1) O Bioma Pampa no Rio Grande do Sul está sendo rapidamente convertido em monoculturas de árvores exóticas como eucalipto, ameaçando a biodiversidade local.
2) Apenas 0,46% do Pampa gaúcho é protegido em Unidades de Conservação, apesar de sua grande riqueza biológica.
3) O governo estadual apoiou projetos de celulose que converteriam o Pampa em "desertos verdes" de eucalipto, ignorando a legislação ambiental e os estudos de zoneamento realizados
Falta de política de conservação e preservação ambiental promove a conversão do bioma pampa em desertos verdes cintiabarenho
1. Falta
de
Política
de
Conservação
e
Preservação
Ecológica
promove
a
conversão
do
Bioma
Pampa
em
Desertos
Verdes
por
Cíntia
Barenho
Bióloga,
Mestre
em
Educação
Ambiental
e
coordenadora
de
Projetos
do
Centro
de
Estudos
Ambientais
(CEA).
Também
atua
na
Marcha
Mundial
das
Mulheres.
O
Bioma
Pampa
sul-‐rio-‐grandense
abrange
cerca
de
180
mil
Km2,
o
que
equivale
a
cerca
de
60%
da
área
do
Rio
Grande
do
Sul
(RS).
O
Pampa
é
caracterizado
por
uma
vegetação
campestre,
que
predomina
em
relevos
de
planície,
e
por
uma
vegetação
mais
densa,
arbustiva
e
arbórea,
nas
encostas
e
ao
longo
dos
cursos
de
água,
além
da
ocorrência
de
banhados
e
áreas
úmidas.
Além
disso,
as
terras
pampeanas
ocupam
uma
área
de
aproximadamente
700
mil
km2
entre
os
países
da
Argentina,
Uruguai
e
Brasil
(Schnadelbach
&
Picoli,
2007)1.
No
RS
apenas
39%
de
sua
área
total
ainda
é
constituída
por
remanescentes
de
campos
naturais
(Pillar,
2006)2.
E
mesmo
com
uma
imensa
riqueza
de
biodiversidade
e
significantes
endemismos
(ou
seja,
espécies
que
só
ocorrem
nesse
ecossistema)
apenas
0,46%
do
Pampa
gaúcho
está
protegido
em
Unidades
de
Conservação.
Mesmo
assim,
e
em
ritmo
acelerado,
os
campos
sulinos
estão
sendo
convertidos
em
lavouras
e
plantações
de
árvores
exóticas.
Segundo
Pillar
(2006),
entre
os
anos
de
1970
e
2005
mais
de
4,7
milhões
de
hectares
de
pastagens
naturais
foram
modificadas.
Atualmente
o
RS
tem
uma
área
de
mais
de
500
mil
hectares
de
monoculturas
de
árvores
exóticas3
e,
segundo
projeções,
chegaria
a
cerca
de
um
milhão
de
hectares
de
plantações
de
pinus,
eucalipto
e
acácia
até
20154.
A
metade
sul
do
RS,
onde
predomina
o
bioma,
desde
20035
tem
sofrido
a
ofensiva
1
PICOLI,
Luciana
R.
e
SCHNADELBACH,
Carla
V.
(Coord.).
O
pampa
em
disputa:
a
biodiversidade
ameaçada
pela
expansão
das
monoculturas
de
árvores.
Porto
Alegre:
Núcleo
Amigos
da
Terra/Brasil,
2007.
64p.
Disponível
em:
http://goo.gl/sd1hO
2
PILLAR,
V.D.P.
et
al.
Estado
atual
e
desafios
para
a
conservação
dos
campos.
Workshop
-‐
UFRGS,
Porto
Alegre,
março
de
2006.
3
Infelizmente
não
vem
sendo
possível
acessar
dados
oficiais
e
confiáveis
sobre
a
quantidade
de
hectares
de
eucaliptos
plantados
no
Pampa
até
o
momento.
4
No
entanto,
com
a
crise
econômica
do
sistema
capitalista
o
panorama
mudou.
5
Cabe
destacar
que
durante
1980
outra
ofensiva
ocorreu,
resultando
em
monoculturas
de
acácias
(extração
de
resina)
e
pinus
(cavacos).
As
tentativas
de
instalação
de
fábrica
de
celulose
foram
barradas
pela
sociedade
de
Rio
Grande-‐RS.
2. dos
mega-‐projetos
de
celulose
e
papel6.
Os
projetos,
além
de
transformar
o
Pampa
em
imensos
maciços
de
eucalipto
(desertos
verdes),
também
previam
a
instalação
de,
pelo
menos,
três
fábricas
de
pasta
de
celulose.
O
Executivo
Estadual
apoia,
a
sociedade
disputa
de
modelo
O
Governo
estadual
(gestão
Rigotto
e
Yeda
Crusius)
fez
de
“tudo”
para
não
preservar
o
Pampa.
Para
tanto,
assumiu
os
investimentos
do
setor
da
celulose
e
papel
como
projeto
de
governo
(especialmente
Yeda),
incentivando
de
diferentes
formas
a
consolidação
deste
setor
no
Estado.
Pode-‐se
dizer
que
a
principal
foi
a
flexibilização
e
o
descumprimento
da
legislação
ambiental.
Por
exemplo,
excluindo
ou
postergando
a
apresentação
do
Estudo
Prévio
de
Impacto
Ambiental
em
empreendimento
de
florestamento
ou
reflorestamento
para
fins
empresariais
com
menos
de
1000
hectares.
A
sociedade
civil
organizada
(Movimento
Ecológico
Gaúcho)
conquistou,
a
duras
penas,
o
Zoneamento
Ambiental
para
atividade
de
Silvicultura
(ZAS),
desenvolvido
pela
Fundação
Estadual
de
Proteção
Ambiental
e
da
Fundação
Zoobotânica.
Mesmo
sendo
desenvolvido
por
órgão
público,
o
ZAS
foi
desqualificado
e
rechaçado
pelas
empresas,
por
algumas
entidades
e
sindicatos
e,
pelo
próprio
governo,
uma
vez
que
o
zoneamento
limitava
o
plantios
de
pinus
e
eucalipto
em
grande
escala
e
em
determinadas
áreas
do
RS.
Além
da
disputa
por
dentro
do
“sistema”,
a
sociedade,
através
dos
movimentos
sociais-‐ecológicos,
sistematicamente
estava
às
ruas
denunciando
e
condenando
a
transformação
do
Pampa
em
Desertos
Verdes.
Uma
das
ações
mais
condenadas
midiaticamente,
foi
a
ocupação
e
destruição
do
viveiros
de
mudas
da
Aracruz,
por
mulheres
da
Via
Campesina.
Também
era
possível
contar
com
alguns
parlamentares,
ligados
a
campos
ditos
de
esquerda,
que
apoiavam
a
luta
contra
a
expansão
do
projeto.
Sobre
a
mídia,
não
se
pode
deixar
de
destacar
que
nos
meios
de
comunicação 7
imperava
a
desinformação:
comemoravam
os
investimentos,
destacando
apenas
lados
ditos
positivos8.
6
Eram
três
grandes
projetos
–
da
Aracruz,
da
Stora
Enzo
(Finlândia)
e
da
Votorantim
Celulose
e
Papel
(VCP)
–
que
pretendiam
investir
cerca
de
US$
3,5
bilhões
em
sete
anos.
3. A
crise
econômica
do
capital
sobre
os
desertos
verdes
Com
o
agravamento
da
crise
econômica
mundial,
bem
como
com
a
sistemática
luta
e
resistência
local,
os
investimentos
do
setor
de
celulose
e
papel
foram
minguando.
Por
conta
da
crise
e
de
estripulias
junto
ao
mercado
financeiro
(derivativos),
a
Aracruz
foi
incorporada
à
VCP,
transformando-‐se
em
Fibria.
Assim
a
fábrica
de
celulose
de
Guaíba
virou
Fibria,
mas
rapidamente
foi
comprada
pela
empresa
chilena
CMPC9
(Companhia
Manufatureira
de
Papeis
e
Cartões).
Na
Metade
Sul
a
Fibria
anunciou
que
venderia
o
“Projeto
Losango”
para
reduzir
dívidas,
ativos
considerados,
agora
como
não-‐estratégicos.
Empresas
que
até
então
ressaltavam
a
importância
e
suas
boas
intenções
com
o
desenvolvimento
do
RS,
escolhem
outro
cenário
mais
favorável
(no
restante
do
Brasil
os
projetos
seguem
e
se
expandem).
A
volta
dos
que
não
foram:
os
novos
velhos
investimentos
Atualmente
a
ofensiva
papeleira
volta
a
pauta.
Primeiramente
com
o
anúncio
que
a
CMPC
comprou 10
cerca
de
100
mil
hectares
monocultura
de
eucalipto
por
R$
615
milhões
de
reais.
A
chilena,
também
anunciou
que
a
fábrica
de
Guaíba
será
ampliada
e
passará
a
produzir
1.750
mil
ton/ano,
com
início
das
operações
comerciais
em
2015.
O
valor
total
do
investimento
previsto
será
de
R$
4,6
bilhões,
sendo
que
seu
conselho
administrativo
autorizou
obter
crédito
no
valor
de
R$
2,51
bilhões
no
Banco
Nacional
de
Desenvolvimento
Econômico
e
Social
(BNDES).
Projetam
a
geração
de
mais
de
7
mil
postos
de
trabalho
diretos
e
17.100
indiretos,
até
2015.
7
A
principal
empresa
de
comunicação
do
RS,
detentora
de
concessão
pública
de
rádios-‐TV-‐
jornais,
foi
e
é
a
porta-‐voz
das
empresas
promotoras
dos
Desertos
Verdes.
Inclusive
a
mesma
promovia
“campanhas”
de
criminalização
dos
movimentos
sociais-‐ecológicos.
8
Uma
tal
salvação
que
também
não
veio
dos
eucaliptos.
Disponível
em:
http://goo.gl/Tdmzl
9
A
fábrica
de
celulose
de
Guaíba-‐RS
já
foi
Borregaard,
Riocel,
Aracruz,
Fibria,
e
agora
é
da
empresa
CMPC,
mas
se
utiliza
de
um
nome
que
soa
melhor
aos
ouvidos
locais:
Celulose
Riograndense.
10
Referente
a
conclusão
da
operação
de
compra
de
ativos
florestais
(projeto
Losango)
da
brasileira
Fibria
no
RS.
A
transação
inclui
100
mil
hectares
de
áreas
próprias,
dos
quais
38
mil
hectares
com
plantações
de
eucalipto.
Disponível
em:
http://goo.gl/FZjVB
4. No
comunicado
da
empresa
informa11
que
possui
214
mil
hectares
de
terras,
dos
quais
81
mil
hectares
são
destinados
à
preservação
ambiental12.
Tal
anúncio
foi
saudado
não
só
por
parlamentares
e
meios
de
comunicação
(comprometidos
com
seus
anunciantes),
como
também
pelo
atual
executivo
estadual.
Para
o
atual
governador
Tarso
Genro
(PT-‐RS):
"trata-‐se
de
uma
concepção
de
desenvolvimento,
que
gera
uma
demanda
social
virtuosa
e
o
Estado
está
tecnicamente
preparado
para
isso"13.
Nada
foi
esclarecido
sobre
o
processo
de
licenciamento
ambiental.
O
Movimento
Ecológico
Gaúcho14
manifestou-‐se
sobre
a
ampliação
de
megainvestimento
da
Celulose
Riograndense
no
RS.
Também
cabe
destacar
que
recentemente,
o
Congresso
Nacional
aprovou
a
compra
de
terra
por
estrangeiros
(empresas
brasileiras
controladas
por
estrangeiros).
Ou
seja,
o
Pampa
já
pode
ser
“vendido”.
Benefícios
tanto
para
a
empresa
chilena,
como
para
sueco-‐finlandesa
Stora
Enso.
Tal
empresa
se
utilizou
de
laranjas
para
comprar
terras
no
RS,
na
faixa
de
fronteira.
Denúncias
do
descumprimento
da
Constituição
Federal
foram
feitas,
mesmo
assim
a
Stora
Enso
obteve
aval
para
legalizar
o
que
adquiriu
ilegalmente
na
faixa
de
fronteira.
E
no
Congresso
Nacional,
há
parlamentares
gaúchos
tentando
reduzir
definitivamente
as
faixas
de
fronteira.
Além
disso,
há
uma
ofensiva
das
empresas
multinacionais
de
agrotóxicos,
afim
de
flexibilizar
a
legislação
estadual
sobre
Agrotóxicos15.
A
lei
impede,
por
exemplo,
registro
de
agrotóxicos
banidos,
em
seus
países
de
origem.
Certamente
tais
mudanças
também
beneficiarão
às
monoculturas
de
árvores.
11
Celulose
Riograndense
anuncia
aprovação
de
seu
projeto
de
expansão
no
RS.
Disponível
em:
http://goo.gl/HJ3F9
12
Informação
sobre
preservação
ambiental
promovida
por
papeleira
seria
a
Reserva
Natural
Barba
Negra
(Reserva
Particular
do
Patrimônio
Natural-‐RPPN),
que
tem
10,6
mil
hectares,
aproximadamente
6
mil
hectares
possuem
eucaliptos
e
viveiro
de
mudas;
e
outros
2,4
mil
hectares
seriam
designados
para
a
reserva
ambiental.
“Celulose
Riograndense
apresenta
Reserva
Natural
Barba
Negra?”
Disponível
em:
http://goo.gl/3svP1
Sendo
assim,
onde
estarão
os
demais
milhares
de
hectares
informados?
13
Celulose
Riograndense
confirma
investimento
de
R$
5
bilhões
no
Estado.
Disponível
em:
http://goo.gl/HJ0lD
14
A
Assembleia
Permanente
de
Entidades
em
Defesa
do
Meio
Ambiente
do
Rio
Grande
do
Sul
(APEDeMA-‐RS)
manifestou-‐se
contra
o
megainvestimento
da
Celulose
Riograndense
no
RS.
Disponível
em:
http://goo.gl/8XKXZ
15
A
lei
Lei
n.
7.747
foi
criada
em
1982.
Atualmente
o
RS
é
o
quarto
estado
brasileiro
em
consumo
de
agrotóxicos.
Disponível
em:
http://goo.gl/Lw8VP
5. Desafios
para
tornar
vislumbrar
um
Pampa
não
mais
pobre
As
grande
extensões
de
terra
do
RS
que
outrora
foram
propriedade
de
poucos
latifundiários,
agora
passam
para
as
mãos
de
duas
empresas
e
multinacionais.
Seria
isso
desenvolvimento
e
sustentabilidade?
A
Falta
de
Política
de
Conservação
e
Preservação
Ecológica16
promove
a
conversão
do
Bioma
Pampa
em
Desertos
Verdes,
o
mesmo
modelo
recorrente
de
desenvolvimento
que
nos
mantém
como
uma
colônia,
onde
se:
• Privatiza
os
lucros
e
socializa
os
custos
sociais,
ecológicos;
• Intensifica
a
concentração
de
terra/renda
e
diminui
a
diversificação
produtiva;
• Submete
o
Aqüífero
Guarani
aos
interesses
do
capital
estrangeiro,
rechaçando
a
soberania;
• Transforma
terras
agriculturáveis
em
monocultivos
de
árvores;
Até
quando
seguiremos
nos
submetendo
a
falsos
projetos
de
desenvolvimento?
Alternativas
produtivas,
reprodutivas
e
de
preservação/conservação
já
existem
no
Pampa.
Precisamos
de
mais
meios
para
visibilizá-‐las
e
efetivá-‐las!
16
Existe
o
projeto,
ação
que
não
se
restringe
ao
Pampa,
chamado
“RS
Biodiversidade
-‐
Conservação
da
Biodiversidade
como
Fator
de
Contribuição
ao
Desenvolvimento”
que
prevê
proteção
e
conservação
dos
recursos
naturais
e
busca
promover
a
incorporação
do
tema
biodiversidade
nas
instituições
e
comunidades
envolvidas..
Os
recursos
para
execução
provêm
de
doação
de
US$
5
milhões
do
Fundo
Global
do
Meio
Ambiente
(Banco
Mundial),
com
contrapartida
de
US$
6,1
milhões
por
parte
do
Governo
Estadual.
Disponível
em:
http://goo.gl/Bza4F