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Prenhas – uma mãe (im)pertinente: comunicação popular, identidade e
                      territorialidade do povo negro

           Fabiano Estanislau (Especialização Comunicação Popular e Comunitária/UEL)
                                                        fabiano_marcal@hotmail.com

       O estudo, empreendido na Especialização em Comunicação Popular e Comunitária
da Universidade Estadual de Londrina, buscou entender como se desenvolve a relação
entre a Comunicação Social e questões sobre a cultura negra. Utilizou-se como análise o
projeto “PRENHAS: uma investigação cênica sobre mães solteiras negras”, realizado em
2005, no município de Londrina, Paraná. O “Prenhas” é autobiográfico, concebido e
desenvolvido pela pesquisadora e atriz Rosa das Dores, visando intervir nas discussões
sobre a relação da auto-estima da mulher negra, o matrimônio e o abandono de seus
filhos e família, o qual circulava com a exposição Território Prenhas e a montagem cênica,
ambas com a realização de debates em escolas públicas, unidades básicas de saúde,
centros comunitários e culturais da periferia e uma apresentação na Penitenciária
Estadual de Londrina. A metodologia dos Estudos Culturais balizou o trabalho, auxiliando
na conceituação da Comunicação Popular em um viés cultural, e proporcionou uma
participação crítica no projeto, atuando na coordenação de produção e comunicação,
realizando uma análise sobre identidade, alteridade, representação do povo negro na
mídia, sua territorialidade e formas de ocupar espaços simbólicos e concretos na
sociedade, buscando uma inter-relação entre a Psicologia Social, Geografia Humana e
Comunicação Popular. Não conseguiremos entender a dominação do bloco hegemônico
utilizando a metodologia positivista e estruturalista. Temos que conectar as áreas de
conhecimento, compreendendo que as identidades são constituídas a partir de um
território em que você domina ou é dominado. Londrina foi “construída” pelos
colonizadores ingleses, onde predomina a ideologia eurocêntrica, branca. Por isso, as
pessoas negras e o Movimento Negro encontram dificuldades em construir espaços de
lutas efetivas, pois, historicamente, suas reivindicações e ações solúveis são atreladas a
interesses “politiqueiros” ou “enxugados” pelo mito da igualdade racial e do convívio
cordial entre as etnias.
       Essa discussão é necessária para a compreensão do objetivo deste trabalho, e
principalmente, analisar o objeto de estudo, o projeto “Prenhas”, em suas práticas de
Comunicação Popular. Além disso, faz-se importante tal análise para conceituarmos tais
práticas na área da comunicação, pois cada vez vemos termos sendo utilizados para citar
ações e concepções em sua esfera social, como comunicação alternativa, popular,
comunitária, clandestina, marginal. Nasce ai o risco de cairmos no discurso neoliberal e
colocar todas as práticas sociais da comunicação em um mesmo quadro analítico –
reduzindo seu potencial transformador e escamoteando seu sentido. A Comunicação
Popular foi analisada em uma perspectiva cultural, conceituando o termo popular à luta
cultural, por espaços concretos e simbólicos contra-hegemônicos.
       Apontou-se alguns aspectos relacionados à Comunicação Popular, desenvolvido no
projeto “Prenhas”, como trabalhar em uma lógica de quebrar a cultura do silenciamento,
apontada por Paulo Freire, além de efetivar estratégias de comunicação para intervir nas
representações sociais em relação ao povo negro, como a construção de uma imagem
positiva da pessoa negra na televisão. A figura da escrava Anastácia foi utilizada no
projeto como símbolo do silenciamento do povo negro. Quando ela começa a falar na
montagem cênica, entende-se que eles conseguiram se “libertar” da máscara e podem
dizer tudo o que pensam, ressignificando suas relações.
“Prenhas – uma mãe (im)pertinente: comunicação popular, identidade e
                      territorialidade do povo negro”

                                                             Fabiano Marçal Estanislau1

                           GT6: Estado, meios de comunicação e movimentos sociais




Resumo:
Buscou-se entender como se desenvolve a relação Comunicação Social e cultura do povo
negro, utilizando-se como análise o projeto “PRENHAS”, desenvolvido em 2005, no
município de Londrina, Paraná. O projeto é autobiográfico, concebido pela atriz e
pesquisadora Rosa das Dores, para intervir nas discussões sobre a relação da auto-estima
da mulher negra, o matrimônio e o abandono de seus filhos e de sua família. A metodologia
dos Estudos Culturais balizou o trabalho, auxiliando na conceituação da Comunicação
Popular em um viés cultural, bem como proporcionar uma análise sobre identidade,
alteridade, a representação do povo negro na grande mídia.




Comunicação Popular e Comunicação Comunitária na perspectiva cultural




       Como     toda   área,   a   Comunicação      Social    deve   ser   compreendida
analiticamente e conjunturalmente à Cultura, Política, Educação. Por isso, faz-se
necessário pensarmos sobre algumas de suas considerações, como o entendimento
dos termos Comunicação Popular e Comunicação Comunitária, desmistificando seus
objetivos, ações, intervenções e, principalmente, seu papel na sociedade.
       Para atender tal diferenciação, buscaremos compreender os termos povo e
comunidade, respectivamente ligados à Comunicação Popular e Comunicação
Comunitária. Tais termos são analisados por vários autores, mas, com uma linha
muito tênue que não tem localidade espacial, misturando-se muitas vezes. Opto, por
utilizar uma perspectiva cultural em minha análise, já que todo meu trabalho é
balizado pelos Estudos Culturais. Faço isso, por considerar que tanto o povo quanto
a comunidade fazem parte de um processo cultural, sendo termos complexos,
influenciados e influenciando relações sociais.

1
  Pós-graduando na Especialização em Comunicação Popular e Comunitária da Universidade
Estadual de Londrina; coordenador de Comunicação Sócio-Ambiental do Grupo de Ação Ecológica
Novos Curupiras – Belém/Soure-Pará. E-mail: fabiano_marcal@hotmail.com;
Explicito, primeiramente, o entendimento pelo termo comunidade. O conceito
de comunidade está ligado ao coletivo de pessoas que se sentem pertencentes a
um grupo específico da sociedade, com características locais/espaciais restritas e
muito particulares2. Buscam interpelar nesse espaço particular, como a melhoria do
saneamento básico do bairro da periferia ou a modificação do sentido de trânsito em
frente à escola particular na região central do município. Pode-se indicar que
comunidade está situada, ou melhor, constitui-se tanto nos bairros da periferia,
quanto em lugares nobres das cidades. As pessoas que se sentem pertencentes à
determinada comunidade buscam suprir necessidades “particulares” do grupo e não
questões “universais” como nas lutas populares. Porém, ressalta-se que tal análise é
realizada nesse trabalho, pois podemos encontrar outras que não distinguem
comunidade e povo, comunidade e nação, elas se misturam.
       Em relação ao popular, os conceitos e distinções são ainda mais diversos e
conflituosos. Se considerarmos o contexto do consumismo e, é claro, a indústria
cultural, buscaremos analisar ao que a massa compra, ouve, assiste e aceita como
produto feito para ela. Porém, esse significado está direcionado à manipulação e à
dicotomia da alta cultura e baixa cultura, sendo ainda abrangente, podendo
considerar que programas de televisão como “Domingão do Faustão” e “Domingo
Legal” são programas populares.
       Stuart Hall (2003) contribui indicando três definições de povo, dentro de uma
perspectiva para explicar a cultura popular. A primeira tem como característica
considerar que o povo consome produtos culturais capitalistas que lhe trazem uma
“falsa consciência”, são passíveis e manipuláveis, portanto, as pessoas não têm
autonomia. Para contrapor essa situação cultural, buscam ações “alternativas”,
dando-lhe um viés de uma cultura popular autêntica e pura, livre de manipulações do
sistema capitalista. Portanto, nota-se que essa definição subestima demasiadamente
as relações culturais e as pessoas, não dá conta de explicitar a dinâmica cultural e a
relações de forças e de poder nela implicadas. “O estudo da cultura popular fica se
deslocando entre esses dois pólos inaceitáveis: da ‘autonomia’ pura ou do total
encapsulamento” (HALL, 2003:254).
       Como segunda definição, Hall (2003) aborda que tudo o que o “povo” faz ou
fez é cultural popular, uma aproximação da antropologia, analisando ações e

2
 Não se inclui aqui a análise de comunidades virtuais, como é o caso do Orkut – espaço virtual que
engloba várias comunidades, relacionadas a interesses e assuntos diversos da sociedade.
pensamentos da vida do povo. Porém, ele aponta que o difícil é distinguir o que não
é cultura popular:


         Não podemos simplesmente juntar em uma única categoria todas as coisas que o
         “povo” faz, sem observar que a verdadeira distinção analítica não surge da lista –
         uma categoria inerte de coisas ou atividades – mas da oposição chave: pertence/não
         pertence ao povo. Em outras palavras, o princípio estruturador do “popular” neste
         sentido são as tensões e oposições entre aquilo que pertence ao domínio central da
         elite ou da cultura dominante, e à cultura da “periferia”. É essa oposição que
         constantemente estrutura o domínio da cultura na categoria do “popular” e do “não-
         popular”. Mas essas oposições não podem ser construídas de forma puramente
         descritiva, pois, de tempos em tempos, os conteúdos de cada categoria mudam
         (HALL, 2003: 256-257 – grifo do autor).

         Em sua terceira definição, considerada como mais analítica e a qual utilizarei
como referencial no trabalho, o termo popular tem uma relação intrínseca entre a
cultura e questões de hegemonia3. Está ligado a questões históricas de ações
provindas de classes específicas, considerando suas condições materiais e sociais.
Diretamente “insistindo que o essencial em uma definição de cultura popular são as
relações que colocam a ‘cultura popular’ em uma tensão contínua (de
relacionamento, influência e antagonismo) com a cultura dominante” (Hall, 2003, p.
257). Portanto, o popular está inserido na dialética cultural, resistindo, incorporando
e/ou incorporado, influenciando e/ou influenciado, transformado e/ou transformador,
contribuindo com o jogo das relações culturais. Pode-se notar, portanto, a relação
que o popular faz com o termo “classe”, porém, relacionando-se de forma complexa,
já que não podemos falar que existe uma cultura fixa e anti-histórica. Com seu
argumento nessa perspectiva, o autor revela que a cultura popular é um dos lugares
aonde se desenvolve a luta contra a cultura do bloco de poder, tem o objetivo
veemente de tirar o poder de decisão desse bloco (HALL, 2003).
         Como diz Marilena Chauí a cultura popular se caracteriza por:


         Um conjunto disperso de práticas, representações e formas de consciência que
         possuem lógica própria (o jogo interno do conformismo, do inconformismo e da
         resistência) distinguindo-se da cultura dominante exatamente por essa lógica de
         práticas, representações e formas de consciência (CHAUÍ,1982: 24).


         Partindo desse entendimento de “cultura popular” busco explicitar agora como
o termo pode fazer relações com a “comunicação popular”. Anteriormente, foi

3
    Termo Gramsciniano.
pontuado que o termo “popular” é histórico e por isso podemos perceber que
ocorreram transformações em suas práticas e até mesmo sua relação com o termo
“classe”. Laclau (1990 apud WOODWARD, 2000) conclui que estamos vivendo um
deslocamento do centro determinante de identidades, constituindo vários centros no
mundo atual. Um de seus principais argumentos é que o principal centro deslocado
foi a classe social, entendendo-a como nas análises marxistas, que determinada
todas as outras relações sociais. Esse deslocamento implica em mudanças
fundamentais na estrutura social, compreendendo que a emancipação social não
será conquistada apenas por uma classe social, mas sim que há atualmente
diversos “locais” e surgimento de novos sujeitos que vão expressar tal objetivo.
Exemplificando tais transformações podemos perceber “a relativa diminuição da
importância das afiliações baseadas na classe, tais como os sindicatos operários e o
surgimento de outras arenas de conflito social, tais como as baseadas no gênero, na
‘raça’, na etnia ou na sexualidade” (WOODWARD, 2000: 29).
      O popular reflete e projeta um conjunto de ações no palco da sociedade, onde
os diferentes segmentos comumente reconhecidos e autorizados fundam a história
da sociedade. A cultura popular é a construção de outras representações, institui um
imaginário, experiências cotidianas. "Uma influência recíproca entre a cultura das
classes subalternas e a cultura dominante" (Bakhtin apud Montenegro, 2001: 36).
Portanto, a comunicação popular acontece quando a comunicação é pensada e
utilizada para a concretização da luta - fundamental - de estabelecimentos de outras
realidades a serem alcançadas, de outras culturas serem ouvidas e não somente a
oficial e/ou dominante. Seguindo esse entendimento, diferencio a comunicação
popular como uma luta por questões culturais de um povo dominado - caracterizados
pela sua língua, práticas discursivas, complexidade de relações, conflitos internos e
externos com outras culturas.


A gravidez indesejada, para quem?




      De quem é a responsabilidade social, por uma pessoa que não teve pai, que
foi criada por sua mãe, ou muitas vezes por seus avós ou outra família que não a
biológica? Por que essas histórias de vida crescem à medida que a cor de homens e
mulheres ficam mais escuras? Como a sociedade representa a mulher negra? Por
que minha mãe e suas irmãs não casaram na igreja, de véu e grinalda? Como as
mulheres negras estão mantendo suas relações sociais e “vivendo” nessa
sociedade?
        Tais questionamentos serviram como incentivo “desagradável” para a
efetivação do projeto cultural “Prenhas – uma investigação cênica sobre mães
solteiras negras”. O projeto foi idealizado em 20044, pela pesquisadora e atriz
(graduada na Universidade Estadual de Londrina) Rosa Lucimara das Dores, dando
continuidade à sua pesquisa sobre a inserção da pessoa negra no teatro brasileiro.
Provinda do município de Diadema, na Grande São Paulo, Rosa conviveu na
periferia e sempre se questionou sobre as perguntas citadas acima.
        O projeto foi aprovado, em 2005, no edital “Bolsa Vitae de Artes”, pela
Fundação Vitae que apóia projetos na área de Artes Cênicas. Prenhas é um projeto
autobiográfico - além de tratar aspectos vividos pela proponente (sua mãe é negra e
seu pai é branco), ela busca unir histórias recorrentes sobre o matrimônio da mulher
negra, maternidade, o abandono de seus companheiros e as representações sociais
sobre a pessoa negra. Rosa iniciou a pesquisa com a bolsa e começou a convidar
pessoas para fazer parte da organização do projeto. Ao todo passaram pelo mesmo
onze pessoas, pois um dos objetivos é transformar a pesquisa individual em coletiva
– o ComunidadeVoz5.
        Em seu rol de ações, o projeto foi pensado para desenvolver um processo
cênico6 (montagem cênica que se utiliza do recurso do vídeo-cena), que tem a
pretensão de ser apresentado em 12 pontos da periferia da cidade de Londrina até
abril de 2006. A apresentação é antecedida pelo “Território Prenhas” – em cada local
de apresentação, uma semana antes se escolhe alguns lugares como Unidades
Básicas de Saúde, Escolas Públicas e outras instituições para realizar uma
exposição de objetos retirados de cena e outros comprados no comércio referentes
à cultura negra. É mostrado um vídeo-apresentação do projeto, explicando seu
objetivo e o porquê de sua proposição e posteriormente ocorre um debate sobre a
temática. Ressalto que eu fui convidado a participar do projeto em meados do mês
de julho de 2005, assumindo a coordenação de produção e de comunicação.

4
  Rosa das Dores argumenta que tais questionamentos surgiram desde sua infância.
5
  Projeto que tem por objetivo criar uma pesquisa coletiva com pessoas negras, inserindo-as no teatro
brasileiro.
6
   Rosa das Dores prefere utilizar o termo processo cênico, pois argumenta que além de ser
constituída por uma pesquisa, a montagem cênica é construída e reconstruída a cada apresentação,
utilizando-se de observações dos questionamentos do público.
Desde o início o projeto causou impacto perante as pessoas que tinham
contato com ele, principalmente pelo nome “Prenhas”. As pessoas remetem o nome
às fêmeas de animais mamíferos não-racionais como a vaca, a porca, a gata, por
isso, o “choque” das pessoas. O nome foi escolhido por um fato ocorrido no qual
Rosa das Dores teve conhecimento por uma amiga que morava com ela, no ano de
2003. Havia um amigo dela que se queixou em trocar o local de sua residência
médica, saindo do Pronto Socorro para a Maternidade do H.U., dizendo que não
suportava em ter que atender mulheres pobres, da periferia, usando frases como “lá
vem aquela negra fedida, aquela prenha”.
       O mais interessante é que um tempo depois, em abril de 2005, houve uma
denúncia de funcionários do Hospital Universitário de Londrina, indicando que
alguns médicos residentes mantinham uma comunidade virtual no Orkut7, a qual
continha frases discriminatórias e racistas, referentes aos funcionários do hospital e
dos pacientes. O fato teve repercussão nos meios de comunicação local, porém o
processo está em andamento, pois não existe uma lei específica no Brasil sobre os
chamados “crimes virtuais”.
       Para divulgar o projeto, elaboramos um plano de comunicação, com cartazes,
flyers, convites virtuais, e-mails e comunicados à imprensa. Para fazer a arte do
material gráfico, a Rosa convidou um de nossos amigos que realiza esse tipo de
trabalho na área cultural da cidade. Porém, ao explicar sobre o projeto, o mesmo
ficou muito preocupado sobre o nome “Prenhas”, pois poderia ser associado ao fato
do Orkut, solicitando que mudasse o seu nome. Realizamos uma reunião, Rosa e
eu, decidindo pela continuidade do nome, utilizando o mesmo para provocar as
pessoas, além de nós mesmo construirmos a arte do projeto.
       Quando ocorria o “Território Prenhas” era recorrente a fala de algumas
pessoas: “Por que vocês focam somente sobre a gravidez das mulheres negras? E
as brancas? O projeto poderia ser ampliado para todas as mulheres”. Esse fato
confirma o que Tatum, psicóloga norte-americana aponta: “[...] os brancos negam
inicialmente qualquer preconceito pessoal, tendendo a posteriormente reconhecer o
impacto do racismo sobre a vida dos negros, mas evitando reconhecer o impacto
sobre as suas próprias vidas” (BENTO, 2003:42-43).
       O que se percebe nessas falas é a negação de uma diferença entre as

7
 O orkut é uma comunidade virtual afiliada ao Google, criada em 22 de Janeiro de 2004 com o
objetivo de ajudar seus membros a criar novas amizades e manter relacionamentos.
mulheres negras e as mulheres brancas. Como salienta Cristina da Silva Souza
Coelho o processo histórico impôs experiências diferentes na vida dessas mulheres.
As mulheres negras na ordem patriarcal sofreram uma situação de exploração
sexual, eram muito mais simbolizadas como “objeto sexual” do que as mulheres
brancas (as sinhazinhas). Essa representação pode ser muito bem auferida hoje,
principalmente quando analisamos as estruturas do universo do trabalho. Foram
divulgadas na publicação Brasil, Gênero e Raça, as diferenças no rendimento
salarial médio dos negros e dos brancos, apontando que entre os homens o branco
ganha em média 6,3 salários mínimos, enquanto o negro 2,9; comparando com a
média dos homens, as mulheres são demasiadamente discriminadas, elevando a
desigualdade quando entra em cena a questão cor: entre as mulheres brancas 3,6
salários mínimos (nota-se que maior que o homem negro), as mulheres negras
menos da metade das brancas – 1,7 salários mínimos (Almeida, 2004).
      Outro ponto muito relevante é o estudo de Alaerte Leandro Martins (2001)
sobre cor e mortalidade materna, entre 1993 e 1998. Detectou-se que o risco relativo
de morte das mulheres negras por motivos relacionados à maternidade foi 7,4 vezes
maior que da cor branca no estado do Paraná, demonstrando que no serviço público
de saúde também há preconceito racial, pois muitas mulheres negras não recebem o
mesmo tratamento que as mulheres de outras cores.
      Interpretando esses dados, verificamos o quanto é essencial a questão de
gênero e etnia na sociedade contemporânea. Digo isso, não me esquecendo que é
um conjunto de ações históricas, mas reforçando que a ideologia do bloco do poder
busca ocultar tal desigualdade. Por esse motivo:


      Alguns membros dos “novos movimentos sociais” têm reivindicado o direito de
      construir e assumir a responsabilidade de suas próprias identidades. Por exemplo,
      as mulheres negras têm lutado pelo reconhecimento de sua própria pauta de luta no
      interior do movimento feminista, resistindo, assim, aos pressupostos de um
      movimento de mulheres baseado na categoria unificada de “mulher” que,
      implicitamente, inclui apenas as mulheres brancas (AZIZ apud WOODWARD, 2000:
      35).

      Uma das explicações sobre esse escamoteamento da desigualdade racial no
Brasil é a ideologia do branqueamento. A partir do momento em que a questão racial
foi incorporada pela biologia (teoria evolucionista) e até mesmo considerada
patologia médica, aos negros e índios foram dedicadas as piores características
sociais e culturais de nossa sociedade. Depois que acabou a escravidão, houve a
“passagem do racismo de dominação para o de exclusão” (Sodré, 1999, p. 87).
Quanto menos traços europeus tiver a pessoa, mais “condenada” às mazelas e
“migalhas” da sociedade ela estará condicionada, por isso, embranquecer vem
acompanhado do pensamento de ascensão e aceitação social. É o que ressalta
Ianni, quando diz que conseguir descendentes com aspectos fenotípicos mais
brancos já é motivo de orgulho para as pessoas negras (apud BENTO, 2003).


      A mestiçagem, produzida como ideologia dessa forma nos espaços coloniais latino-
      americanos, é a reinterpretação de um ethos de transigência e nomadismo,
      transmitido por traços manifestos e latentes na dinâmica intergeracional dos sujeitos
      do patrimônio. Mas o ethos não é puramente cultural nem exclusivamente simbólico:
      ele sempre serviu, no interior de práticas políticas deliberadas, como “filtro seletivo”
      para controlar o acesso de segmentos econômica e politicamente subalternos à
      estrutura de poder. Serviu também para polir as arestas das relações raciais e
      impedir reações radicais (SODRÉ, 1999:124).


      No artigo “De café e de leite...” Rosa Maria Rodrigues dos Santos (2003) nos
remete a uma experiência profissional vivida por ela, quando se deparou com uma
menina de nove anos com ascendência negra, que se afirmava ser loira. Sua mãe
era negra e seu pai loiro, este abandonou sua mãe na gravidez que também não
contava com a ajuda da família. A menina somente teve contato do pai por algum
tempo depois que ele retornou após a gravidez para morar com sua mãe. Depois de
várias situações complicadas na relação matrimonial ele as abandonou e foi morar
com uma mulher loira, como ele. Esse quadro caracterizou um desenvolvimento
psicológico diferenciado na menina, entre a fronteira da neurose e a psicose, ela
negava sua negritude. Mas por qual razão? Santos depois de conviver e participar
do tratamento da menina, conclui que ela era o “espelho” da mãe, que se sentia
rejeitada pelo homem branco por ser negra. A menina queria ser aceita,
principalmente pela mãe, pois para ela a mãe considerava os traços europeus
decisivos nos relacionamentos sociais e familiares.
      Um fato importante que aconteceu foi o relato de uma professora de História,
em uma das ações do projeto em Assis, interior de São Paulo. Ela nos contou que
seu filho, estudante do ensino fundamental de uma escola particular daquele
município, iria participar de uma peça teatral elaborado pela escola. Havia no roteiro
uma personagem negra, porém não existia na escola nenhum aluno negro ou aluna
negra. A alternativa foi escolher um aluno branco que faria o papel, mas aí entrou o
segundo dilema: quem aceita desenvolver a personagem? A professora, que
também leciona nessa instituição de ensino, conversou com seu filho e deu-lhe a
idéia de fazer a personagem. Porém, ele resistiu à proposta e argumentou: “O que
vão pensar de mim? Não vou fazer uma pessoa negra, elas só sofrem”.




A pessoa negra na televisão: por uma outra representação




       Um dos principais objetivos do projeto Prenhas é construir uma nova
representação social em relação à imagem da pessoa negra, aonde mulheres e
homens negros possam valorizar e fortalecer sua auto-estima, e proporcionar uma
visão positiva da sociedade em relação às pessoas negras. Busca inverter na lógica
da sociedade da informação com a chamada globalização. Como reforça Milton
Santos (2003) ao contrário dessa nova lógica do sistema contemporâneo possibilitar
novos conhecimentos, valorização e reconhecimento dos diversos lugares e
diferentes culturas, ele imprime sua marca com um papel despótico midiático. O
bloco de poder, que é uma minoria de atores sociais, utiliza as técnicas da
comunicação e da informação em benefício próprio, os quais determinam o
conteúdo, a transmissão, bem como o grupo da massa que deve receber tal
informação. As decisões e a participação nos meios de comunicação acabam cada
vez mais restritos e a maioria considerável da população somente “participa” na
recepção, sendo marginalizadas no processo do controle comunicacional.
       Dentre suas ações, o projeto busca a utilização dos recursos de vídeo, como
o vídeo-apresentação e o vídeo-cena8. Aquele é mostrado no espaço do “Território
Prenhas” juntamente com a exposição dos objetos relacionados à cultura negra,
onde seu conteúdo é explicar o porquê do projeto e introduzir a discussão da
discriminação racial, matrimônio e o abandono da mulher negra. O vídeo conta com
o relato de Rosa das Dores, coordenadora geral e atriz do projeto.
       O vídeo-cena foi o recurso utilizado por Rosa para que além de sua
performance no processo cênico, ela mostrasse a imagem de outras pessoas negras

8
 Vídeo-cena é uma concepção que utiliza o vídeo no espaço cênico. Um recurso que além de mudar
a estética tradicional do teatro, busca o auxílio e um novo olhar sobre a expressividade cênica.
e como o projeto é autobiográfico ela se utilizou dos relatos de sua mãe (Neuza das
Dores), sua irmã mais velha (Jussara das Dores) e seu avô (José das Dores). Suas
imagens são transmitidas por uma televisão que faz parte do cenário do processo
cênico buscando uma nova representação da imagem das pessoas negras. Bento
(2003) ressalta que no Brasil, vários estudos dão a ressalva que a representação da
imagem videográfica das pessoas negras são construídas em cima de aspectos
negativos e remetidos a recursos que fazem ligação com figuras demoníacas.
      Esse movimento de estigmatização e estereotipação das pessoas negras faz
com que elas próprias criem uma identidade individual e coletiva negativa da sua
imagem. Existe uma não declaração da desigualdade racial pelos meios de
comunicação, e além de camuflada, proporciona um sentimento de “vergonha” e
dificuldade das pessoas negras em se afirmar etnicamente, por isso, a busca pelo
embranquecimento dos seus relacionamentos e dos seus filhos (CARONE, 2003).
      Se analisarmos a construção da representação social pela televisão,
podemos perceber que nos programas de maior audiência como em noticiários e
novelas a imagem das pessoas negras tem características e estereótipos fixados e
espaços definidos. Nos telejornais, além de uma presença ínfima dos profissionais
de origem negra, os espaços destinados para o povo negro, são em sua maioria os
fatos policiais e degradação social.
      Várias pessoas, principalmente as que eram convidadas a participar da
organização do projeto, inclusive eu, quando assistiam à montagem cênica,
sugeriam à Rosa que ao invés da televisão utilizasse um telão, aumentando a
imagem, dando maior projeção. Rosa sempre argumenta que a utilização da
televisão é proposital, pois ela quer mostrar para as pessoas uma nova maneira de
ver as mulheres e os homens negros na televisão, ou seja, a questão é o meio a ser
utilizado para retratar o imaginário social e sua representação do povo negro.
      O Brasil não é um país racista e dá exemplo ao mundo todo. Essa é a
conclusão a que chega qualquer pessoa que tenha visto nos noticiários o caso do
jogador argentino Leandro Desábato, preso após ofender com palavras de cunho
racista o jogador são paulino Grafite. O jogo aconteceu no dia 14 de abril de 2005,
dentro da maior competição de futebol das Américas, a Copa Libertadores da
América. Ao vivo para o Brasil e para o mundo, o jogador argentino foi autuado e
preso. Ocorreu a partir desse fato os mais diversos discursos nacionalistas perante a
questão racial. Em entrevista aos programas esportivos, a fala de Nicolas Leoz,
presidente da Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol): "O futebol perde
muito com esse episódio. Nada pode justificar um ato de racismo. Que isso sirva de
exemplo para todo o mundo do futebol” foi utilizada para reforçar que no Brasil não
há racismo e a lei cumpre o seu papel.
      As telenovelas são o programa e o instrumento mais utilizado pela grande
mídia para criar padrões morais, estéticos, de moda e comportamento da sociedade
brasileira. Joel Zito Araújo (2000) mostrou que apesar de representar parcela
expressiva da população e da cultura brasileiras, os negros têm sido ignorados na
ficção ou vêm sendo retratados de modo negativo ou estereotipado. Ele argumenta
que a novela brasileira, produto de sucesso nacional e de exportação para os quatro
cantos do mundo, vende a imagem do negro como subalterno, submisso, pronto
para servir ao senhor branco. Mas o autor acredita que esta negação do Brasil não
retrata nada além do que é visto na elite nacional. O mito da democracia racial, o
idealismo branco e o desejo de europeização de toda população, mascarado por
personagens fictícios que invadem todas as noites os lares brasileiros é o espelho
do preconceito enraizado há mais de 500 anos e que até os dias atuais circunda e
permeia as relações inter-raciais.
      Sodré (1999) argumenta que nos jornais impressos do passado, as
referências identitárias do negro eram ideológicas, como José do Patrocínio. No
mundo contemporâneo o padrão é estético, doutrinário ou ético. A grande mídia
utiliza a imagem de modelos, jogadores de futebol e atores. Por isso criou-se uma
“obsessão” pelos padrões europeus como o cabelo. Em um dos relatos do vídeo-
cena, aparece a fala da irmã de Rosa, aonde ela conta seu casamento na igreja, e
foca o nascimento de seus dois filhos. Em um determinado momento ela conta que o
filho mais novo, enquanto ela o arrumava em frente a um espelho, questiona se
quando ele crescer poderá alisar o cabelo. Ela argumenta que não é preciso, pois
ele deve ter orgulho de seu cabelo e de sua “raça” negra.


      A que conclusões podemos chegar diante desse grande espelho da sociedade, que
      é a imprensa? Uma delas, a mais imediata, é a de que a questão racial é de
      natureza explosiva, mesmo quando as suas faíscas elétricas e as suas chamas
      súbitas são neutralizadas e contidas por um certo tempo, pois as suas causas
      continuam a existir onde sempre existiram: no preconceito e na discriminação. Mas,
      em definitivo, a repressão de um problema não é a sua supressão.
      Outra conclusão é a de que a questão racial é representada como um problema ou
      uma doença dos negros, o que é, evidentemente, falso e ideológico: onde estão os
      escravizadores de ontem e os dominadores de hoje? Nesse sentido, o ponto de vista
que prevalece na imprensa ainda hoje é o ponto de vista de quem goza de poderes
          na sociedade atual e culpabiliza a vítima da opressão (CARONE, NOGUEIRA, 2003:
          179).


          A utilização do vídeo no projeto busca inserir uma imagem diferente da
pessoa negra. Além da imagem, o conteúdo das falas é remetido para que o público
repense o mito da igualdade racial, represente a pessoa negra com outros
referenciais – positivos – e valorizem sua imagem. Tal prática vai de encontro ao que
Santos enfoca sobre as técnicas da comunicação e da informação: “[...] quando sua
utilização for democratizada, essas técnicas doces estarão ao serviço do homem”
(2003, p. 174).




Eu tenho raiva




          Na performance, Rosa utiliza a figura da Anastácia para demonstrar e
representar a questão sexual que é remetida à mulher negra, a escravidão do povo
negro e, principalmente, o silenciamento imposto às pessoas negras no Brasil.
Anastácia era filha de Delminda, princesa da tribo bantu, oriunda da família do rei
Galanga, que foi trazida ao Brasil e vendida como escrava. Foi estuprada por seu
feitor e engravidou gerando Anastácia, moça muito bonita, com características do
povo negro e olhos azuis, por parte do feitor. Começa a ser assediada por Joaquim
Antonio, recebendo até mesmo oferta em dinheiro pela sua virgindade, mas
resistindo foi violentada sexualmente por ele, machucando seu rosto. Como castigo,
foi submetida a usar uma máscara, podendo apenas retirá-la para se alimentar,
utilizando-o até morrer9.


          Que raiva. Eu sinto muita Raiva.
          Olha! É muita raiva que eu sinto!

          Eu sinto raiva dessas mães.
          Eu sinto raiva dessas mães.
          Eu sinto raiva dessas mães.
          Não! Elas não são mães.

9
    A História de Anastácia não tem confirmação de veracidade.
Essas mulheres que abandonam os filhos.
      Vão pro baile. Só pensam no prazer delas.
      Depois voltam chorando. Arrependidas.
      Eu tenho raiva.
      Muita raiva dessas mães que abortam os filhos com bucha, chá de canela, agulha de
      tricô, cinta para disfarçar a barriga, em clínicas clandestinas.
      Jogam em privadas, em rios.
      Eu tenho raiva dessas mães que têm filhos para ganhar dinheiro da Assistência
      Social.
      Eu tenho raiva dessa indústria da miséria, desse assistencialismo, que precisa de
      pobre.
      Pobre não pode morrer.
      Tem que nascer e viver sempre na miséria para ser atendido.
      Eu tenho raiva desses pais.
      Que não podem ser chamados de pais.
      Que colocam filho no mundo e não assumem.
      Eu tenho raiva de médico que faz a mulher pobre e negra esperar para ter o filho no
      hospital público e faz ameaça que não vai fazer o parto se ela não pagar.
      Eu tenho raiva desses professores que dizem que vão corrigir neguinho insolente.
      Que dizem que negro é sujo, burro, inferior.
      Eu tenho raiva desses homens brancos.
      Que olham pra gente como objeto de consumo.
      Usa e joga fora!
      Eu tenho raiva das pessoas que usam o projeto de ação afirmativa do negro para se
      promover.
      Eu tenho raiva de mulher que abandona os filhos por causa de homem.
      Eu tenho raiva de ver as prisões cheias de homens negros.
      Que poderiam estar com suas famílias, trabalhando, cuidando de seus filhos.
      Eu tenho raiva cada vez que eu vejo uma criança negra com uma mãe adotiva
      branca.
      Eu me pergunto: Onde está esta mãe negra? Vai ter outros filhos? Vai doá-los? E se
      não tivesse a mãe adotiva? E se não tivessem casas para abrigar estas crianças?
      Eu tenho raiva desses políticos.
      Que posam com crianças negras nos braços em ano eleitoral.
      Eu tenho raiva de empresas religiosas que usam a gente para ter verba,
      E depois a gente, negro, pobre, trabalha na faxina, trabalha no portão.
      Eu tenho raiva quando me vêem como uma ameaça.
      A gente não pode ter dinheiro, casa, boa profissão, não pode ter oportunidade, não
      pode ser igual.
      A raiva é o sentimento mais corrosivo. Ruim.
      Quando vem com o medo é destrutiva.
      Eu sinto ela aqui dentro.


      O texto acima é uma fala na última parte da montagem cênica do Projeto
Prenhas. Nesse momento a performer expõe a imagem da Anastácia em cima da
televisão e uma fala gravada em fita cassete é apresentada. Concebo que é o
momento chave da montagem, pois consegue resumir todos os anseios,
observações, vivências, experiências, questionamentos e lutas de Rosa das Dores,
quanto do povo negro e da sociedade. Há uma problematização de todas as
questões tratadas no projeto, comungando-os e interligando suas relações na
interferência com a humanidade, ficando evidentes quais as concepções e
direcionamentos políticos, culturais e sociais que permeiam o projeto.
       Não é a busca de apontar os culpados e nem tornar em vítimas as pessoas
negras. A fala procura apontar a lógica social em que vivemos, responsabilizando a
humanidade, independente de sua ação nas relações de poder, etnia e ação política.
Além disso, é importante pontuar que é a figura da Anastácia que fala e dissemina
todos os pensamentos, com a voz da performer. O que quero dizer é: uma pessoa
que faz parte do povo negro, aponta visões sobre suas relações sociais; diz que não
aceita o aborto e nem o abandono dos filhos pelas mulheres negras; o sistema
empreendido pelas Rodas de Misericórdia.
       Essa ação consegue quebrar com a lógica representativa da percepção social
étnica que Edith Piza (2003) salienta. Ela aponta que o negro é representado por
uma coletividade, portanto, se um negro tem pensamento e ações considerados
“imorais” e não condizentes à vida social, é representativo de todo o povo negro; já
um branco representa a si, sua individualidade. Ao expor todas as suas concepções
no projeto, a performer consegue intervir nessa lógica, mostrando que também entre
as pessoas negras há diferenças de pensamentos, ações, práticas “morais” e
“éticas”.
       Por conseguinte, essa parte da montagem expõe todas as “dores” e
“mazelas” que acompanham a vida da performer, podemos dizer que é seu
momento de “cura”, pois consegue comunicar essas “dores” aos expectadores,
questioná-los, instigá-los a refletir sobre todo o contexto apontado na montagem
vídeo-cênica.
       No fim do texto sobre a raiva, Rosa das Dores pontua que a “raiva é o
sentimento mais corrosivo”. Mas, não foi por meio desse sentimento que ela se
mobilizou a elaborar e realizar o projeto? Não foi por ele que ela procurou unir forças
a outras pessoas que demonstravam ter os mesmos pensamentos e objetivos que
ela? Não foi esse sentimento que a fez ter pensamentos e práticas de transformação
social, principalmente em relação à identidade e representação da pessoa negra?
       Como diz Paulo Freire (1989) os homens conseguem obter uma consciência
sobre a razão dos obstáculos quando suas práticas são barradas, mostrando
também que nenhuma relação humana com o mundo é neutra, “pura”,
conscientizando-se a si mesmo, depois as outras pessoas.
Bibliografia



ALMEIDA, I. J.de. (2004) Presença negra: a história da caminhada de um povo em
Londrina. Londrina.
ARAÚJO, J. Z. (2000) A negação do Brasil: o negro na telenovela brasileira. São
Paulo: Editora Senac.
BENTO, M. A. S. (2003) Branqueamento e branquitude no Brasil. In: CARONE, I;
BENTO, M.A.S. (Orgs.). Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e
branqueamento no Brasil. pp.25-57 2 ª ed. Petrópolis: Editora Vozes.
CARONE, I. (2003) Breve histórico de uma pesquisa psicossocial sobre a questão
racial brasileira. In: CARONE I; BENTO, M.A. S. (Orgs.). Psicologia social do
racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil pp.13-23. 2ª ed.
Petrópolis: Editora Vozes.
___; NOGUEIRA, I. B. (2003) Faíscas elétricas na imprensa brasileira: a questão
racial em foco. In: CARONE, I; BENTO, M. A. S. (Orgs.). Psicologia social do
racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil pp.163-180. 2ª ed.
Petrópolis: Editora Vozes.
CHAUÍ, M. (1982) Conformismo e resistência. São Paulo: Cortez.
HALL, S. (2003) Da diáspora: identidades e mediações culturais; Organização Liv
Sovik; Tradução Adelaine La Guardia Resende (et al). Belo Horizonte: Editora
UFMG; Brasília: Representação da UNESCO no Brasil.
MARTINS, A. L. (2006) Mortalidade Materna: maior risco para mulheres negras no
Brasil. Disponível em: http://www.redesaude.org.br/jornal/html/jr23-alaerte.html,
Acesso em 22 de março de 2006.
MONTENEGRO, A. T. (2001) História oral e memória: a cultura popular revisitada.
3ed. São Paulo: Contexto.
PIZA, E. (2003) Porta de vidro: entrada para a branquitude. In: CARONE, I.; BENTO,
M.A.S. (Orgs.). Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e
branqueamento no Brasil. pp.59-90 2ª ed. Petrópolis: Editora Vozes.
SANTOS, M. (2003) Por uma outra globalização: do pensamento único à
consciência universal. 10ª ed. Rio de Janeiro: Record.
SODRÉ, M. (1999) Claros e escuros: identidade, povo e mídia no Brasil. Petrópolis,
RJ: Vozes.
WOODWARD, K. (2005) Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual.
In: SILVA, T. T.da (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais.
p.7-72. 4ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes.

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  • 1. Prenhas – uma mãe (im)pertinente: comunicação popular, identidade e territorialidade do povo negro Fabiano Estanislau (Especialização Comunicação Popular e Comunitária/UEL) fabiano_marcal@hotmail.com O estudo, empreendido na Especialização em Comunicação Popular e Comunitária da Universidade Estadual de Londrina, buscou entender como se desenvolve a relação entre a Comunicação Social e questões sobre a cultura negra. Utilizou-se como análise o projeto “PRENHAS: uma investigação cênica sobre mães solteiras negras”, realizado em 2005, no município de Londrina, Paraná. O “Prenhas” é autobiográfico, concebido e desenvolvido pela pesquisadora e atriz Rosa das Dores, visando intervir nas discussões sobre a relação da auto-estima da mulher negra, o matrimônio e o abandono de seus filhos e família, o qual circulava com a exposição Território Prenhas e a montagem cênica, ambas com a realização de debates em escolas públicas, unidades básicas de saúde, centros comunitários e culturais da periferia e uma apresentação na Penitenciária Estadual de Londrina. A metodologia dos Estudos Culturais balizou o trabalho, auxiliando na conceituação da Comunicação Popular em um viés cultural, e proporcionou uma participação crítica no projeto, atuando na coordenação de produção e comunicação, realizando uma análise sobre identidade, alteridade, representação do povo negro na mídia, sua territorialidade e formas de ocupar espaços simbólicos e concretos na sociedade, buscando uma inter-relação entre a Psicologia Social, Geografia Humana e Comunicação Popular. Não conseguiremos entender a dominação do bloco hegemônico utilizando a metodologia positivista e estruturalista. Temos que conectar as áreas de conhecimento, compreendendo que as identidades são constituídas a partir de um território em que você domina ou é dominado. Londrina foi “construída” pelos colonizadores ingleses, onde predomina a ideologia eurocêntrica, branca. Por isso, as pessoas negras e o Movimento Negro encontram dificuldades em construir espaços de lutas efetivas, pois, historicamente, suas reivindicações e ações solúveis são atreladas a interesses “politiqueiros” ou “enxugados” pelo mito da igualdade racial e do convívio cordial entre as etnias. Essa discussão é necessária para a compreensão do objetivo deste trabalho, e principalmente, analisar o objeto de estudo, o projeto “Prenhas”, em suas práticas de Comunicação Popular. Além disso, faz-se importante tal análise para conceituarmos tais práticas na área da comunicação, pois cada vez vemos termos sendo utilizados para citar ações e concepções em sua esfera social, como comunicação alternativa, popular, comunitária, clandestina, marginal. Nasce ai o risco de cairmos no discurso neoliberal e colocar todas as práticas sociais da comunicação em um mesmo quadro analítico – reduzindo seu potencial transformador e escamoteando seu sentido. A Comunicação Popular foi analisada em uma perspectiva cultural, conceituando o termo popular à luta cultural, por espaços concretos e simbólicos contra-hegemônicos. Apontou-se alguns aspectos relacionados à Comunicação Popular, desenvolvido no projeto “Prenhas”, como trabalhar em uma lógica de quebrar a cultura do silenciamento, apontada por Paulo Freire, além de efetivar estratégias de comunicação para intervir nas representações sociais em relação ao povo negro, como a construção de uma imagem positiva da pessoa negra na televisão. A figura da escrava Anastácia foi utilizada no projeto como símbolo do silenciamento do povo negro. Quando ela começa a falar na montagem cênica, entende-se que eles conseguiram se “libertar” da máscara e podem dizer tudo o que pensam, ressignificando suas relações.
  • 2. “Prenhas – uma mãe (im)pertinente: comunicação popular, identidade e territorialidade do povo negro” Fabiano Marçal Estanislau1 GT6: Estado, meios de comunicação e movimentos sociais Resumo: Buscou-se entender como se desenvolve a relação Comunicação Social e cultura do povo negro, utilizando-se como análise o projeto “PRENHAS”, desenvolvido em 2005, no município de Londrina, Paraná. O projeto é autobiográfico, concebido pela atriz e pesquisadora Rosa das Dores, para intervir nas discussões sobre a relação da auto-estima da mulher negra, o matrimônio e o abandono de seus filhos e de sua família. A metodologia dos Estudos Culturais balizou o trabalho, auxiliando na conceituação da Comunicação Popular em um viés cultural, bem como proporcionar uma análise sobre identidade, alteridade, a representação do povo negro na grande mídia. Comunicação Popular e Comunicação Comunitária na perspectiva cultural Como toda área, a Comunicação Social deve ser compreendida analiticamente e conjunturalmente à Cultura, Política, Educação. Por isso, faz-se necessário pensarmos sobre algumas de suas considerações, como o entendimento dos termos Comunicação Popular e Comunicação Comunitária, desmistificando seus objetivos, ações, intervenções e, principalmente, seu papel na sociedade. Para atender tal diferenciação, buscaremos compreender os termos povo e comunidade, respectivamente ligados à Comunicação Popular e Comunicação Comunitária. Tais termos são analisados por vários autores, mas, com uma linha muito tênue que não tem localidade espacial, misturando-se muitas vezes. Opto, por utilizar uma perspectiva cultural em minha análise, já que todo meu trabalho é balizado pelos Estudos Culturais. Faço isso, por considerar que tanto o povo quanto a comunidade fazem parte de um processo cultural, sendo termos complexos, influenciados e influenciando relações sociais. 1 Pós-graduando na Especialização em Comunicação Popular e Comunitária da Universidade Estadual de Londrina; coordenador de Comunicação Sócio-Ambiental do Grupo de Ação Ecológica Novos Curupiras – Belém/Soure-Pará. E-mail: fabiano_marcal@hotmail.com;
  • 3. Explicito, primeiramente, o entendimento pelo termo comunidade. O conceito de comunidade está ligado ao coletivo de pessoas que se sentem pertencentes a um grupo específico da sociedade, com características locais/espaciais restritas e muito particulares2. Buscam interpelar nesse espaço particular, como a melhoria do saneamento básico do bairro da periferia ou a modificação do sentido de trânsito em frente à escola particular na região central do município. Pode-se indicar que comunidade está situada, ou melhor, constitui-se tanto nos bairros da periferia, quanto em lugares nobres das cidades. As pessoas que se sentem pertencentes à determinada comunidade buscam suprir necessidades “particulares” do grupo e não questões “universais” como nas lutas populares. Porém, ressalta-se que tal análise é realizada nesse trabalho, pois podemos encontrar outras que não distinguem comunidade e povo, comunidade e nação, elas se misturam. Em relação ao popular, os conceitos e distinções são ainda mais diversos e conflituosos. Se considerarmos o contexto do consumismo e, é claro, a indústria cultural, buscaremos analisar ao que a massa compra, ouve, assiste e aceita como produto feito para ela. Porém, esse significado está direcionado à manipulação e à dicotomia da alta cultura e baixa cultura, sendo ainda abrangente, podendo considerar que programas de televisão como “Domingão do Faustão” e “Domingo Legal” são programas populares. Stuart Hall (2003) contribui indicando três definições de povo, dentro de uma perspectiva para explicar a cultura popular. A primeira tem como característica considerar que o povo consome produtos culturais capitalistas que lhe trazem uma “falsa consciência”, são passíveis e manipuláveis, portanto, as pessoas não têm autonomia. Para contrapor essa situação cultural, buscam ações “alternativas”, dando-lhe um viés de uma cultura popular autêntica e pura, livre de manipulações do sistema capitalista. Portanto, nota-se que essa definição subestima demasiadamente as relações culturais e as pessoas, não dá conta de explicitar a dinâmica cultural e a relações de forças e de poder nela implicadas. “O estudo da cultura popular fica se deslocando entre esses dois pólos inaceitáveis: da ‘autonomia’ pura ou do total encapsulamento” (HALL, 2003:254). Como segunda definição, Hall (2003) aborda que tudo o que o “povo” faz ou fez é cultural popular, uma aproximação da antropologia, analisando ações e 2 Não se inclui aqui a análise de comunidades virtuais, como é o caso do Orkut – espaço virtual que engloba várias comunidades, relacionadas a interesses e assuntos diversos da sociedade.
  • 4. pensamentos da vida do povo. Porém, ele aponta que o difícil é distinguir o que não é cultura popular: Não podemos simplesmente juntar em uma única categoria todas as coisas que o “povo” faz, sem observar que a verdadeira distinção analítica não surge da lista – uma categoria inerte de coisas ou atividades – mas da oposição chave: pertence/não pertence ao povo. Em outras palavras, o princípio estruturador do “popular” neste sentido são as tensões e oposições entre aquilo que pertence ao domínio central da elite ou da cultura dominante, e à cultura da “periferia”. É essa oposição que constantemente estrutura o domínio da cultura na categoria do “popular” e do “não- popular”. Mas essas oposições não podem ser construídas de forma puramente descritiva, pois, de tempos em tempos, os conteúdos de cada categoria mudam (HALL, 2003: 256-257 – grifo do autor). Em sua terceira definição, considerada como mais analítica e a qual utilizarei como referencial no trabalho, o termo popular tem uma relação intrínseca entre a cultura e questões de hegemonia3. Está ligado a questões históricas de ações provindas de classes específicas, considerando suas condições materiais e sociais. Diretamente “insistindo que o essencial em uma definição de cultura popular são as relações que colocam a ‘cultura popular’ em uma tensão contínua (de relacionamento, influência e antagonismo) com a cultura dominante” (Hall, 2003, p. 257). Portanto, o popular está inserido na dialética cultural, resistindo, incorporando e/ou incorporado, influenciando e/ou influenciado, transformado e/ou transformador, contribuindo com o jogo das relações culturais. Pode-se notar, portanto, a relação que o popular faz com o termo “classe”, porém, relacionando-se de forma complexa, já que não podemos falar que existe uma cultura fixa e anti-histórica. Com seu argumento nessa perspectiva, o autor revela que a cultura popular é um dos lugares aonde se desenvolve a luta contra a cultura do bloco de poder, tem o objetivo veemente de tirar o poder de decisão desse bloco (HALL, 2003). Como diz Marilena Chauí a cultura popular se caracteriza por: Um conjunto disperso de práticas, representações e formas de consciência que possuem lógica própria (o jogo interno do conformismo, do inconformismo e da resistência) distinguindo-se da cultura dominante exatamente por essa lógica de práticas, representações e formas de consciência (CHAUÍ,1982: 24). Partindo desse entendimento de “cultura popular” busco explicitar agora como o termo pode fazer relações com a “comunicação popular”. Anteriormente, foi 3 Termo Gramsciniano.
  • 5. pontuado que o termo “popular” é histórico e por isso podemos perceber que ocorreram transformações em suas práticas e até mesmo sua relação com o termo “classe”. Laclau (1990 apud WOODWARD, 2000) conclui que estamos vivendo um deslocamento do centro determinante de identidades, constituindo vários centros no mundo atual. Um de seus principais argumentos é que o principal centro deslocado foi a classe social, entendendo-a como nas análises marxistas, que determinada todas as outras relações sociais. Esse deslocamento implica em mudanças fundamentais na estrutura social, compreendendo que a emancipação social não será conquistada apenas por uma classe social, mas sim que há atualmente diversos “locais” e surgimento de novos sujeitos que vão expressar tal objetivo. Exemplificando tais transformações podemos perceber “a relativa diminuição da importância das afiliações baseadas na classe, tais como os sindicatos operários e o surgimento de outras arenas de conflito social, tais como as baseadas no gênero, na ‘raça’, na etnia ou na sexualidade” (WOODWARD, 2000: 29). O popular reflete e projeta um conjunto de ações no palco da sociedade, onde os diferentes segmentos comumente reconhecidos e autorizados fundam a história da sociedade. A cultura popular é a construção de outras representações, institui um imaginário, experiências cotidianas. "Uma influência recíproca entre a cultura das classes subalternas e a cultura dominante" (Bakhtin apud Montenegro, 2001: 36). Portanto, a comunicação popular acontece quando a comunicação é pensada e utilizada para a concretização da luta - fundamental - de estabelecimentos de outras realidades a serem alcançadas, de outras culturas serem ouvidas e não somente a oficial e/ou dominante. Seguindo esse entendimento, diferencio a comunicação popular como uma luta por questões culturais de um povo dominado - caracterizados pela sua língua, práticas discursivas, complexidade de relações, conflitos internos e externos com outras culturas. A gravidez indesejada, para quem? De quem é a responsabilidade social, por uma pessoa que não teve pai, que foi criada por sua mãe, ou muitas vezes por seus avós ou outra família que não a biológica? Por que essas histórias de vida crescem à medida que a cor de homens e mulheres ficam mais escuras? Como a sociedade representa a mulher negra? Por
  • 6. que minha mãe e suas irmãs não casaram na igreja, de véu e grinalda? Como as mulheres negras estão mantendo suas relações sociais e “vivendo” nessa sociedade? Tais questionamentos serviram como incentivo “desagradável” para a efetivação do projeto cultural “Prenhas – uma investigação cênica sobre mães solteiras negras”. O projeto foi idealizado em 20044, pela pesquisadora e atriz (graduada na Universidade Estadual de Londrina) Rosa Lucimara das Dores, dando continuidade à sua pesquisa sobre a inserção da pessoa negra no teatro brasileiro. Provinda do município de Diadema, na Grande São Paulo, Rosa conviveu na periferia e sempre se questionou sobre as perguntas citadas acima. O projeto foi aprovado, em 2005, no edital “Bolsa Vitae de Artes”, pela Fundação Vitae que apóia projetos na área de Artes Cênicas. Prenhas é um projeto autobiográfico - além de tratar aspectos vividos pela proponente (sua mãe é negra e seu pai é branco), ela busca unir histórias recorrentes sobre o matrimônio da mulher negra, maternidade, o abandono de seus companheiros e as representações sociais sobre a pessoa negra. Rosa iniciou a pesquisa com a bolsa e começou a convidar pessoas para fazer parte da organização do projeto. Ao todo passaram pelo mesmo onze pessoas, pois um dos objetivos é transformar a pesquisa individual em coletiva – o ComunidadeVoz5. Em seu rol de ações, o projeto foi pensado para desenvolver um processo cênico6 (montagem cênica que se utiliza do recurso do vídeo-cena), que tem a pretensão de ser apresentado em 12 pontos da periferia da cidade de Londrina até abril de 2006. A apresentação é antecedida pelo “Território Prenhas” – em cada local de apresentação, uma semana antes se escolhe alguns lugares como Unidades Básicas de Saúde, Escolas Públicas e outras instituições para realizar uma exposição de objetos retirados de cena e outros comprados no comércio referentes à cultura negra. É mostrado um vídeo-apresentação do projeto, explicando seu objetivo e o porquê de sua proposição e posteriormente ocorre um debate sobre a temática. Ressalto que eu fui convidado a participar do projeto em meados do mês de julho de 2005, assumindo a coordenação de produção e de comunicação. 4 Rosa das Dores argumenta que tais questionamentos surgiram desde sua infância. 5 Projeto que tem por objetivo criar uma pesquisa coletiva com pessoas negras, inserindo-as no teatro brasileiro. 6 Rosa das Dores prefere utilizar o termo processo cênico, pois argumenta que além de ser constituída por uma pesquisa, a montagem cênica é construída e reconstruída a cada apresentação, utilizando-se de observações dos questionamentos do público.
  • 7. Desde o início o projeto causou impacto perante as pessoas que tinham contato com ele, principalmente pelo nome “Prenhas”. As pessoas remetem o nome às fêmeas de animais mamíferos não-racionais como a vaca, a porca, a gata, por isso, o “choque” das pessoas. O nome foi escolhido por um fato ocorrido no qual Rosa das Dores teve conhecimento por uma amiga que morava com ela, no ano de 2003. Havia um amigo dela que se queixou em trocar o local de sua residência médica, saindo do Pronto Socorro para a Maternidade do H.U., dizendo que não suportava em ter que atender mulheres pobres, da periferia, usando frases como “lá vem aquela negra fedida, aquela prenha”. O mais interessante é que um tempo depois, em abril de 2005, houve uma denúncia de funcionários do Hospital Universitário de Londrina, indicando que alguns médicos residentes mantinham uma comunidade virtual no Orkut7, a qual continha frases discriminatórias e racistas, referentes aos funcionários do hospital e dos pacientes. O fato teve repercussão nos meios de comunicação local, porém o processo está em andamento, pois não existe uma lei específica no Brasil sobre os chamados “crimes virtuais”. Para divulgar o projeto, elaboramos um plano de comunicação, com cartazes, flyers, convites virtuais, e-mails e comunicados à imprensa. Para fazer a arte do material gráfico, a Rosa convidou um de nossos amigos que realiza esse tipo de trabalho na área cultural da cidade. Porém, ao explicar sobre o projeto, o mesmo ficou muito preocupado sobre o nome “Prenhas”, pois poderia ser associado ao fato do Orkut, solicitando que mudasse o seu nome. Realizamos uma reunião, Rosa e eu, decidindo pela continuidade do nome, utilizando o mesmo para provocar as pessoas, além de nós mesmo construirmos a arte do projeto. Quando ocorria o “Território Prenhas” era recorrente a fala de algumas pessoas: “Por que vocês focam somente sobre a gravidez das mulheres negras? E as brancas? O projeto poderia ser ampliado para todas as mulheres”. Esse fato confirma o que Tatum, psicóloga norte-americana aponta: “[...] os brancos negam inicialmente qualquer preconceito pessoal, tendendo a posteriormente reconhecer o impacto do racismo sobre a vida dos negros, mas evitando reconhecer o impacto sobre as suas próprias vidas” (BENTO, 2003:42-43). O que se percebe nessas falas é a negação de uma diferença entre as 7 O orkut é uma comunidade virtual afiliada ao Google, criada em 22 de Janeiro de 2004 com o objetivo de ajudar seus membros a criar novas amizades e manter relacionamentos.
  • 8. mulheres negras e as mulheres brancas. Como salienta Cristina da Silva Souza Coelho o processo histórico impôs experiências diferentes na vida dessas mulheres. As mulheres negras na ordem patriarcal sofreram uma situação de exploração sexual, eram muito mais simbolizadas como “objeto sexual” do que as mulheres brancas (as sinhazinhas). Essa representação pode ser muito bem auferida hoje, principalmente quando analisamos as estruturas do universo do trabalho. Foram divulgadas na publicação Brasil, Gênero e Raça, as diferenças no rendimento salarial médio dos negros e dos brancos, apontando que entre os homens o branco ganha em média 6,3 salários mínimos, enquanto o negro 2,9; comparando com a média dos homens, as mulheres são demasiadamente discriminadas, elevando a desigualdade quando entra em cena a questão cor: entre as mulheres brancas 3,6 salários mínimos (nota-se que maior que o homem negro), as mulheres negras menos da metade das brancas – 1,7 salários mínimos (Almeida, 2004). Outro ponto muito relevante é o estudo de Alaerte Leandro Martins (2001) sobre cor e mortalidade materna, entre 1993 e 1998. Detectou-se que o risco relativo de morte das mulheres negras por motivos relacionados à maternidade foi 7,4 vezes maior que da cor branca no estado do Paraná, demonstrando que no serviço público de saúde também há preconceito racial, pois muitas mulheres negras não recebem o mesmo tratamento que as mulheres de outras cores. Interpretando esses dados, verificamos o quanto é essencial a questão de gênero e etnia na sociedade contemporânea. Digo isso, não me esquecendo que é um conjunto de ações históricas, mas reforçando que a ideologia do bloco do poder busca ocultar tal desigualdade. Por esse motivo: Alguns membros dos “novos movimentos sociais” têm reivindicado o direito de construir e assumir a responsabilidade de suas próprias identidades. Por exemplo, as mulheres negras têm lutado pelo reconhecimento de sua própria pauta de luta no interior do movimento feminista, resistindo, assim, aos pressupostos de um movimento de mulheres baseado na categoria unificada de “mulher” que, implicitamente, inclui apenas as mulheres brancas (AZIZ apud WOODWARD, 2000: 35). Uma das explicações sobre esse escamoteamento da desigualdade racial no Brasil é a ideologia do branqueamento. A partir do momento em que a questão racial foi incorporada pela biologia (teoria evolucionista) e até mesmo considerada patologia médica, aos negros e índios foram dedicadas as piores características
  • 9. sociais e culturais de nossa sociedade. Depois que acabou a escravidão, houve a “passagem do racismo de dominação para o de exclusão” (Sodré, 1999, p. 87). Quanto menos traços europeus tiver a pessoa, mais “condenada” às mazelas e “migalhas” da sociedade ela estará condicionada, por isso, embranquecer vem acompanhado do pensamento de ascensão e aceitação social. É o que ressalta Ianni, quando diz que conseguir descendentes com aspectos fenotípicos mais brancos já é motivo de orgulho para as pessoas negras (apud BENTO, 2003). A mestiçagem, produzida como ideologia dessa forma nos espaços coloniais latino- americanos, é a reinterpretação de um ethos de transigência e nomadismo, transmitido por traços manifestos e latentes na dinâmica intergeracional dos sujeitos do patrimônio. Mas o ethos não é puramente cultural nem exclusivamente simbólico: ele sempre serviu, no interior de práticas políticas deliberadas, como “filtro seletivo” para controlar o acesso de segmentos econômica e politicamente subalternos à estrutura de poder. Serviu também para polir as arestas das relações raciais e impedir reações radicais (SODRÉ, 1999:124). No artigo “De café e de leite...” Rosa Maria Rodrigues dos Santos (2003) nos remete a uma experiência profissional vivida por ela, quando se deparou com uma menina de nove anos com ascendência negra, que se afirmava ser loira. Sua mãe era negra e seu pai loiro, este abandonou sua mãe na gravidez que também não contava com a ajuda da família. A menina somente teve contato do pai por algum tempo depois que ele retornou após a gravidez para morar com sua mãe. Depois de várias situações complicadas na relação matrimonial ele as abandonou e foi morar com uma mulher loira, como ele. Esse quadro caracterizou um desenvolvimento psicológico diferenciado na menina, entre a fronteira da neurose e a psicose, ela negava sua negritude. Mas por qual razão? Santos depois de conviver e participar do tratamento da menina, conclui que ela era o “espelho” da mãe, que se sentia rejeitada pelo homem branco por ser negra. A menina queria ser aceita, principalmente pela mãe, pois para ela a mãe considerava os traços europeus decisivos nos relacionamentos sociais e familiares. Um fato importante que aconteceu foi o relato de uma professora de História, em uma das ações do projeto em Assis, interior de São Paulo. Ela nos contou que seu filho, estudante do ensino fundamental de uma escola particular daquele município, iria participar de uma peça teatral elaborado pela escola. Havia no roteiro uma personagem negra, porém não existia na escola nenhum aluno negro ou aluna negra. A alternativa foi escolher um aluno branco que faria o papel, mas aí entrou o
  • 10. segundo dilema: quem aceita desenvolver a personagem? A professora, que também leciona nessa instituição de ensino, conversou com seu filho e deu-lhe a idéia de fazer a personagem. Porém, ele resistiu à proposta e argumentou: “O que vão pensar de mim? Não vou fazer uma pessoa negra, elas só sofrem”. A pessoa negra na televisão: por uma outra representação Um dos principais objetivos do projeto Prenhas é construir uma nova representação social em relação à imagem da pessoa negra, aonde mulheres e homens negros possam valorizar e fortalecer sua auto-estima, e proporcionar uma visão positiva da sociedade em relação às pessoas negras. Busca inverter na lógica da sociedade da informação com a chamada globalização. Como reforça Milton Santos (2003) ao contrário dessa nova lógica do sistema contemporâneo possibilitar novos conhecimentos, valorização e reconhecimento dos diversos lugares e diferentes culturas, ele imprime sua marca com um papel despótico midiático. O bloco de poder, que é uma minoria de atores sociais, utiliza as técnicas da comunicação e da informação em benefício próprio, os quais determinam o conteúdo, a transmissão, bem como o grupo da massa que deve receber tal informação. As decisões e a participação nos meios de comunicação acabam cada vez mais restritos e a maioria considerável da população somente “participa” na recepção, sendo marginalizadas no processo do controle comunicacional. Dentre suas ações, o projeto busca a utilização dos recursos de vídeo, como o vídeo-apresentação e o vídeo-cena8. Aquele é mostrado no espaço do “Território Prenhas” juntamente com a exposição dos objetos relacionados à cultura negra, onde seu conteúdo é explicar o porquê do projeto e introduzir a discussão da discriminação racial, matrimônio e o abandono da mulher negra. O vídeo conta com o relato de Rosa das Dores, coordenadora geral e atriz do projeto. O vídeo-cena foi o recurso utilizado por Rosa para que além de sua performance no processo cênico, ela mostrasse a imagem de outras pessoas negras 8 Vídeo-cena é uma concepção que utiliza o vídeo no espaço cênico. Um recurso que além de mudar a estética tradicional do teatro, busca o auxílio e um novo olhar sobre a expressividade cênica.
  • 11. e como o projeto é autobiográfico ela se utilizou dos relatos de sua mãe (Neuza das Dores), sua irmã mais velha (Jussara das Dores) e seu avô (José das Dores). Suas imagens são transmitidas por uma televisão que faz parte do cenário do processo cênico buscando uma nova representação da imagem das pessoas negras. Bento (2003) ressalta que no Brasil, vários estudos dão a ressalva que a representação da imagem videográfica das pessoas negras são construídas em cima de aspectos negativos e remetidos a recursos que fazem ligação com figuras demoníacas. Esse movimento de estigmatização e estereotipação das pessoas negras faz com que elas próprias criem uma identidade individual e coletiva negativa da sua imagem. Existe uma não declaração da desigualdade racial pelos meios de comunicação, e além de camuflada, proporciona um sentimento de “vergonha” e dificuldade das pessoas negras em se afirmar etnicamente, por isso, a busca pelo embranquecimento dos seus relacionamentos e dos seus filhos (CARONE, 2003). Se analisarmos a construção da representação social pela televisão, podemos perceber que nos programas de maior audiência como em noticiários e novelas a imagem das pessoas negras tem características e estereótipos fixados e espaços definidos. Nos telejornais, além de uma presença ínfima dos profissionais de origem negra, os espaços destinados para o povo negro, são em sua maioria os fatos policiais e degradação social. Várias pessoas, principalmente as que eram convidadas a participar da organização do projeto, inclusive eu, quando assistiam à montagem cênica, sugeriam à Rosa que ao invés da televisão utilizasse um telão, aumentando a imagem, dando maior projeção. Rosa sempre argumenta que a utilização da televisão é proposital, pois ela quer mostrar para as pessoas uma nova maneira de ver as mulheres e os homens negros na televisão, ou seja, a questão é o meio a ser utilizado para retratar o imaginário social e sua representação do povo negro. O Brasil não é um país racista e dá exemplo ao mundo todo. Essa é a conclusão a que chega qualquer pessoa que tenha visto nos noticiários o caso do jogador argentino Leandro Desábato, preso após ofender com palavras de cunho racista o jogador são paulino Grafite. O jogo aconteceu no dia 14 de abril de 2005, dentro da maior competição de futebol das Américas, a Copa Libertadores da América. Ao vivo para o Brasil e para o mundo, o jogador argentino foi autuado e preso. Ocorreu a partir desse fato os mais diversos discursos nacionalistas perante a questão racial. Em entrevista aos programas esportivos, a fala de Nicolas Leoz,
  • 12. presidente da Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol): "O futebol perde muito com esse episódio. Nada pode justificar um ato de racismo. Que isso sirva de exemplo para todo o mundo do futebol” foi utilizada para reforçar que no Brasil não há racismo e a lei cumpre o seu papel. As telenovelas são o programa e o instrumento mais utilizado pela grande mídia para criar padrões morais, estéticos, de moda e comportamento da sociedade brasileira. Joel Zito Araújo (2000) mostrou que apesar de representar parcela expressiva da população e da cultura brasileiras, os negros têm sido ignorados na ficção ou vêm sendo retratados de modo negativo ou estereotipado. Ele argumenta que a novela brasileira, produto de sucesso nacional e de exportação para os quatro cantos do mundo, vende a imagem do negro como subalterno, submisso, pronto para servir ao senhor branco. Mas o autor acredita que esta negação do Brasil não retrata nada além do que é visto na elite nacional. O mito da democracia racial, o idealismo branco e o desejo de europeização de toda população, mascarado por personagens fictícios que invadem todas as noites os lares brasileiros é o espelho do preconceito enraizado há mais de 500 anos e que até os dias atuais circunda e permeia as relações inter-raciais. Sodré (1999) argumenta que nos jornais impressos do passado, as referências identitárias do negro eram ideológicas, como José do Patrocínio. No mundo contemporâneo o padrão é estético, doutrinário ou ético. A grande mídia utiliza a imagem de modelos, jogadores de futebol e atores. Por isso criou-se uma “obsessão” pelos padrões europeus como o cabelo. Em um dos relatos do vídeo- cena, aparece a fala da irmã de Rosa, aonde ela conta seu casamento na igreja, e foca o nascimento de seus dois filhos. Em um determinado momento ela conta que o filho mais novo, enquanto ela o arrumava em frente a um espelho, questiona se quando ele crescer poderá alisar o cabelo. Ela argumenta que não é preciso, pois ele deve ter orgulho de seu cabelo e de sua “raça” negra. A que conclusões podemos chegar diante desse grande espelho da sociedade, que é a imprensa? Uma delas, a mais imediata, é a de que a questão racial é de natureza explosiva, mesmo quando as suas faíscas elétricas e as suas chamas súbitas são neutralizadas e contidas por um certo tempo, pois as suas causas continuam a existir onde sempre existiram: no preconceito e na discriminação. Mas, em definitivo, a repressão de um problema não é a sua supressão. Outra conclusão é a de que a questão racial é representada como um problema ou uma doença dos negros, o que é, evidentemente, falso e ideológico: onde estão os escravizadores de ontem e os dominadores de hoje? Nesse sentido, o ponto de vista
  • 13. que prevalece na imprensa ainda hoje é o ponto de vista de quem goza de poderes na sociedade atual e culpabiliza a vítima da opressão (CARONE, NOGUEIRA, 2003: 179). A utilização do vídeo no projeto busca inserir uma imagem diferente da pessoa negra. Além da imagem, o conteúdo das falas é remetido para que o público repense o mito da igualdade racial, represente a pessoa negra com outros referenciais – positivos – e valorizem sua imagem. Tal prática vai de encontro ao que Santos enfoca sobre as técnicas da comunicação e da informação: “[...] quando sua utilização for democratizada, essas técnicas doces estarão ao serviço do homem” (2003, p. 174). Eu tenho raiva Na performance, Rosa utiliza a figura da Anastácia para demonstrar e representar a questão sexual que é remetida à mulher negra, a escravidão do povo negro e, principalmente, o silenciamento imposto às pessoas negras no Brasil. Anastácia era filha de Delminda, princesa da tribo bantu, oriunda da família do rei Galanga, que foi trazida ao Brasil e vendida como escrava. Foi estuprada por seu feitor e engravidou gerando Anastácia, moça muito bonita, com características do povo negro e olhos azuis, por parte do feitor. Começa a ser assediada por Joaquim Antonio, recebendo até mesmo oferta em dinheiro pela sua virgindade, mas resistindo foi violentada sexualmente por ele, machucando seu rosto. Como castigo, foi submetida a usar uma máscara, podendo apenas retirá-la para se alimentar, utilizando-o até morrer9. Que raiva. Eu sinto muita Raiva. Olha! É muita raiva que eu sinto! Eu sinto raiva dessas mães. Eu sinto raiva dessas mães. Eu sinto raiva dessas mães. Não! Elas não são mães. 9 A História de Anastácia não tem confirmação de veracidade.
  • 14. Essas mulheres que abandonam os filhos. Vão pro baile. Só pensam no prazer delas. Depois voltam chorando. Arrependidas. Eu tenho raiva. Muita raiva dessas mães que abortam os filhos com bucha, chá de canela, agulha de tricô, cinta para disfarçar a barriga, em clínicas clandestinas. Jogam em privadas, em rios. Eu tenho raiva dessas mães que têm filhos para ganhar dinheiro da Assistência Social. Eu tenho raiva dessa indústria da miséria, desse assistencialismo, que precisa de pobre. Pobre não pode morrer. Tem que nascer e viver sempre na miséria para ser atendido. Eu tenho raiva desses pais. Que não podem ser chamados de pais. Que colocam filho no mundo e não assumem. Eu tenho raiva de médico que faz a mulher pobre e negra esperar para ter o filho no hospital público e faz ameaça que não vai fazer o parto se ela não pagar. Eu tenho raiva desses professores que dizem que vão corrigir neguinho insolente. Que dizem que negro é sujo, burro, inferior. Eu tenho raiva desses homens brancos. Que olham pra gente como objeto de consumo. Usa e joga fora! Eu tenho raiva das pessoas que usam o projeto de ação afirmativa do negro para se promover. Eu tenho raiva de mulher que abandona os filhos por causa de homem. Eu tenho raiva de ver as prisões cheias de homens negros. Que poderiam estar com suas famílias, trabalhando, cuidando de seus filhos. Eu tenho raiva cada vez que eu vejo uma criança negra com uma mãe adotiva branca. Eu me pergunto: Onde está esta mãe negra? Vai ter outros filhos? Vai doá-los? E se não tivesse a mãe adotiva? E se não tivessem casas para abrigar estas crianças? Eu tenho raiva desses políticos. Que posam com crianças negras nos braços em ano eleitoral. Eu tenho raiva de empresas religiosas que usam a gente para ter verba, E depois a gente, negro, pobre, trabalha na faxina, trabalha no portão. Eu tenho raiva quando me vêem como uma ameaça. A gente não pode ter dinheiro, casa, boa profissão, não pode ter oportunidade, não pode ser igual. A raiva é o sentimento mais corrosivo. Ruim. Quando vem com o medo é destrutiva. Eu sinto ela aqui dentro. O texto acima é uma fala na última parte da montagem cênica do Projeto Prenhas. Nesse momento a performer expõe a imagem da Anastácia em cima da televisão e uma fala gravada em fita cassete é apresentada. Concebo que é o momento chave da montagem, pois consegue resumir todos os anseios, observações, vivências, experiências, questionamentos e lutas de Rosa das Dores, quanto do povo negro e da sociedade. Há uma problematização de todas as questões tratadas no projeto, comungando-os e interligando suas relações na
  • 15. interferência com a humanidade, ficando evidentes quais as concepções e direcionamentos políticos, culturais e sociais que permeiam o projeto. Não é a busca de apontar os culpados e nem tornar em vítimas as pessoas negras. A fala procura apontar a lógica social em que vivemos, responsabilizando a humanidade, independente de sua ação nas relações de poder, etnia e ação política. Além disso, é importante pontuar que é a figura da Anastácia que fala e dissemina todos os pensamentos, com a voz da performer. O que quero dizer é: uma pessoa que faz parte do povo negro, aponta visões sobre suas relações sociais; diz que não aceita o aborto e nem o abandono dos filhos pelas mulheres negras; o sistema empreendido pelas Rodas de Misericórdia. Essa ação consegue quebrar com a lógica representativa da percepção social étnica que Edith Piza (2003) salienta. Ela aponta que o negro é representado por uma coletividade, portanto, se um negro tem pensamento e ações considerados “imorais” e não condizentes à vida social, é representativo de todo o povo negro; já um branco representa a si, sua individualidade. Ao expor todas as suas concepções no projeto, a performer consegue intervir nessa lógica, mostrando que também entre as pessoas negras há diferenças de pensamentos, ações, práticas “morais” e “éticas”. Por conseguinte, essa parte da montagem expõe todas as “dores” e “mazelas” que acompanham a vida da performer, podemos dizer que é seu momento de “cura”, pois consegue comunicar essas “dores” aos expectadores, questioná-los, instigá-los a refletir sobre todo o contexto apontado na montagem vídeo-cênica. No fim do texto sobre a raiva, Rosa das Dores pontua que a “raiva é o sentimento mais corrosivo”. Mas, não foi por meio desse sentimento que ela se mobilizou a elaborar e realizar o projeto? Não foi por ele que ela procurou unir forças a outras pessoas que demonstravam ter os mesmos pensamentos e objetivos que ela? Não foi esse sentimento que a fez ter pensamentos e práticas de transformação social, principalmente em relação à identidade e representação da pessoa negra? Como diz Paulo Freire (1989) os homens conseguem obter uma consciência sobre a razão dos obstáculos quando suas práticas são barradas, mostrando também que nenhuma relação humana com o mundo é neutra, “pura”, conscientizando-se a si mesmo, depois as outras pessoas.
  • 16. Bibliografia ALMEIDA, I. J.de. (2004) Presença negra: a história da caminhada de um povo em Londrina. Londrina. ARAÚJO, J. Z. (2000) A negação do Brasil: o negro na telenovela brasileira. São Paulo: Editora Senac. BENTO, M. A. S. (2003) Branqueamento e branquitude no Brasil. In: CARONE, I; BENTO, M.A.S. (Orgs.). Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. pp.25-57 2 ª ed. Petrópolis: Editora Vozes. CARONE, I. (2003) Breve histórico de uma pesquisa psicossocial sobre a questão racial brasileira. In: CARONE I; BENTO, M.A. S. (Orgs.). Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil pp.13-23. 2ª ed. Petrópolis: Editora Vozes. ___; NOGUEIRA, I. B. (2003) Faíscas elétricas na imprensa brasileira: a questão racial em foco. In: CARONE, I; BENTO, M. A. S. (Orgs.). Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil pp.163-180. 2ª ed. Petrópolis: Editora Vozes. CHAUÍ, M. (1982) Conformismo e resistência. São Paulo: Cortez. HALL, S. (2003) Da diáspora: identidades e mediações culturais; Organização Liv Sovik; Tradução Adelaine La Guardia Resende (et al). Belo Horizonte: Editora UFMG; Brasília: Representação da UNESCO no Brasil. MARTINS, A. L. (2006) Mortalidade Materna: maior risco para mulheres negras no Brasil. Disponível em: http://www.redesaude.org.br/jornal/html/jr23-alaerte.html, Acesso em 22 de março de 2006. MONTENEGRO, A. T. (2001) História oral e memória: a cultura popular revisitada. 3ed. São Paulo: Contexto. PIZA, E. (2003) Porta de vidro: entrada para a branquitude. In: CARONE, I.; BENTO, M.A.S. (Orgs.). Psicologia social do racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. pp.59-90 2ª ed. Petrópolis: Editora Vozes. SANTOS, M. (2003) Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 10ª ed. Rio de Janeiro: Record. SODRÉ, M. (1999) Claros e escuros: identidade, povo e mídia no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes. WOODWARD, K. (2005) Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. T.da (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. p.7-72. 4ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes.