2. UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS
Reitor
Pe. Marcelo Fernandes de Aquino, SJ
Vice-reitor
Pe. José Ivo Follmann, SJ
Editora Unisinos
Diretor
Pe. Pedro Gilberto Gomes, SJ
Editora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Editora Unisinos
Av. Unisinos, 950
93022-000 São Leopoldo RS Brasil
Tel.: 51.3590 8239 | 51.3590 8238
editora@unisinos.br
www.edunisinos.com.br
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3. Linguagens artístico-culturais I
Camila Monteiro Shenkel
Clarice Bourscheid
Cristina Seibert Schneider
Edmar Galiza
João Paulo Sefrin
Laura Habckost Dalla Zen (org.)
Editora Unisinos
2013
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5. Apresentação
A formação cultural de professores apenas tangencia os debates na área da
Educação, embora seja inegável o reconhecimento de sua importância nos últimos
anos. Nos documentos institucionais brasileiros, é contemplada tanto no Plano Nacional de Educação, como nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação
de professores, ainda que de maneira difusa. Os documentos apenas sugerem que
os currículos dos cursos de Pedagogia assegurem uma “ampla formação cultural”
(BRASIL, 2001, p. 74), ao atentar para “[...] outras formas de orientação inerentes à
formação para a atividade docente” (BRASIL, 2002). Falamos de diretrizes amplas,
que não indicam caminhos metodológicos de como incluir esse tipo de formação
no currículo dos cursos. Assim, cabe às faculdades de Pedagogia a criação de espaços que visem à ampliação do repertório dos alunos.
As competências previstas pela atividade acadêmica Linguagens artístico-culturais I (assim como Linguagens artístico-culturais II) vão ao encontro,
justamente, de uma formação cultural pautada pela ampliação de repertório.
Neste livro, mostraremos algumas especificidades das seguintes linguagens:
patrimônio cultural, música, artes visuais e artes cênicas (teatro e dança), além
de diferentes obras culturais e artísticas. Também serão apresentados alguns
marcos do ensino da arte no Brasil e seus principais enfoques metodológicos.
O livro está organizado a partir de três grandes eixos: formação cultural de
professores, linguagens artístico-culturais e ensino da arte. O primeiro eixo compõe o Capítulo 1 e discute a importância da cultura na formação de professores.
O segundo, composto pelos Capítulos 2, 3, 4 e 5, apresenta pressupostos básicos
sobre as linguagens artístico-culturais, com ênfase na sua apropriação em sala
aula; por fim, o último capítulo aborda aspectos históricos e metodológicos
sobre o ensino da arte no país.
Aproveite a leitura e não deixe de acessar os links sugeridos nos capítulos!
Laura Habckost Dalla Zen
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7. Sumário
Capítulo 1 – Formação cultural de professores............................................ 11
1.1 Saber docente................................................................................................ 11
1.2 O conceito de cultura..................................................................................... 12
1.3 Formação cultural de professores.................................................................. 14
Capítulo 2 – Patrimônio cultural........................................................................ 17
2.1 Introdução...................................................................................................... 17
2.2 Alguns conceitos-chave.................................................................................. 20
2.3 Educação patrimonial..................................................................................... 22
Capítulo 3 – Música................................................................................................. 29
3.1 Uma breve história da música......................................................................... 29
3.2 Música na educação básica............................................................................ 33
3.3 A sala de aula como espaço de ampliação do repertório musical................. 35
3.4 Experiência estética e poética com a música................................................. 35
Capítulo 4 – Artes visuais....................................................................................... 39
4.1 Quando surge aquilo que chamamos de arte?.............................................. 39
4.2 Mas, afinal, o que é arte?................................................................................ 42
4.3 Arte e educação............................................................................................. 44
Capítulo 5 – Artes cênicas: teatro e dança...................................................... 47
5.1 Teatro e dança: aproximações históricas........................................................ 47
5.2 Teatro e dança: diálogos com a educação..................................................... 49
Capítulo 6 – Ensino da arte.................................................................................. 59
6.1 Ensino da arte no Brasil: principais marcos..................................................... 59
6.2 Metodologias do ensino da arte.................................................................... 63
Sobre os autores.................................................................................................... 67
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9. Capítulo
1
Formação cultural de professores
A importância da formação cultural do professor é o tema central deste capítulo. Para um melhor aproveitamento da discussão, também serão tratados
assuntos como a constituição do saber docente e o conceito de cultura. O principal objetivo é perceber como a ampliação do repertório cultural qualifica não
apenas o trabalho docente, mas os processos de subjetivação do professor.
1.1 Saber docente
Discussões em torno do saber docente estão presentes há algumas décadas, embora ganhem impulso nos anos 1980, em razão do movimento de
profissionalização do magistério. Tal movimento, que inclui a valorização dos
salários e o aumento do status profissional, tem como eixo fundador a qualificação da formação de professores. Nesse contexto, surgem estudos que buscam apontar diretrizes para a constituição de um saber docente, ampliando o
debate perante o trabalho do professor. Trata-se de estudos com abordagens
distintas, ainda que seja possível identificar traços comuns, como a importância dada à pluralidade do saber docente.1
Dentre os trabalhos que se inserem nessa perspectiva, destaca-se o do pesquisador canadense Maurice Tardif, o qual utilizaremos a seguir como referência. Para esse autor, durante muito tempo, a formação de professores esteve
pautada pelos saberes disciplinares, isto é, bastaria o professor ter domínio dos
conteúdos e transmiti-los a seus alunos. Apesar de reconhecermos a validade
desses saberes, “essa visão [...] não tem assim sentido hoje em dia, não somente
no campo do ensino, mas também nos outros setores profissionais” (TARDIF,
2002, p. 23). Para Tardif, o saber docente2 é plural e, por isso, precisa ser compreendido a partir de diferentes enfoques.
Assim, segundo o autor, podemos conceber o saber docente a partir de
quatro diferentes saberes: os saberes da formação profissional, ligados aos co-
1 É importante notar que alguns autores (ARCE , 2001; DUARTE , 2003) fazem uma crítica
a essa ideia de saber plural, acreditando, inclusive, tratar-se de um recuo no modo de se
conceber a formação do professor.
2 É importante destacar que a noção de saber recebe aqui um sentido amplo, “que engloba
os conhecimentos, as competências, as habilidades (ou aptidões) e as atitudes, isto é aquilo
que muitas vezes foi chamado de saber, saber-fazer e saber-ser” (TARDIF, 2000, p. 10).
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nhecimentos pedagógicos, mais precisamente aos cursos de formação de professores; os saberes disciplinares, relacionados aos diferentes campos do conhecimento, isto é, se eu vou dar uma aula de fotossíntese, preciso conhecer
o assunto para poder explicá-lo aos alunos; os saberes curriculares, associados
aos objetivos e conteúdos previstos para serem desenvolvidos em determinado
período de tempo (no Brasil, um dos documentos orientadores são os Parâmetros Curriculares Nacionais. Sobre esse aspecto, podemos citar, também,
a apropriação pelo professor do Projeto Político Pedagógico da escola em que
atua); e os saberes experienciais, que estão ligados à experiência cotidiana do
trabalho docente e às experiências socioculturais do professor, as quais acabam
repercutindo fortemente em sala de aula.
Tardif nos chama a atenção para os saberes experienciais, ao relacioná-los
à profissionalização docente. Esses saberes, que não podem ser pensados isoladamente, são os principais responsáveis pela singularidade da mediação pedagógica. Ou seja, são os saberes experienciais que tornarão a aula do professor
A diferente da do professor B, ainda que ambos estejam trabalhando a mesma
temática e valendo-se de uma mesma metodologia de ensino.
A formação cultural do professor integraria, assim, os saberes experienciais
e deve ser entendida como um processo contínuo na vida de qualquer docente. Da
mesma forma que se ressalta a importância de o professor manter-se atualizado
sobre discussões no campo da Educação, é fundamental instigá-lo a ampliar seu
repertório cultural não apenas para a qualificação do trabalho em sala de aula,
mas no que diz repeito à própria constituição da subjetividade docente.
1.2 O conceito de cultura
Ao falarmos em formação cultural do professor, é imprescindível assinalarmos a que ideia de cultura fazemos referência. Não se trata de uma demarcação fácil, sobretudo em razão da apropriação do termo por diferentes campos
do saber. Nesse sentido, a discussão que propomos não pretende traçar um histórico do conceito de cultura e tampouco atribuir um sentido fechado ao termo,
mas apontar reminiscências, a fim de compreendermos alguns significados que
circulam hoje, em especial, na escola.
Zygmunt Bauman, em seu livro Ensaios sobre o conceito de cultura, dá
ênfase ao confronto entre a concepção de cultura como privilégio da elite e seu
entendimento como modo de diferenciar grupos sociais a partir de fronteiras
temporais e geográficas. Essas duas concepções, por sua vez, ganham visibilidade ao longo do século XVIII, com o advento do movimento Iluminista. Até
então, o termo “cultura” encontrava-se associado ao seu sentido etimológico,
isto é, àquilo que deve ser cultivado.3
Comecemos pela concepção de cultura como privilégio da elite, ou concepção francesa. Neste caso, a cultura é entendida como característica do gêne-
3
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A origem da palavra cultura é o verbo colo que, na Roma antiga, significava “eu cultivo”. A
palavra agricultura, de algum modo, nos mostra isso: “cultura do campo”.
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11. F o r mação cultur al de pr o f e s s o r e s
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ro humano, ao aparecer associada às ideias de progresso, evolução, educação e
razão. Pressupõe-se a existência de uma cultura hierarquicamente superior e,
por isso, ela passa a ser classificada como universal. Desse modo, há um conjunto de tradições, conhecimentos e obras artísticas que deve ser acessado por
todos, uma vez que se trata daquilo que “de melhor produziu a humanidade”.
Essa concepção ainda repercute fortemente nos grupos sociais. Ao falarmos “o
fulano não tem cultura” ou “o cicrano é culto”, há uma clara referência a esse
entendimento. Segundo Monique Nogueira (2010, p. 9), a Educação, em geral,
vinha adotando a concepção francesa, também chamada de universalista ou
hierárquica: “Os currículos e conteúdos considerados ‘educacionais’ giravam
em torno dos saberes consagrados.”
Já a concepção alemã, surge como uma espécie de contraponto à ideia francesa de cultura. Intelectuais alemães, em uma crítica à influência da corte francesa, passam a utilizar o termo para designar o que é autêntico, genuíno. Assim,
cultura passa a ser compreendida como um conjunto de características intelectuais, morais e artísticas que constituem o patrimônio de uma nação, ou seja,
trata-se dos princípios fundadores de sua unidade, em que a cultura de um povo
é o que o diferencia das demais nações. Temos um conceito diferencial ou particularista de cultura, igualmente conhecido como concepção alemã. Ao vincularmos o chimarrão à cultura gaúcha, por exemplo, aludimos a essa concepção.
Tal polarização (concepção francesa versus concepção alemã) permanece
até meados do século XIX, ainda que suas reminiscências, como mencionado,
continuem a ser percebidas. Atualmente, porém, mais do que uma tendência
a aproximar esses dois polos (entender cultura tanto do ponto de vista local,
como universal), podemos falar em uma ampliação do conceito de cultura.
Hoje se prefere falar em culturas para designar qualquer ‘lugar social’, onde
não apenas se dão constantes lutas pela imposição de significados, valores e
modos de vida, como, também, se constituem subjetividades e se dão poderosos processos de regulação social (VEIGA-NETO, 2004, p. 53).
Falar em culturas, portanto, é falar dos “lugares sociais” que nos ensinam
formas de ser e estar no mundo. Assumimos, pois, uma concepção elástica do
termo: chamaremos de culturas “[...] o conjunto complexo e diferenciado de significações relativas aos vários setores da vida dos grupos sociais e das sociedades e por eles historicamente produzidas” (FISCHER, 2003, p. 25) (as linguagens
artísticas, a literatura, o cinema, os meios de comunicação, as crenças, a filosofia, os sentidos dados às ações humanas, sejam elas relacionadas à economia, à
medicina, à educação, e assim por diante).
Para aprofundar os estudos sobre o conceito de cultura, sugere-se:
«« assistir ao vídeo Formação cultural – questões teóricas, produzido pela
TV Escola (Televisão Pública do Ministério da Educação): http://tvescola.mec.gov.br/index.php?option=com_zoo&view=item&item_id=8548.
«« ler o artigo Cultura, culturas e educação, de Alfredo Veiga-Neto: http://
www.scielo.br/pdf/rbedu/n23/n23a01.pdf.
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1.3 Formação cultural de professores
As duas seções anteriores demarcam a ideia de formação cultural abordada neste capítulo. Assim, não se trata de o professor realizar um exercício
com o objetivo de acessar uma suposta cultura universal, ou hierarquicamente superior às manifestações culturais com as quais está familiarizado. A expressão “ampliação de repertório” será utilizada inúmeras vezes para reforçar
essa ideia. Porém, é importante esclarecer que o alargamento do conceito de
cultura não implica, de modo algum, equiparar estética e politicamente artefatos e manifestações culturais. Embora já não faça sentido separar, “[...] o
que seria ‘material’, econômico, daquilo que seria ‘cultural’” (FISCHER, 2003,
p. 27), não podemos cair no perigoso relativismo de que tudo se equivale ou,
como aponta Nogueira (2010), de que produções da indústria cultural seriam
verdadeiramente populares.
Vemos muitos professores levarem para a sala de aula, por exemplo, músicas e imagens que já fazem parte do contexto sociocultural do aluno. Trata-se
de algo extremamente importante, uma vez que os artefatos culturais (sobretudo os de ampla divulgação midiática), ao atuarem na constituição das subjetividades contemporâneas, merecem ser discutidos no espaço escolar. No entanto,
a maioria dessas produções não só é de fácil acesso aos alunos, mas, muitas
vezes, sua única opção de lazer. Desse modo, em vez de reproduzir “mais do
mesmo”, o professor pode, por meio de suas escolhas, converter a sala de aula
em um espaço de ampliação de repertório.
Para que isso ocorra é preciso haver um deslocamento por parte do docente, de modo que sua formação cultural não se dê apenas em cursos de formação de professores ou na leitura de artigos da área. As experiências culturais do professor aparecem aqui como condutoras de uma prática pedagógica
significativa. Como bem aponta Célia Almeida (2010, p. 15), “quanto maior
e mais variado for o repertório cultural do professorado, mais numerosas e
apropriadas serão as escolhas possíveis para que este medeie a construção de
conhecimentos escolares”. Isto é, se ele já teve contato com diferentes imagens
(pintura, gravura, fotografia, escultura, grafite, para citar algumas), é provável
que, ao escolher uma para ilustrar um conteúdo de história, a mediação se
constitua, ela mesma, um espaço de ampliação de repertório para os alunos.
Ainda que o foco da atividade não fosse a imagem em si, haveria ali um momento mais rico de produção de significados. Além disso, evitar-se-ia reproduzir muitas das imagens estereotipadas dos livros didáticos, tão presentes no
universo escolar.
O exemplo anterior, embora bastante simples, indica-nos uma possibilidade de aprendizagem (no caso, um conteúdo de história) por meio da arte. Porém, e ao levar em consideração a unidocência, devemos estender o debate para
uma aprendizagem em que as linguagens artístico-culturais apareçam também
como fim; ou seja, falamos aqui de uma aprendizagem para a arte, para a cultura. Inúmeros professores, com a melhor das intenções, têm trabalhado obras
de Tarsila do Amaral em suas aulas. É comum vermos os corredores escolares
repletos de reproduções de Abaporu, presas por prendedores em longos fios de
barbante. Obviamente que se trata de uma artista fundamental para a compre-
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13. F o r mação cultur al de pr o f e s s o r e s
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ensão da arte brasileira. Porém, a arte brasileira não se restringe ao movimento
modernista e tampouco a Tarsila do Amaral. O mesmo ocorre, igualmente, com
a escolha de determinadas músicas. E, assim, constrói-se um repertório próprio da escola e, consequentemente, uma ideia sobre o que é ou não arte.
É importante estar atento, porém, no sentido de a formação cultural não
ser entendida como um mero instrumento para a qualificação da prática pedagógica, como constitutiva do saber docente. Ela deve ser pensada, também,
como formação humana em sentido lato (ALMEIDA, 2010), como prática social
que atua, decisivamente, no modo como somos e nos posicionamos no mundo.
Metaforicamente, podemos conceber a formação cultural como uma espécie de
lente, que modifica nosso olhar em relação àquilo que nos cerca.
São raros os estudos que têm a formação cultural e, em especial, a formação cultural do professor como foco. “Mas tal escassez não se justifica por falta
de reconhecimento da importância desses vínculos, apontados por vários autores que defendem uma política de formação (inicial e continuada) que assegure
ao professor e à professora o acesso a variadas formas de expressão artística”
(ibidem, p. 16). No Brasil, trata-se de um tema que, embora referido em documentos institucionais,4 é abordado de forma incipiente. Dessa forma, cabe aos
cursos de formação de professores garantir espaços de ampliação de repertório
tanto em sua estrutura curricular, como por meio de parcerias com instituições
culturais. Tal investimento na formação docente não somente contribui para
que barreiras simbólicas sejam transpostas, mas também para modos de existência mais sensíveis.
Para aprofundar os estudos sobre formação cultural de professores, sugere-se:
«« assistir ao vídeo Cultura e formação de professores, produzido pela TV Es-
cola (televisão pública do Ministério da Educação): http://tvescola.mec.
gov.br/index.php?option=com_zoo&view=item&item_id=8565.
«« assistir ao vídeo Experiências estéticas e linguagens artísticas, produzido pela TV Escola (televisão pública do Ministério da Educação): http://
tvescola.mec.gov.br/index.php?option=com_zoo&view=item&item_
id=10654
Referências
ALMEIDA, Célia Maria de Castro. Cultura e formação de professores. In: Cultura e for-
mação de professores [online]. Brasília: Ministério da Educação: Secretaria de Educação a Distância, 2010. p. 14-21,. Disponível em: <http://tvbrasil.org.br/fotos/salto/
series/10343907-formacaocultural.pdf>.
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Plano Nacional de Educação e Diretrizes Curriculares Nacionais.
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Laura Habc k o s t Da l l a Z e n
ARCE, Alessandra. Compre o kit neoliberal para a educação infantil e ganhe grátis os
dez passos para se tornar um professor reflexivo. In: Educação & Sociedade [online], v.
22, n. 74, abr. 2001, p. 251-283. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v22n74/
a14v2274.pdf>.
BAUMAN, Zygmunt. Ensaios sobre o conceito de cultura. Rio de Janeiro: Zahar, 2012.
BRASIL. Plano Nacional de Educação. Subsídios para a elaboração dos planos estaduais e municipais de educação. Brasília- DF, 2001.
BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP
nº 1, de 18 de fevereiro de 2002. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de
graduação plena. Brasília: MEC/CNE, 2002. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/
cne/arquivos/pdf/rcp01_02.pdf>.
DUARTE, Newton. Conhecimento tácito e conhecimento escolar na formação do professor (por que Donald Schön não entendeu Lúria). In: Educação & Sociedade [online], v. 24, n. 83, ago. 2003, p. 601-625. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/
v24n83/a15v2483.pdf>.
FISCHER, Rosa Maria Bueno. Televisão e educação: fruir e pensar a TV. Belo Horizonte:
Autêntica, 2003.
NOGUEIRA , Monique Andries. Formação cultural: questões teóricas. In: Formação
cultural de professores [online]. Brasília: Ministério da Educação: Secretaria de Educação a Distância, 2010. p. 8-13. Disponível em: <http://tvbrasil.org.br/fotos/salto/
series/10343907-formacaocultural.pdf>.
TARDIF, Maurice. Saberes profissionais dos professores e conhecimentos universitários:
elementos para uma epistemologia da prática profissional dos professores e suas consequências em relação à formação para o magistério. In: Revista Brasileira de Educação
[online], n. 13, jan. fev. mar. abr. 2000, p. 5-24. Disponível em: <http://educa.fcc.org.br/
pdf/rbedu/n13/n13a02.pdf>.
_____. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
VEIGA-NETO, Alfredo. Cultura e Currículo: um passo adiante. In: MOREIRA, Antonio
Flavio Barbosa; PACHECO, José Augusto; GARCIA, Regina Leite (orgs.). Currículo: pensar, sentir e diferir. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.
Este capítulo foi elaborado por Laura Habckost Dalla Zen.
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15. Capítulo
2
Patrimônio cultural
Relacionar a ideia patrimônio cultural à memória dos grupos sociais é o principal objetivo deste capítulo. Inicialmente, é feita uma contextualização do tema
e são apresentados alguns conceitos-chave, a fim de fundamentar o trabalho
do professor. Depois, procura-se relacionar os conceitos à prática pedagógica,
destacando aspectos da educação patrimonial.
2.1 Introdução
O que é patrimônio cultural? São todas as expressões de natureza cultural representativas de um povo e que carregam testemunhos da sua história.
Essas expressões foram sendo agregadas com o tempo às das gerações anteriores e podem ser edificações, sítios históricos, ambientes naturais, móveis
e utensílios, saberes e celebrações. O Brasil, por sua extensão territorial e
formação cultural marcada pela contribuição de diferentes etnias, possui
uma grande riqueza de manifestações culturais. Cada grupo humano tem
modos de viver, saberes e fazeres que reforçam a noção de identidade1 (pessoal e coletiva). A cultura é dinâmica, se transmite e se apreende, e é neste
processo de socialização que aprendemos a formar parte do grupo ao qual
pertencemos, que vamos adquirindo a nossa identidade. A riqueza das diferentes manifestações culturais é o que chamamos de diversidade cultural e
seu reconhecimento é essencial, pois não existem culturas mais importantes
que outras.
A capacidade do homem de se adaptar, criar e recriar cultura é o que nos
diferencia dos animais. Somos capazes de buscar respostas para nossos problemas atuais à luz dos referenciais culturais herdados de nossos antepassados
e transmitidos de geração para geração. Jacques Le Goff (1994, p. 476) afirma
que “a memória é um elemento essencial do que se costuma chamar identidade, individual ou coletiva, cuja busca é uma das atividades fundamentais dos
indivíduos e das sociedades de hoje”. Compreender que existem diferentes povos e formas de viver nos ajuda a evitar, entre outras coisas, comportamentos
preconceituosos.
1
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O conceito de identidade vem sendo substituído hoje pelo de identificação.
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C ri st i n a S e i b e r t Sch n e i d e r
Figura 1 – A farta gastronomia mineira, o Museu do Pão no Rio Grande do Sul e o Jardim Botânico no Rio de Janeiro são exemplos de patrimônio cultural.
Fonte: fotos da autora deste capítulo.
Assim, não fazem parte do patrimônio cultural somente as construções
antigas e os objetos históricos e artísticos. Segundo o Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o patrimônio cultural não se restringe
apenas a imóveis oficiais isolados, igrejas ou palácios, mas, na sua concepção
contemporânea, se estende a imóveis particulares, trechos urbanos e até ambientes naturais de importância paisagística, além de imagens, mobiliário, utensílios,
saberes, fazeres, celebrações etc. Como aponta Françoise Choay (2006, p. 11):
A expressão designa um bem destinado ao usufruto de uma comunidade que
se ampliou a dimensões planetárias, constituído pela acumulação contínua
de uma diversidade de objetos que se congregam por seu passado comum:
obras e obras-primas das belas-artes e das artes aplicadas, trabalhos e produtos de todos os saberes e savoir-faire dos seres humanos.
Durante muito tempo, o patrimônio cultural esteve restrito à cultura monumental, ocidental, branca e católica. Nos últimos anos, porém, o conceito se
ampliou para as diferentes manifestações culturais e passou a dar relevância,
também, ao patrimônio de valor local, uma vez que nem todo bem cultural tem
relevância nacional. Além da Organização das Nações Unidas para a Educação,
a Ciência e a Cultura (Unesco), que reconhece os bens de importância para a
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17. Pat r imô nio cult ur al
17
Figura 2 – O sítio histórico de Ouro Preto foi declarado, em 1933, “monumento nacional”, em razão da sua arquitetura colonial e por ser imprescindível para o processo
de construção da identidade nacional. Ouro Preto é patrimônio cultural tombado pelo
IPHAN e pela Unesco.
Fonte: fotos da autora deste capítulo.
humanidade, e o IPHAN, que protege os bens de importância nacional, os municípios têm criado legislação e instrumentos de preservação dos referenciais
culturais significativos para sua comunidade.
Figura 3 – A arte Kusiwa é um sistema de representação gráfico próprio dos povos indígenas Wajãpi, do Amapá, que sintetiza seu modo particular de conhecer, conceber e
agir sobre o universo. Como patrimônio imaterial, ela foi inscrita no livro Registro das
Formas de Expressão, em 2002.
Fonte: www.iphan.gov.br.
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18. 18
C ri st i n a S e i b e r t Sch n e i d e r
2.2 Alguns conceitos-chave
A Constituição Federal de 1988, em seus artigos 215 e 216, ampliou a noção de patrimônio cultural ao reconhecer a existência de bens culturais de natureza material e imaterial e estabelecer outras formas de preservação – como o
registro e o inventário – além do tombamento, instituído pelo Decreto-lei nº 25
de 30de novembro de 1937, referente, principalmente, à proteção de edificações,
paisagens e conjuntos históricos urbanos.
Nesses artigos, reconhece-se a inclusão, no patrimônio a ser preservado
pelo Estado em parceria com a sociedade, dos bens culturais que sejam referências dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. Sobre esses
bens, muitos deles considerados de natureza intangível, a Unesco propõe uma
definição, que pode ser encontrada na convenção para salvaguarda do patrimônio cultural imaterial, ratificada pelo Brasil em 2006:
As práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas – com os
instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que lhes são associados
- que as comunidades, os grupos e, em alguns casos os indivíduos, reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural.
Para fins didáticos, iremos adotar as definições do IPHAN:
PATRIMÔNIO MATERIAL
Conjunto de bens culturais classificados segundo
sua natureza nos quatro Livros do Tombo: arqueológico, paisagístico e etnográfico; histórico; belas
artes; e das artes aplicadas. Eles estão divididos em
bens imóveis como os núcleos urbanos, sítios arqueológicos e paisagísticos e bens individuais; e móveis
como coleções arqueológicas, acervos museológicos, documentais, bibliográficos, arquivísticos, videográficos, fotográficos e cinematográficos. Na foto
Casa de Nona Neni em Antônio Prado/RS inscrita no
Livro Tombo Histórico e no Livro Tombo arqueológico, paisagístico e etnográfico pelo IPHAN em 1990,
A casa foi inscrita no Livro Tombo de Belas Artes em
1985. Foto da autora.
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19. Pat r imô nio cult ur al
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Dizem respeito àquelas práticas e domínios da vida
social que se manifestam em saberes, ofícios e modos de fazer; celebrações; formas de expressões
cênicas, plásticas, musicais ou lúdicas; e nos lugares
(como mercados, feiras e santuários que abrigam
práticas culturais coletivas). Os bens são classificados
em: Livro de Registro dos Saberes, para os conhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidianos
das comunidades; Livro de Registro de Celebrações,
para os rituais e festas que marcam vivência coletiva, religiosidade, entretenimento e outras práticas
da vida social; Livro de Registros das Formas de Expressão, para as manifestações artísticas em geral; e
Livro de Registro dos Lugares, para mercados, feiras,
santuários, praças onde são concentradas ou reproduzidas práticas culturais coletivas. Na foto as mãos
da peneleira de Goiabeiras um saber envolvido na
fabricação artesanal de panelas de barro tendo sido
registrado como Patrimônio Imaterial no Livro dos
Saberes em 2002. O processo de produção no bairro
de Goiabeiras Velha, em Vitória, no Espírito Santo,
emprega técnicas tradicionais e matérias-primas provenientes do meio natural. A panela de barro, fruto
de um conjuntos de saberes, constitui suporte indispensável para o preparo da típica moqueca capixa ba. Foto: portal.iphan.gov.br
Figura 4 – Patrimônio material e imaterial.
Fonte: www.iphan.gov.br.
Nos meios de comunicação, usa-se de forma recorrente a denominação
patrimônio histórico para designar bens de relevância cultural. Porém, é importante destacar que essa expressão, utilizada inclusive pelo órgão responsável
pela proteção do patrimônio de relevância nacional, o IPHAN, refere-se somente
a um dos segmentos que compõe o patrimônio cultural de um povo.
Como instrumentos legais de proteção do patrimônio cultural, tanto material quanto imaterial, temos:
«« Inventário: segundo o IPHAN, “o inventário é a primeira forma para o
reconhecimento da importância dos bens culturais e ambientais, por
meio do registro de suas características principais”. É a ação inicial a
ser realizada pelo poder público com o intuito de fazer um reconhecimento da localização desses bens de relevância cultural, qual o estado de conservação, quantidade, formas de manifestação, exemplares
existentes etc.
«« Tombamento: segundo o IPHAN, é um ato administrativo do poder
público, que envolve um conjunto de ações, visando preservar legal-
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C ri st i n a S e i b e r t Sch n e i d e r
mente os bens de valor cultural e impedindo a sua destruição e/ou
descaracterização. Os bens tombados pelo executivo são amparados
em pareceres dos institutos ou conselhos de defesa do patrimônio. De
acordo com uma escala de relevância, os bens podem ser: de interesse
da humanidade e de excepcional valor e, portanto, inscritos na lista
do patrimônio universal pela Unesco; de interesse nacional, tombados
pelo presidente da república e amparados pelo IPHAN; de interesse estadual, tombados pelo governador do estado e amparado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Rio Grande do Sul (IPHAE);
e de interesse local, tombados por prefeitos e amparados em conselhos
e técnicos locais.
2.3 Educação patrimonial
O pedagogo tem sua área de atuação para além do espaço escolar. Em seu
sentido etimológico, Pedagogia vem do grego “paidós”, que significa criança,
mais “ago”, no sentido de dirigir, e “logia” que significa ciência; portanto, a
ciência de dirigir crianças (NÉRICI, 1993, p. 24). O autor complementa ao apontar que “a Pedagogia hoje pode ser considerada como o estudo, sob todos os aspectos, do fenômeno da educação, não só da criança, mas também da criatura
humana, através de todas as suas fases de vida”.
Nesse sentido, é importante reconhecer a Pedagogia de uma forma mais
ampla, não a restringindo ao trabalho docente, uma vez que este é somente um
de seus desdobramentos. Além disso, há uma diversidade de práticas educativas
na sociedade que se realizam em diferentes lugares e sob várias modalidades,
de forma que a contemporaneidade revela uma sociedade pedagógica (BEILLEROT apud PIMENTA, 1996).
Do mesmo modo, Myrian Greco (2005) ressalta que o pedagogo está inserido em um mercado de trabalho cada vez mais diversificado e amplo. A dinâmica social na atualidade se pauta em um discurso voltado para a inclusão
social, ao voluntariado, a projetos de pesquisa, para a educação formal e não
formal, sendo o processo de ensino e de aprendizagem não restrito ao cotidiano
escolar, mas sim a todo e qualquer segmento da sociedade.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação no 9394/1996 prevê, no artigo
1º, que “a educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na
vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e
pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais”, ou seja, identifica os contextos culturais das pessoas como
importante espaço de formação dos sujeitos.
A partir desse estudo inicial, definir educação patrimonial torna-se um
pouco mais fácil. Horta (2006, p. 6) afirma que se trata de um processo permanente e sistemático de trabalho educacional, tendo como foco o patrimônio cultural como fonte primária de conhecimento e enriquecimento tanto individual
como coletivo. A educação patrimonial é um instrumento de reencontro do indivíduo consigo mesmo, resgatando sua autoestima através da valorização e do re-
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21. Pat r imô nio cult ur al
21
conhecimento da sua identidade e da sua cultura. Ainda segundo essa autora, “o
conhecimento crítico e a apropriação consciente pelas comunidades do seu patrimônio são fatores indispensáveis no processo de preservação sustentável desses
bens, assim como no fortalecimento dos sentimentos de identidade e cidadania”.
O patrimônio cultural estimula em crianças e adultos um processo ativo
de conhecimento, apropriação e valorização de sua herança cultural, a partir da experiência e do contato direto com as evidências e manifestações da
cultura em seus múltiplos aspectos, sentidos e significados. Horta (2006) define a educação patrimonial como um instrumento de “alfabetização cultural”
que possibilita ao indivíduo fazer a leitura do mundo que o rodeia, levando-o à
compreensão do universo sociocultural e da trajetória histórico-temporal em
que está inserido. Este processo leva ao reforço da autoestima dos indivíduos e comunidades e à valorização da cultura brasileira, compreendida como
múltipla e plural. Assim, a educação patrimonial consiste na implementação
de ações educativas de investigação, apropriação e valorização do patrimônio
cultural, essenciais na formação da identidade e da cidadania, tendo em vista
que o trabalho com a produção cultural das gerações que nos antecederam permite reativar os processos da memória: descobrir como nossos antepassados
produziam a satisfação de suas necessidades, como resolviam seus problemas
imediatos e como se organizavam socialmente (MACHADO, 2004).
No caso de instituições museológicas, percebemos que sua atenção esteve,
durante muito tempo, basicamente voltada ao cuidado com o acervo. A partir
da segunda metade do século XX, o caráter educativo dos museus se consolida
e eles tornam-se instituições também voltadas para o “cuidado” com o público.
Essa mudança implica novas formas de atuação nestes espaços, de maneira que
as atividades educativas adquirem cada vez mais importância. Dessa forma, a
presença de um pedagogo em espaços como esses ganha sentido e força. A necessidade de implantação de áreas educativas nos museus, a fim de desenvolver
atividades regulares e contínuas, contando com a participação de profissionais
especializados, vem se tornando cada vez mais crescente nas últimas décadas,
tanto em âmbito internacional como no Brasil. Essa necessidade pode ser considerada “um reflexo da consciência de que um caminho para os museus enfrentarem os desafios da vida contemporânea consiste no estabelecimento de
novas relações com os públicos, na perspectiva de construção de uma cidadania consciente” (GRINSPUM; ARAÚJO, 2001, p. 12). Além disso, podemos pensar
o espaço educativo como todo lugar que:
[...] possibilite e estimule, positivamente, o desenvolvimento e as experiências do viver, do conviver, do pensar e do agir consequente [...]. Portanto,
qualquer espaço pode se tornar um espaço educativo, desde que um grupo
de pessoas dele se aproprie, dando-lhe este caráter positivo, tirando-lhe o
caráter negativo da passividade e transformando-o num instrumento ativo
e dinâmico da ação de seus participantes, mesmo que seja para usá-lo como
exemplo crítico de uma realidade que deveria ser outra. [...] O arranjo destes
espaços não deve se limitar a especialistas (arquitetos, engenheiros...), mas,
sim, deve ser prática cotidiana de toda a comunidade escolar (Ana Beatriz
Goulart de Faria, a partir da definição de Mayumi Souza Lima, retirada da
série “Cadernos Pedagógicos” do Programa Mais Educação).
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22. 22
C ri st i n a S e i b e r t Sch n e i d e r
Mas como explorar o tema do patrimônio cultural com os alunos? Partindo dessa problemática, seguem algumas sugestões de abordagens para serem
desenvolvidas em sala de aula:
Patrimônio histórico
O que é
••É um bem cultural que simboliza a formação de um povo e
carrega testemunhos de sua história. As relações entre passado e presente e as mudanças ocorridas em uma cidade ao
longo do tempo, por exemplo, são representadas no centro
histórico suas diferentes arquiteturas, o desenho das ruas,
tudo pode ser uma referência para que se compreenda o
modo de vida dos antigos e atuais habitantes de um lugar.
Da mesma maneira, arquivos históricos, jardins, parques,
praças e artefatos de época podem ser considerados patrimônios históricos por sua importância como documentos
de uma época.
Por que trabalhar
••Para debater questões relativas à preservação e à modernização de uma região, refletir sobre planejamento urbano
(disposição de ruas e técnicas de construção, por exemplo)
ou entender as relações entre passado e presente (via observação e interpretação de um espaço).
Sobrado Weber, em Tupandi/RS. Foto da autora.
Patrimônio artístico
O que é
••Todos os bens artísticos ou mobiliários (esculturas, telas, móveis, em peças únicas ou acervos) que tenham relevância cultural para a comunidade. Identificam uma região ou um povo
por ser uma referência estética, plástica ou estilística, sem
necessariamente ter passado pelo processo de tombamento.
Por que trabalhar
••O valor cultural de cada obra abre um debate sobre o significado da arte e como ela está inserida na comunidade. As
peças marcam a identidade da paisagem urbana. Estimular
a apreciação e a crítica artística acentua o diálogo entre as
produções regionais e a diversidade da arte universal.
Escultura de Aleijadinho em Congonhas do Campo, Minas
Gerais. Foto da autora
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23. Pat r imô nio cult ur al
23
Patrimônio arquitetônico
O que é
••Edificações que, preservadas ou em ruínas, guardam a memória histórica e representam as inovações ocorridas naquele local ao longo do tempo. Podem ser monumentos
religiosos, palácios, casas, indústrias e prédios oficiais que
indiquem um estilo e uma técnica de construção marcante
para a comunidade.
Por que trabalhar
••É essencial que os alunos compreendam a necessidade de
preservar um bem arquitetônico, pois ele revela informações sobre a formação da região. Entre outros aspectos, as
construções apontam as relações com o meio ambiente, as
necessidades de certa época e as inspirações artísticas.
Missões Jesuítas em São Miguel das Missões/RS tombada
pela Unesco. Foto da autora
Patrimônio imaterial
O que é
••O conjunto de práticas e saberes transmitidos de geração
em geração que diferenciam determinado povo ou região.
Danças, músicas, expressões, lendas, festas, celebrações, conhecimentos e técnicas, assim como instrumentos, artefatos e
lugares, carregam em si uma memória coletiva.
Por que trabalhar
••Os bens imateriais estão relacionados à formação da identidade da comunidade. É importante ressaltar o significado
cultural para se sentir integrante do contexto em que vive e
refletir sobre a diversidade das manifestações.
Foto: http://www.onordeste.com/onordeste/enciclopediaNordeste/index.php?titulo=Feira+de+Caruaru,Pernambuc
o<r=f&id_perso=687
Patrimônio natural
O que é
••Todo local cuja natureza tenha relevância para uma população. É o lugar que apresenta relações significativas com a sociedade, por causa das lendas e da história ou da economia
a ele associada. A raridade, a importância de um bioma ou
a beleza de seu conjunto também recebe a classificação de
patrimônio natural.
Por que trabalhar
••Para que o aluno compreenda o espaço onde vive com conhecimentos históricos e geográficos, sendo apresentado às manifestações folclóricas e às atividades econômicas ou turísticas
do local. O estudo sobre a flora e a fauna típicas da região incentiva a preservação, pois assim ele se considera parte dele.
Corcovado no Rio de Janeiro. Foto da autora
Figura 5 – Sugestões de abordagens.
Fonte: texto adaptado pela autora deste capítulo, a partir da revista “Nova Escola” (2012).
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C ri st i n a S e i b e r t Sch n e i d e r
O patrimônio cultural proporciona uma rica experiência educativa e
cultural aos alunos e à comunidade em geral, seja em sala de aula, no museu
da cidade, no bairro ou nos demais espaços sociais. Educar o olhar para desvendar esses referenciais é de suma importância no processo de valorização
e apropriação dos bens culturais. Após a definição do objeto, sítio histórico,
expressão cultural ou outro patrimônio cultural estudado, a ação educativa
poderá desenvolver inúmeras possibilidades de trabalhos, inclusive de forma
interdisciplinar:
Quadro 1
Etapa metodológica
Observação
Recursos/ atividades
Objetivos
«« identificação do
teriais: dimensões, formas,
elementos, cores, texturas,
organização, usos, funções,
valores, relações, espaços, movimentos etc.;
«« utilização e desenvolvimento
dos sentidos (visão, olfato, audição, gosto e tato);
«« jogos de detetive: comparação,
memória, questionamento.
Registro
«« observação e análise de ma-
objeto/ função/ significado;
«« desenvolvimento da
percepção visual e
simbólica.
«« desenhos, fotografias, relatos
«« fixação do conhe-
««
««
««
««
_Livro.indb 24
escritos ou gravados, maquetes, filmes etc.;
atividades de pesquisa e coleta
de dados;
entrevistas com pessoas envolvidas e da comunidade (p. ex.:
idosos, professores, comerciantes, artesões, profissionais
liberais, tabeliães, agricultores, industriais, donas de casa,
jornalistas etc.);
consulta a arquivos, bibliotecas, jornais, cartórios etc.;
registros de todas as informações materiais e simbólicas,
históricas e culturais a respeito do objeto de estudo (bem
cultural).
cimento percebido,
aprofundamento da
observação e análise crítica;
«« desenvolvimento da
memória, pensamento lógico, intuitivo e operacional.
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25. Pat r imô nio cult ur al
25
Quadro 1 (continuação)
Etapa metodológica
Exploração
Recursos/ atividades
«« análise do problema, levanta-
Objetivos
«« desenvolvimento
mento de hipóteses, discussão,
questionamento, avaliação,
pesquisa em outras fontes, tais
como bibliotecas, arquivos,
cartórios, instituições, jornais,
entrevistas.
Apropriação
das capacidades de
análise e julgamento crítico, interpretação das evidências e significados.
exposições;
recriação, releitura;
vivência de situações;
dramatizações;
elaboração de textos, livros,
murais, jornais, histórias em
quadrinhos, poesias, vídeos,
filmes, desenhos;
«« interpretação em diferentes
meios de expressão como: pintura, escultura, drama, dança,
música, poesia, texto, filme e
vídeo;
«« atividades de recreação e lazer
etc.
«« envolvimento afeti-
««
««
««
««
««
vo, internalização,
desenvolvimento da
capacidade de autoexpressão, apropriação, participação
criativa, valorização
do bem cultural.
Fonte: elaborado pela autora deste capítulo, a partir de Horta, Grunberg e Monteiro (2006).
Referências
BRASIL, LDB. Lei nº 9394/1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Dispo-
nível em: <http://www4.planalto.gov.br/legislacao>.
BRÜNINGHAUS-KNUBEL, Cornelia. A educação do museu no contexto das funções mu-
seológicas. Unesco, 2004, p.129-144.
CHOAY, Françoise. A Alegoria do Patrimônio. 3. ed. São Paulo: Unesp, 2006.
GRECO, Myrian Glória. O pedagogo empresarial. Pedagogia em foco. Rio de Janeiro,
2005. Disponível em: <http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/jovens01.html>.
GRINSPUM, Denise; ARAUJO, Marcelo. Introdução. In: Museums & Galleries Commission. Educação em Museus. São Paulo: EDUSP; Vitae, 2001, p.11-12.
HORTA, Maria de Lurdes Parreiras; GRUNBERG, Evelina; MONTEIRO, Adriane Queiroz.
Guia básico de educação patrimonial. Brasília: Museu Imperial, 2006. (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.)
IPHAN. Patrimônio cultural. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br>.
LE GOFF, Jacques. Memória e história. São Paulo: EDUSP, 1994.
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C ri st i n a S e i b e r t Sch n e i d e r
MACHADO, Maria Beatriz Pinheiro. Educação Patrimonial: orientações para professores
do ensino fundamental e médio. Caxias do Sul: Maneco Livraria & Editora, 2004.
NÉRICI, Imídio G. Didática do Ensino Superior. São Paulo: Ibrasa, 1993.
PIMENTA, Selma Garrido (org.). Pedagogia e pedagogos: caminhos e perspectivas. 2.
ed. São Paulo: Cortez, 2006.
SCHNEIDER, Cristina. GALAFASSI, Gabriele. A importância do olhar pedagógico no
museu. In: FERNANDES, Evandro. NEUMANNN, Rosane Marcia. WEBER, Roswitia (org.).
Imigração: diálogos e novas abordagens. São Leopoldo: OIKOS, 2012.
UNESCO – Convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial. Paris: Unes-
co, 2003.
Este capítulo foi elaborado por Cristina Seibert Schneider.
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27. Capítulo
3
Música
Este capítulo, primeiramente, apresenta alguns marcos da história da música,
relacionando-os às características sociais de cada período. Em seguida, é proposta uma discussão sobre as relações entre música e educação, na qual se
busca problematizar o uso da linguagem musical em sala de aula.
3.1 Uma breve história da música1
A música acompanha a humanidade desde seu início. E, mesmo não havendo documentos precisos, é possível afirmarmos, sem medo do exagero, que
o ser humano teve na música importante elemento de apoio nas mais diferentes
manifestações de seu espírito, quer seja tomando parte em rituais mágicos para
agradar aos seus deuses (caça, colheita, guerra, natureza etc.), quer seja como
forma de catarse, estabelecendo um elo entre o mundo externo, real, pragmático e objetivo, que lhe impunha grandes desafios diários, e o mundo interior,
subjetivo, complexo e único.
À medida que a compreensão do mundo foi se modificando e ampliando,
aprofundou a interação e participação do homem no cosmos, no universo ao
seu redor, fazendo-o passar de espectador a agente promotor de ações e mudanças.
As percepções de seu mundo, ao lado das conquistas nos mais variados
campos do pensamento e das realizações humanas, constituem um conjunto de
elementos que forma e caracteriza um período no qual todos os olhares convergem na mesma direção, criando uma linha de pensamento, por meio do qual
o mundo é interpretado e compreendido. É isso que constitui o lastro cultural
em que pensadores, filósofos, místicos, cientistas e artistas processam sua vida
e o desenvolvimento de seus talentos, quer seja desenvolvendo uma linha de
pensamento baseada em fatos dados e passados, quer seja antevendo futuros. A
convergência em torno deste lastro cultural – conjunto de entendimentos e percepções sobre o mundo, a vida, o universo, durante um determinado tempo – é
que caracteriza um período da história.
Foram muitos os períodos históricos que se desenvolveram em um processo de permanente transformação. Na música, ainda que muitos fatos e fenôme-
1
_Livro.indb 27
Elaborado por João Paulo Sefrin.
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28. 28
J o ão Pau l o S e f r i n & C l a r i c e B o u r s che id
nos tenham interferido na sua construção, podemos referir os acontecimentos a
partir da Idade Média como os mais significativos. Assim, é interessante, como
resumo, a seguinte ideia de divisão histórica:
««
««
««
««
««
««
««
Primórdios – do advento da escrita (?) até o século V.
Idade Média – do século V ao século XV.
Renascimento – do século XVI ao século XVII.
Barroco – do século XVII ao século XVIII.
Classicismo – do século XVIII ao século XIX.
Romantismo – do século XIX ao século XX.
Contemporâneo – a partir do século XX .
O estabelecimento destes períodos não segue critérios rígidos nem específicos e, portanto, pode variar em datas e características, de acordo com a área
do pensamento, do autor etc. Certo é que a música passou por todo um processo
de transformação, indo desde sua realização e transmissão puramente oral até
a criação de seu sistema de registro, a princípio gráfico e depois também na
forma de registro sonoro (acetato de vinil, CD, DVD, internet etc.). Cada um dos
períodos é caracterizado por um conjunto de elementos. Os principais estão
descritos e exemplificados a seguir.
3.1.1 Períodos da música e suas características essenciais
É difícil precisar os acontecimentos musicais durante os primórdios do
tempo, pela escassez de documentação. Não havia modo de grafar a música e
sua realização estava associada a situações específicas, como rituais religiosos,
por exemplo. Ao que tudo indica, não tinha caráter lúdico. É a partir da IDADE
MÉDIA (do século V ao XV), no entanto, que se observa uma linha de desenvolvimento da música.
Neste período, a organização social está baseada no feudalismo, sistema
de semiescravidão no qual um senhor de terras distribuía partes de sua propriedade a quem a explorasse e cuidasse dela, em troca de parte da produção
e, principalmente, de lealdade na defesa territorial e política. A situação era de
exclusão e miséria, com exceção dos suseranos, que eram os donos e detentores
das terras e que viviam da exploração e subserviência dos vassalos, aqueles que
recebiam partes da terra em troca de total fidelidade. Esse período é também
chamado de período gótico, conhecido como “a noite dos mil anos”, de grande
obscuridade em todas as áreas de conhecimento, em que tudo é depositado e
creditado na figura de Deus, caracterizando a Teocracia.
O século XV, final da Idade Média, representa uma transição. Muitas características já apresentam grande evolução e quase não se encaixam nas ideias
medievais, já se constituindo a antecipação do pensamento futuro, conduzindo
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29. Pat r imô nio cult ur al
29
o homem a um dos períodos mais fervilhantes e criativos: o RENASCIMENTO (do
século XVI ao XVII).
É o período do avanço da ciência, da tecnologia, da afirmação do homem
diante da natureza e do mundo. Tais avanços técnicos e científicos, como na
área da astronomia, por exemplo, permitem a construção de navios e embarcações mais confiáveis, assim como o estabelecimento de rotas marítimas seguras, possibilitando viagens mais ousadas e longas. É o período das grandes
descobertas territoriais.
Agora o homem é personagem principal, caracterizando o antropocentrismo e os valores cultuados são a inteligência, a técnica, o talento. A música segue
a serviço da Igreja, mas já apresenta características um pouco diferentes. Já
não é exclusivamente litúrgica e os compositores produzem música profana,
isto é, uma música tomando situações cotidianas como tema.
O renascimento foi o período do florescimento das ideias. Essas ideias
evoluíram e levaram a humanidade ao período BARROCO (do século XVII ao
XVIII). É interessante notarmos que os períodos que se sucedem contrapõem
ideias e pensamentos, que buscam na negação de seus opostos a afirmação de
princípios e ideias revolucionárias e modernas. Assim, o barroco faz voltar ao
centro das atenções a figura do divino, reforçando um sentimento de religiosidade mística.
A complexidade da música, baseada na técnica do contraponto atinge seu
mais alto grau de complexidade, ao mesmo tempo em que se criam outras formas, como a melodia acompanhada, modelo anterior ao que hoje conhecemos
como canção.
Assim, a Igreja Católica não é a única força religiosa, pois a partir da
reforma luterana surgiram dissidências religiosas. Desse modo, a concentração de conhecimento se abranda e há a constituição de universidades e escolas
como importantes centros de disseminação do saber.
Após o barroco, veio o CLASSICISMO (do século XVIII ao XIX), um período de importantes mudanças sociais e políticas, que se refletiram nas artes
e, por conseguinte, na música. Impulsionada pelas revoluções industriais, na
Inglaterra, na França e nos Estados Unidos, e pelos clarões e reflexos do iluminismo, a classe social burguesa, agora rica e poderosa, estava no comando.
Com dinheiro, comprava, encomendava e decidia, inclusive, grande parte da
produção artística.
É neste período que acontece a primeira apresentação pública de música,
aberta a qualquer pessoa, mediante a compra de ingressos. Era a independên-
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30. 30
J o ão Pau l o S e f r i n & C l a r i c e B o u r s che id
cia do artista; o surgimento da figura do profissional da música nos moldes de
hoje, que passou a viver com os proventos obtidos pela sua arte. Esse período
também é marcado pela frivolidade, pompa e leviandade dos elementos, o que
se refletiu na produção musical.
É importante notar que os períodos vão se tornando mais curtos em sua
duração, ainda que com grande intensidade. O ROMANTISMO (do século XIX
ao XX) sucede o classicismo. É o período do exagero, da grandiloquência e da
grandiosidade. O compositor já é visto como artista independente e autônomo,
com forte papel de movimentador, de impulsionador da sociedade através da
sua arte.
Amparados pelas revoluções e ideais sociais, há um sentimento de ufanismo nacionalista, que se faz sentir na produção da arte em geral, inclusive na
música. Os compositores passam a incluir em suas obras referências folclóricas
e populares, criando uma arte universal a partir do particular. Além disso, há
uma tendência aos ideais liberais traduzindo-se na defesa dos direitos do homem, na democracia e na liberdade de expressão.
O ritmo de vida se intensifica e acelera, e a burguesia é a classe social mais
rica e poderosa. Seus recursos financiam e impulsionam a criação de grandes
espetáculos, como óperas, balés e sinfonias, que saem cada vez mais dos salões
dos palácios em direção às salas de concerto.
Surge a figura do solista como prodígio, capaz de envolver e encantar a
plateia com suas habilidades técnicas e estéticas. Em contraposição ao Classicismo, o Romantismo buscava maior liberdade de expressão, buscando a tradução mais profunda de sua subjetividade, revelando emoções e sentimentos.
Durante o romantismo houve a eclosão de vários movimentos paralelos,
gerando uma concomitância de atividades estéticas, muitas vezes contraditórias entre si. E como característica de tempos mais velozes, a duração do
período foi bem mais curta que as demais, trazendo em seguida várias linhas
de pensamento que originaram tendências, escolas, filosofias, caracterizando
com sua simultaneidade uma era de modernidade e ritmo frenético, conhecido como período CONTEMPORÂNEO (a partir do século XX), que se caracteriza
por uma estética áspera e agressiva, a qual busca o desequilíbrio, a inquietação, o questionamento.
Assolado pelas duas grandes guerras, o século XX traduziu na arte a crueza das catástrofes sociais que explicitaram grandes e profundas diferenças entre liberdade e tolhimento, riqueza e pobreza, poder e subserviência. Os compositores se utilizaram de recursos como a busca de sonoridades e timbres, ritmos
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31. Pat r imô nio cult ur al
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fortes e contundentes, novos parâmetros sonoros, criando uma arte bastante
inóspita, de difícil digestão e, por isso mesmo, de acesso bastante limitado. É
uma arte muito mais cognitiva e racional do que bela e prazerosa.
Ao lado disso tudo, há o fortalecimento da chamada MÚSICA POPULAR,
que recebe cada vez mais espaço ao redor do mundo. Com o advento das mídias de caráter democrático, com acesso facilitado à população, como o rádio
e a televisão, além da evolução de formas de reprodução mecânica de música,
como os gramofones, toca-discos, eletrolas, vitrolas e, mais recentemente, CD
players e internet, a música popular ganhou força e status de principal forma
de manifestação artística na área musical, além de se tornar emblemática do
ponto de vista comercial.
Na segunda metade do século XX, por volta de 1950, surge um fenômeno que se tornaria um estilo de vida e haveria de se constituir uma forma
de comportamento, de viver e compreender o mundo, que foi o ROCK’N ROLL .
Surgido nos Estados Unidos, logo se alastrou por todo o mundo, criando uma
infinidade de gêneros e subgêneros musicais, influenciando, a partir da arte,
questões políticas, sociais e mercadológicas. Ao longo dos anos surgiram tipos,
gêneros, estilos de rock diferentes entre si, mas que conservaram a essência da
subversão, da contracultura, como o rock progressivo, o punk-rock, o heavy-metal, entre outros.
No Brasil, a música popular encontra importantes manifestações através
do SAMBA , TROPICÁLIA, BOSSA-NOVA , JOVEM GUARDA, e MPB. Além dessas manifestações, há uma eclosão de estilos e gêneros oriundos destes, que representam importante fatia tanto no mercado musical, quanto na expressão das
necessidades afetivas do público. Entre esses estilos podemos citar a música
SERTANEJA e a música REGIONAL, como a nordestina, a gaúcha etc.
Hoje em dia, há uma simultaneidade de gêneros musicais. A cada ano é
produzida uma infinidade de músicas populares de todos os estilos e de músicas eruditas. Nenhum gênero é superior ou inferior. Cada um cumpre sua
função na interpretação dos anseios, necessidades, sentimentos, angústias e
alegrias da sociedade.
Há espaço para todos os gêneros. Cumpre a cada um conhecer a maior
quantidade e variedade possível das manifestações musicais e encontrar a que
melhor traduz os sentimentos mais fortes, da maneira mais próxima, para poder traduzir sua alma para o mundo e o interpretar para si mesmo.
3.2 Música na educação básica2
Em nosso país, as leis que regulam o ensino de artes e da música na educação básica passaram por muitas transformações ao longo dos anos. Contudo,
como não cabe aqui nos deter neste fato (para isso, ver SANTOS, 2011), destacamos a Lei no 11769/2008, que altera a LDB no 9394/1996 e institui a obrigatoriedade do conteúdo de música na escola básica, dentro do componente arte.
2
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Elaborado por Clarice Bourscheid.
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É importante notar “que não é na escola que a educação musical começa
ou acaba, mas onde deve se fazer com a participação de especialistas e em íntima conexão com outros campos de saberes e práticas” (SANTOS, 2011, p. 193).
Ou seja, a aprendizagem musical certamente não ocorre somente no âmbito escolar, mas a escola tem o compromisso de proporcionar aos seus alunos, especialmente dentro do componente arte, o contato com a linguagem musical nas
suas diferentes formas. E isto poderá ser tarefa tanto do professor pedagogo
quanto do licenciado em música, pois esta lei não exige a presença do especialista em música para este fim. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais
de Arte (1998, p. 54):
Para que a aprendizagem da música possa ser fundamental na formação
de cidadãos é necessário que todos tenham a oportunidade de participar
ativamente como ouvintes, intérpretes, compositores e improvisadores, dentro e fora da sala de aula. Envolvendo pessoas de fora no enriquecimento
do ensino e promovendo interação com os grupos musicais e artísticos das
localidades, a escola pode contribuir para que os alunos se tornem ouvintes
sensíveis, amadores talentosos ou músicos profissionais. Incentivando a participação em shows, festivais, concertos, eventos da cultura popular e outras
manifestações musicais, ela pode proporcionar condições para uma apreciação rica e ampla onde o aluno aprenda a valorizar os momentos importantes
em que a música se inscreve no tempo e na história.
Se apreciação, interpretação, improvisação e composição são as diferentes formas de nos relacionar com a música, é importante que, em sala
de aula, se tenha a oportunidade de experimentar essas quatro formas de
vivência da linguagem artística. Afinal, como aponta Lino (2009, p. 62): “A
música não é abstrata, nem é pura descarga de emoções; ela é um objeto de
conhecimento palpável que deve ser descoberto pelas crianças a partir do seu
fazer musical.”
Segundo Brito (2010, p. 35), em seu livro Música na educação infantil, “os
bebês e as crianças interagem permanentemente com o ambiente sonoro que
os envolve e – logo – com a música, já que ouvir, cantar e dançar são atividades
presentes na vida de quase todos os seres humanos, ainda que de diferentes maneiras”. Ressalto aqui a importância dos jogos e das brincadeiras na infância
e que a música não acontece sem o cenário lúdico. Ainda segundo a autora, “a
criança é um ser ‘brincante’ e, brincando, faz música, pois assim se relaciona
com o mundo que descobre a cada dia”.
É preciso lembrar, porém, que falar em música é falar em silêncio. Precisamos garantir também espaços para isso no âmbito da educação, especialmente no contexto de vida das grandes cidades, em que há pouco espaço para
momentos de silêncio. A música na educação básica visa a uma formação mais
complexa do humano, ao favorecer uma educação da sensibilidade quando lida
com o corpo que age no mundo. Nesse sentido, “um trabalho pedagógico-musical deve se realizar em contextos educativos que entendam a música como
processo contínuo de construção, que envolve perceber, sentir, experimentar,
imitar, criar e refletir” (BRITO, 2010, p. 46).
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3.3 A sala de aula como espaço de ampliação do repertório
musical
Favorecer a apreciação de repertório musical brasileiro, em seus mais variados estilos e formas, bem como de diferentes partes do mundo, é tarefa do
educador que trabalha com música em sala de aula. Segundo Beyer (2007, p.
123), “a apreciação está relacionada à capacidade de ouvir atentamente o todo
ou detalhes da música, levando posteriormente a uma forma de expressão (falada, cantada, tocada, dançada, poética ou outra), de modo que outros possam
também compartilhar daquilo que ouviu a pessoa”. Esta é uma atividade importante ao se falar de música na educação e muitos autores já escreveram sobre
isso. Entretanto, Beyer (2009) lembra que ainda encontramos muitas escolas que
se valem apenas de dois tipos de atividades ao trabalharem com música na sala
de aula; são elas: cantar “ao som de um instrumento” ou “enquanto um aparelho
de som toca”, o que enfraquece as vivências musicais no âmbito da educação.
Nesse sentido, é importante destacar que “a apreciação é uma troca entre
diferentes universos de pessoas, em que vivências pessoais, aprendizagens, perspectivas de mundo fundam-se, canalizam-se para emitir uma opinião ou recriação de uma música” (BEYER, 2009, p. 124). A apreciação configura-se, portanto, como um lugar “[...] fundamental para qualquer nível ou idade na educação
musical, uma vez que o aluno pode ampliar sua perspectiva de mundo” (ibidem).
Logo, a pesquisa de repertório musical que não só aquele imposto pelas mídias é
também tarefa do educador. Sobre isso é importante lembrar que a criança não
precisa nem deve ficar limitada a um repertório considerado especifico para
sua faixa etária, a exemplo das canções infantis e das músicas simplificadas ou
“adoçadas” para o público infantil. Essas supostas adequações nos remetem a
uma concepção de infância que enxerga a criança como incompleta e incapaz,
como se ela não pudesse escutar as músicas que os adultos em seu entorno escutam, ou músicas de outras culturas, sejam elas próximas ou distantes.
É importante, pois, que o educador reflita sobre suas próprias experiências com a música e procure ampliar o seu repertório musical das mais diversas
maneiras. Para tanto, deve estar atento ao que ocorre de manifestação musical/
cultural em sua cidade, ao que os alunos conhecem e podem apresentar para
a turma, bem como pesquisar o que pode ser interessante para si e para seus
alunos através, por exemplo, de CDs, DVDs, sites da internet e de canais como
o YouTube. Isso não apenas diversifica a “bagagem cultural” como traz para
mais perto músicos e músicas aos quais há tempos não teríamos acesso. Enfim,
o importante é saber que há infinitas possibilidades musicais para se escutar,
assistir e experimentar! Para isso é preciso estar aberto tanto para conhecer o
que já foi feito, e é considerado referência na história da música, como para o
que está sendo feito hoje, seja perto ou longe de nós.
3.4 Experiência estética e poética com a música
Proponho-me a refletir aqui sobre a importância das experiências estética
e poética como forma de aprendizagem e de se pensar a música dentro deste
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contexto. Essas experiências não acontecem separadas, porém podemos dizer,
simplificadamente, que a estética diz respeito ao sentir e a poética ao agir, isto
é, ao pensamento em ato.
Lino (2010, p. 85) chama de “barulhar” a experiência poética de fazer
música na infância, identificando o “barulhar” como o atrito do corpo com o
real que brota da criança que experimenta o mundo. Essa autora aponta que “a
criança barulha porque mobiliza uma pluridimensionalidade de mundos sentidos, tendo na performance a sua forma de expressão mais direta, tomada corpo
na voz, que parece concentrar os efeitos das sonorizações de que a criança necessita; sem esgotar-se nela”.
Meira e Pillotto (2010, p. 16) compartilham dessa perspectiva ao destacarem a relação do brinquedo e do jogo com as práticas artísticas e afirmam
que “o brinquedo e o jogo encontram continuidades nas artes para redefinir
criadoramente o sentido de experiência de ser humano”. Comentam ainda que
“manifestar-se por meio da expressão artística significa para a criança o prazer e o aprender sobre suas capacidades de criar, de produzir e de materializar
suas vontades. Ajuda a compreender a si mesma, aos outros, às obras sociais e
à própria pedagogia como parte de um ritmo constante em suas construções.”
Desse modo, “quando a escola desconsidera a importância da escuta das
crianças na música, ignorando seu inabordável encanto em barulhar, corre o
risco de manter-se estática e petrificada pelas rotinas sonoras oferecidas no
cardápio escolar” (LINO, 2010, p. 86). Essa autora ressalta que a rotina escolar
não tem acolhido o imprevisto e o impreciso, que são justamente características
fortes da expressão sonora na infância. Como mencionado anteriormente, a
criança faz música brincando, uma vez que “a música como substantivo plural
não prescreve, mas emerge na infância como brincadeira, acolhendo e se nutrindo de vários repertórios que lhe conferem identidade, servem à diversão e à
alegria para expressar a necessidade de lançar o corpo à sensibilidade de soar”
(ibidem, p. 84).
No entanto, ainda hoje, a música aparece, tanto na educação infantil
como nas séries iniciais, “como suporte para a aquisição de conhecimentos gerais, para a formação de hábitos e atitudes, disciplina, condicionamento da rotina, comemorações de datas diversas” (BRITO, 2010, p. 51). Ou seja, a música,
nesses contextos, serve apenas como um meio para atingir objetivos. Por isso é
necessário que se reitere nosso papel como educadores de novas sonoridades,
de novas sensibilidades!
Para aprofundar os estudos sobre música, sugere-se:
«« a leitura das seguintes revistas:
«« ABEM – Associação Brasileira de Educação Musical: http://www.abe-
meducacaomusical.org.br/revistas.html
«« Música na Educação Básica: http://www.abemeducacaomusical.org.
br/noticia_revista_musica_escola.html
«« a aquisição do seguinte livro (editora Companhia das Letras):
«« O som e o sentido.
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Referências
BEYER, Esther. Apreciação musical por músicas experientes. In: BEYER, Esther; KEBACH, Patrícia (org.) Pedagogia da Música: experiências de apreciação musical. Porto
Alegre: Mediação, 2010.
BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: Arte. Secretaria
de Educação Fundamental. Rio de Janeiro: DPA, 1998. Disponível em: http://portal.
mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/arte.pdf.
BRITO, Teca A. Música na educação infantil: propostas para a formação integral da
criança. São Paulo: Peirópolis, 2010.
LINO, Dulcimarta Lemos. Música é... cantar, dançar e brincar! Ah, tocar também! In:
CUNHA, Susana Rangel Vieira (org.). Cor, som e movimento: a expressão plástica, musi-
cal e dramática no cotidiano da criança. Porto Alegre: Mediação, 2009.
______. Barulhar: a música das culturas infantis. In: Revista da ABEM, Porto Alegre, n.
24, p. 81-88, set. 2010.
MEIRA, Marly; PILLOTTO, Silvia. Arte, afeto, educação: a sensibilidade na ação pedagógica. Porto Alegre: Mediação, 2010.
SANTOS, Regina Marcia Simão. Educação musical, educação artística, arte-educação e
música na escola básica no Brasil: trajetórias de pensamento e prática. In: Música, Cultura e Educação: os múltiplos espaços de educação musical. Porto Alegre: Sulina, 2011.
Este capítulo foi elaborado por João Paulo Sefrin e Clarice Bourscheid.
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37. Capítulo
4
Artes visuais
Com o advento da arte contemporânea, a pergunta O que é arte? ganhou
ainda mais repercussão. Este capítulo, embora não apresente uma resposta,
procura indicar caminhos para que o professor sinta-se à vontade ao trabalhar o
tema em sala de aula. Para facilitar a compreensão, são apresentados exemplos
de obras e movimentos artísticos.
4.1 Quando surge aquilo que chamamos de arte?
A dificuldade que encontramos para definir o que é arte também é sentida
quando tentamos apontar seu início. Quando surge aquilo que chamamos de
arte? Um conceito mais amplo do termo envolve, além das tradicionais pintura
e escultura, manifestações como edificações, tecelagem e adornos. São produtos expressivos de determinadas culturas que desempenham funções estéticas,
ritualísticas ou práticas. Temos indícios desse tipo de produção há pelo menos
duzentos e cinquenta mil anos, antes mesmo do surgimento de nossa espécie,
quando hominídeos selecionavam alguns tipos de pedras para trabalhar suas
formas (BELL, 2008).
Ainda estamos descobrindo esse passado artístico. Os sítios arqueológicos
encontrados no sul da França e no norte da Espanha a partir do final do século XIX impactaram profundamente a nossa compreensão do que é arte. “Não
aprendemos nada!”, exclamou Pablo Picasso ao visitar as cavernas de Lascaux
em 1940 (ibidem, p. 13). E não é preciso ir até a Europa para encontrar expressões ancestrais daquilo que hoje chamamos de arte. Os zoólitos descobertos
entre a costa do Uruguai e o litoral de São Paulo, exibidos recentemente na 8ª
Bienal do Mercosul1, nos mostram que nossa produção de objetos com preocupações estéticas foi iniciada milhares de anos antes de os europeus atracarem
no novo mundo.
1
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As peças, emprestadas do laboratório de ensino e pesquisa em Antropologia e Arqueologia
da Universidade Federal de Pelotas e o do Museu de Arqueologia e Antropologia da Universidade de São Paulo, entre outros acervos, foram exibidas na mostra Além Fronteiras, no
Museu de Arte de Porto Alegre Ado Malagoli – MARGS, com curadoria de Aracy Amaral,
em 2011.
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Figura 6 – Pintura em Lascaux.
Fonte: Wikipedia
Quando pensamos na palavra arte como um conceito específico, no entanto, suas origens e desenvolvimento são mais nítidos e mais bem registrados.
A ideia de arte compartilhada pelo mundo ocidental começa a se formar durante o Renascimento, quando o objeto artístico se diferencia de outros artefatos
manufaturados para se tornar algo raro e precioso, feito para a contemplação.
Juntamente com essa noção específica de arte, é claro, surge também o artista,
que se afasta do modo de produção das guildas e se afirma como um indivíduo
criador. Até então, a pintura e a escultura eram vistas como um trabalho manual que envolvia conhecimentos técnicos, mas não um investimento mental.
Durante a Renascença, o lugar dessas artes foi revisto, especialmente por empregarem conhecimentos teóricos como a perspectiva e o estudo de anatomia.
Essas manifestações passaram a ser vistas, a partir de então, como um exercício de espírito. “Arte é coisa mental”, já dizia Leonardo da Vinci, símbolo do
homem renascentista.
O crescimento populacional e o desenvolvimento do comércio possibilitaram a aquisição privada de obras de arte, ao mesmo tempo em que estimularam
a Igreja, antiga patrona das artes, a competir com essa pulverização. A valorização dos artistas lhes deu cada vez mais liberdade em relação às encomendas, permitindo que o talento e a personalidade individual se tornassem critérios de valor. O aumento dos quadros assinados e dos autorretratos no século XV está entre
os indícios dessa mudança de estatuto apontados por Arnold Hauser.2 Em 1550,
a publicação de As vidas dos mais excelentes pintores, escultores e arquitetos, de
Giorgio Vasari, além de consolidar a posição dos artistas de sua época, marca o
início de uma história da arte centrada, naquele tempo, na biografia dos artistas.
Outro período-chave para a construção da nossa ideia de arte foi o século
XVIII. Dentro do contexto iluminista de propagação do conhecimento, desligamento da Igreja e expansão do comércio, a arte ampliou seu alcance com o
surgimento dos museus e da figura do crítico de arte, responsável por fazer a
2
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HAUSER, Arnold. História social da literatura e da arte. São Paulo: Mestre Jou, 1982.
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crônica das exposições. Esses novos personagens ajudaram a democratizar a
apreciação de bens artísticos que, até então, era privilégio da aristocracia. É
também nessa época que a estética e a história da arte se constituem como disciplinas, evidenciando a valorização da arte como campo do conhecimento e a
consequente vontade de registrar e compreender sua linguagem. O século XVIII
é marcado, ainda, pela multiplicação das academias na Europa, um indicativo
da crescente consciência dos Estados em relação ao poder da arte como instrumento de distinção e propaganda. Tais instituições controlavam o ensino e as
exposições de arte e determinavam os padrões oficiais de gosto.
Nos anos seguintes, esse campo consolidado passa por uma série de questionamentos e transformações. A arte do século XIX é marcada pela multiplicação de concepções pictóricas e um desajuste entre produção e recepção da
arte, tanto por parte da academia e da crítica quanto por parte do público e
dos compradores. Em uma sucessão de movimentos artísticos que começa com
o Romantismo, a arte gradativamente se afasta das regras da academia e seus
ideais de beleza. Primeiro, as paixões do homem e a expressão da subjetividade
ganham lugar na produção de artistas como Eugène Delacroix e William Turner e no pensamento de críticos como Charles Baudelaire e John Ruskin. Na
metade do século, os temas pictóricos também começam a mudar. Os pintores
realistas posicionam-se contra a idealização da tradição clássica e os temas
da aristocracia, voltando-se para o homem comum e a observação direta da
natureza. O advento da fotografia, as pesquisas científicas, a comercialização
da tinta a óleo em tubos portáteis e a descoberta da arte oriental foram fatores
que contribuíram para libertar a produção artística do compromisso com a representação da realidade, favorecendo as pesquisas sobre a forma e a maneira
de pintar, especialmente no final do século XIX. A arte moderna substitui o belo
pelo novo, ampliando seu repertório de temas e técnicas artísticas.
Figura 7 – A liberdade guiando o povo, de Eugène Delacroix (1830).
Fonte: Wikipedia
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Consolidando essa revolução, os primeiros anos do século XX foram
marcados por diferentes movimentos artísticos reunidos pelo mesmo sufixo:
os –ismos da arte moderna. Em uma reação à homogeneização provocada
pelo desenvolvimento da indústria e da cultura de massa, muitos artistas se
reuniram em grupos para defender uma ruptura com o passado e a afirmação de novos valores para a arte. O artista de vanguarda é, acima de tudo, um
provocador que questiona as convenções da arte, os valores burgueses e as
regras das instituições e do mercado em defesa da construção da expressão
de seu próprio tempo. A ideia não é “[...] mais apenas modernizar ou atualizar, e sim revolucionar radicalmente as modalidades e finalidades da arte”
(ARGAN, 1992, p. 186).
Décadas depois, correntes dos anos 1960 e 1970 retomam a iconoclastia de
alguns movimentos do início do século, questionando o objeto artístico e também o papel do artista, cada vez mais próximo do homem comum. Nesse momento de transição entre a arte moderna e a arte contemporânea, a produção é
marcada pelo que a crítica Lucy Lippard (1973) chamou de “desmaterialização
da arte”, fruto do trabalho de artistas que enfatizaram antes as ideias, os gestos
e as ações do que uma obra acabada, de valores plásticos e comercias.
4.2 Mas, afinal, o que é arte?
Quais são as características daquilo que entendemos, hoje, como artes visuais? Para nos ajudar nessa busca, apresentamos um pequeno panorama de alguns artistas importantes a partir do período que nos referimos anteriormente.
Em 1961, Piero Manzoni transforma o mundo inteiro em uma obra de
arte ao instalar sobre o chão, de cabeça para baixo, um pedestal com a inscrição “Base do mundo”. Marina Abramovic, desde o início dos anos 1970, utiliza
seu próprio corpo como material, testando seus limites físicos, bem como a
relação que se estabelece entre o artista em performance e seu observador. Em
The Lightning Field (1977), Walter de Maria instala no deserto do Novo México
centenas de postes de metal que, em dias de tempestade, criam um campo de
raios. A obra só pode ser vista por pequenos grupos de pessoas que se deslocam
até o local, nos dias em que as condições climáticas são propícias.
Pensemos, agora, em alguns exemplos mais recentes. Desde a década de
1980, a base do trabalho multimídia de William Kentridge são desenhos a carvão, o mesmo material utilizado pelo homem pré-histórico para representar
animais nas paredes das cavernas. Depois de realizar mais de três mil fotografias em Ruanda, logo após o genocídio que varreu o país em 1994, Alfredo Jaar
apresenta algumas dessas imagens na instalação Real Pictures (1996). O artista
as coloca em caixas pretas, lacradas, em cujas tampas podemos apenas ler
a descrição daquilo que as imagens representam (CHOW, 2008). A instalação
FOREST (for a thousand years...), de Janet Cardiff e George Miller, exibida na
Documenta de Kassel de 2012, convida os visitantes a se acomodarem em meio
a uma floresta real. Ao longo da experiência, os sons do ambiente se misturam
com a composição transmitida pelos alto-falantes instalados no local pelos
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artistas. A gravação começa com o barulho do vento e das árvores, mas, no
desenrolar da obra, os ouvintes são transportados para uma floresta em meio
a um bombardeio.
Diante de um quadro tão variado, o próprio termo artes visuais, criado
para substituir as já insuficientes denominações belas artes e artes plásticas,
parece limitado. Continuamos empregando-o para diferenciar essas manifestações de outras linguagens artísticas, como a música, o teatro, o cinema e a
dança, mesmo sabendo que nenhum desses campos é estanque. Essa diluição
de fronteiras não é exclusiva do cenário atual. Em diversos momentos ao longo
da história da arte, diferentes linguagens se cruzaram e dialogaram.
Por outro lado, as teorias artísticas foram muitas vezes marcadas por
um desejo de delimitar as especificidades de cada arte para melhor compreendê-las. Gotthold Ephraim Lessing, poeta e filósofo do Iluminismo alemão,
procurou separar campos até então frequentemente aproximados. No livro
Laocoonte, ou sobre as fronteiras da pintura e da poesia, de 1766, Lessing estabelece as diferenças entre as artes que se desenvolvem no espaço, como a
pintura e a escultura, e as artes que se desenvolvem no tempo, como a música
e a poesia.
Centenas de anos mais tarde, o norte-americano Clement Greenberg, um
dos críticos mais influentes do século XX, parte das ideias de Lessing para defender a pureza de cada linguagem artística, que, para ele, deveriam investir
nas características únicas de cada meio para chegar à autonomia. Entre os
anos 1940 e os anos 1960, Greenberg constrói uma defesa da arte abstrata norte-americana por meio de sua inserção no fim de um processo de afastamento
da realidade rumo à abstração que começa, para o crítico, com a produção de
Édouard Manet.
A pureza na arte consiste na aceitação – a aceitação voluntária das limitações do meio de cada arte específica. [...] É em virtude de seu meio que
cada arte é única e estritamente ela mesma. Para restaurar a identidade
de uma arte, a opacidade de seu meio deve ser enfatizada. [...] A pintura
ou a estátua se esgota na sensação visual que produz. Não há nada para
identificar, associar ou pensar, mas tudo a sentir. [...] As qualidades puramente plásticas ou abstratas da obra de arte são as únicas que contam
(GREENBERG, 1997, p. 53).
O texto de Greenberg no qual essa passagem pode ser encontrada, um de
seus primeiros ensaios de impacto, foi publicado pela primeira vez em 1940.
Duas décadas depois, a sensação visual produzida pela pintura ou escultura
já parecia insuficiente como característica essencial para julgar a arte. Arthur
Danto está entre os teóricos que apontaram essa limitação. O filósofo toma
como exemplo dessa perda de definição as Brillo Boxes (1964) de Andy Warhol,
esculturas em madeira pintadas aparentemente iguais às embalagens do produto encontradas nas prateleiras de qualquer supermercado. Para Danto (2006,
p. 16), a obra significava que, “no que se refere às aparências, tudo poderia ser
uma obra de arte”. Quase sessenta anos antes de Warhol, os readymades de
Marcel Duchamp já haviam nos mostrado que, mesmo quando falamos em artes visuais, o gesto artístico pode ir muito além das aparências.
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Figura 8 – A fonte, deMarcel Duchamp (1917).
Fonte: Wikipedia.
A arte contemporânea é marcada pela pluralidade: pelo resgate das relações com o passado após o ímpeto modernista do novo, pela pulverização dos
grandes movimentos, pela mistura com outras disciplinas, pela atenção à vida
cotidiana, pelo retorno da ficção, pela ênfase na comunicação, por tentativas de
descobrir novas formas de compartilhamento e sociabilidade e pela coexistência de tudo isso com técnicas e valores tradicionais. Talvez devêssemos falar, ao
contrário, sobre a inespecificidade daquilo que consideramos, hoje, artes visuais.
Arte é o que eu e você chamamos de arte, diz o título de um livro organizado pelo
crítico Frederico Morais, que compila oitocentos e uma definições de artistas e
teóricos sobre a arte.3 Essa pluralidade de pontos de vista indica, acima de tudo,
a riqueza de um campo que, assim como a vida, está sempre se reconfigurando.
4.3 Arte e educação
Ao nos aproximarmos de uma obra ou de uma proposição artística nos
dias de hoje, precisamos estar preparados para acolher essa diversidade e pensar sobre o modo como ela desafia nossa própria concepção do que é arte. É o
contato direto com essas produções que apontará as maneiras mais frutíferas
de abordá-las, considerando o contexto do artista, da obra, da situação em que
ela é apresentada e dos discursos que a acompanham. Uma educação em artes
deve não apenas estimular a expressão e a experimentação dos alunos por meio
de linguagens artísticas, tarefa de suma importância, mas, também, prepará-los para descobrir a potência de diferentes tipos de obras.
3
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MORAIS, Frederico (org.). Arte é o que eu e você chamamos de arte. Rio de Janeiro: Record,
1998.
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43. Ar te s v is uais
43
A relação com a arte nos ajuda a perceber o universo visual que nos cerca
de maneira mais complexa. Esse tipo de relação pode abrir, enriquecer, dar
definição e tempo ao universo de imagens e estímulos que nos rodeia. Pode
“fazer-nos ver”, como afirma Aurora Polanco (2007), oferecendo ferramentas
para restaurar nossa percepção.
O contato com a produção artística, com as emoções e as reflexões que
ela possibilita constitui uma poderosa ferramenta para conhecermos melhor a
nós próprios. O ensino deve aproveitar essa chave para explorar a sensibilidade
muitas vezes soterrada pelos fluxos da vida contemporânea. O tempo da arte
exige uma forma de envolvimento que não costumamos exercer em nosso dia a
dia. Diante do significado aberto de uma obra de arte, nosso pensamento está
sempre em movimento.
Esteja atento às exposições de arte que têm lugar na cidade em que você vive e
arredores. A reprodução de imagens em sala de aula, ainda que fundamental
para fins didáticos, não substitui o contato com a obra de arte. Procure oportunizar a seus alunos visitas a espaços culturais. Atualmente, muitos deles realizam visitas mediadas para grupos de estudantes, além de disponibilizarem
materiais pedagógicos, impressos e online, direcionados ao professor. Realize
uma pesquisa e verifiquese a instituição oferece transporte para escolas públicas. A seguir relacionamos alguns lugares em que é possível agendar uma
visita mediada:
««
««
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««
««
MARGS, Porto Alegre – www.margs.rs.gov.br/.
Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre – www.iberecamargo.org.br/.
Fundação Vera Chaves Barcellos, Viamão – www.fvcb.com/.
Santander Cultural, Porto Alegre – www.santandercultural.com.br/.
Bienal do Mercosul, Porto Alegre (somente durante o evento) –
www.bienalmercosul.art.br/
Referências
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo, Companhia das Letras, 1992.
BELL, Julian. Uma nova história da arte. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2008.
CHOW, Oliver. “Alfredo Jaar and the Post-Traumatic Gaze”. Tate papers: Tate’s online
research papers. Primavera de 2008. Disponível em: http://www.tate.org.uk/research/
tateresearch/tatepapers/08spring/chow.shtm.
DANTO, Arthur C. Após o fim da arte: a arte contemporânea e os limites da história.
São Paulo: EDUSP, Odysseus, 2006.
HAUSER, Arnold. História social da literatura e da arte. São Paulo: Mestre Jou, 1982.
GREENBERG, Clement. “Rumo a um mais novo Laocoonte”. In: FERREIRA, Glória; COTRIM, Cecília (org.). Clement Greenberg e o debate crítico. Rio de Janeiro: Funarte,
Jorge Zahar, 1997.
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LIPPARD, Lucy. Six years: the dematerialization of the art object from 1966 to 1972.
Berkeley: University of California, 1973.
MORAIS, Frederico (org.). Arte é o que eu e você chamamos de arte. Rio de Janeiro:
Record, 1998.
POLANCO, Aurora. “Outro mundo es posible. Que pude El Arte?” Estúdios Visuales,
v.5 , Madrid, CENDEAC, enero, 2007.
Este capítulo foi elaborado por Camila Monteiro Shenkel.
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45. Capítulo
5
Artes cênicas: teatro e dança
Este capítulo aborda algumas especificidades do teatro e da dança e estabelece um diálogo entre as linguagens artísticas e o campo da Educação. Propõe,
inicialmente, uma breve contextualização histórica para, então, indicar alguns
caminhos para o trabalho em sala de aula. Por fim, sugere sites e filmes como
forma de ampliar o repertório do professor e qualificar sua prática pedagógica.
5.1 Teatro e dança: aproximações históricas
Só mais uma coisa. Posso lhe perguntar, Billy, como se sente quando está
dançando?
Não sei... Eu me sinto bem. No começo é difícil, mas, depois que começo,
esqueço tudo. E desapareço. Parece que desapareço. Eu sinto uma mudança
no meu corpo todo, como se tivesse um fogo. E eu fico ali. Voando. Como um
pássaro. Como a eletricidade. É. Eletricidade.
(Stephen Daldry, Billy Elliot, 2000)
Este texto é um convite para fazermos um passeio pelo teatro e pela
dança: suas especificidades, manifestações artísticas e estéticas. Concomitantemente, veremos alternativas de diálogos entre essas duas linguagens e
a educação. Muito já foi escrito sobre o tema, há vários caminhos abertos
e o debate está longe de se esgotar. O caminho que trilha este capítulo não
é um receituário nem um rol de atividades para serem trabalhadas com os
alunos, mas, sim, um elenco de possibilidades e reflexões sobre o teatro e a
dança na escola.
A princípio, comentaremos sobre a dança, pois ela é considerada a mais
antiga manifestação artístico-cultural. Dizem que antes que o ser humano
pudesse falar, ele já dançava. Desde a Antiguidade, portanto, a humanidade
expressava-se corporalmente por meio da dança. O ser humano dançava em
celebrações, em rituais para cultuar seus deuses; dançava para guerrear; usava
(e alguns ainda usam) a dança para celebrar o casamento, o nascimento e a
morte. Dançava-se para pedir chuva aos céus. As danças primitivas eram realizadas pelos homens das cavernas, que dançavam para estar em contato com
o sobrenatural, como se fosse algo mágico. Suas danças e movimentos estão
registrados na arte rupestre.
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Edm a r G a l i za
Na história da humanidade, a dança sempre foi utilizada como uma manifestação social,1 uma comunhão de grupos sociais entre os povos antigos.
Mirian Baiak (2007, p. 20) afirma que “o homem primitivo dançava porque não
sabia falar, hoje os homens falam, mas continuam dançando, não como antes,
mas dançam, mesmo depois de anos de evolução e transformação”.
Na abordagem sobre teatro, busquemos a origem etimológica da palavra.
Teatro vem do grego, theatron, que é o local de onde o público olha uma apresentação, um lugar de onde se pode ver/enxergar algo, como explica Patrice
Pavis (2007 p. 372), “o teatro é, mesmo na verdade, um ponto de vista sobre um
acontecimento: um olhar”. Com o passar do tempo, a palavra teatro se tornou a
própria arte do gênero dramático: o teatro.
O teatro como conhecemos tem sua origem na Grécia, há cerca de dois
mil e quinhentos anos,2 e está estritamente ligado a ritos, caça, colheita, cultos
aos deuses e danças. Na Grécia, havia grandes festivais de teatro que reuniam
multidões.3 O teatro era utilizado como celebração de caráter cívico e religioso
e considerado uma maneira fácil e rápida para se “transmitir” ideias a grandes
multidões. Assim, sob a forma de grandes festivais, o teatro grego era também
um ato de educar: “o teatro, em todos os seus aspectos, foi a maior força unificadora e educacional do mundo ático” (COURTNEY, 2003, p. 5). A relação entre
teatro e educação pode ser igualmente percebida, séculos mais tarde, no trabalho realizado pelos padres jesuítas (em especial no Brasil), que, no período
colonial, foram os primeiros a utilizarem o teatro na educação. O teatro era um
instrumento para a catequização dos povos indígenas, que se dava a partir dos
ensinamentos bíblicos.
Já no século XIX e início do século XX, quando as artes cênicas começam
a fazer parte da educação escolar, o teatro e a dança aparecem relacionados às
apresentações das datas cívicas, festivas e comemorativas (natal, páscoa, dia
das mães, dia da bandeira etc.). As crianças decoravam o texto, os movimentos
e os gestos da professora, tendo que imitar rigorosamente. Esse tipo de ensino, porém, se faz presente até hoje nas escolas. Quem não tem na memória a
apresentação de alunos pequenos e, na frente deles, uma professora fazendo os
gestos e articulando sons com a boca para que as crianças a imitassem?
O ensino da arte começa a ganhar outra dimensão na escola brasileira a
partir das teorias educacionais emergidas do movimento da Escola Nova, entre as décadas de 1920 e 1970, quando a educação artística “volta-se para o
desenvolvimento natural da criança, centrado no respeito às suas necessidades e aspirações, valorizando suas formas de expressão e de compreensão do
mundo” (PCNs-Arte, 1998, p. 23). Com as teorias escolanovistas, a arte passa a
1
Para ver a linha do tempo do tempo da dança e saber mais sobre as danças primitivas e
milenares, acesse: http://www.slideshare.net/bbpn/histria-da-dana
2 O texto refere-se somente ao teatro ocidental, uma vez que há o teatro primitivo, tais
como do Egito, do antigo oriente, das civilizações islâmicas e indo-pacíficas, da China e
do Japão.
3 Destacam-se as festas em homenagem a Dionísio, deus do vinho e do teatro, chamadas de
ditirambo. Nelas, a multidão se reunia extasiadamente bebendo vinho, declamando poesias e agradecendo pela colheita e fertilização.
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