, estimulada pelo contato com antropólogos e as teorias e abordagens oriundas dessa disciplina (2011: 11). Em outra esfera de discussão, o designer e pensador do design brasileiro Pedro Luiz Pereira de Souza aponta para a importância da entrada em cena, no campo do design, da idéia de relativismo cultural, até então condenada e posta de lado pela disciplina. Segundo ele, essa idéia se faz presente, no design, através da ergonomia e dos estudos do antropólogo americano Gordon W. Hewes (1917-1997), que, interessado, pelos aspectos culturais e antropológicos das posições corporais, chamou a atenção dos designers para a necessária consideração da diversidade dos hábitos corporais no desenho de objetos dentro de uma civilização tecnológica. Assim, “o conceito de relativismo cultural fez, através da ergonomia, uma entrada triunfal no universo do design moderno acostumado ao autoritarismo ocidental” (Souza, 2008: s/p). Em comum nessas narrativas, a vontade de identificar as origens da aproximação do design em relação à antropologia - movimento que, para alguns desses autores, é responsável por consideráveis transformações na forma como se pratica o design, hoje. Se interessa, àqueles mais explicitamente situados no campo do design, compreender o que move essa vontade de aproximação - seja em termos históricos, seja
  • 8. 8 em termos conceituais -, é porque a chamada ‘design anthropology’ vem se afirmando como um sub-campo do design com características teórico-metodológicas e localizações institucionais específicas, e que ganha cada vez mais espaço, naquele campo profissional-disciplinar. Se aqueles envolvidos com pesquisas e projetos de ‘design anthropology’ tem tanto formação em design ou em antropologia, quanto (fenômeno mais recente) formação híbrida entre as duas disciplinas, e se existe hoje (como é o caso de Aberdeen) um mestrado de ‘design anthropology’ dentro de um programa de antropologia, deve-se cogitar sobre as implicações desse sub-campo também para esta ciência social. Ou seja, é preciso que a antropologia perceba como ocorrem fenômenos como esse, considerando que neles se encontra a oportunidade de discutir, também, e a partir de renovadas perspectivas, algumas definições e recortes que incidem sobre a disciplina na contemporaneidade. Bibliografia CARDOSO, Rafael. Uma introdução à história do design. São Paulo: Blucher, 2008. CLARK, Brendon. Design as sociopolitical navigation. A performative framework for action-oriented design. PhD Thesis. Apresentada ao Mads Clausen Institute for Product Innovation, University of Southern Denmark, 2007. CLARKE, Alison J. (Ed.). Design anthropology. Object culture in the 21st century. Viena: Springer-Verlag, 2011. CLARKE, Alison J. “The anthropological object in design: from Victor Papanek to Superstudio”. In: Design anthropology. Object culture in the 21st century. Viena: Springer-Verlag, 2011, p. 74-87. FRASCARA, Jorge. Design and the social sciences: making connections. Londres e Nova York: Taylor & Francis, 2002. KERSEY, Jen Cardew. Final Paper/Annotated Bibliographies. Trabalho de conclusão do curso “Introduction to design anthropology”, ministrado por Christina Wasson na University of North Texas, verão de 2007.
  • 9. 9 LENSKJOLD, Tau Ulv. “Accounts of a critical artefacts approach to design anthropology”. Comunicação apresentado ao Nordic Design Research Conference, 2011. www.nordes.org PACHECO, Heliane Soneghet. O design e o aprendizado. Barraca: quando o design social deságua no desenho coletivo. Dissertação de Mestrado em Design. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 1996. PAPANEK, Victor. Design for the real world. Chicago: Academy Chicago Publishers, 2000. PAPANEK, Victor. Arquitectura e design. Ecologia e ética. Lisboa: Edições 70, 1995. SOUZA, Pedro Luiz Pereira de. “Design moderno: a Natureza”. Texto inédito disponibilizado para os alunos do curso “Design moderno: a Natureza”, realizado no Centro de Design de Recife, 2008. THARP, Bruce M. (Ed.). Ethnography and design: resources for teaching and research. Department of Anthropology, University of Chicago, march 2006. WASSON, Christina. “Ethnography in the field of design”. In: Human Organization, v. 59, n. 4, winter 2000, p. 377-388. WEBER, Leslie MacNeil. Design ethnography: strategy for visual communications. Graduate Thesis, Visual Communication Design, Division of Design, University of Washington, 2009.