Este documento fornece um resumo de uma oficina sobre técnicas literárias e jornalismo literário. A oficina é dividida em dois dias. No primeiro dia, os participantes recebem uma apresentação teórica sobre as técnicas literárias e fazem exercícios. No segundo dia, eles produzem textos próprios e participam de um sarau literário e publicação em blog. O documento também discute conceitos como jornalismo, literatura e jornalismo literário, e apresenta técnicas como construção de cenas, diálog
2. Dinâmica da oficina
Primeiro Dia
Apresentação
Apresentação da Teoria
Leitura de Textos
Apresentação das Técnicas Literárias
Exercícios
Segundo Dia
Exercício de observação
Produção textual
Sarau literário
Publicação no Blog
3. O que é o jornalismo?
“O jornalismo, independente de qualquer definição
acadêmica, é uma fascinante batalha pela conquista
das mentes e corações de seus alvos. A objetividade é o
tempero desta batalha, e a neutralidade a posição
ideal, porém se resume só aos editoriais dos
jornais”.(Clóvis Rossi)
4. O que é a Literatura?
A Literatura é como as demais formas de arte, tem a
capacidade de provocar no leitor um estranhamento
diante da realidade, como se a víssemos pela primeira
vez, sob um prisma diferente. (Chklovski, escritor
russo)
A Literatura é a expressão da sociedade, como a
palavra é a expressão do homem.(Louis de Bonald,
crítico do Romantismo francês)
5. Por onde caminham o Jornalismo e a Literatura?
Ato Funções da
Comunicativo Linguagem
Emissor Quem fala Emotiva
Mensagem O que se fala Poética Literatura
Receptor Para quem se Conativa Publicidade
fala
Canal Por qual meio se Fática
fala
Código Como se fala Metalinguística
Contexto Onde e quando Referencial Jornalismo
se fala
6. Por onde caminham o Jornalismo e a Literatura?
As funções não são exploradas isoladamente. Na
prática, ocorre a superposição de cada uma delas,
sendo que sempre uma se sobressai. Nesse caso, a que
se sobressai é a que indica a finalidade principal do
texto
7. E o Jornalismo Literário? Onde fica?
É função poética ou função referencial?
8. Conceito de Jornalismo Literário
Modalidade de prática da reportagem de profundidade
e do ensaio jornalístico utilizando recursos de
observação e redação originários da (ou inspirados
pela) literatura.
Traços básicos: imersão do repórter na realidade, voz
autoral, estilo, precisão de dados e informações, uso de
símbolos (inclusive metáforas), digressão e
humanização.(Edvaldo Pereira Lima)
9. Onde surgiu?
Primórdios:
Séc. 18 – França e Inglaterra
Realismo na literatura divulgado nas páginas dos
Folhetins
Precurssores: Balzac, Victor Hugo, Charles Dickens,
Dostoievski, Flaubert etc.
No Brasil: Machado de Assis, Raul Pompéia, Aloísio
Azevedo etc.
10. No Brasil
Destaque para Euclides da Cunha
“A linha férrea corre no lado oposto. Aquele liame do
progresso passa, porém, por ali, inútil, sem atenuar sequer o
caráter genuinamente roceiro do arraial. Salta-se do trem;
transpõe-se poucas centenas de metros entre casas
deprimidas; e topa-se para logo, à fímbria da praça – o
sertão... Está-se no ponto de tangência de duas sociedades,
de todo alheias uma à outra. O vaqueiro encourado emerge
da caatinga, rompe entre a casaria desgraciosa, e estaca o
campião junto aos trilhos, em que passam,
vertiginosamente, os patrícios do litoral, que o não
conhecem.”
11. New Journalism
Década de 1960 – EUA
Gay Talese, um dos representantes dessa especialização,
definiu esse tipo de jornalismo como:
“New journalism (ou narrative writing, que seja) quer
dizer apenas escrever bem. É um texto literário que não
é inventado, não é ficção, mas que é narrado como um
conto, como uma sequência de filme. É como um
enredo dramático digno de ser levado aos palcos e não
apenas um amontoado de fatos, fácil de ser digerido.”
12. Representantes do New Journalism
Tom Wolfe (Radical Chique e o New Journalism)
Gay Talese (Fama e Anonimato; O Reino e o Poder)
Norman Mailer (O super-homem vai ao
supermercado)
Truman Capote (A Sangue Frio)
John Hersey (Hiroshima)
Joseph Mitchell (O Segredo de Joe Gould)
14. Jornalismo Literário no Brasil
Revista Realidade (considerada até hoje a Bíblia do
Jornalismo Literário brasileiro)
(vídeo – Revista Realidade)
15. Jornalismo Literário no Brasil
Autores
Caco Barcellos
José Hamilton Ribeiro
Eliane Brum
Marcos Faerman
Roberto Freire
Revistas
Revista Piauí
Revista Caros Amigos
16. Características do Jornalismo Literário
Emprego de técnicas literárias;
Profunda observação;
Profunda pesquisa de campo;
Criatividade;
Grande caracterização dos personagens;
Ambientação do fato narrado;
Fuga das regras do texto jornalístico; convencional.
17. E qual é a do Jornalismo Literário?
•Ir além do factual
•Ir além da objetividade
•Ir além dos dados
estatísticos
•Ir além do lead
18. E qual é a do Jornalismo Literário?
O Jornalismo Literário:
•Humaniza o texto
•Aprofunda a reportagem
•Trabalha a linguagem
•Observa os detalhes
•Vai além do lead
20. Técnicas Literárias
1. Construção cena a cena
2. Reprodução de diálogos
3. Foco narrativo
4. Fluxo de consciência
21. Exemplo de abertura:
narração convencional
A nave se prepara para pousar. Da escotilha enxerga-se o solo arenoso e
acidentado da Lua. É dia. O Sol brilha, intenso e dourado, como você o
vê aqui da Terra, só que cercado de estrelas, num céu completamente
negro. É que na Lua não existe atmosfera e, sem atmosfera, não tem os
gases que, espalhando a luz solar, nos dão a ilusão de que o céu é azul.
Na Lua, o firmamento é sempre escuro. A nave se aproxima ainda
mais. Dá para ver, lá em baixo, jipes e robôs que zanzam pelas colinas.
Homens vestindo macacões super-refrigerados e capacetes com
oxigênio caminham pela planície como que em câmera lenta. É que lá
a gravidade é uma lei mais fraca, mal corresponde a um sexto da
gravidade que nos prende à Terra. O foguete pousa suavemente. Os
passageiros se preparam para desembarcar. Colocam suas roupas com
proteção térmica. Fora da cúpula protetora da primeira colônia
terráquea, a temperatura atinge esturricantes 123 gruas Celsius.
22. Narração cena a cena
Construção cena a cena (cena presentificada) – é o
relato detalhado do acontecimento à medida que ele se
desenvolve, desdobrando-o como em uma projeção
cinematográfica. Mas, como a vida do personagem não
transcorre somente no universo de suas ações diretas,
pode-se estabelecer relações com acontecimentos
paralelos, que, de alguma forma, contribuíram para o
destino do biografado
23. Construção cena a cena
Exemplo 1:
Chegam à casa ao entardecer. São um pequeno grupo de
policiais. Todos uniformizados. Passeiam pela sala e olham a
biblioteca. Riem com sarcasmo. Pegam o livro História da
Diplomacia. "Assim que os kosovares descendentes de
albaneses também querem ser diplomatas?" Mudam o tom
da conversa. Gritam. "Nos dê chaves", exigem. "Pegue uma
mala", ordenam. "Deixa o resto. Tens 10 minutos. Logo irás
para a Albânia e nunca mais voltarás. Nem sequer poderás
voltar a sonhar com Kosovo", profetizam.
24. Construção cena a cena
Exemplo 2:
O texto de Gay Talese sobre o ex-campeão mundial Joe
Louis começa descrevendo a cena do atleta chegando de
viagem e termina com a cena da segunda ex-mulher de
Louis, Rose Morgan, assistindo em casa,como amigos e o
atual marido, a um tape de uma luta de Louis. O tom do
texto é o da melancolia pelo envelhecimento do ex-
campeão.
25. Construção cena a cena
CENA 1
“Oi, doçura!” Joe Louis chamou a esposa, localizando-a esperando por ele, no aeroporto
de Los Angeles.
Ela sorriu, caminhou em sua direção e estava para espichar-se sobre os pés para beijá-lo
–mas parou, de repente.
“Joe”, disse ela, “Cadê sua gravata?”
“Ah, docinho”, disse ele, dando de ombros, “passei a noite toda fora em Nova York e não
tive tempo...”
A noite toda!”, interrompeu ela. “Quando você está aqui, tudo o que faz é dormir,
dormir, dormir”.
“Docinho”, disse Joe Louis com um sorriso cansado, “sou um véio”.
“Sim”, concordou ela, “mas quando você vai para Nova York tenta ser jovem de novo”.
26. Construção cena a cena
CENA 2
Rose parecia entusiasmada em ver Joe no auge da forma e toda vez que um murro de Louis golpeava
Conn, ela fazia “Pann!” (soco). “Pann” (soco). “Pann!” (soco).
Billy Conn impressionava bem, na luta, mas, quando a tela anunciou o assalto 13, alguém disse:
“É aqui que Conn vai cometer seu erro, vai querer sair na força bruta pra cima do Joe Louis”. O marido
de Rose ficou quieto, saboreando seu scotch.
Quando os golpes combinados de Joe começaram a encaixar, Rose começou, “Pann! Paann!”, e então
o corpo pálido de Conn começou a cair no tablado.
Billy Conn começou lentamente a se levantar. O juiz contava. Suspendeu uma perna, depois as duas,
depois já estava de pé –mas o juiz o forçou de volta. Era tarde demais.
E então, pela primeira vez, do fundo da sala, subindo, como em ondas crescentes, desde as felpudas
almofadas do sofá, surge a voz do atual marido –esta droga de Joe Louis outra vez.
“Acho que o Conn levantou a tempo”, disse, “mas o juiz não o deixou continuar”.
Rose Morgan não disse nada –apenas tomou o resto de sua bebida.
(apud. LIMA, 2009, p.202)
27. Reprodução de diálogos
2) Reprodução do diálogo das personagens – segundo
Tom Wolfe, os diálogos são um dos recursos que mais
envolvem o leitores.
28. Reprodução de diálogos
Exemplo:
Um antigo balcão de metal – desses típicos de escritório – separa os fregueses da área
onde estão Roque Mascarin, 71 anos, e Sebastião Peixe, 74 anos. O salão forma um “L” e
não tem mais que 30 metros quadrados. Nas prateleiras, ao lado esquerdo e ao fundo,
peças de tecidos. No centro, lado a lado, duas máquinas de costura. E outros dois
balcões de madeira. São antigos, de imbuia. “Tem mais de cem anos”, diria mais tarde
seu Mascarin. São usados para riscar moldes e cortar tecidos. Um velho rádio, da
Motorádio, está sintonizado numa emissora AM que toca Nelson Gonçalves quando eu
chego. O aparelho completa a decoração do ateliê. É como se eu abrisse uma porta para
o passado.
Seu Mascarin deixa a velha máquina PFAFF e vem em minha direção.
- Você deve ser o repórter. “Sim, eu que liguei hoje de manhã.”
- Eu só não sei o que você quer com dois velhos. Nós não temos muito para falar.
Estamos no fim de carreira.
29. (continuação)
A carreira de Roque Mascarin tem mais de 60 anos. Aos 9, recém- chegado da roça, fez o
que faziam os meninos ao concluir o grupo escolar. Era hora de procurar emprego, um
ofício. Bateu na alfaiataria de Geraldo Adabo. Nessa época, por volta de1950, São Carlos
tinha talvez centenas de alfaiatarias.
- Eram umas 200 – puxa pela memória seu Mascarin.
- 280. A voz fraca de Sebastião Peixe quebra o silêncio pela primeira vez para corrigir o
colega. Foi na alfaiataria do Adabo que os dois se conheceram. Seu Peixe tinha 10 anos
de idade. Os cabelos estão brancos. É um homem esguio, alto mesmo, quase um metro
e noventa de altura. Mas o corpo arqueado denuncia os efeitos dos anos quando ele se
levanta, para os cumprimentos. É homem frágil.
- Eu que conversei com você no telefone. Eu estou muito doente.
Seu Peixe caminha lentamente e com dificuldade. De volta a maquina de costura, por
várias vezes interrompe o vai e vem dos pés no pedal. Para. O olhar se fixa e se perde em
algum ponto. Parece querer relembrar fatos, pessoas, lugares e histórias enquanto seu
Mascarin ativa na memória os tempos em que São Carlos era a capital dos alfaiates
brasileiros.
30. Foco narrativo
Foco narrativo (ou ponto de vista) – é a perspectiva pela
qual é contada a história. Pode ser:
Narrador-observador (3ª. Pessoa) ou narrador-
personagem (1ª. Pessoa).
Narrador-personagem (1ª. Pessoa)
31. Foco narrativo
Narrador-observador
Exemplo:
“Ali pelas onze horas da manhã o velho Joaquim Prestes
chegou no pesqueiro. Embora fizesse força em se mostrar
amável por causa da visita convidada para a pescaria,
vinha mal-humorado daquelas cinco léguas cabritando na
estrada péssima. Alias o fazendeiro era de pouco riso
mesmo, já endurecido pelos setenta e cinco anos que o
mumificavam naquele esqueleto agudo e taciturno.” - O
poço, de Mário de Andrade.
32. Foco narrativo
Narrador- personagem – quando o narrador participa da
história
Exemplo
“Vai então, empacou o jumento em que eu vinha montado;
fustiguei-o, ele deu dois corcovos, depois mais três, enfim
mais um, que me sacudiu fora da sela,…” “mas um
almocreve, que ali estava, acudiu a tempo de lhe pegar na
rédea e detê-lo, não sem esforço nem perigo. Dominado o
bruto, desvencilhei-me do estribo e pus-me de pé.” -
Memórias Póstuma de Brás Cubas,de Machado de Assis.
33. Fluxo de consciência
Fluxo de consciência – Escrever um fluxo de consciência
é como instalar uma câmera na cabeça da personagem,
retratando fielmente sua imaginação, seus pensamentos.
Como o pensamento, a consciência não é ordenada.
Presente e passado, realidade e desejos, falas e ações se
misturam na narrativa.
34. Fluxo de consciência
Exemplo
Como a humanidade é louca, pensou ela ao atravessar Victoria
Street. Porque só Deus sabe porque amamos tanto isto, o
concebemos assim , elevando-o, construindo-o à nossa volta,
derrubando-o, criando-o novamente a cada instante, mas até as
próprias megeras, as mendigas mais repelentes sentadas às portas
(a beberem a sua ruína) fazem o mesmo; não se podia resolver o seu
caso, ela tinha a certeza, com leis parlamentares por esta simples
razão: porque amam a vida.(Mrs. Dalloway, 1925, trad. port. Lisboa,
Ulisseia, 1982, pp.5-6)
35. EXERCÍCIO 1 - FOCO NARRATIVO
A partir do tema proposto, desenvolva um texto
utilizando o foco narrativo em primeira pessoa, e depois o
foco narrativo em terceira pessoa
Tema: Dois amigos que se encontram depois de muito
tempo numa padaria.
36. EXERCÍCIO 2 – FLUXO DE CONSCIÊNCIA
Carlos Barrios Contreras, 27 anos e o 13º mineiro chileno
a ser resgatado, ficou o tempo todo da clausura sem
saber que seria pai pela segunda vez. Tem um filho de
cinco anos e sua mulher soube que estava grávida uma
semana depois do desmoronamento da mina San José.
Sua esposa, no entanto, foi orientada a não contar a
novidade até que ele fosse resgatado. (extraído e
adaptado do portal G1)
A partir do texto acima construa um texto utilizando o
recurso do fluxo de consciência a partir do ponto de
vista da mulher do mineiro.
37. BIBLIOGRAFIA
JATOBÁ, JOÃO FELIPE BRANDÃO. Técnicas Literárias. Disponível em:
http://migre.me/5KNuv . Acesso em 7.set.2011
LIMA, Edvaldo Pereira. Páginas Ampliadas. São Paulo, Manole, 2004
PRIOSTE, Roberto Nogueira. Os alfaiates de São carlos, Disponível em:
http://migre.me/5KNkI . Acesso em 7.set.2011
SCARTON, Gilberto. Guia de Produção Textual. Disponível em Fonte:
http://www.pucrs.br/gpt/index.php. Acesso em 5.ago.2011