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Juízo de valor e norma
Juízo de valor e norma A decisão sobre dizer ou não a verdade está estreitamente ligada aos sistemas de valores de uma sociedade. Há coisas que valorizamos, consideramos boas e procuramos fazer. Por outro lado, sentimo-nos mal quando não conseguimos evitar ações que julgamos más ou reprováveis.  Em outras palavras, somos capazes de estabelecer juízos de valor, diferenciando o bem e o mal, e de agir conforme essa diferenciação.  Esses juízos nos permitem estabelecer princípios morais que procuramos seguir e que convém serem seguidos por todos.
 
Mas por que escolhemos fazer o bem? A resposta é simples: escolhemos fazer o bem, seguindo princípios morais, porque, caso contrário, seria quase impossível o convívio social. Imagine se cada um pudesse estabelecer suas próprias normas.  Certamente predominaria a insegurança, principalmente se as pessoas tivessem como princípio a mentira, o egoísmo ou o uso da violência física ou psíquica.
Assim, pode-se dizer que os valores têm caráter social (ou histórico): na maior parte das vezes, vêm do passado, são herdados, e nos aparecem sob a forma de  normas que devem ser respeitadas em  benefício de todos, sejam elas uma lei, um regulamento escrito ou um princípio de conduta. Por outro lado, como já sabia Sócrates, o homem tem autonomia, é capaz não só de criar seus próprios valores como de questionar os valores herdados. Trata-se de uma tarefa perigosa: toda vez que nossa consciência ética confronta valores estabelecidos, corremos um risco. Aliás, no caso de Sócrates, o desfecho foi trágico.
Norma e práxis Certamente, dizer até quando uma norma deve ser respeitada e quando ela deve ser mudada é uma tarefa difícil, ainda mais levando-se em consideração as transformações que ocorrem, com o tempo, em todas as sociedades. Mas, além dessa, deve-se considerar outra dificuldade em relação às normas: em nossa vida prática, estamos o tempo todo escolhendo entre alternativas possíveis e nem sempre nosso sistema de valores dá conta de todas as situações que se apresentam a nós, ou seja, nem sempre essa escolha é pacífica.
Pense, por exemplo, no preceito bíblico “não matarás”. Não precisamos ser religiosos para concordar com esse princípio,  aparentemente inquestionável. Porém, ele é realmente aplicável a todas as situações?
Imagine, por exemplo, que você esteja ao volante de um carro desgovernado que se dirige rumo a um grupo de cinco pessoas. Numa fração de segundos, você percebe que talvez até possa mover o volante em outra direção, atingindo apenas uma pessoa. O que você faria? A morte de um é preferível à morte de cinco?
Imagine agora outra situação: num hospital cinco pacientes em estado grave esperam por um transplante de órgão (cada paciente necessita de um órgão diferente). Na sala de espera desse hospital, há um indivíduo saudável. Suponhamos que os órgãos desse indivíduo fossem compatíveis com todos os cinco pacientes e poderiam, portanto, salvar cinco vidas. O que fazer? Matar o indivíduo saudável, para salvar os cinco doentes, parece-nos uma opção inviável. Então, nesse caso, a morte de cinco é preferível à morte de um?
Outro exemplo de que a discussão sobre esse princípio não está fechada é a polêmica gerada pelas pesquisas com células-tronco, vistas pela ciência como uma alternativa bastante eficaz para o tratamento de quantidade significativa de doenças graves e até então de tratamento difícil, como alguns tipos de câncer e paralisia. Essas pesquisas colocam-nos diante de um dilema ético, afinal as células-tronco mais eficazes são extraídas de embriões humanos, que são destruídos no processo. Segundo alguns setores da sociedade – principalmente a Igreja –, a destruição de um embrião humano significa a destruição de uma vida. Trata-se, portanto, da violação de um princípio moral. Para esses setores, portanto, essas pesquisas não deveriam ser realizadas, apesar de prometerem melhorar a qualidade devida de muitas pessoas, ou até mesmo salvá-las.
Os princípios morais estão ligados às nossas escolhas: somos dotados da capacidade de decidir o que fazer e de utilizar nossa consciência moral para isso. Ao escolher, exercemos nossa capacidade de ser livres. Mas, como acabamos de ver, a decisão sobre que caminho seguir nem sempre é tão simples, ainda mais numa época em que as transformações ocorrem com muita velocidade, exigindo que se faça constantemente uma revisão de valores. É justamente nesse ponto que os estudos sobre Ética são de grande interesse para nossa sociedade.
Moral e Ética Moral (do latim  moralis, de mor-, mos: costume) é  o conjunto de valores – que variam de cultura para cultura e mudam com o tempo – em que se baseiam os princípios e as normas que garantem o convívio entre as pessoas e, portanto, a sobrevivência do grupo.
Moral e Ética Ética (do grego  ethiké, ethikos: que se refere aos  costumes) é o ramo da Filosofia que aborda os problemas fundamentais da moral (significado do bem e do mal, da justiça e do dever, bem como o sentido e a finalidade da vida). Trata das regras de conduta permanentes e de validade universal, buscando definir seus princípios.
As duas palavras têm o mesmo sentido original (ligado aos costumes) tanto no grego quanto no latim, mas a moral tem um sentido mais prático (relacionado ao estabelecimento de princípios ou normas), enquanto a Ética tem um sentido mais teórico. Na linguagem cotidiana, porém, os termos costumam ser utilizados como sinônimos.
Ética em Aristóteles Aristóteles abordou a questão da Ética a partir do princípio segundo o qual todas as coisas (tanto os objetos como as pessoas) têm uma finalidade. Em sua obra  Ética a Nicômaco, ele afirma: “Toda arte e  todo método, assim como toda ação e escolha, parece tender para um certo bem; por isso se tem dito, com acerto, que o bem é aquilo para que todas as coisas tendem.” Ao escrever “toda arte e todo método”, Aristóteles refere-se a toda atividade e todo conhecimento humano. Assim, a metalurgia e a agricultura, por exemplo, têm como finalidade o bem do homem. Essa concepção, segundo a qual todas as coisas têm uma finalidade, é chamada de  teleológica.
No ser humano, essa finalidade é a  felicidade,  alcançada pela prática da  virtude. Aristóteles entende  a virtude como fruto de um  equilíbrio entre  o excesso e a falta, obtido a partir de escolhas concretas, que resultam em atos reais. Entre a covardia e a audácia, encontra-se a coragem; entre a arrogância e a humilhação, a dignidade.  Portanto, não existia um Bem supremo que deveria ser conhecido, mas sim uma série de situações de vida em que as pessoas praticavam o que poderia ser considerado o bem ou a virtude, utilizando-se, para isso, do meio-termo (ou  justa medida).
Segundo Aristóteles, há três tipos de vida: a vida dos  prazeres, que encontra o bem e a felicidade na satisfação imediata dos desejos;  a vida  política, que é exercida pelo cidadão livre e se satisfaz com a honra; a vida  contemplativa, fundada na reflexão e na investigação filosófica.   Nesse caso, o meio-termo resultaria do reconhecimento de que as três formas de vida visam à felicidade e devem se integrar.
A lei moral kantiana No livro  Crítica da razão prática, Kant afirmou que  a existência de deus, da liberdade e da alma não pode ser comprovada, uma vez que essas coisas não se submetem à causalidade, ou seja, não ocorrem no espaço e no tempo (veja a aula 9). Ora, a moral cristã fundava- se justamente nesses elementos: admitindo-se a existência de deus e de uma alma imortal, mais cedo ou mais tarde teríamos que prestar contas de nossos atos. Nesse sentido, surgiam restrições à liberdade de se fazer o que se queria.
Kant propôs um novo princípio ético fundamental: “age de tal forma que a norma de tua conduta possa ser tomada como lei universal”. Trata- -se do conhecido  imperativo categórico kantiano,  que submete toda ação a uma regra moral nascida de um exame feito pelo sujeito. A moral kantiana está fundada no princípio do  dever: existe um dever  universal que se identifica com o aperfeiçoamento moral do homem. Não há perfeição moral maior do que cumprir o dever, sob a forma do imperativo categórico.
Em Kant, a moralidade não depende nem da vontade de deus nem da submissão a um objetivo maior (como o bem-estar ou até mesmo a sobrevivência de uma comunidade). A lei moral é também  a priori, ou seja, não depende de fatores externos  a ela. Nossa  vontade gera nossos atos, e esses  seguem suas próprias leis, baseando-se nos princípios da  razão prática, que todos nós possuímos.  Agir moralmente significa reconhecer que todo homem é um fim em si mesmo, e não um meio que se usa para se atingir determinada finalidade. Desenvolvendo o imperativo categórico, Kant escreveu em  Fundamentação da metafísica dos costumes: Age de tal maneira que trates a humanidade, em tua própria pessoa e na pessoa de cada outro ser humano, jamais meramente como um meio, porém sempre ao mesmo tempo como um fim .
Os fins que cada ser humano deve buscar são: a perfeição própria e a felicidade dos outros. Tais metas surgem como um dever que nos devemos impor. A perfeição própria é atingida com o desenvolvimento pleno das capacidades intelectuais, morais e físicas. A felicidade dos outros depende da aceitação daquilo que cada indivíduo entende como um direito seu (desde que também reconhecido como um direito meu). A partir daí, Kant fundamenta sua  doutrina do Direito: jamais podemos  interferir na liberdade alheia.
Kant entendia a lei interna como uma lei universal. Ao mesmo tempo em que a lei interna se funda no dever e tem um fundamento ético, deve existir uma lei externa que lida com a forma como um indivíduo exerce ou sofre influência do outro.  A lei interna caracteriza o  direito natural, baseado  em princípios racionais  a priori. A lei externa  assume a forma do  direito positivo, que inclui a  possibilidade de restrição à liberdade de cada indivíduo para que se respeite a liberdade de todos.
Falando sobre a lei moral enquanto uma lei interna, presente em todos nós, disse Kant em uma de suas mais famosas citações:  Duas coisas me enchem a alma de admiração e respeito crescentes, quanto mais frequentemente delas se ocupa meu pensamento: o céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim.

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  • 1.  
  • 2. Juízo de valor e norma
  • 3. Juízo de valor e norma A decisão sobre dizer ou não a verdade está estreitamente ligada aos sistemas de valores de uma sociedade. Há coisas que valorizamos, consideramos boas e procuramos fazer. Por outro lado, sentimo-nos mal quando não conseguimos evitar ações que julgamos más ou reprováveis. Em outras palavras, somos capazes de estabelecer juízos de valor, diferenciando o bem e o mal, e de agir conforme essa diferenciação. Esses juízos nos permitem estabelecer princípios morais que procuramos seguir e que convém serem seguidos por todos.
  • 4.  
  • 5. Mas por que escolhemos fazer o bem? A resposta é simples: escolhemos fazer o bem, seguindo princípios morais, porque, caso contrário, seria quase impossível o convívio social. Imagine se cada um pudesse estabelecer suas próprias normas. Certamente predominaria a insegurança, principalmente se as pessoas tivessem como princípio a mentira, o egoísmo ou o uso da violência física ou psíquica.
  • 6. Assim, pode-se dizer que os valores têm caráter social (ou histórico): na maior parte das vezes, vêm do passado, são herdados, e nos aparecem sob a forma de normas que devem ser respeitadas em benefício de todos, sejam elas uma lei, um regulamento escrito ou um princípio de conduta. Por outro lado, como já sabia Sócrates, o homem tem autonomia, é capaz não só de criar seus próprios valores como de questionar os valores herdados. Trata-se de uma tarefa perigosa: toda vez que nossa consciência ética confronta valores estabelecidos, corremos um risco. Aliás, no caso de Sócrates, o desfecho foi trágico.
  • 7. Norma e práxis Certamente, dizer até quando uma norma deve ser respeitada e quando ela deve ser mudada é uma tarefa difícil, ainda mais levando-se em consideração as transformações que ocorrem, com o tempo, em todas as sociedades. Mas, além dessa, deve-se considerar outra dificuldade em relação às normas: em nossa vida prática, estamos o tempo todo escolhendo entre alternativas possíveis e nem sempre nosso sistema de valores dá conta de todas as situações que se apresentam a nós, ou seja, nem sempre essa escolha é pacífica.
  • 8. Pense, por exemplo, no preceito bíblico “não matarás”. Não precisamos ser religiosos para concordar com esse princípio, aparentemente inquestionável. Porém, ele é realmente aplicável a todas as situações?
  • 9. Imagine, por exemplo, que você esteja ao volante de um carro desgovernado que se dirige rumo a um grupo de cinco pessoas. Numa fração de segundos, você percebe que talvez até possa mover o volante em outra direção, atingindo apenas uma pessoa. O que você faria? A morte de um é preferível à morte de cinco?
  • 10. Imagine agora outra situação: num hospital cinco pacientes em estado grave esperam por um transplante de órgão (cada paciente necessita de um órgão diferente). Na sala de espera desse hospital, há um indivíduo saudável. Suponhamos que os órgãos desse indivíduo fossem compatíveis com todos os cinco pacientes e poderiam, portanto, salvar cinco vidas. O que fazer? Matar o indivíduo saudável, para salvar os cinco doentes, parece-nos uma opção inviável. Então, nesse caso, a morte de cinco é preferível à morte de um?
  • 11. Outro exemplo de que a discussão sobre esse princípio não está fechada é a polêmica gerada pelas pesquisas com células-tronco, vistas pela ciência como uma alternativa bastante eficaz para o tratamento de quantidade significativa de doenças graves e até então de tratamento difícil, como alguns tipos de câncer e paralisia. Essas pesquisas colocam-nos diante de um dilema ético, afinal as células-tronco mais eficazes são extraídas de embriões humanos, que são destruídos no processo. Segundo alguns setores da sociedade – principalmente a Igreja –, a destruição de um embrião humano significa a destruição de uma vida. Trata-se, portanto, da violação de um princípio moral. Para esses setores, portanto, essas pesquisas não deveriam ser realizadas, apesar de prometerem melhorar a qualidade devida de muitas pessoas, ou até mesmo salvá-las.
  • 12. Os princípios morais estão ligados às nossas escolhas: somos dotados da capacidade de decidir o que fazer e de utilizar nossa consciência moral para isso. Ao escolher, exercemos nossa capacidade de ser livres. Mas, como acabamos de ver, a decisão sobre que caminho seguir nem sempre é tão simples, ainda mais numa época em que as transformações ocorrem com muita velocidade, exigindo que se faça constantemente uma revisão de valores. É justamente nesse ponto que os estudos sobre Ética são de grande interesse para nossa sociedade.
  • 13. Moral e Ética Moral (do latim moralis, de mor-, mos: costume) é o conjunto de valores – que variam de cultura para cultura e mudam com o tempo – em que se baseiam os princípios e as normas que garantem o convívio entre as pessoas e, portanto, a sobrevivência do grupo.
  • 14. Moral e Ética Ética (do grego ethiké, ethikos: que se refere aos costumes) é o ramo da Filosofia que aborda os problemas fundamentais da moral (significado do bem e do mal, da justiça e do dever, bem como o sentido e a finalidade da vida). Trata das regras de conduta permanentes e de validade universal, buscando definir seus princípios.
  • 15. As duas palavras têm o mesmo sentido original (ligado aos costumes) tanto no grego quanto no latim, mas a moral tem um sentido mais prático (relacionado ao estabelecimento de princípios ou normas), enquanto a Ética tem um sentido mais teórico. Na linguagem cotidiana, porém, os termos costumam ser utilizados como sinônimos.
  • 16. Ética em Aristóteles Aristóteles abordou a questão da Ética a partir do princípio segundo o qual todas as coisas (tanto os objetos como as pessoas) têm uma finalidade. Em sua obra Ética a Nicômaco, ele afirma: “Toda arte e todo método, assim como toda ação e escolha, parece tender para um certo bem; por isso se tem dito, com acerto, que o bem é aquilo para que todas as coisas tendem.” Ao escrever “toda arte e todo método”, Aristóteles refere-se a toda atividade e todo conhecimento humano. Assim, a metalurgia e a agricultura, por exemplo, têm como finalidade o bem do homem. Essa concepção, segundo a qual todas as coisas têm uma finalidade, é chamada de teleológica.
  • 17. No ser humano, essa finalidade é a felicidade, alcançada pela prática da virtude. Aristóteles entende a virtude como fruto de um equilíbrio entre o excesso e a falta, obtido a partir de escolhas concretas, que resultam em atos reais. Entre a covardia e a audácia, encontra-se a coragem; entre a arrogância e a humilhação, a dignidade. Portanto, não existia um Bem supremo que deveria ser conhecido, mas sim uma série de situações de vida em que as pessoas praticavam o que poderia ser considerado o bem ou a virtude, utilizando-se, para isso, do meio-termo (ou justa medida).
  • 18. Segundo Aristóteles, há três tipos de vida: a vida dos prazeres, que encontra o bem e a felicidade na satisfação imediata dos desejos; a vida política, que é exercida pelo cidadão livre e se satisfaz com a honra; a vida contemplativa, fundada na reflexão e na investigação filosófica. Nesse caso, o meio-termo resultaria do reconhecimento de que as três formas de vida visam à felicidade e devem se integrar.
  • 19. A lei moral kantiana No livro Crítica da razão prática, Kant afirmou que a existência de deus, da liberdade e da alma não pode ser comprovada, uma vez que essas coisas não se submetem à causalidade, ou seja, não ocorrem no espaço e no tempo (veja a aula 9). Ora, a moral cristã fundava- se justamente nesses elementos: admitindo-se a existência de deus e de uma alma imortal, mais cedo ou mais tarde teríamos que prestar contas de nossos atos. Nesse sentido, surgiam restrições à liberdade de se fazer o que se queria.
  • 20. Kant propôs um novo princípio ético fundamental: “age de tal forma que a norma de tua conduta possa ser tomada como lei universal”. Trata- -se do conhecido imperativo categórico kantiano, que submete toda ação a uma regra moral nascida de um exame feito pelo sujeito. A moral kantiana está fundada no princípio do dever: existe um dever universal que se identifica com o aperfeiçoamento moral do homem. Não há perfeição moral maior do que cumprir o dever, sob a forma do imperativo categórico.
  • 21. Em Kant, a moralidade não depende nem da vontade de deus nem da submissão a um objetivo maior (como o bem-estar ou até mesmo a sobrevivência de uma comunidade). A lei moral é também a priori, ou seja, não depende de fatores externos a ela. Nossa vontade gera nossos atos, e esses seguem suas próprias leis, baseando-se nos princípios da razão prática, que todos nós possuímos. Agir moralmente significa reconhecer que todo homem é um fim em si mesmo, e não um meio que se usa para se atingir determinada finalidade. Desenvolvendo o imperativo categórico, Kant escreveu em Fundamentação da metafísica dos costumes: Age de tal maneira que trates a humanidade, em tua própria pessoa e na pessoa de cada outro ser humano, jamais meramente como um meio, porém sempre ao mesmo tempo como um fim .
  • 22. Os fins que cada ser humano deve buscar são: a perfeição própria e a felicidade dos outros. Tais metas surgem como um dever que nos devemos impor. A perfeição própria é atingida com o desenvolvimento pleno das capacidades intelectuais, morais e físicas. A felicidade dos outros depende da aceitação daquilo que cada indivíduo entende como um direito seu (desde que também reconhecido como um direito meu). A partir daí, Kant fundamenta sua doutrina do Direito: jamais podemos interferir na liberdade alheia.
  • 23. Kant entendia a lei interna como uma lei universal. Ao mesmo tempo em que a lei interna se funda no dever e tem um fundamento ético, deve existir uma lei externa que lida com a forma como um indivíduo exerce ou sofre influência do outro. A lei interna caracteriza o direito natural, baseado em princípios racionais a priori. A lei externa assume a forma do direito positivo, que inclui a possibilidade de restrição à liberdade de cada indivíduo para que se respeite a liberdade de todos.
  • 24. Falando sobre a lei moral enquanto uma lei interna, presente em todos nós, disse Kant em uma de suas mais famosas citações: Duas coisas me enchem a alma de admiração e respeito crescentes, quanto mais frequentemente delas se ocupa meu pensamento: o céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim.