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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, ALFABETIZAÇÃO E DIVERSIDADE
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA
Projeto Base
ProJovem Campo –
Saberes da Terra
Edição 2009
PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE JOVENS
AGRICULTORES(AS) FAMILIARES INTEGRADA À QUALIFICAÇÃO
SOCIAL E PROFISSIONAL
Brasília/2009
SUMÁRIO
1. Apresentação ...................................................................................................... 05
1.1. ProJovem Campo – Saberes da Terra ..................................................... 07
2. Justificativa ........................................................................................................... 09
2.1 - A Educação no Meio Rural Brasileiro ................................................... 10
2.2. Educação e juventude no Campo: breve diagnóstico .............................. 15
2.3. Agricultura Familiar ............................................................................ 17
3. Projeto Político-Pedagógico Integrado ................................................................ 20
3.1. Objetivo Geral .......................................................................................... 20
3.2.Objetivos Específicos ................................................................................. 20
3.3. Público beneficiário ................................................................................... 21
3.4. Metas .................................... .................................................................... 21
3.5. Pressupostos do ProJovem Campo – Saberes da Terra ............................ 22
3.6. Aspectos Legais ........................................................................................ 22
3.7. Base Conceitual de Referência do Programa ........................................... 27
3.8. Princípios Político-Pedagógicos ............................................................... 33
3.9. Organização Curricular ........................................................................... 36
3.10. Estrutura do Currículo ........................................................................... 39
3.11. Ementa da Qualificação Social e Profissional ....................................... 43
3.12. Aprendizagens Pretendidas ...................................................................... 49
4. Organização dos Tempos e Espaços Formativos .................................................. 51
4.1. Tempo Escola ............................................................................................. 52
4.2. Tempo Comunidade ..................................................................................... 52
4.3. Aprendizagens do Tempo Escola – Tempo Comunidade ........................... 53
4.4. Carga Horária ............................................................................................... 54
4.5. Avaliação ..................................................................................................... 54
4.6. Transferências............................................................................................... 56
4.7. Projetos Produtivos ...................................................................................... 56
4.8. Conclusão e Certificação ............................................................................. 57
4.9. Possibilidades de organização da alternância nas turmas ........................... 58
5. Formação Continuada de Educadores e Coordenadores Pedagógicos .................59
6. Gestão e Monitoramento do Programa .................................................................. 63
6.1. Monitoramento ............................................................................................. 64
6.2. Acompanhamento ......................................................................................... 64
6.3. Estratégia de Gestão do Programa ................................................................ 65
7. Recursos Humanos e Financiamento ...................................................................... 70
7.1. Recursos Humanos ....................................................................................... 70
7.2. Recursos para entes executores .................................................................... 71
7.3. Pagamento de Auxílio Financeiro para Educandos ..................................... 72
7.4. Recurso para Formação Continuada ............................................................ 73
7.5. Cadernos Pedagógicos e Publicações de Apoio ........................................... 74
8. Referências Bibliográficas ...................................................................................... 75
9. Anexos
Anexo I – Roteiro Para Projeto Pedagógicos
Anexo II – Termo de Compromisso
1. APRESENTAÇÃO
““Na oferta de educação básica para a população rural, osNa oferta de educação básica para a população rural, os sistemas desistemas de
ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação àsensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às
peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:
I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas àsI - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reaisreais
necessidades e interesses dos alunos da zona rural;necessidades e interesses dos alunos da zona rural;
II - organização escolar própria, incluindo adequação doII - organização escolar própria, incluindo adequação do calendáriocalendário
escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;
III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.”III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.” (LDBEN.(LDBEN.
Art.28).Art.28).
A construção de uma política educacional de Estado, adequada aos povos do campo1
,
que dialogue com a diversidade nas diferentes realidades, aliada a construção de uma política
nacional de juventude que reconhece os jovens do campo como sujeitos de direitos, constitui-se
uma prioridade do atual Governo Federal.
A Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD/MEC),
para garantir o direito destes povos a uma educação adequada a suas características,
necessidades e pluralidade (de gênero, étnico-racial, cultural, geracional, política, econômica,
territorial e produtivas, entre outras), implementou o Programa Nacional de Educação de Jovens
e Adultos para Agricultores/as Familiares integrada com Qualificação Social e Profissional,
denominado Saberes da Terra.
O Programa Saberes da Terra foi iniciado em dezembro de 2005 em 12 Unidades da
Federação (BA, PB, PE, MA, PI, RO, TO, PA, MG, MS, PR e SC) em colaboração com
secretarias estaduais de educação, representações estaduais da União Nacional dos Dirigentes
Municipais em Educação – UNDIME, Associação de Municípios Cantuquiriguaçu, entidades e
movimentos sociais do campo integrantes dos comitês e fóruns estaduais de Educação do
Campo.
1
Estão sendo considerados povos do campo: agricultores/as familiares, assalariados, assentados ou em processo de
assentamento, ribeirinhos, caiçaras, extrativistas, pescadores, indígenas, remanescentes de quilombos, entre outros
povos que lutam pela afirmação dos seus direitos do campo no diversos biomas do território nacional.
5
Durante a implantação do projeto piloto Saberes da Terra foram realizadas:
• A formação de cinco mil e sessenta educandos, com certificação em nível de
ensino fundamental integrado à qualificação social e profissional;
• Formação continuada de seiscentos profissionais da educação – professores,
educadores, técnicos e gestores participantes e/ou em exercício na execução
do Programa;
• Construção, em parceria com estados, municípios, organizações populares
da sociedade civil e movimentos sociais de uma metodologia de Educação
de Jovens e Adultos - EJA, integrada à qualificação social e profissional,
realizando práticas pedagógicas de fortalecimento da Agricultura Familiar,
da Economia Solidária e do Desenvolvimento Sustentável contextualizadas
nas diferentes realidades e necessidades regionais e culturais.
• A construção de metodologias para a elaboração de material pedagógico que
possa ser replicado de acordo com o contexto de cada estado ou região.
• Produção de cadernos pedagógicos que tratam dos Eixos Temáticos do
Programa, em três estados participantes, com atuação fundamental de
organizações de assessoria, populares, com experiência em educação do
campo.
• Quatro seminários nacionais de formação das equipes pedagógicas estaduais.
No ano de 2007 o Ministério da Educação, por meio da SECAD, participou do processo
de construção do programa nacional da juventude, conduzido pela Secretaria Nacional de
Juventude/Presidência da República (SNJ/SG/PR), no qual foram integrados seis programas já
existentes: a) Agente Jovem, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; b)
ProJovem, da Casa Civil; c) Saberes da Terra e Escola de Fábrica, do Ministério da Educação;
d) Consórcio Social da Juventude e Juventude Cidadã, do Ministério do Trabalho e Emprego.
No processo de integração foi resguardada a autonomia político-pedagógica das
experiências acumuladas por cada Programa. Como resultado desse processo foi instituído pela
o Programa Nacional de Inclusão de Jovens – PROJOVEM, que objetiva promover a
reintegração de jovens ao processo educacional, sua qualificação profissional e seu
desenvolvimento humano e cidadão. O PROJOVEM está organizado em quatro modalidades: I)
6
ProJovem Adolescente; II) ProJovem Urbano; III) ProJovem Trabalhador; e IV) ProJovem
Campo – Saberes da Terra.
A partir de então, o Saberes da Terra passou a denominar-se de ProJovem Campo-
Saberes da Terra destinado à garantia de ensino fundamental a jovens agricultores/as, como
política de educação, na modalidade EJA integrada à qualificação social e profissional.
1.1. Projovem Campo – Saberes da Terra
O ProJovem Campo – Saberes da Terra constitui-se no Programa nacional de
educação de jovens agricultores/as familiares, implementado pelo Ministério da Educação por
meio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) e da
Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC), numa ação integrada com o
ministérios do Desenvolvimento Agrário por meio da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF)
e da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), do Trabalho e Emprego por meio da
Secretaria de Políticas Públicas de Emprego (SPPE) e da Secretaria Nacional de Economia
Solidária (SENAES), o Ministério do Meio Ambiente por meio da Secretaria de Biodiversidade
e Floresta (SBF), o Ministério do Desenvolvimento e Combate à Fome e a Secretaria Nacional
de Juventude (SNJ) vinculada à Presidência da República.
O Programa se destina ao desenvolvimento de uma política que fortaleça e amplie o
acesso de jovens agricultores (as) familiares, situados na faixa etária de 18 a 29 anos, no sistema
formal de ensino, e sua permanência tendo em vista a conclusão do Ensino Fundamental com
qualificação social e profissional.
Mais amplamente, é objetivo do Programa contribuir para a formação integral do jovem
do campo, potencializando a sua ação no desenvolvimento sustentável e solidário de seus
núcleos familiares e comunidades, por meio de atividades curriculares e pedagógicas, em
conformidade com o que estabelecem as Diretrizes Operacionais para Educação Básica nas
Escolas do Campo – Resolução CNE/CEB Nº 1 de 03 de abril de 2002.
O recorte etário vem ao encontro do redesenho do Programa que passa a ser
componente de duas políticas de Estado – de Educação do Campo e de Juventude – ambas
indispensáveis para a qualificação social, formação profissional e construção da autonomia dos
jovens do campo. Se, por um lado, restringe o acesso aos maiores de 30 anos, por outro, em
relação ao Saberes da Terra, amplia visivelmente as condições de implementação: a) aumento de
R$ 1.000,00 (um mil) reais para R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos) reais o investimento do
7
Governo Federal por educando, repassado aos entes executores; b) garantia de recursos
específicos para produção e distribuição dos cadernos pedagógicos; c) recursos específicos para
realização da formação continuada, por meio de instituições de ensino superior públicas, na
ordem de R$ 5.700,00 (cinco mil e setecentos) reais por cursista - profissional em exercício no
Programa e, d) instituição de auxílio financeiro de R$ 1.200,00 (um mil e duzentos) reais por
educando, pago em doze parcelas.
O Programa será desenvolvido pelos entes federativos estaduais ou municipais com
prioridade aos Territórios da Cidadania2
, em parceria com instituições de Ensino Superior
públicas, organizações não-governamentais e movimentos sociais do campo. Embora os projetos
e as transferências de recursos sejam exclusivamente a entes federativos – Estados e
DF(podendo, também, vir-a-ser Municípios) e instituições de Ensino Superior públicas (IES), é
fundamental, para a garantia das características, da identidade e da estratégia político-
metodológica do Programa, que os projetos busquem e demonstrem a participação de outros
sujeitos indispensáveis, tais como movimentos sociais e sindicais do campo, organizações
populares de educação e assessoria com experiência em educação do campo, União Nacional de
Dirigentes Municipais – UNDIME, EFA's, fóruns e comitês de educação do campo – incluindo
a possibilidade de retribuição financeira por serviços eventuais, de pessoas físicas ou jurídicas
destas parceiras, para atividades as quais estejam qualificadas a executar (seminários, oficinas,
palestras, elaboração de material de apoio técnico-pedagógico, etc).
Com a edição 2008, foram disponibilizadas pela SECAD/MEC 35.000 (trinta e cinco
mil) vagas, distribuídas em 19 estados da Federação: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão,
Pernambuco, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe - região Nordeste; Mato Grosso e
Mato Grosso do Sul - região Centro-Oeste; Santa Catarina e Paraná - região Sul; Minas Gerais e
Espírito Santo - região Sudeste; Amazonas, Pará, Rondônia e Tocantins - região Norte.
A realidade da educação e da juventude do campo no país, demonstrada a seguir, reforça
a importância de uma política de Educação do Campo e de Juventude, por meio de ações de
formação/qualificação tais como ProJovem Campo – Saberes da Terra.
2
Para 2009, a relação completa dos municípios pertencentes a Territórios da Cidadania pode ser obtida no
endereço: http://sit.mda.gov.br/territorio.php?menu=cidadania&base=2, no campo “Documentos”, “Planilha com a
relação dos 120 Territórios da Cidadania com código do IBGE”.
8
2. JUSTIFICATIVA
Na faixa etária de 18 a 29 anos existem mais de 6 milhões de jovens agricultores. A
desigualdade entre os níveis de escolaridade entre as pessoas que vivem no campo e os que
vivem nas cidades está claramente demonstrada nas pesquisas populacionais e educacionais.
Dados da PNAD de 2006 mostram que 1.641.940 jovens do campo (26,16%), não concluíram o
primeiro segmento do ensino fundamental e 3.878.757 (61,80%) não concluíram a segunda
etapa do ensino fundamental. Enquanto que para os jovens das cidades, esta média é de 18% e
30%, respectivamente.
Como demonstrado no Item 2.2., em todos os indicadores sociais e educacionais as
populações do campo estão em desvantagem, sejam eles relativos à matrícula, ao desempenho
educacional dos alunos, à formação dos profissionais de educação ou à infra-estrutura física das
escolas.
Essa realidade aponta para a necessidade de adoção de políticas que revertam a situação
da educação oferecida aos povos do campo, das águas e das florestas, em idade escolar - a fim
de se impedir que esse quadro se mantenha inalterado. Para além da situação comparativa,
tomada a educação como direito subjetivo, em si só é motivo suficiente para exigir das políticas
públicas o resgate dessa dívida histórica da sociedade brasileira para com os jovens e adultos
que vivem no campo e não tiveram ainda tal direito assegurado.
Para enfrentar esses problemas, não basta a mera oferta de escolarização, como extensão
de uma escola urbana. É preciso que seja uma política educacional adequada aos povos do
campo e que integre os conhecimentos próprios do ensino fundamental adequado e os de
qualificação social e profissional, visando o desenvolvimento da solidariedade e a emancipação.
É preciso, ainda, superar a dicotomia histórica entre a Educação Básica (fundamental,
média e de jovens e adultos) e a formação profissional. Para isso, deve-se atuar na formação
continuada de educadores (das áreas próprias do ensino fundamental e das ciências agrárias) e
coordenadores, de modo a efetivamente promover a integração dos conhecimentos e fortalecer o
desenvolvimento de metodologias adequadas às especificidades da EJA do campo,
compreendido como sujeitos de conhecimentos e saberes significativos e, portanto, de educação,
conforme já reconhecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº
9.394/96.
9
A importância histórica, social e econômica da Agricultura Familiar para o campo
brasileiro é outra variável que deve ser considerada numa política adequada de ensino integrado
à qualificação social e profissional. Dar ênfase a essa forma de organização do trabalho é
valorizar a manutenção da família no controle sobre as decisões que se referem à cultura e à
atividade a ser desenvolvida. Além disso, o trabalho exercido pelo grupo familiar destina-se
prioritariamente ao sustento da própria família, não excluindo a produção de excedentes para
comercialização e geração de renda.
O Censo Agropecuário 1995/1996, realizado pelo IBGE, revelou que aproximadamente
85% do total de propriedades rurais do país pertenciam a grupos familiares. A atividade
agrícola, para 13,8 milhões de pessoas representava praticamente a única alternativa de vida, em
cerca de 4,1 milhões de estabelecimentos familiares, o que correspondia a 77% da população
ocupada na agricultura. Cerca de 60% dos alimentos consumidos pela população brasileira vêm
desse tipo de produção.
A base legal e normativa para a instituição de políticas públicas diferenciadas para
pessoas que vivem e trabalham no campo – LDBEN e Diretrizes Operacionais da Educação do
Campo -, prescreve a adequação do calendário escolar às condições climáticas e ao ciclo
agrícola, bem como a contextualização da organização curricular e das metodologias de ensino
às características e realidades da vida dos povos do campo.
2.1 - A educação no meio rural brasileiro
No âmbito das políticas públicas, equivocadamente pensava-se que o problema a ser
resolvido para a educação das populações que vivem fora das cidades decorria apenas da
localização geográfica das escolas e da baixa densidade populacional nas regiões rurais. Isso
implicava, entre outras coisas, a necessidade de serem percorridas grandes distâncias entre casa
e escola e o atendimento de um número reduzido de alunos, com conseqüências diretas nos
gastos para a manutenção do então denominado ensino rural.
O modelo escravocrata utilizado por Portugal para colonizar o Brasil e, mais tarde, os
adotados pelos próprios brasileiros para a colonização do interior do país - de exploração brutal
dos trabalhadores rurais pelos proprietários de terra, sendo sistematicamente negados aos
primeiros seus direitos humanos, sociais e trabalhistas - geraram forte desigualdade e
discriminação em relação aos povos que vivem e trabalham no campo, bem como uma enorme
dívida social.
Ao mesmo tempo, a suposição de que os conhecimentos tido como “universais”
produzidos pelo mundo letrado ocidental deveria ser estendido – ou imposto – a todos, de
acordo com a “capacidade” de cada um, serviu para escamotear a negação do direito a uma
10
educação contextualizada, promotora de emancipação, de superação das desigualdades e de
acesso aos bens econômicos e sociais, que respeitasse os modos de viver, pensar e produzir dos
diferentes povos do campo. Coerente com a estrutura social e a concepção de educação
hegemônicas, se ofereceu - a uma pequena parcela da população rural -, uma educação
instrumental reduzida ao atendimento de necessidades educacionais elementares e ao
treinamento de mão-de-obra. Paralelamente, os filhos dos proprietários rurais estudavam nas
metrópoles, capacitando-se para funções “nobres”.
Em 1932, foi lançado o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova3
, que buscava
diagnosticar e sugerir rumos às políticas públicas de educação, preconizando a organização de
uma escola democrática, no qual o Estado assumisse uma reação categórica, intencional e
sistemática contra a velha estrutura do sistema educacional, a favor de um novo sistema de
educação vinculado ao trabalho e à formação da personalidade moral. Segundo o Manifesto dos
Pioneiros, a escola deveria proporcionar a aquisição de cultura geral comum e possibilitar
especializações para as atividades de preferência intelectual (humanidades e ciências) ou de
preponderância anual e mecânica (cursos de caráter técnico) agrupadas em: extração de
matérias-primas - agricultura, minas e pesca; elaboração de matérias-primas - indústria;
distribuição de produtos elaborados - transportes e comércio. Nessa proposta, porém, as
demandas do campo e da cidade eram igualmente consideradas e contempladas.
A separação entre a educação das elites e a das classes populares perdurou nas Leis
Orgânicas da Educação Nacional, promulgadas a partir de 1942. De acordo com essas Leis, o
objetivo do ensino secundário e normal seria “formar as elites condutoras do país” e o do
ensino profissional oferecer “formação adequada aos filhos dos operários, aos desvalidos da
sorte e aos menos afortunados, aqueles que necessitam ingressar precocemente na força de
trabalho4
”. Com o advento e crescimento das indústrias, demandantes de mão-de-obra em
condições de ler os manuais e instruções para operar as máquinas, o número de escolarizados
precisava ser ampliado.
Na década de 1960, por interesse da elite brasileira preocupada com o crescimento do
número de favelados nas periferias dos grandes centros urbanos, a educação rural foi adotada
pelo Estado como estratégia de contenção do fluxo migratório do campo para a cidade. A Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961, em seu art. 105, estabeleceu que “os poderes
públicos instituirão e ampliarão serviços e entidades que mantenham na zona rural escolas
capazes de favorecer a adaptação do homem ao meio e o estímulo de vocações profissionais”.
3
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova lutou por uma escola pública democrática, aberta a valorização das
experiências dos educandos. Uma das idéias estruturais do movimento diz que as escolas deviam deixar de ser
meros locais de transmissão de conhecimentos e tornar-se pequenas comunidades, onde houvesse maior
preocupação em entender e adaptar-se a cada criança do que em encaixar todas no mesmo molde.
4
Leis Orgânicas do Ensino Secundário (Decreto-Lei n.º 4.244/42), do Ensino Industrial (Decreto-Lei n.º4.073/42);
do Ensino Comercial (Decreto-Lei n.º 6.141/43); do Ensino Primário (Decreto-Lei n.º 8.529/46), do Ensino Normal
(Decreto-Lei n.º 8.530/46) e do Ensino Agrícola (Decreto-Lei n.º 9.613/46).
11
Dessa concepção surge a expressão inadequada “fixar o homem no campo”, reproduzida por
várias décadas, suscitando tentativas de evitar que os povos do campo abandonassem suas
atividades muito mais preocupadas em impedir o “êxodo” do que em garantir desenvolvimento
adequado.
O mesmo enfoque instrumentalista e de ordenamento social veio caracterizar a formação
de técnicos para as atividades agropecuárias. Em meados da década de 1960, por ocasião da
implantação do modelo Escola-Fazenda no ensino técnico agropecuário, os currículos oficiais
foram elaborados com enfoque tecnicista para também atender ao processo de industrialização
em curso. Simultaneamente à formação de técnicos, instituiu-se como política pública os
serviços de “extensão rural”, destinados a levar para o campo os insumos e produtos do pacote
tecnológico agroquímico, conhecido como “Revolução verde”.
Educação Popular e educação do campo
Em sentido oposto, ocorreu um vigoroso movimento de educação popular que, na
segunda metade do século XX ganhou identidade e dimensões nacionais. Protagonizado por
estudantes e educadores de universidades, movimentos religiosos de base, organizações
profissionais ou partidos políticos de orientação de esquerda, seu propósito era fomentar a
participação política das camadas populares, inclusive as do campo, e criar alternativas
pedagógicas identificadas com a cultura e com as necessidades nacionais, em oposição à
importação de idéias pedagógicas alheias à realidade brasileira.
Em 1964, com a instauração do governo militar, as organizações voltadas para a
mobilização política da sociedade civil – entre elas o Centro Popular de Cultura (CPC), criado
no ano de 1960 em Recife-PE; os Centros de Cultura Popular (CCP), criados pela União
Nacional dos Estudantes em 1961, e o Movimento de Educação de Base (MEB), orgão da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) – sofreram um pesado processo de
repressão política e policial. Essa repressão resultou na desarticulação e na suspensão de muitas
dessas iniciativas. Muitos educadores foram exilados, levando consigo as concepções e
propostas de educação popular em desenvolvimento no Brasil, as quais tiveram grande
contribuição em vários países, principalmente da América Latina e da África. Foi o caso, por
exemplo, de Paulo Freire que, por causa de suas convicções e práticas de educação popular,
ficou exilado por quase duas décadas.
Ao mesmo tempo em que reprimiu os movimentos de educação popular, o governo
militar, diante da elevada taxa de analfabetismo que o país registrava, buscando atingir
12
resultados imediatamente mensuráveis, instituiu o Movimento Brasileiro de Alfabetização
(MOBRAL), uma campanha de alfabetização em massa, sem compromisso com a elevação dos
níveis de escolaridade e, muito menos, com a educação em sentido mais amplo.
No processo de resistência à ditadura militar, sobretudo a partir de meados da década de
1980, as organizações da sociedade civil, especialmente as ligadas à educação popular,
recolocaram a educação do campo na pauta dos temas estratégicos para a redemocratização do
país. A idéia era reivindicar e, simultaneamente, construir um projeto de educação sintonizado
com as particularidades culturais, os direitos sociais e as necessidades próprias à vida dos
camponeses.
Nesse ambiente político, aliando mobilização e experimentação pedagógica, passam a
atuar juntos sindicatos de trabalhadores rurais, organizações comunitárias do campo, educadores
ligados à resistência à ditadura militar, partidos políticos de esquerda, sindicatos e associações
de profissionais da educação, setores da igreja católica identificados com a teologia da
libertação e as organizações de luta pela reforma agrária, entre outros. O objetivo era o
estabelecimento de um sistema público de ensino para o campo, baseado no paradigma
pedagógico da educação como elemento de pertencimento cultural.
Nas últimas décadas ampliaram-se iniciativas educacionais desenvolvidas pelos
movimentos sociais e organizações não-governamentais do campo (ANARA, CONTAG,
FETRAF, CUT, MAB, MST, RESAB, entre outros)5
. A disseminação de tantas iniciativas
educacionais vai se configurando como um terreno de experimentação de diferentes concepções
educativas e de propostas pedagógicas, assim como de produção teórica sobre a Educação do
Campo.
Em que pese as abrangências destinadas as suas áreas de intervenção, estas organizações
têm apresentado avaliações positivas nos processos de escolarização que realizam6
, além de
apresentarem propostas pedagógicas e organizações curriculares coerentes e adequadas aos
tempos e espaços da vida cotidiana das pessoas do campo. Há também um intenso envolvimento
destas organizações e movimentos com a formação continuada de professores e de monitores
5
ANARA – Associação Nacional pela Reforma Agrária. CEFFA’s – Centros Familiares de Formação em
Alternância. CONTAG – Confederação dos Trabalhadores na Agricultura. FETRAF – Federação dos
Trabalhadores na Agricultura Familiar. CUT – Central Única dos Trabalhadores. MAB – Movimento dos Atingidos
por Barragens. MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. RESAB – Rede de Educação do Semi-
Árido Brasileiro.
6
A FETRAF SUL/CUT, no período de 1999 a 2002 realizou a escolarização de aproximadamente 4 mil
agricultores familiares/as na Região Sul do Brasil na modalidade EJA, com qualificação profissional e atuou na
formação continuada de aproximadamente 150 educadores e técnicos envolvidos no projeto Terra Solidária. A CUT
também desenvolveu o Projeto Semear na Bahia. As Escolas Famílias Agrícolas (EFA’s) possuem 127 unidades em
funcionamento e atendem a aproximadamente 10.779 estudantes atendidos, 25.400 famílias. As Casas Familiares
Rurais (CFR’s) possuem 91 unidades em funcionamento (Queiroz, 2004).
13
responsáveis pela condução das propostas pedagógicas, o que se diferencia significativamente
dos processos formativos convencionais.
Outras iniciativas populares de organização da educação para o campo são as Escolas
Famílias Agrícolas (EFA’s) e as Casas Familiares Rurais (CFR’s) que, juntas, constituem-se nos
Centros Familiares de Formação por Alternância (CEFFA’s). Essas instituições, inspiradas em
modelos franceses e criadas no Brasil a partir de 1969 no Estado do Espírito Santo, associam
aprendizado técnico com o conhecimento crítico do cotidiano comunitário. A proposta
pedagógica, denominada Pedagogia da Alternância, é operacionalizada a partir da divisão
sistemática do tempo e das atividades didáticas entre a escola e o ambiente familiar.
Esse modelo tem sido estudado e elogiado por grandes educadores brasileiros e é
apontado pelos movimentos sociais como uma das alternativas promissoras para uma Educação
do Campo com qualidade, por articular o aprendizado escolar com as vivências produtivas das
populações do campo.
A partir desse contexto de mobilização social, a Constituição de 1988 consolidou o
compromisso do Estado e da sociedade brasileira em promover a educação para todos,
garantindo o direito à adequação da educação e ao respeito às singularidades culturais e
regionais.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n° 9.394/96) estabelece uma base
comum a todas as regiões do país, a ser complementada pelos sistemas federal, estaduais e
municipais de ensino, e determina a adequação da educação e do calendário escolar às
peculiaridades da vida rural de cada região
Em 1998, foi criada a “Articulação Nacional Por uma Educação do Campo”, entidade
supra-organizacional que passou a promover e gerir as ações conjuntas pela educação dos povos
do campo como um direito público inalienável. Dentre as conquistas alcançadas por essa
Articulação, estão: a realização de duas conferências nacionais por uma Educação Básica do
Campo, em 1998 e 2004; a instituição pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) das
Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, em 2002; e a instituição
do Grupo Permanente de Trabalho de Educação do Campo (GPT), em 2003.
Desafiado a construir uma agenda específica para a educação do campo, em 2004, o
Ministério da Educação, por meio da SECAD, criou a Coordenação-Geral de Educação do
Campo (CGEC), com o objetivo de elaborar e coordenar políticas públicas específicas, assim
como apoiar iniciativas pedagógicas para o atendimento dessa demanda a partir do
reconhecimento de suas necessidades e singularidades.
14
Em 2007, o Ministério da Educação por meio da Portaria Nº 1.258/07 institui a
Comissão Nacional de Educação do Campo (CONEC), órgão colegiado de caráter consultivo
com a atribuição de assessorar o MEC para a elaboração de políticas públicas em educação do
campo.
Nesse contexto histórico de mobilização em prol da garantia dos direitos públicos dos
povos do campo, a SECAD organizou, coordena e vem implementando programas destinados a
atender, de forma simultânea, integrada e complementar, a diferentes demandas: construção de
escolas do campo; PROCAMPO – apoiando a formação superior em licenciatura em educação
do campo; Escola Ativa, destinado a escolas com classes multisseriadas e, ProJovem Campo –
Saberes da Terra.
O ProJovem - Campo Saberes da Terra é uma opção político-pedagógica de oferecer
ensino fundamental integrado à qualificação social e profissional para os jovens agricultores do
Brasil, num esforço de reunir princípios político-metodológicos acumulados ao longo das
últimas décadas, desde as primeiras ações da educação popular, até as recentes e importantes
iniciativas de educação do campo protagonizados pelos diferentes movimentos sociais e alguns
governos locais, sem a pretensão de abranger as suas totalidades.
Representa um desafio por se tratar de um Programa que representa uma inovação para
o conjunto de políticas da educação nacional. É caracterizado por uma pedagogia que vincula
educação e trabalho a um paradigma de educação e sociedade cujo objetivo é construir uma
nova dimensão de desenvolvimento do campo. Aliado a isto, está a estratégia consciente de
fortalecimento dos entes federativos – União, Estados e Municípios – e de tratamento do
Programa na perspectiva de sua institucionalização como política de Estado. Por isso, executado
em regime de colaboração com entes federativos estaduais e municipais, como uma ação
interministerial, sob coordenação geral da SECAD/MEC em conjunto com as coordenações dos
demais entes partícipes.
2.2. Educação e juventude no campo: breve diagnóstico
Embora a legislação determine a obrigatoriedade da educação para crianças na faixa
etária de 7 a 14 anos e tenha ampliado a duração do Ensino Fundamental para nove anos, a
situação das populações do campo ainda apresenta-se problemática e desigual. De modo geral,
as escolas possuem instalações precárias e improvisadas, e oferecem apenas as séries iniciais do
Ensino Fundamental.
15
Segundo os dados do INEP de 2006 do total de 86.129 estabelecimentos de ensino
rurais, 50.176 (37,4%) são exclusivamente multisseriadas, e na maioria das vezes com
professores unidocentes pouco qualificados profissionalmente e mal remunerados. A
organização curricular, geralmente desconsidera a realidade das pessoas do campo e a sua
diversidade sociocultural.
Estes, entre outros fatores, têm contribuído sobremaneira para a baixa escolarização no
campo, demonstrando a histórica incapacidade do Estado brasileiro, em suas diversas instâncias,
de atender dignamente essa demanda e, por extensão, pouco tem contribuído com as
necessidades de desenvolvimento dessas populações.
Segundo o Censo Demográfico do IBGE, em 2000 29,8% da população do campo com
15 anos ou mais era analfabeta, enquanto que na área urbana o indicador era de 10,3%.
Dados do IBGE de 2001 indicam que o percentual da população com 15 anos ou mais de
idade sem instrução ou com menos de um ano de estudo, correspondia a 16,2 milhões de
pessoas. Entre as faixas mais jovens, os dados também preocupam: na faixa etária de 15 a 19
anos, 21,7% dos jovens não concluíram o equivalente às quatro séries iniciais do ensino básico e
66,7% não completaram os oito anos de escolaridade obrigatória. Os índices para a faixa etária
de 20 a 24 anos, apesar de melhores, confirmam a situação: 20,1% não concluíram as quatro
séries iniciais e 55,9% completaram o ensino fundamental de oito anos.
Quando comparados os indicadores das populações do campo e das populações urbanas
constata-se que a escolaridade média da população do campo com 15 anos ou mais corresponde
a 3,4 anos, menos que a metade da média para a população urbana que é de 7 anos de
escolarização. Os índices do analfabetismo também apontam uma distância considerável: 29,8%
da população adulta rural é analfabeta, enquanto, que na zona urbana esse índice é de 10,3%.
Nesses dados não estão incluídas aquelas pessoas com menos de quatro séries do ensino
fundamental.
A pesquisa “O perfil da juventude brasileira”7
considera que os dados levantados
permitem a informação sobre questões de extrema importância, embora a referida pesquisa
tenha trabalhado com uma amostra reduzida de jovens rurais (19% do total da população
pesquisada – 669 jovens rurais).
Em relação ao trabalho e formação profissional dos jovens, a pesquisa destaca que 90%
dos jovens entrevistados não passaram por nenhum curso de capacitação e a profissionalização é
feita por meio do aprendizado direto na prática; 95% consideram a escola importante para o seu
futuro profissional e 80% a consideram importante para conseguiram um emprego hoje;
7
Desenvolvida e coordenada pelo Instituto Cidadania em 2004, organizada por Maria José Carneiro.
16
somente 30% dos jovens residentes no campo e que trabalham na cidade têm carteira de
trabalho assinada; os demais são assalariados sem registro ou fazem “bico”; dos que trabalham
ou trabalharam (independe do local de residência), 42% ganham meio salário mínimo e 27%
ganham entre meio e um salário mínimo; dos 24% que trabalham no campo, 14% estão
inseridos em estabelecimentos de agricultura familiar, enquanto apenas 8% são assalariados sem
registro e 2% são ajudantes familiares sem remuneração.
Entre outros aspectos da pesquisa é destacado que 24% dos jovens demandam por
atividades culturais (cinema, teatro, shows, etc), apesar de ocuparem os fins de semana
assistindo TV, ajudando em casa ou encontrando os amigos; 60% dos jovens rurais declararam
ler ou assistir noticiários sobre política; 81% dos jovens rurais nunca participaram de
associações ou grupos comunitários.
Na compreensão dos jovens a ausência de espaços de lazer é um dos fatores responsáveis
pela avaliação negativa do campo e do desejo de migrar; do mesmo modo manifestam o desejo
de permanecer na localidade de origem, desde que ocupados em atividades não agrícolas.
2.3. Agricultura Familiar
O ProJovem Campo – Saberes da Terra concebe a Agricultura Familiar como forma
histórica de viver e produzir, na qual predominam relações de solidariedade recíproca,
interdependência/interrelação com os recursos naturais e cooperação mútua, com uma
organização do trabalho onde planejamento, execução, controles e outras tarefas de gestão são
realizados em conjunto pelas pessoas que compõem o núcleo familiar e se beneficiam
coletivamente dos resultados obtidos. A produção (cultivo, extração e/ou beneficiamento)
destina-se prioritariamente ao sustento da própria família e o excedente é comercializado,
contribuindo para a criação de uma atividade econômica fundamental para o desenvolvimento
socioeconômico do campo e do país.
Para a Secretaria da Agricultura Familiar (SAF/MDA), é uma forma de produção onde
predomina a interação entre gestão e trabalho. São os agricultores familiares que dirigem o
processo produtivo, dando ênfase na diversificação e utilizando o trabalho familiar,
eventualmente complementado pelo trabalho assalariado.
Estima-se que no Brasil existam cerca de 4.859.864 (quatro milhões, oitocentos e
cinqüenta e nove mil, oitocentos e sessenta e quatro) estabelecimentos rurais (IBGE, 1996).
Destes cerca de 85,2% são de estabelecimentos familiares. Estes dados são confirmados pelo
17
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e o Fundo das Nações Unidas
para a Agricultura e Alimentação (FAO), para os quais aproximadamente 85% do total de
propriedades rurais do país pertencem a grupos familiares.
O agricultor familiar agrega em seu trabalho diversas especializações, indissociadas e
simultâneas. É culturalmente pluriativo por assumir diversas ocupações, na maioria das vezes,
realizando atribuições típicas de agricultor (cultivo e produção vegetal e animal), agrônomo,
operador de máquinas, mecânico, meteorologista empírico, pescador, construtor, eletricista,
administrador, comerciante, industriador8
, artesão, ecologista, extrativista, líder comunitário e de
organização, entre outros.
Transversalmente a essas atribuições é, à sua maneira e por excelência, um observador e
formulador de suas próprias deduções e abstrações, indispensáveis ao desenvolvimento das suas
atividades e à melhoria de suas condições de vida, fazendo jus ao título de agricultor-
pesquisador ou agricultor-experimentador que recebe em algumas regiões do continente e do
planeta.
Nessa diversidade cultural e produtiva, a Agricultura Familiar possui uma importância
fundamental no processo de desenvolvimento do país em suas várias dimensões. Do ponto de
vista da garantia da sobrevivência das famílias, percebe-se que a produção para o consumo
garante a segurança alimentar de inúmeras famílias que moram no campo. Além do
autoconsumo, a produção na agricultura familiar possui a capacidade de fornecer volumes de
alimentos ao mercado, ampliar o acesso aos alimentos e garantir a reciprocidade entre produção
e consumo nas relações campo e cidade.
A ênfase na Agricultura Familiar justifica-se pela importância histórica, social e
econômica que esta modalidade de organização social e produtiva apresenta no campo
brasileiro. Considerando que é uma atividade produtiva complexa, os agricultores familiares se
revestem de uma particularidade que os diferenciam dos trabalhadores urbanos ou dos
produtores rurais, que atuam nas propriedades de grande porte e dependem de mão de obra
externa maior que a mão de obra da família.
A propriedade do agricultor familiar é considerada “pequena” com poucos módulos
rurais e, via de regra, insuficiente para a manutenção de todos membros da família.
Historicamente, o agricultor familiar produz nesse espaço praticamente tudo o que é necessário
para garantir a existência dos seus filhos, tais como alimentos, lazer e abrigo. Em decorrência
desse processo produtivo, existe nesse ambiente uma forte tendência à solidariedade, apesar de
8
Aquele que industria, ou seja, que tem habilidade ou aptidão para realizar algo, especialmente para executar
trabalho manual; arte, destreza, perícia capacidade de criar, de produzir com arte, habilidade, sensibilidade;
artifício, criatividade, engenho ato de colocar essas habilidades em prática; ação, atividade, obra.
18
que estes valores têm sido afetados intensamente, nas últimas décadas, com a multiplicação e
massificação do meios de difusão ideológica, propagadores de ideais de mercado como
competitividade e individualismo, com influência bastante negativa nas relações históricas de
vizinhança e cooperação. O vizinho - histórico aliado e parceiro incondicional - passa a ser visto
como concorrente ou, no mínimo, como alguém a ser tratado com indiferença quando em
situação de dificuldade.
Neste tipo de organização social nem sempre é necessária uma divisão rígida das
atividades. Dessa forma, o modo de produção está fundado no trabalho solidário da família
consanguínea e a família comunitária, ao passo que a circulação de moeda é menor que a
circulação de mercadorias e serviços. Ainda pode-se observar a prática dos mutirões, traição ou
surpresa9
, troca de dias, aluguel de mão-de-obra entre outras formas produtivas que representam
o universo do trabalho no campo.
Dada a sua vitalidade para garantir a qualidade de vida dos povos do campo, das águas e
das florestas, a Agricultura Familiar torna-se o eixo articulador no processo educacional do
ProJovem Campo – Saberes da Terra simbioticamente integrada ao desenvolvimento
sustentável. Ela representa a base do fazer pedagógico, do currículo e da metodologia do
Programa, centrada na formação dos jovens agricultores com vistas à construção de um novo
projeto de educação e sociedade do campo, voltado para o aprendizado e multiplicação de
conceitos, princípios e práticas necessárias à construção de um país que, socializando o trabalho,
garanta os direitos, promova a solidariedade e distribua os resultados da produção coletiva,
rumo à crescente eliminação das desigualdades, preconceitos e injustiças.
9
Atividades coletivas que simbolizam a solidariedade, o festejar coletivo, a cultura do campo, entre outras
manifestações, onde o beneficiado é surpreendido pela comunidade que, reunida, vem prestar seu apoio e
solidariedade na realização de trabalhos necessários na unidade familiar.
19
3. PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO INTEGRADO
3.1. Objetivo Geral
Desenvolver políticas públicas de Educação do Campo e de Juventude que oportunizem
a jovens agricultores (as) familiares excluídos do sistema formal de ensino a escolarização em
Ensino Fundamental na modalidade de Educação de Jovens e Adultos, integrado à qualificação
social e profissional.
3.2. Objetivos Específicos
Elevar a escolaridade e proporcionar a qualificação profissional inicial de
agricultores(as) familiares;
Estimular o desenvolvimento sustentável, com recorte agroecológico e enfoque
territorial, como possibilidade de vida, trabalho e constituição de sujeitos
cidadãos no campo;
Fortalecer o desenvolvimento de propostas pedagógicas e metodologias
adequadas à modalidade de EJA no campo;
Realizar formação continuada em metodologias e princípios político-
pedagógicos voltados às especificidades do campo para educadores(as) atuantes
no Programa;
Fornecer e publicar materiais pedagógicos que sejam apropriados ao
desenvolvimento da proposta pedagógica;
Conceder auxílio financeiro aos educandos, minorando carências materiais que
poderiam impedir sua frequência ou manutenção no curso.
20
3.3. Público beneficiário
Jovens agricultores(as) familiares na faixa etária de 18 a 29 anos, residentes no campo,
que saibam ler e escrever, mas que não concluíram o Ensino Fundamental.
São considerados agricultores familiares os educandos que cumpram os requisitos do art.
3º da Lei nº 11.326. de 24 de julho de 2006.
3.3.1. Inscrição, matrícula e organização das turmas
É responsabilidade do proponente a inscrição, a matrícula e a organização das turmas.
Cada turma deve ser constituída de no mínimo 25 alunos e no máximo de 35 alunos.
Para inscrever-se no ProJovem Campo – Saberes da Terra, o interessado deverá:
• ser alfabetizado, ou seja, apresentar domínio da leitura e da escrita e ter noções
matemáticas (que possam ser detectados através de preenchimento de ficha de
inscrição, preenchida pelo próprio interessado);
• ser agricultor/a familiar10
, na faixa etária, entre 18 e 29 anos;
• residir ou trabalhar nas regiões de abrangência do projeto aprovado,
especialmente em municípios localizados nos territórios de cidadania;
• não ter concluído o Ensino Fundamental;
• não estar matriculado em curso regular.
3.4. Metas
O ProJovem Campo – Saberes da Terra tem meta prevista no PPA o atendimento de
275 (duzentos e setenta e cinco) mil jovens agricultores(as) familiares, sendo: 35 (trinta e cinco)
mil em 2008, 24 mil (vinte e quatro mil) em 2009, 80 (oitenta) mil em 2010 e 85 (oitenta e
cinco) mil em 2011.
10
Serão considerados agricultores familiares os educandos que cumpram os requisitos do art. 3º
da Lei no
11.326, de 24 de julho de 2006.
21
3.5. Pressupostos do ProJovem Campo – Saberes da Terra
O ProJovem Campo – Saberes da Terra se orienta, principalmente, pelos seguintes
pressupostos:
• A educação como afirmação, reconhecimento, valorização e legitimação das
diferenças culturais, étnico-raciais, de geração, de gênero, da diversidade de
orientação sexual e socioambiental, visando a superação dos preconceitos, a
eliminação das desigualdades e o fortalecimento da solidariedade;
• Independente do nível de escolaridade, os povos do campo, das águas e das
florestas são sujeitos de direito e de conhecimento;
• A EJA é elemento constitutivo da política pública nos sistemas de ensino dos
entes federativos, direito dos povos do campo, instrumento de emancipação e
uma estratégia viável para fortalecer o desenvolvimento sustentável com
enfoque territorial;
• A efetivação do dever do Estado com educação escolar pública, mediante a
garantia de ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que
a ele não tiveram acesso na idade própria e, a oferta de educação escolar
regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas
às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem
trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola;
• O trabalho e a qualificação profissional como direitos dos povos do campo,
devendo a educação escolar vincular-se ao mundo do trabalho e à prática
social;
• Além das políticas públicas de educação do campo, existem sujeitos sociais
que possuem projetos político pedagógicos próprios.
3.6. Aspectos Legais
A legislação educacional brasileira apresenta uma sólida base legal para a instituição de
políticas públicas diferenciadas, destinadas ao atendimento escolar das pessoas que vivem e
trabalham no campo. Construir um Projeto Político-Pedagógico que possa inserir o calendário
escolar às condições climáticas e ao ciclo agrícola, contextualizar a organização curricular e as
22
metodologias de ensino às características e realidades da vida dos povos do campo são
determinações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 (LDBEN).
Desse modo, o presente Programa fundamenta-se na e trata da implementação da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº 9.394/96. Em seu Art. 4º, a referida lei
estabelece que:
O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a
garantia de:
I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não
tiveram acesso na idade própria; (...)
VII - oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com
características e modalidades adequadas às suas necessidades e
disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de
acesso e permanência na escola.
A LDBEN determina em seu Art. 5º que “o acesso ao ensino fundamental é direito
público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária,
organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério
Público, acionar o Poder Público para exigí-lo”. Para assegurar a obrigatoriedade escolar o
poder público deverá criar “formas de acesso aos diferentes níveis de ensino,
independentemente da escolarização anterior” (Art. 5º § 5º).
É garantido ainda na LDBEN em seu Art. 37 que “A Educação de Jovens e Adultos será
destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e
médio na idade própria”. Nos parágrafos desse artigo são estabelecidos que:
§ 1º. Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e
aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular,
oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as
características do alunado, seus interesses, condições de vida e de
trabalho, mediante cursos e exames.
§ 2º. O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a
permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e
complementares entre si.
Reconhecendo as especificidades da Educação do Campo, a referida Lei estabelece no
seu Art. 28o
que:
Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de
ensino promoverão as adaptações necessárias a sua adequação às
peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:
23
I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais
necessidades e interesses dos alunos da zona rural;
II - organização escolar própria incluindo a adequação do calendário
escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;
III - adequação ao trabalho na zona rural.
Sobre as formas de organização da Educação Básica a lei prevê em seu Art. 23:
A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos
semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos
não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios,
ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo
de aprendizagem assim o recomendar.
§ 2º. O calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais,
inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de
ensino, sem com isso reduzir o número de horas letivas previsto nesta
Lei. (Art. 23º).
Esse aspecto é de fundamental importância para a integração entre trabalho e
escolarização, pois possibilita a permanência dos estudantes na escola, o que torna a adequação
do calendário escolar um fator significativo para o acesso e progressão dos estudantes no
sistema educacional.
A dimensão da qualificação profissional inicial do Programa é assegurada legalmente
com os seguintes Artigos da LDBEN Lei nº 9394/96:
Art. 39. A educação profissional, integrada às diferentes formas de
educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente
desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva.
§ único. O aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e
superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará
com a possibilidade de acesso à educação profissional.
Art. 40. A educação profissional será desenvolvida em articulação com o
ensino regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em
instituições especializadas ou no ambiente de trabalho.
Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profissional, inclusive
no trabalho, poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e
certificação para prosseguimento ou conclusão de estudos.
O Decreto nº 5.154/2004 que regulamenta os artigos de 39 a 41 da LDBEN,
apresentados acima, determina que a educação profissional será desenvolvida por meio de:
24
Cursos e programas de formação inicial e continuada nos formatos
capacitação, aperfeiçoamento, especialização e atualização em todos os
níveis de escolaridade, ofertados segundo itinerários formativos,
objetivando o desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva e
social (Art. 3º).
Estabelece ainda o § 2º do Art. 3º do mesmo Decreto:
Os cursos mencionados (...) articular-se-ão preferencialmente, com
cursos de educação de jovens e adultos, objetivando a qualificação para
o trabalho e a elevação do nível de escolaridade do trabalhador, o qual,
após a conclusão com aproveitamento dos referidos cursos, fará jus a
certificados de formação inicial ou continuada para o trabalho.
O Plano Nacional de Educação (Lei 10.172/2001) prevê que o Estado deve:
Assegurar, em cinco anos, a oferta de educação de jovens e adultos
equivalente às quatro séries iniciais do ensino fundamental para 50% da
população de 15 anos e mais que não tenha atingido este nível de
escolaridade.
Assegurar, até o final da década, a oferta de curso equivalentes às quatro
séries finais do ensino fundamental para toda a população de 15 anos e
mais que concluiu as quatro séries iniciais.
Estabelecer programa nacional de fornecimento, pelo Ministério da
Educação, de material didático-pedagógico, adequado a clientela, para
os cursos em nível de ensino fundamental para jovens e adultos.
Assegurar que os sistemas estaduais de ensino, em regime de
colaboração com os demais entes federativos, mantenham programas de
formação de educadores de jovens e adultos.
Dobrar em cinco anos e quadruplicar em dez anos a capacidade de
atendimento nos cursos de nível médio para jovens e adultos.
De acordo com o Art. 3º das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas
do Campo (2002):
O Poder Público, considerando a magnitude da importância da educação
escolar para o exercício da cidadania plena e para o desenvolvimento de
um país cujo paradigma tenha como referências a justiça social, a
solidariedade e o diálogo entre todos, independentemente de sua
inserção em áreas urbanas ou rurais, deverá garantir a universalização do
acesso da população do campo à Educação Básica e à Educação
Profissional de Nível Técnico.
25
A Resolução 01/2002 do CNE/CEB, em seu Art. 6º estabelece:
O Poder Público no cumprimento das suas responsabilidades com o
atendimento escolar e à luz da diretriz legal do regime de colaboração
entre a União, os estados, o Distrito federal e os municípios,
proporcionará Educação infantil e Ensino Fundamental nas comunidades
rurais, inclusive para aqueles que não o concluíram na idade prevista,
(...).
Na Resolução supracitada é estabelecido no Art. 7º:
É de responsabilidade dos respectivos sistemas de ensino, por meio de
seus órgãos normativos, regulamentar as estratégias específicas de
atendimentos escolar do campo e a flexibilização da organização do
calendário escolar, salvaguardando, nos diversos espaços pedagógicos e
tempos de aprendizagem, os princípios da política da igualdade.
O Plano Nacional de Juventude11
ao enfocar a juventude rural, propõe como objetivos e
metas disseminar programas de capacitação e formação profissional na área rural, implantar
programas de estímulo a agroecologia e à produção orgânica; buscar capacitação para a
juventude rural em organização da produção, entre outros objetivos. O ProJovem Campo –
Saberes da Terra vem ao encontro dos fundamentos, objetivos e metas do referido Plano.
As possibilidades e, mais que isso, as exigências apontadas pela legislação educacional
brasileira e os instrumentos da política de juventude, aliadas a uma proposta de educação
brasileira que coloca na agenda pública de um governo democrático popular a diversidade, a
inclusão e a cidadania fortalecem a importância e necessidade de uma política de Estado para as
populações do campo.
Por ser uma política pública nova e recente, exige dos entes federativos e seus
respectivos conselhos e sistemas de ensino, a regulamentação e adequação de suas leis, normas,
no que for necessário, para viabilizar as condições necessárias à sua implementação.
3.7. Bases conceituais de referência do Programa
O ProJovem Campo – Saberes da Terra caracteriza-se por levar em conta as
especificidades do campo e as condições de vida dos (as) jovens agricultores (as) familiares.
Responder efetivamente esse desafio pedagógico requer a definição de bases conceituais
que criam a referência político-pedagógica do Programa, entre elas a concepção de campo,
11
Projeto de Lei 4.530/2004.
26
educação do campo, educação de jovens e adultos, desenvolvimento sustentável, trabalho,
economia solidária e qualificação social e profissional.
3.7.1. Campo
Concebe-se o campo como um universo socialmente integrado ao conjunto da sociedade
brasileira e ao contexto atual das relações econômicas internacionais, mantendo particularidades
históricas, sociais, culturais e ecológicas que o diferenciam de qualquer espaço social e
produtivo.
A manutenção dessas particularidades é o reflexo da compreensão de campo enquanto
produto e produtor de culturas, não se supondo, portanto a sua existência como um universo
isolado, autônomo em relação ao conjunto da sociedade e que tem uma lógica exclusiva de
funcionamento e reprodução.
O campo compreendido a partir do conceito de territorialidade é o lugar marcado pelo
humano e pela diversidade cultural, étnico-racial, pela multiplicidade de geração e recriação de
conhecimentos-saberes que são organizados com lógicas diferentes, de lutas, de mobilização
social, de estratégias de sustentabilidade. Espaço emancipatório, quando associado à construção
da democracia e de solidariedade de lutas pelo direito à terra, à educação, à saúde, à organização
da produção e pela preservação da vida. Assim, o desenvolvimento humano, ampliação e
socialização do patrimônio cultural, por meio dos vínculos sociais, culturais e de relações de
pertencimento a um determinado lugar como um espaço vivido, são imprescindíveis para o
desenvolvimento territorial sustentável12
.
Mais do que um perímetro não-urbano, o campo expressa um conjunto de possibilidades
que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria produção das condições da
existência social, material e imaterial, e com as realizações da humanidade. Toda essa
diversidade de coletivos humanos apresenta formas específicas de produção de conhecimentos-
saberes, ciência, tecnologias, valores e culturas, devem ser respeitadas e incorporadas nas
políticas públicas e nos projetos pedagógicos. Por isso, o campo e a cidade ou o rural e o urbano
são apreendidos como duas partes intercomplementares de um continuum, com especificidades
que não se anulam e nem se isolam, mas, antes de tudo, articulam-se.
12
Conceito difundido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Proposta técnica de intercâmbios de
experiências inovadoras de educação e cultura para o fortalecimento do desenvolvimento territorial, s.d. (mimeo.)
27
3.7.2. Educação do Campo
O ProJovem Campo – Saberes da Terra concebe a Educação do Campo como um
projeto de desenvolvimento da sociedade do campo que incorpora os espaços das florestas, das
águas, acolhendo a si os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos, extrativistas, entre outros, e
fundamentando-se nas práticas sociais constitutivas dessas populações: os seus conhecimentos,
habilidades, potencialidades, sentimentos, valores, modo de ser e de produzir, de se relacionar
com a terra e formas de compartilhar a vida.
Fundamentada nas práticas sociais dos agricultores familiares, a Educação do Campo
enfrenta os processos de alienação dirigidos contra si, tais como, o esvaziamento e a
precarização da produção, da cultura e da escola do campo. Segundo essa visão de alienação,
existe um esvaziamento cultural do trabalho e da educação, provocado pela desvalorização
crescente da escola e da cultura do campo diante do avanço da modernização da agricultura no
Brasil. Sobre essa lógica, Arroyo (2004) enfatiza que a modernização da agricultura nunca foi
um potencial de desenvolvimento da escola do campo, pelo contrário, aquela considera esta
como um espaço vazio, inculto, através da qual para trabalhar com a enxada poucas letras
bastam e que o agronegócio provoca a expulsão da terra e aumenta a precarização da força
humana que trabalha na terra.
A Educação do Campo sustenta-se na valorização da vida do campo com o objetivo de
construir políticas públicas que garantam o direito de trabalhar e estudar no campo
satisfatoriamente, o que significa construir um paradigma solidário e sustentável nas relações
entre a educação, Agricultura Familiar e os demais aspectos culturais e produtivos dos povos do
campo.
As Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (CNE/CEB,
2002), expressam no Art. 2º, § Único, uma compreensão de Educação do Campo que vincula a
identidade da escola à valorização da vida camponesa:
A identidade da escola do campo é definida pela sua vinculação as questões
inerentes a sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos
estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e
tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de
projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade
social da vida coletiva no país. (Grifo nosso)
Considerando que a educação do campo não se resume à escola, as Diretrizes
Operacionais incentivam a construção de Projetos Institucionais das escolas do campo que
devam ser a “expressão do trabalho compartilhado” e constituindo-se num “espaço público de
investigação e articulação de experiências e estudos direcionados para o mundo do trabalho”, a
28
fim de se buscar um “desenvolvimento socialmente justo, economicamente viável e
ecologicamente sustentável” das práticas sociais dos povos do campo (Art. 4º).
Como se vê, a Educação do Campo compreende que os sujeitos têm história, participam
de lutas sociais, têm nome e rostos, gêneros, raças, etnias e gerações diferenciadas. O que
significa que um projeto de educação do campo leva em conta as pessoas e os conhecimentos
que estas possuem, por apropriação ou produção, mediadas pelos conflitos das relações sociais.
Dois aspectos precisam ser considerados na Educação do Campo: o primeiro, diz
respeito à superação da dicotomia entre rural e urbano e o segundo, à necessidade de recriar os
vínculos de pertença dos sujeitos ao campo. Esses dois aspectos somados à diversidade dos
povos do campo exigem um processo educativo que afirme a educação como um processo ao
longo da vida.
Essa compreensão resulta na promoção de uma identidade coletiva que fortalece a
criação de cooperação entre os diversos segmentos sociais, visando a criação de políticas
públicas por meio de novas experiências de escolarização e de transformações no processo
educacional.
O ProJovem Campo – Saberes da Terra fundamenta-se nesses marcos teóricos e
operacionais de Educação do Campo e propõe a construção de um projeto educativo onde os
cidadãos do campo sejam respeitados como sujeitos das suas produções, das suas culturas e que
possam utilizar os recursos naturais de modo sustentável na produção e reprodução de sua
própria existência.
3.7.3. Educação de jovens e adultos (EJA)
O Art. 3º da Declaração de Hamburgo, realizada em 1997, na qual foram firmados
compromissos pautados na concepção de educação de jovens e adultos na perspectiva da
educação continuada ao longo da vida, afirma que:
A educação de adultos engloba todo o processo de aprendizagem formal ou
informal, onde pessoas consideradas “adultas” pela sociedade desenvolvem
suas habilidades, enriquecem seu conhecimento e aperfeiçoam suas
qualificações técnicas e profissionais, direcionando-as para a satisfação de suas
necessidades e as de sua sociedade. A educação de adultos inclui a educação
formal, a educação não-formal e o espectro da aprendizagem informal e
incidental disponível numa sociedade multicultural, onde os estudos baseados
na teoria e na prática devem ser reconhecidos.
29
Essa concepção permite superar a de EJA como política compensatória, cujo único papel
seria repor a escolarização de pessoas que não tiveram acesso à escola em fase anterior da sua
vida. Essa modalidade de ensino deve “contemplar os diferentes espaços de aprendizagem,
formais ou não-formais, por meio dos quais os jovens e adultos possam desenvolver suas
aptidões, conhecimentos e qualificações”. Desse modo, a EJA deve possibilitar “a
transformação dos indivíduos em sujeitos com maior autonomia e melhores condições de
enfrentamento das questões que envolvem a sociedade brasileira.13
”.
O Programa tem nos jovens de 18 a 29 anos o seu foco principal, mas orienta-se também
pela legislação da EJA. A Resolução CNE/CEB 1/2000 que estabelece as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a EJA determina no Art. 5º, parágrafo único:
(...) a identidade própria da Educação de Jovens e Adultos considerará as
situações, os perfis dos estudantes, as faixas etárias e se pautará pelos
princípios de eqüidade, diferença e proporcionalidade na apropriação e
contextualização das Diretrizes Curriculares Nacionais e na proposição
de um modelo pedagógico próprio de modo a assegurar:
I.Quanto à eqüidade, a distribuição específica dos componentes
curriculares a fim de proporcionar um patamar igualitário de formação e
restabelecer a igualdade de direitos e de oportunidades face ao direito à
educação;
II.Quanto à diferença, à identificação e ao reconhecimento da alteridade
própria é inseparável dos jovens e dos adultos em seu processo
formativo, da valorização do mérito de cada qual e do desenvolvimento
de seus conhecimentos e valores;
III.Quanto à proporcionalidade, a disposição e alocação adequadas dos
componentes curriculares face às necessidades próprias da EJA com
espaços e tempos nos quais as práticas pedagógicas assegurem aos seus
estudantes identidade formativa comum aos demais participantes da
escolarização básica.
As Diretrizes Curriculares para a EJA destacam ainda que a identidade específica dos(as)
estudantes que frequentam a EJA é diferente dos estudantes presentes nos cursos regulares e
recomendam que “o perfil dos estudantes da EJA e suas situações reais devem constituir o
núcleo da organização da proposta pedagógica” a ser desenvolvida. Para tanto, o desafio deste
Programa integrar em sua organização curricular o trabalho à elevação de escolaridade.
13
MEC. Educação de Jovens e Adultos, 2004, p. 1 (Mimeo.)
30
3.7.4. Desenvolvimento sustentável
O ProJovem Campo – Saberes da Terra entende que o desenvolvimento e a
sustentabilidade são relativos quanto ao tempo e ao espaço. São, portanto, históricos e
geográficos, econômicos, políticos, culturais, sociais e ambientais. O desenvolvimento
sustentável traz a promessa de conciliar eqüidade social, crescimento econômico, mercado e
preservação do meio ambiente no que diz respeito aos padrões de uso e sustentabilidade dos
recursos naturais e à promoção da sociedade.
No caso mais particular do campo, o desenvolvimento sustentável localmente
estabelecido prima pela manutenção dos ecossistemas, dos agroecossistemas e das culturas
locais, sendo fundamental estabelecer sua ligação, interação e relação com o todo; mas esse
desenvolvimento começa com as práticas imediatas e as vivências dos povos do campo e toda a
sua riqueza e diversidade socioculturais e etnoculturais. Portanto, seus conhecimentos-saberes e
tradições.
Para se tornarem eficazes, as estratégias de desenvolvimento sustentável do campo
devem incorporar não somente dimensões tecnológicas e/ou restrito à substituição de insumos.
Desenvolvimento sustentável, como a própria agroecologia - presente nas práticas de famílias,
grupos, associações e redes de agricultores familiares, - pressupõe a abrangência das questões
sociais, econômicas e políticas. A sustentabilidade e o meio ambiente implicam que, nas
investigações, nas pesquisas que os sujeitos educativos efetuam e elaboram sobre o campo,
devem remeter sua análise aos aspectos sociais, econômicos e ecológicos, de modo a promover
a compreensão da sustentabilidade como um todo e, mais em particular, a agrária-agrícola-
camponesa, bem como os fenômenos relativos aos processos culturais e às relações
socioambientais que os agricultores familiares vivenciam.
3.7.5. Trabalho e economia solidária
Para o ProJovem Campo – Saberes da Terra, o trabalho e a economia solidária
representam a construção de um novo modelo de mundo e educação do campo. O trabalho é o
processo pelo qual os sujeitos do campo reconstroem a sua história por meio da transformação
da natureza e das relações sociais, produzindo culturas e um conjunto de aprendizagens que
criam sentido às relações dos seres humanos com os outros e com o mundo.
A economia solidária surge como resgate da luta histórica dos(as) trabalhadores(as) na
defesa contra a exploração do trabalho humano e como alternativa ao modo capitalista de
organizar as relações sociais dos seres humanos entre si e destes com a natureza (FBES, 2003).
31
Compreende-se então que trabalho e economia solidária adquirem centralidade na
formação dos jovens agricultores no Brasil por se tornarem um poderoso instrumento de
garantia de condições fundamentais à emancipação e alternativas de enfrentamento das
sucessivas crises da sociedade capitalista. Ambos apresentam uma alternativa viável de geração
de emprego e renda por meio de ações de cooperação, associativismo, crédito comunitário, entre
outras formas coletivas de atuar e produzir valores solidários nas relações de produção. Os
espaços de trocas solidárias e comercialização justa, preferencialmente de contato direto entre os
agricultores familiares e os consumidores, são também espaços privilegiados de pesquisa,
produção e socialização de conhecimentos, aprendizado e emancipação.
3.7.6. Qualificação social e profissional
A qualificação social e profissional (relação social construída pela interação dos agentes
sociais do trabalho em torno da propriedade, significado e uso do conhecimento construído no e
pelo trabalho) é um complexo construto social. Por ser intimamente ligado à produção e
reprodução da força de trabalho, têm um enorme papel na possibilidade dos indivíduos
adentrarem, permanecerem ou serem excluídos do processo produtivo (embora estas relações
possam extrapolar a esfera da produção).
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) enfatiza que a qualificação profissional
pode ser entendida como:
• Parte indissolúvel das Políticas de Trabalho, Emprego e Renda, sejam elas
urbanas ou rurais; públicas ou privadas; resultem em relações assalariadas,
empreendedoras individuais ou solidárias;
• Uma forma de educação profissional (formação inicial e continuada), devendo
estar articulada com a educação de jovens e adultos, a educação do campo e a
educação profissional de nível técnico e tecnológico;
• Um processo de construção de políticas afirmativas de gênero, etnia e geração, ao
reconhecer a diversidade do trabalho e demonstrar as múltiplas capacidades;
• Uma forma de reconhecimento social do conhecimento do trabalhador, ou seja,
de certificação profissional e ocupacional que deve estar articulada com
classificações de ocupações, profissões, carreiras e competências;
32
• Uma necessidade para o/a jovem e o/a adulto/a, em termos de orientação
profissional para sua inserção no mundo do trabalho;
• Um objeto de disputa de hegemonia, com a negociação coletiva da qualificação e
certificação profissionais devendo integrar um sistema democrático de relações
de trabalho.
Por esta multidimensionalidade, a qualificação nunca é apenas “profissional” (dimensão
técnica), mas sempre “social” (dimensão sociolaboral). Fala-se, portanto, em qualificação
social e profissional para denominar as ações de formação voltadas para uma inserção
autônoma, solidária e empoderada no mundo do trabalho. A qualificação social e profissional
permite a inserção e atuação do cidadão no mundo do trabalho, com efetivo impacto para a vida
e o trabalho das pessoas14
. Para isso, faz-se necessário no decorrer do processo formativo:
A promoção de atividades político-pedagógicas baseadas em
metodologias inovadoras dentro de um pensamento emancipatório de
inclusão, tendo o trabalho como princípio educativo; o direito ao
trabalho como um valor estruturante da cidadania; a qualificação como
uma política de inclusão social e um suporte indispensável do
desenvolvimento sustentável, a associação entre a participação social e a
pesquisa como elementos articulados na construção desta política e na
melhoria da base de informação sobre a relação trabalho-educação-
desenvolvimento. (MTE, 2003, p. 25).
Tomando como referência essas diretrizes para a qualificação social e profissional, o
ProJovem Campo – Saberes da Terra contém o desafio de efetivar a integração entre
escolaridade e qualificação social e profissional relacionada aos processos produtivos do campo,
como possibilidade de melhoria das condições de trabalho e da qualidade social de vida da
população.
3.8. Princípios Político-Pedagógicos15
Os princípios político-pedagógicos que sustentam/norteiam o Programa são orientados
pelas Referências para uma Política Nacional de Educação do Campo e pelas Diretrizes
Curriculares Nacionais. São elas:
14
MTE. Plano Nacional de Qualificação 2003-2007, 2003, p. 24.
15
MEC. Referências para uma Política Nacional de Educação do Campo, 2004.
33
3.8.1. A escola formadora de sujeitos articulada a um projeto de emancipação
humana
Pauta-se pela necessidade de estimular os sujeitos da educação em sua capacidade de
criar com outros um espaço humano de convivência social desejável. Possibilitando aos sujeitos
constituírem-se enquanto seres sociais responsáveis e livres, capazes de refletir sobre suas
atividades, capazes de ver e corrigir os erros, capazes de cooperar e se relacionar eticamente,
porque não desaparece nas suas relações com o outro. Portanto, a educação como formação
humana é também uma ação cultural. Esse processo que envolve atitudes, valores e
comportamentos deve refletir também na dimensão institucional de forma permanente e
sistemática e deve atravessar toda a vida escolar.
3.8.2. A valorização dos diferentes saberes no processo educativo
A escola precisa valorizar os conhecimentos que estudantes, seus núcleos familiares e
comunidades possuem, estabelecendo um diálogo permanente com os saberes produzidos nas
diferentes áreas de conhecimento. O diálogo entre esses conhecimentos precisa garantir
elementos para a melhoria da qualidade de vida dos sujeitos envolvidos.
3.8.3. A compreensão dos tempos e espaços de formação dos sujeitos educativos
A Educação no Campo ocorre tanto em espaços escolares como fora deles. Envolve
conhecimentos-saberes, métodos, tempos e espaços físicos diferenciados. Portanto, não são
apenas os saberes construídos na escola, mas também aqueles construídos na produção, na
família, na convivência social, na cultura, no lazer e nos movimentos sociais. A escola do campo
é um espaço específico de sistematização, análise e de síntese das aprendizagens, se constituindo
assim, num local de encontro das diferenças, pois, é nela que se produzem novas formas de ver,
estar e se relacionar com o mundo.
34
3.8.4. A escola vinculada à realidade dos sujeitos
A escola do campo está vinculada à realidade dos sujeitos, realidade esta que não se
limita ao espaço geográfico, mas que se refere, principalmente, aos elementos socioculturais que
constituem os modos de vida desses sujeitos. Construir uma educação do campo significa pensar
numa escola sustentada no enriquecimento das experiências de vida, não em nome da
permanência nem da redução destas experiências, mas em nome de uma reconstrução dos modos
de vida, pautada na ética da valorização humana e do respeito à diferença. Uma escola que
possibilite aos educandos/as condições de optarem sobre o lugar onde desejam viver e produzir
as suas existências.
3.8.5. A educação como estratégia para o desenvolvimento sustentável
A educação para o desenvolvimento leva em conta a sustentabilidade ambiental, agrícola,
agrária, econômica, social, política, cultural, a eqüidade de gênero, racial, étnica e
intergeracional. Realizar uma educação com o desenvolvimento sustentável é considerar que o
local e o território podem ser reinventados por meio das suas potencialidades. Uma das formas
de trazer à tona essas potencialidades está na revitalização da importância do coletivo como
método de participação popular, de gestão das políticas e das comunidades onde vivem.
3.8.6. A autonomia e colaboração entre os sujeitos do campo e o sistema nacional de
ensino
É preciso estar atento para a diversidade existente entre os povos do campo. Isso
significa que não se pode construir uma política de educação idêntica para todos os povos do
campo. Neste sentido, adquire importância a ampla participação dos movimentos sociais e
organizações da sociedade civil na construção das políticas educacionais para que a identidade
do campo na sua complexa diversidade, e o compromisso com um projeto de desenvolvimento
sustentável para o mesmo estejam intrinsecamente articulados aos projetos pedagógicos.
3.8.7. O trabalho como princípio educativo
O trabalho como prática social e princípio educativo orienta teórico-metodologicamente
o desenvolvimento do Programa. Considerando aqui o trabalho como produção da existência
humana na relação com a natureza, num processo de humanização de homens e mulheres.
35
A formulação de projetos político-pedagógicos, na perspectiva da formação humana e da
garantia de direitos, é uma tarefa histórica a ser enfrentada por coletivos que reconheçam a
educação e a escola como estratégicas para a manutenção de um modo de vida e de sociedade.
Todo o conhecimento seja ele científico ou da prática social, é dado pela ação dos seres
humanos sobre a natureza e da sociedade pelo trabalho. Portanto, o eixo de todo conhecimento é
o trabalho humano. O trabalho como princípio educativo orienta o desenvolvimento do
Programa, de modo a resgatar os valores do trabalho coletivo e contribuir para a autonomia e o
empoderamento dos jovens agricultores familiares.
3.8.8. A pesquisa como princípio educativo
A pesquisa é princípio de todo o processo formativo. Como forma de intervenção da e na
realidade estrutura todo o processo elencado neste Projeto, assumindo, assim, a direção das
ações que pode ser visualizada no Plano de Pesquisa, nos debates em turma, na partilha de
saberes, nos círculos de diálogos, entre outras atividades que podem ser consultadas no Percurso
Formativo.
A realização da pesquisa é uma estratégia pedagógica para o estudo e o conhecimento da
realidade, para auxiliar os processos de transformação social, cultural, político e econômico. Ela
implica um trabalho conjunto de discussão e execução, no qual participam educadores e
educandos mediatizados sempre pela realidade a ser conhecida e transformada, confrontando
conceitos existentes, novas hipóteses e indagações significativas para a formulação de novos
conceitos, novas hipóteses e novas indagações que, por sua vez, realimentam o círculo virtuoso
da pesquisa-ação.
3.9. Organização Curricular
Antes de ser uma proposta pré-definida, o currículo orienta-se pelo diálogo constante
com a realidade, na interação dos sujeitos com a comunidade, estruturando-se em questões
desencadeadoras que articulam os conteúdos a partir da realidade prática dos educandos. Esta
concepção está em sintonia com o Plano Nacional de Qualificação: 2003-2007 (2003, p. 30)
quando orienta que uma educação integral do/a trabalhador/a supere as práticas de qualificação
profissional tidas como treinamento operacional, imediatista, segmentado e pragmático. A
concepção de currículo integrado requer:
• Um projeto pedagógico que tenha como eixos gerais articuladores os temas
do trabalho e da cidadania, para propiciar aos/às educandos/as uma
36
articulação virtuosa entre sua inserção no mundo do trabalho e sua
participação social e política;
• Uma construção curricular que envolva as dimensões técnico-científica,
sociopolítica, econômica, metodológica e ético-cultural.
O Programa Saberes da Terra baseia-se na construção de um currículo que tem como
referência principal a formação humana e o modo de produção e reprodução da vida, ou seja, as
relações sócio-históricas, políticas e culturais das comunidades do campo e, em âmbito maior,
do estado e do país. O foco do Programa é o jovem agricultor familiar, enquanto sujeito
histórico, na dialética de sua realidade, problemática, projetos e potencialidades.
A formação pretendida objetiva atender a uma formação geral integrada com a
qualificação social e profissional aportada em itinerários formativos. Nela, a atualização dos
conhecimentos necessários ao mundo do trabalho no campo sempre em mudança, deve
necessariamente reconhecer, por um lado, o conhecimento-saber acumulado pelos(as)
agricultores(as) familiares em sua cultura e sua trajetória e, por outro, a dimensão tecnológica e
organizacional cada vez mais presente no campo.
Para que a formação seja de fato integrada é necessário construir pontes entre os
conhecimento-saberes das áreas do ensino fundamental geral e os da qualificação social e
profissional, de modo a garantir a (re-)significação e/ou apropriação de tecnologias específicas,
dos processos de transformação presentes no campo, das temáticas de gestão e de controle dos
processos produtivos, da organização do trabalho e da organização da produção em constante
diálogo com as áreas de estudo que compõem o ensino fundamental.
Nesta perspectiva a organização curricular está fundamentada no eixo curricular
articulador Agricultura Familiar e Sustentabilidade que dialogará com os eixos temáticos:
Agricultura Familiar: Identidade, Cultura, Gênero e Etnia; Desenvolvimento Sustentável
e Solidário com Enfoque Territorial; Sistemas de Produção e Processos de Trabalho no
Campo; Economia Solidária e Cidadania, Organização Social e Políticas Públicas. Os eixos
temáticos agregam conhecimentos da formação profissional e das áreas de estudos para a
elevação de escolaridade.
Como apresenta o diagrama abaixo os Eixos Temáticos compõem partes integradas que
se articulam entre si e com o eixo articulador Agricultura Familiar e Sustentabilidade.
Às coordenações estaduais, comissões de educação do campo, instituições formadoras,
conselhos estaduais de educação e responsáveis pelos setores jurídico-administrativos coloca-se
o desafio de recriar, no âmbito de suas atribuições específicas, as condições, instrumentos,
rotinas, controles e regulamentos necessários e adequados para atender a esta política de
educação adequada aos jovens do campo.
37
3.9.1. Mudanças exigidas
Importante! - Como visto ao longo deste Projeto Base, o ProJovem Campo – Saberes
da Terra, embasado na legislação geral, na legislação específica da educação e nas normativas
da Educação do Campo, constitui-se como um programa de inclusão educacional bastante
diferenciado do modelo convencional de ensino. Esta diferenciação, imprescindível para tornar-
se adequada às características e necessidades dos jovens a que se destina, pressupõe, para sua
implementação, a criação e a garantia de condições também diferenciadas, nos estados. Só para
citar alguns exemplos:
a) Adequação do calendário escolar – que respeite/valorize o calendário de produção
(agrícola, extrativista, pesqueiro) e o regime de alternância mais apropriado ao desenvolvimento
do curso e participação dos educandos. As atividades do tempo-escola poderão ocorrer, de
acordo com a realidade de cada turma, diariamente, em etapas intensivas, em finais de semana
ou numa combinação entre as opções anteriores, sempre intercaladas com atividades do tempo-
comunidade a serem desenvolvidas nas unidades familiares e/ou comunidades, individualmente
ou em grupos.
b) Organização das alternâncias de tempos e espaços pedagógicos – Observando que
as atividades do tempo-comunidade precisam ser devidamente planejadas, durante o tempo-
escola e, na sua execução, acompanhadas pelos educadores responsáveis pela turma.
c) Exigência de formação continuada dos profissionais em exercício – abordando as
temáticas da organização curricular e outros temas necessários ao conhecimento e domínio da
concepção teórico e prática do Programa e da Educação do Campo.
d) Forma de contratação, carga horária e forma de atuação da equipe de
educadores – A concepção do programa transcende a lógica do ensino fragmentado em
disciplinas, completamente inadequado aos propósitos do Programa e às necessidades
educacionais e de qualificação social e profissional dos jovens participantes. Materializar a
concepção do Programa exige, neste aspecto, uma atuação diferenciada dos educadores que
deverão trabalhar colegiadamente, em equipe, com atribuições intercomplementares.
Diferentemente da escola convencional, o ProJovem Campo – Saberes da Terra exige
planejamento coletivo da equipe, no mínimo semanalmente, para que as atividades do tempo-
escola e do tempo-comunidade sejam executadas coerentemente com o que se propõe.
Assim como o profissional das Ciências Agrárias deve participar ativamente no
planejamento e execução do conjunto das atividades, como educador da turma, o
acompanhamento às atividades do tempo-comunidade também são de responsabilidade de toda
equipe. Obviamente, dependendo do tema e do foco da atividade, um ou outro profissional terá
papel diferenciado de coordenação, conforme sua experiência e área específica de formação.
38
No tempo-comunidade, embora a condução das atividades agrárias tenha maior
responsabilidade do profissional das Ciências Agrárias, simultaneamente, os educadores de
outras áreas acompanharão sempre, contribuindo no desenvolvimento da atividade,
identificando temas a serem trabalhados no tempo-escola e auxiliando o(s) educando(s) a
desenvolver(em), no seu espaço, habilidades que na escola demonstre(m) alguma dificuldade.
Portanto, é inviável conceber uma forma de contratação destes educadores em condições
idênticas às dos contratados para trabalhar de maneira individualizada, por disciplinas isoladas,
na rede escolar seriada. A contratação dos profissionais para o ProJovem Campo – Saberes da
Terra precisa garantir que eles possam participar dos tempos coletivos de
planejamento/preparação, das etapas de formação continuada e da realização colegiada das
atividades do tempo-escola e do tempo-comunidade. Dependendo da dinâmica de alternâncias e
da localização das turmas, cada equipe de educadores poderá atender, alternadamente, a duas
turmas.
3.10. Estrutura do Currículo
39
Sistemas de
Produção
e Processo de
Trabalho
no Campo
Agricultura Familiar,
Identidade, Cultura,
Gênero e Etnia
Desenvolvimento
Sustentável e Solidário
com Enfoque Territorial
Economia
Solidária
Cidadania,
Organização Social
e Políticas Públicas
AGRICULTURA
FAMILIAR E
SUSTENTABILIDADE
3.10.1 – Eixos Temáticos
Os Eixos Temáticos agregam conhecimentos da formação profissional e das áreas do
conhecimento para a elevação da escolaridade. Objetivam a formação de jovens agricultores que
se apropriem dos conhecimentos humanos e, que compreendam a tecnologia, as ciências e a
cultura como partes de uma única realidade, criada pela capacidade do ser humano pensar e
atuar sobre o mundo, pela sua capacidade de produzir cultura, técnica e conhecimentos.
A ementa básica de cada Eixo Temático é a seguinte, devendo ser adequada e
complementada em cada estado/região de acordo com suas características específicas:
 Agricultura Familiar, Identidade, Cultura, Gênero e Etnia – Estudo das relações
sociais no processo histórico de produção econômica e cultural da Agricultura Familiar,
seus problemas e potencialidades culturais nas dimensões de gênero, etnia, geração e de
identidade. Estudo das ocupações e transformações do ambiente, das diferentes
concepções de Agricultura Familiar e das relações campo-cidade.
 Sistemas de Produção e Processos de Trabalho no Campo - Estudo sobre questões
relacionadas à Agricultura Familiar e suas relações com os sistemas de produção; o papel
da família e da comunidade na transformação dos ecossistemas em agroecossistemas; a
sucessão vegetal e os possíveis limites, potencialidades e desafios dessa transformação
ecológica; as práticas dos sistemas de produção locais e sua reprodução social; a
produção e reprodução familiar, sua territorialidade e influências das relações de trabalho
internas e externas ao estabelecimento rural; compreender os processos de trabalho no
campo, inclusive os papéis dos membros da família e das pessoas da comunidade; estudo
das principais políticas agrárias e agrícolas que influenciam na produção familiar e
realidades do campo.
 Cidadania, Organização Social e Políticas Públicas - Estudo das organizações sociais,
da relação entre Estado e Sociedade Civil a partir do contexto sócio-histórico, discutindo
conceito de cidadania e princípios de ética; Análise dos conceitos de Estado, Governo,
Democracia suas relações com a legislação (Federal, Estadual, Municipal);
Conhecimento da trajetória dos Movimentos Sociais e das Organizações Sociais e suas
implicações na definição de Políticas Públicas; as estratégias organizativas locais; jovens
como foco de políticas públicas; educação no meio rural brasileiro e educação do campo.
Refletir as políticas públicas voltadas para o desenvolvimento do ensino e a valorização
40
das manifestações culturais e sociais; refletir sobre as políticas de saúde, educação,
esporte e lazer; Conselhos municipais e Cartas de Direito; Compreender as políticas para
a Agricultura Familiar: crédito, assistência técnica, seguro safra, geração de trabalho e
renda, mercados.
 Economia Solidária - Estudo do campo como local de formação de pessoas, de relações
sociais e econômicas; sistemas sociais e econômicos ao longo da história; modos de
produção e organização social; Legislação agrária e ambiental. Refletir sobre as formas
de economia solidária no Brasil: cooperativismo, associativismo, micro-crédito e
sistemas de crédito; Mercados solidários; Comercio justo. Análise conceitos de
solidariedade; relações sociais e econômicas presentes na sociedade em geral;
desenvolvimento humano e solidário.
 Desenvolvimento Sustentável e Solidário com Enfoque Territorial - Estudar,
pesquisar e refletir sobre conceitos básicos de desenvolvimento e sustentabilidade;
evolução histórica do termo Desenvolvimento Sustentável; desafios, limites e
potencialidades para o desenvolvimento sustentável; princípios e fundamentos da
Agroecologia; importância do uso racional dos recursos naturais; Políticas Públicas;
experiências de promoção do desenvolvimento local e territorial sustentável; práticas
sustentáveis nas unidades familiares de produção, microbacias hidrográficas e biomas
específicos.
A partir do eixo articulador Agricultura Familiar e Sustentabilidade, serão desdobrados
os conhecimentos que garantam uma base teórica fundamental e o desenvolvimento de
habilidades e competências gerais do ser humano – científicas, pedagógicas, técnicas, éticas,
morais, políticas e estéticas. Cada área de conhecimento deverá indicar os conhecimentos
necessários para desenvolver o pensamento científico dos educandos, organizando um programa
curricular básico.
As áreas do conhecimento chamadas a dialogar com os eixos temáticos são: Linguagem,
códigos e suas tecnologias; Ciências da natureza e linguagem matemática; Ciências
humanas; e, Ciências agrárias. Estas áreas estabelecem um diálogo entre si e, ao mesmo
tempo, cada uma contribui para ampliar a compreensão das práticas sociais como produtoras de
significados, servindo de referência para que as áreas de estudos ressignifiquem o conteúdo de
sua contribuição na explicitação da temática estudada.
41
Sendo assim, deverão ser construídas problemáticas que possibilitem perceber as
relações entre as áreas do conhecimento e os eixos temáticos, por exemplo:
• Quais as contribuições das ciências sociais, das ciências da natureza, das
linguagens e das linguagens matemáticas entre outras, para a compreensão e
explicação dos conhecimentos presentes nos eixos temáticos?
• Quais as articulações desses conhecimentos com o arco ocupacional?
Para o desenvolvimento da qualificação profissional inicial foi construído um arco
ocupacional que congrega um conjunto de atividades diversas realizadas pelos agricultores
familiares.
3.10.2. Arcos Ocupacionais
Arcos ocupacionais são conjuntos de ocupações relacionadas, ou seja, que possuem
base técnica comum, neste caso a agroecologia. Estes arcos devem abranger as esferas da
produção e da circulação (produção rural, agroindústria, comércio, prestação de serviços),
garantindo uma formação mais ampla e aumentando as possibilidades de inserção ocupacional
do/a trabalhador/a, seja como agricultor familiar, assalariado, auto-emprego ou
associado/cooperativado (economia solidária).
No âmbito do ensino fundamental cada instituição ao elaborar o projeto educativo
promoverá, junto com os educandos, educadores, organizações sociais e outro partícipes do
programa, estratégias para a escolha das atividades que apresentam possibilidades na região ou
aquelas que potencialmente poderão ser desenvolvidas. Estabelecer mecanismos de análise para
determinar aquilo que não está sendo desenvolvido, mas que existem possibilidades concretas
ou interesse em desenvolver, os educadores e professores através de consultas aos educandos
poderão encontrar quais são as atividades a serem escolhidas como tema de estudo.
O arco Produção Rural Familiar é composto por 5 ocupações e servirá como eixo
orientador e facilitador do processo de formação social e profissional, variando o(s) foco(s) de
acordo com as características de cada realidade e turma.
42
O arco Produção rural familiar deverá contemplar de modo transversal estudos em
meio ambiente, gestão e administração. Os conteúdos do currículo do ensino formal são
trabalhados em um processo de reflexão e aprofundamento das questões desencadeadas pelos
temas específicos de cada grupo de educandos, assim como os conceitos desenvolvidos nos
cursos dialogam com a experiência vivida pelo/a agricultor/a familiar.
As ocupações descritas no arco têm como base a Resolução n º 4/1999 do CNE:
ARCO OCUPAÇÕES
PRODUÇÃO RURAL
FAMILIAR
1. Sistemas de Cultivo
2. Sistemas de Criação
3. Extrativismo
4. Agroindústria
5. Aquicultura
3.11. Ementa da qualificação social e profissional
A) AGRICULTURA FAMILIAR
• A multifuncionalidade da Agricultura Familiar.
• Agricultura Familiar e a conservação da biodiversidade.
• Agricultura Familiar e a segurança alimentar e nutricional.
• O papel da mulher na Agricultura Familiar.
• O papel do jovem na Agricultura Familiar.
B) PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL
• Princípios da agroecologia.
• Sistemas de produção – orgânico, ecológico, em transição.
• Visão holística e sistêmica.
• Relação da Agricultura Familiar com o meio ambiente.
43
3.11.1. Formação Geral
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Projovem projetobase2009(1)

  • 1. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, ALFABETIZAÇÃO E DIVERSIDADE SECRETARIA DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA Projeto Base ProJovem Campo – Saberes da Terra Edição 2009 PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE JOVENS AGRICULTORES(AS) FAMILIARES INTEGRADA À QUALIFICAÇÃO SOCIAL E PROFISSIONAL Brasília/2009
  • 2. SUMÁRIO 1. Apresentação ...................................................................................................... 05 1.1. ProJovem Campo – Saberes da Terra ..................................................... 07 2. Justificativa ........................................................................................................... 09 2.1 - A Educação no Meio Rural Brasileiro ................................................... 10 2.2. Educação e juventude no Campo: breve diagnóstico .............................. 15 2.3. Agricultura Familiar ............................................................................ 17 3. Projeto Político-Pedagógico Integrado ................................................................ 20 3.1. Objetivo Geral .......................................................................................... 20 3.2.Objetivos Específicos ................................................................................. 20 3.3. Público beneficiário ................................................................................... 21 3.4. Metas .................................... .................................................................... 21 3.5. Pressupostos do ProJovem Campo – Saberes da Terra ............................ 22
  • 3. 3.6. Aspectos Legais ........................................................................................ 22 3.7. Base Conceitual de Referência do Programa ........................................... 27 3.8. Princípios Político-Pedagógicos ............................................................... 33 3.9. Organização Curricular ........................................................................... 36 3.10. Estrutura do Currículo ........................................................................... 39 3.11. Ementa da Qualificação Social e Profissional ....................................... 43 3.12. Aprendizagens Pretendidas ...................................................................... 49 4. Organização dos Tempos e Espaços Formativos .................................................. 51 4.1. Tempo Escola ............................................................................................. 52 4.2. Tempo Comunidade ..................................................................................... 52 4.3. Aprendizagens do Tempo Escola – Tempo Comunidade ........................... 53 4.4. Carga Horária ............................................................................................... 54 4.5. Avaliação ..................................................................................................... 54 4.6. Transferências............................................................................................... 56 4.7. Projetos Produtivos ...................................................................................... 56 4.8. Conclusão e Certificação ............................................................................. 57 4.9. Possibilidades de organização da alternância nas turmas ........................... 58 5. Formação Continuada de Educadores e Coordenadores Pedagógicos .................59 6. Gestão e Monitoramento do Programa .................................................................. 63 6.1. Monitoramento ............................................................................................. 64
  • 4. 6.2. Acompanhamento ......................................................................................... 64 6.3. Estratégia de Gestão do Programa ................................................................ 65 7. Recursos Humanos e Financiamento ...................................................................... 70 7.1. Recursos Humanos ....................................................................................... 70 7.2. Recursos para entes executores .................................................................... 71 7.3. Pagamento de Auxílio Financeiro para Educandos ..................................... 72 7.4. Recurso para Formação Continuada ............................................................ 73 7.5. Cadernos Pedagógicos e Publicações de Apoio ........................................... 74 8. Referências Bibliográficas ...................................................................................... 75 9. Anexos Anexo I – Roteiro Para Projeto Pedagógicos Anexo II – Termo de Compromisso
  • 5. 1. APRESENTAÇÃO ““Na oferta de educação básica para a população rural, osNa oferta de educação básica para a população rural, os sistemas desistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação àsensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente: I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas àsI - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reaisreais necessidades e interesses dos alunos da zona rural;necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II - organização escolar própria, incluindo adequação doII - organização escolar própria, incluindo adequação do calendáriocalendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas; III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.”III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.” (LDBEN.(LDBEN. Art.28).Art.28). A construção de uma política educacional de Estado, adequada aos povos do campo1 , que dialogue com a diversidade nas diferentes realidades, aliada a construção de uma política nacional de juventude que reconhece os jovens do campo como sujeitos de direitos, constitui-se uma prioridade do atual Governo Federal. A Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD/MEC), para garantir o direito destes povos a uma educação adequada a suas características, necessidades e pluralidade (de gênero, étnico-racial, cultural, geracional, política, econômica, territorial e produtivas, entre outras), implementou o Programa Nacional de Educação de Jovens e Adultos para Agricultores/as Familiares integrada com Qualificação Social e Profissional, denominado Saberes da Terra. O Programa Saberes da Terra foi iniciado em dezembro de 2005 em 12 Unidades da Federação (BA, PB, PE, MA, PI, RO, TO, PA, MG, MS, PR e SC) em colaboração com secretarias estaduais de educação, representações estaduais da União Nacional dos Dirigentes Municipais em Educação – UNDIME, Associação de Municípios Cantuquiriguaçu, entidades e movimentos sociais do campo integrantes dos comitês e fóruns estaduais de Educação do Campo. 1 Estão sendo considerados povos do campo: agricultores/as familiares, assalariados, assentados ou em processo de assentamento, ribeirinhos, caiçaras, extrativistas, pescadores, indígenas, remanescentes de quilombos, entre outros povos que lutam pela afirmação dos seus direitos do campo no diversos biomas do território nacional. 5
  • 6. Durante a implantação do projeto piloto Saberes da Terra foram realizadas: • A formação de cinco mil e sessenta educandos, com certificação em nível de ensino fundamental integrado à qualificação social e profissional; • Formação continuada de seiscentos profissionais da educação – professores, educadores, técnicos e gestores participantes e/ou em exercício na execução do Programa; • Construção, em parceria com estados, municípios, organizações populares da sociedade civil e movimentos sociais de uma metodologia de Educação de Jovens e Adultos - EJA, integrada à qualificação social e profissional, realizando práticas pedagógicas de fortalecimento da Agricultura Familiar, da Economia Solidária e do Desenvolvimento Sustentável contextualizadas nas diferentes realidades e necessidades regionais e culturais. • A construção de metodologias para a elaboração de material pedagógico que possa ser replicado de acordo com o contexto de cada estado ou região. • Produção de cadernos pedagógicos que tratam dos Eixos Temáticos do Programa, em três estados participantes, com atuação fundamental de organizações de assessoria, populares, com experiência em educação do campo. • Quatro seminários nacionais de formação das equipes pedagógicas estaduais. No ano de 2007 o Ministério da Educação, por meio da SECAD, participou do processo de construção do programa nacional da juventude, conduzido pela Secretaria Nacional de Juventude/Presidência da República (SNJ/SG/PR), no qual foram integrados seis programas já existentes: a) Agente Jovem, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; b) ProJovem, da Casa Civil; c) Saberes da Terra e Escola de Fábrica, do Ministério da Educação; d) Consórcio Social da Juventude e Juventude Cidadã, do Ministério do Trabalho e Emprego. No processo de integração foi resguardada a autonomia político-pedagógica das experiências acumuladas por cada Programa. Como resultado desse processo foi instituído pela o Programa Nacional de Inclusão de Jovens – PROJOVEM, que objetiva promover a reintegração de jovens ao processo educacional, sua qualificação profissional e seu desenvolvimento humano e cidadão. O PROJOVEM está organizado em quatro modalidades: I) 6
  • 7. ProJovem Adolescente; II) ProJovem Urbano; III) ProJovem Trabalhador; e IV) ProJovem Campo – Saberes da Terra. A partir de então, o Saberes da Terra passou a denominar-se de ProJovem Campo- Saberes da Terra destinado à garantia de ensino fundamental a jovens agricultores/as, como política de educação, na modalidade EJA integrada à qualificação social e profissional. 1.1. Projovem Campo – Saberes da Terra O ProJovem Campo – Saberes da Terra constitui-se no Programa nacional de educação de jovens agricultores/as familiares, implementado pelo Ministério da Educação por meio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) e da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC), numa ação integrada com o ministérios do Desenvolvimento Agrário por meio da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF) e da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), do Trabalho e Emprego por meio da Secretaria de Políticas Públicas de Emprego (SPPE) e da Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), o Ministério do Meio Ambiente por meio da Secretaria de Biodiversidade e Floresta (SBF), o Ministério do Desenvolvimento e Combate à Fome e a Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) vinculada à Presidência da República. O Programa se destina ao desenvolvimento de uma política que fortaleça e amplie o acesso de jovens agricultores (as) familiares, situados na faixa etária de 18 a 29 anos, no sistema formal de ensino, e sua permanência tendo em vista a conclusão do Ensino Fundamental com qualificação social e profissional. Mais amplamente, é objetivo do Programa contribuir para a formação integral do jovem do campo, potencializando a sua ação no desenvolvimento sustentável e solidário de seus núcleos familiares e comunidades, por meio de atividades curriculares e pedagógicas, em conformidade com o que estabelecem as Diretrizes Operacionais para Educação Básica nas Escolas do Campo – Resolução CNE/CEB Nº 1 de 03 de abril de 2002. O recorte etário vem ao encontro do redesenho do Programa que passa a ser componente de duas políticas de Estado – de Educação do Campo e de Juventude – ambas indispensáveis para a qualificação social, formação profissional e construção da autonomia dos jovens do campo. Se, por um lado, restringe o acesso aos maiores de 30 anos, por outro, em relação ao Saberes da Terra, amplia visivelmente as condições de implementação: a) aumento de R$ 1.000,00 (um mil) reais para R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos) reais o investimento do 7
  • 8. Governo Federal por educando, repassado aos entes executores; b) garantia de recursos específicos para produção e distribuição dos cadernos pedagógicos; c) recursos específicos para realização da formação continuada, por meio de instituições de ensino superior públicas, na ordem de R$ 5.700,00 (cinco mil e setecentos) reais por cursista - profissional em exercício no Programa e, d) instituição de auxílio financeiro de R$ 1.200,00 (um mil e duzentos) reais por educando, pago em doze parcelas. O Programa será desenvolvido pelos entes federativos estaduais ou municipais com prioridade aos Territórios da Cidadania2 , em parceria com instituições de Ensino Superior públicas, organizações não-governamentais e movimentos sociais do campo. Embora os projetos e as transferências de recursos sejam exclusivamente a entes federativos – Estados e DF(podendo, também, vir-a-ser Municípios) e instituições de Ensino Superior públicas (IES), é fundamental, para a garantia das características, da identidade e da estratégia político- metodológica do Programa, que os projetos busquem e demonstrem a participação de outros sujeitos indispensáveis, tais como movimentos sociais e sindicais do campo, organizações populares de educação e assessoria com experiência em educação do campo, União Nacional de Dirigentes Municipais – UNDIME, EFA's, fóruns e comitês de educação do campo – incluindo a possibilidade de retribuição financeira por serviços eventuais, de pessoas físicas ou jurídicas destas parceiras, para atividades as quais estejam qualificadas a executar (seminários, oficinas, palestras, elaboração de material de apoio técnico-pedagógico, etc). Com a edição 2008, foram disponibilizadas pela SECAD/MEC 35.000 (trinta e cinco mil) vagas, distribuídas em 19 estados da Federação: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe - região Nordeste; Mato Grosso e Mato Grosso do Sul - região Centro-Oeste; Santa Catarina e Paraná - região Sul; Minas Gerais e Espírito Santo - região Sudeste; Amazonas, Pará, Rondônia e Tocantins - região Norte. A realidade da educação e da juventude do campo no país, demonstrada a seguir, reforça a importância de uma política de Educação do Campo e de Juventude, por meio de ações de formação/qualificação tais como ProJovem Campo – Saberes da Terra. 2 Para 2009, a relação completa dos municípios pertencentes a Territórios da Cidadania pode ser obtida no endereço: http://sit.mda.gov.br/territorio.php?menu=cidadania&base=2, no campo “Documentos”, “Planilha com a relação dos 120 Territórios da Cidadania com código do IBGE”. 8
  • 9. 2. JUSTIFICATIVA Na faixa etária de 18 a 29 anos existem mais de 6 milhões de jovens agricultores. A desigualdade entre os níveis de escolaridade entre as pessoas que vivem no campo e os que vivem nas cidades está claramente demonstrada nas pesquisas populacionais e educacionais. Dados da PNAD de 2006 mostram que 1.641.940 jovens do campo (26,16%), não concluíram o primeiro segmento do ensino fundamental e 3.878.757 (61,80%) não concluíram a segunda etapa do ensino fundamental. Enquanto que para os jovens das cidades, esta média é de 18% e 30%, respectivamente. Como demonstrado no Item 2.2., em todos os indicadores sociais e educacionais as populações do campo estão em desvantagem, sejam eles relativos à matrícula, ao desempenho educacional dos alunos, à formação dos profissionais de educação ou à infra-estrutura física das escolas. Essa realidade aponta para a necessidade de adoção de políticas que revertam a situação da educação oferecida aos povos do campo, das águas e das florestas, em idade escolar - a fim de se impedir que esse quadro se mantenha inalterado. Para além da situação comparativa, tomada a educação como direito subjetivo, em si só é motivo suficiente para exigir das políticas públicas o resgate dessa dívida histórica da sociedade brasileira para com os jovens e adultos que vivem no campo e não tiveram ainda tal direito assegurado. Para enfrentar esses problemas, não basta a mera oferta de escolarização, como extensão de uma escola urbana. É preciso que seja uma política educacional adequada aos povos do campo e que integre os conhecimentos próprios do ensino fundamental adequado e os de qualificação social e profissional, visando o desenvolvimento da solidariedade e a emancipação. É preciso, ainda, superar a dicotomia histórica entre a Educação Básica (fundamental, média e de jovens e adultos) e a formação profissional. Para isso, deve-se atuar na formação continuada de educadores (das áreas próprias do ensino fundamental e das ciências agrárias) e coordenadores, de modo a efetivamente promover a integração dos conhecimentos e fortalecer o desenvolvimento de metodologias adequadas às especificidades da EJA do campo, compreendido como sujeitos de conhecimentos e saberes significativos e, portanto, de educação, conforme já reconhecido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) nº 9.394/96. 9
  • 10. A importância histórica, social e econômica da Agricultura Familiar para o campo brasileiro é outra variável que deve ser considerada numa política adequada de ensino integrado à qualificação social e profissional. Dar ênfase a essa forma de organização do trabalho é valorizar a manutenção da família no controle sobre as decisões que se referem à cultura e à atividade a ser desenvolvida. Além disso, o trabalho exercido pelo grupo familiar destina-se prioritariamente ao sustento da própria família, não excluindo a produção de excedentes para comercialização e geração de renda. O Censo Agropecuário 1995/1996, realizado pelo IBGE, revelou que aproximadamente 85% do total de propriedades rurais do país pertenciam a grupos familiares. A atividade agrícola, para 13,8 milhões de pessoas representava praticamente a única alternativa de vida, em cerca de 4,1 milhões de estabelecimentos familiares, o que correspondia a 77% da população ocupada na agricultura. Cerca de 60% dos alimentos consumidos pela população brasileira vêm desse tipo de produção. A base legal e normativa para a instituição de políticas públicas diferenciadas para pessoas que vivem e trabalham no campo – LDBEN e Diretrizes Operacionais da Educação do Campo -, prescreve a adequação do calendário escolar às condições climáticas e ao ciclo agrícola, bem como a contextualização da organização curricular e das metodologias de ensino às características e realidades da vida dos povos do campo. 2.1 - A educação no meio rural brasileiro No âmbito das políticas públicas, equivocadamente pensava-se que o problema a ser resolvido para a educação das populações que vivem fora das cidades decorria apenas da localização geográfica das escolas e da baixa densidade populacional nas regiões rurais. Isso implicava, entre outras coisas, a necessidade de serem percorridas grandes distâncias entre casa e escola e o atendimento de um número reduzido de alunos, com conseqüências diretas nos gastos para a manutenção do então denominado ensino rural. O modelo escravocrata utilizado por Portugal para colonizar o Brasil e, mais tarde, os adotados pelos próprios brasileiros para a colonização do interior do país - de exploração brutal dos trabalhadores rurais pelos proprietários de terra, sendo sistematicamente negados aos primeiros seus direitos humanos, sociais e trabalhistas - geraram forte desigualdade e discriminação em relação aos povos que vivem e trabalham no campo, bem como uma enorme dívida social. Ao mesmo tempo, a suposição de que os conhecimentos tido como “universais” produzidos pelo mundo letrado ocidental deveria ser estendido – ou imposto – a todos, de acordo com a “capacidade” de cada um, serviu para escamotear a negação do direito a uma 10
  • 11. educação contextualizada, promotora de emancipação, de superação das desigualdades e de acesso aos bens econômicos e sociais, que respeitasse os modos de viver, pensar e produzir dos diferentes povos do campo. Coerente com a estrutura social e a concepção de educação hegemônicas, se ofereceu - a uma pequena parcela da população rural -, uma educação instrumental reduzida ao atendimento de necessidades educacionais elementares e ao treinamento de mão-de-obra. Paralelamente, os filhos dos proprietários rurais estudavam nas metrópoles, capacitando-se para funções “nobres”. Em 1932, foi lançado o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova3 , que buscava diagnosticar e sugerir rumos às políticas públicas de educação, preconizando a organização de uma escola democrática, no qual o Estado assumisse uma reação categórica, intencional e sistemática contra a velha estrutura do sistema educacional, a favor de um novo sistema de educação vinculado ao trabalho e à formação da personalidade moral. Segundo o Manifesto dos Pioneiros, a escola deveria proporcionar a aquisição de cultura geral comum e possibilitar especializações para as atividades de preferência intelectual (humanidades e ciências) ou de preponderância anual e mecânica (cursos de caráter técnico) agrupadas em: extração de matérias-primas - agricultura, minas e pesca; elaboração de matérias-primas - indústria; distribuição de produtos elaborados - transportes e comércio. Nessa proposta, porém, as demandas do campo e da cidade eram igualmente consideradas e contempladas. A separação entre a educação das elites e a das classes populares perdurou nas Leis Orgânicas da Educação Nacional, promulgadas a partir de 1942. De acordo com essas Leis, o objetivo do ensino secundário e normal seria “formar as elites condutoras do país” e o do ensino profissional oferecer “formação adequada aos filhos dos operários, aos desvalidos da sorte e aos menos afortunados, aqueles que necessitam ingressar precocemente na força de trabalho4 ”. Com o advento e crescimento das indústrias, demandantes de mão-de-obra em condições de ler os manuais e instruções para operar as máquinas, o número de escolarizados precisava ser ampliado. Na década de 1960, por interesse da elite brasileira preocupada com o crescimento do número de favelados nas periferias dos grandes centros urbanos, a educação rural foi adotada pelo Estado como estratégia de contenção do fluxo migratório do campo para a cidade. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961, em seu art. 105, estabeleceu que “os poderes públicos instituirão e ampliarão serviços e entidades que mantenham na zona rural escolas capazes de favorecer a adaptação do homem ao meio e o estímulo de vocações profissionais”. 3 O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova lutou por uma escola pública democrática, aberta a valorização das experiências dos educandos. Uma das idéias estruturais do movimento diz que as escolas deviam deixar de ser meros locais de transmissão de conhecimentos e tornar-se pequenas comunidades, onde houvesse maior preocupação em entender e adaptar-se a cada criança do que em encaixar todas no mesmo molde. 4 Leis Orgânicas do Ensino Secundário (Decreto-Lei n.º 4.244/42), do Ensino Industrial (Decreto-Lei n.º4.073/42); do Ensino Comercial (Decreto-Lei n.º 6.141/43); do Ensino Primário (Decreto-Lei n.º 8.529/46), do Ensino Normal (Decreto-Lei n.º 8.530/46) e do Ensino Agrícola (Decreto-Lei n.º 9.613/46). 11
  • 12. Dessa concepção surge a expressão inadequada “fixar o homem no campo”, reproduzida por várias décadas, suscitando tentativas de evitar que os povos do campo abandonassem suas atividades muito mais preocupadas em impedir o “êxodo” do que em garantir desenvolvimento adequado. O mesmo enfoque instrumentalista e de ordenamento social veio caracterizar a formação de técnicos para as atividades agropecuárias. Em meados da década de 1960, por ocasião da implantação do modelo Escola-Fazenda no ensino técnico agropecuário, os currículos oficiais foram elaborados com enfoque tecnicista para também atender ao processo de industrialização em curso. Simultaneamente à formação de técnicos, instituiu-se como política pública os serviços de “extensão rural”, destinados a levar para o campo os insumos e produtos do pacote tecnológico agroquímico, conhecido como “Revolução verde”. Educação Popular e educação do campo Em sentido oposto, ocorreu um vigoroso movimento de educação popular que, na segunda metade do século XX ganhou identidade e dimensões nacionais. Protagonizado por estudantes e educadores de universidades, movimentos religiosos de base, organizações profissionais ou partidos políticos de orientação de esquerda, seu propósito era fomentar a participação política das camadas populares, inclusive as do campo, e criar alternativas pedagógicas identificadas com a cultura e com as necessidades nacionais, em oposição à importação de idéias pedagógicas alheias à realidade brasileira. Em 1964, com a instauração do governo militar, as organizações voltadas para a mobilização política da sociedade civil – entre elas o Centro Popular de Cultura (CPC), criado no ano de 1960 em Recife-PE; os Centros de Cultura Popular (CCP), criados pela União Nacional dos Estudantes em 1961, e o Movimento de Educação de Base (MEB), orgão da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) – sofreram um pesado processo de repressão política e policial. Essa repressão resultou na desarticulação e na suspensão de muitas dessas iniciativas. Muitos educadores foram exilados, levando consigo as concepções e propostas de educação popular em desenvolvimento no Brasil, as quais tiveram grande contribuição em vários países, principalmente da América Latina e da África. Foi o caso, por exemplo, de Paulo Freire que, por causa de suas convicções e práticas de educação popular, ficou exilado por quase duas décadas. Ao mesmo tempo em que reprimiu os movimentos de educação popular, o governo militar, diante da elevada taxa de analfabetismo que o país registrava, buscando atingir 12
  • 13. resultados imediatamente mensuráveis, instituiu o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), uma campanha de alfabetização em massa, sem compromisso com a elevação dos níveis de escolaridade e, muito menos, com a educação em sentido mais amplo. No processo de resistência à ditadura militar, sobretudo a partir de meados da década de 1980, as organizações da sociedade civil, especialmente as ligadas à educação popular, recolocaram a educação do campo na pauta dos temas estratégicos para a redemocratização do país. A idéia era reivindicar e, simultaneamente, construir um projeto de educação sintonizado com as particularidades culturais, os direitos sociais e as necessidades próprias à vida dos camponeses. Nesse ambiente político, aliando mobilização e experimentação pedagógica, passam a atuar juntos sindicatos de trabalhadores rurais, organizações comunitárias do campo, educadores ligados à resistência à ditadura militar, partidos políticos de esquerda, sindicatos e associações de profissionais da educação, setores da igreja católica identificados com a teologia da libertação e as organizações de luta pela reforma agrária, entre outros. O objetivo era o estabelecimento de um sistema público de ensino para o campo, baseado no paradigma pedagógico da educação como elemento de pertencimento cultural. Nas últimas décadas ampliaram-se iniciativas educacionais desenvolvidas pelos movimentos sociais e organizações não-governamentais do campo (ANARA, CONTAG, FETRAF, CUT, MAB, MST, RESAB, entre outros)5 . A disseminação de tantas iniciativas educacionais vai se configurando como um terreno de experimentação de diferentes concepções educativas e de propostas pedagógicas, assim como de produção teórica sobre a Educação do Campo. Em que pese as abrangências destinadas as suas áreas de intervenção, estas organizações têm apresentado avaliações positivas nos processos de escolarização que realizam6 , além de apresentarem propostas pedagógicas e organizações curriculares coerentes e adequadas aos tempos e espaços da vida cotidiana das pessoas do campo. Há também um intenso envolvimento destas organizações e movimentos com a formação continuada de professores e de monitores 5 ANARA – Associação Nacional pela Reforma Agrária. CEFFA’s – Centros Familiares de Formação em Alternância. CONTAG – Confederação dos Trabalhadores na Agricultura. FETRAF – Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar. CUT – Central Única dos Trabalhadores. MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens. MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. RESAB – Rede de Educação do Semi- Árido Brasileiro. 6 A FETRAF SUL/CUT, no período de 1999 a 2002 realizou a escolarização de aproximadamente 4 mil agricultores familiares/as na Região Sul do Brasil na modalidade EJA, com qualificação profissional e atuou na formação continuada de aproximadamente 150 educadores e técnicos envolvidos no projeto Terra Solidária. A CUT também desenvolveu o Projeto Semear na Bahia. As Escolas Famílias Agrícolas (EFA’s) possuem 127 unidades em funcionamento e atendem a aproximadamente 10.779 estudantes atendidos, 25.400 famílias. As Casas Familiares Rurais (CFR’s) possuem 91 unidades em funcionamento (Queiroz, 2004). 13
  • 14. responsáveis pela condução das propostas pedagógicas, o que se diferencia significativamente dos processos formativos convencionais. Outras iniciativas populares de organização da educação para o campo são as Escolas Famílias Agrícolas (EFA’s) e as Casas Familiares Rurais (CFR’s) que, juntas, constituem-se nos Centros Familiares de Formação por Alternância (CEFFA’s). Essas instituições, inspiradas em modelos franceses e criadas no Brasil a partir de 1969 no Estado do Espírito Santo, associam aprendizado técnico com o conhecimento crítico do cotidiano comunitário. A proposta pedagógica, denominada Pedagogia da Alternância, é operacionalizada a partir da divisão sistemática do tempo e das atividades didáticas entre a escola e o ambiente familiar. Esse modelo tem sido estudado e elogiado por grandes educadores brasileiros e é apontado pelos movimentos sociais como uma das alternativas promissoras para uma Educação do Campo com qualidade, por articular o aprendizado escolar com as vivências produtivas das populações do campo. A partir desse contexto de mobilização social, a Constituição de 1988 consolidou o compromisso do Estado e da sociedade brasileira em promover a educação para todos, garantindo o direito à adequação da educação e ao respeito às singularidades culturais e regionais. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n° 9.394/96) estabelece uma base comum a todas as regiões do país, a ser complementada pelos sistemas federal, estaduais e municipais de ensino, e determina a adequação da educação e do calendário escolar às peculiaridades da vida rural de cada região Em 1998, foi criada a “Articulação Nacional Por uma Educação do Campo”, entidade supra-organizacional que passou a promover e gerir as ações conjuntas pela educação dos povos do campo como um direito público inalienável. Dentre as conquistas alcançadas por essa Articulação, estão: a realização de duas conferências nacionais por uma Educação Básica do Campo, em 1998 e 2004; a instituição pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, em 2002; e a instituição do Grupo Permanente de Trabalho de Educação do Campo (GPT), em 2003. Desafiado a construir uma agenda específica para a educação do campo, em 2004, o Ministério da Educação, por meio da SECAD, criou a Coordenação-Geral de Educação do Campo (CGEC), com o objetivo de elaborar e coordenar políticas públicas específicas, assim como apoiar iniciativas pedagógicas para o atendimento dessa demanda a partir do reconhecimento de suas necessidades e singularidades. 14
  • 15. Em 2007, o Ministério da Educação por meio da Portaria Nº 1.258/07 institui a Comissão Nacional de Educação do Campo (CONEC), órgão colegiado de caráter consultivo com a atribuição de assessorar o MEC para a elaboração de políticas públicas em educação do campo. Nesse contexto histórico de mobilização em prol da garantia dos direitos públicos dos povos do campo, a SECAD organizou, coordena e vem implementando programas destinados a atender, de forma simultânea, integrada e complementar, a diferentes demandas: construção de escolas do campo; PROCAMPO – apoiando a formação superior em licenciatura em educação do campo; Escola Ativa, destinado a escolas com classes multisseriadas e, ProJovem Campo – Saberes da Terra. O ProJovem - Campo Saberes da Terra é uma opção político-pedagógica de oferecer ensino fundamental integrado à qualificação social e profissional para os jovens agricultores do Brasil, num esforço de reunir princípios político-metodológicos acumulados ao longo das últimas décadas, desde as primeiras ações da educação popular, até as recentes e importantes iniciativas de educação do campo protagonizados pelos diferentes movimentos sociais e alguns governos locais, sem a pretensão de abranger as suas totalidades. Representa um desafio por se tratar de um Programa que representa uma inovação para o conjunto de políticas da educação nacional. É caracterizado por uma pedagogia que vincula educação e trabalho a um paradigma de educação e sociedade cujo objetivo é construir uma nova dimensão de desenvolvimento do campo. Aliado a isto, está a estratégia consciente de fortalecimento dos entes federativos – União, Estados e Municípios – e de tratamento do Programa na perspectiva de sua institucionalização como política de Estado. Por isso, executado em regime de colaboração com entes federativos estaduais e municipais, como uma ação interministerial, sob coordenação geral da SECAD/MEC em conjunto com as coordenações dos demais entes partícipes. 2.2. Educação e juventude no campo: breve diagnóstico Embora a legislação determine a obrigatoriedade da educação para crianças na faixa etária de 7 a 14 anos e tenha ampliado a duração do Ensino Fundamental para nove anos, a situação das populações do campo ainda apresenta-se problemática e desigual. De modo geral, as escolas possuem instalações precárias e improvisadas, e oferecem apenas as séries iniciais do Ensino Fundamental. 15
  • 16. Segundo os dados do INEP de 2006 do total de 86.129 estabelecimentos de ensino rurais, 50.176 (37,4%) são exclusivamente multisseriadas, e na maioria das vezes com professores unidocentes pouco qualificados profissionalmente e mal remunerados. A organização curricular, geralmente desconsidera a realidade das pessoas do campo e a sua diversidade sociocultural. Estes, entre outros fatores, têm contribuído sobremaneira para a baixa escolarização no campo, demonstrando a histórica incapacidade do Estado brasileiro, em suas diversas instâncias, de atender dignamente essa demanda e, por extensão, pouco tem contribuído com as necessidades de desenvolvimento dessas populações. Segundo o Censo Demográfico do IBGE, em 2000 29,8% da população do campo com 15 anos ou mais era analfabeta, enquanto que na área urbana o indicador era de 10,3%. Dados do IBGE de 2001 indicam que o percentual da população com 15 anos ou mais de idade sem instrução ou com menos de um ano de estudo, correspondia a 16,2 milhões de pessoas. Entre as faixas mais jovens, os dados também preocupam: na faixa etária de 15 a 19 anos, 21,7% dos jovens não concluíram o equivalente às quatro séries iniciais do ensino básico e 66,7% não completaram os oito anos de escolaridade obrigatória. Os índices para a faixa etária de 20 a 24 anos, apesar de melhores, confirmam a situação: 20,1% não concluíram as quatro séries iniciais e 55,9% completaram o ensino fundamental de oito anos. Quando comparados os indicadores das populações do campo e das populações urbanas constata-se que a escolaridade média da população do campo com 15 anos ou mais corresponde a 3,4 anos, menos que a metade da média para a população urbana que é de 7 anos de escolarização. Os índices do analfabetismo também apontam uma distância considerável: 29,8% da população adulta rural é analfabeta, enquanto, que na zona urbana esse índice é de 10,3%. Nesses dados não estão incluídas aquelas pessoas com menos de quatro séries do ensino fundamental. A pesquisa “O perfil da juventude brasileira”7 considera que os dados levantados permitem a informação sobre questões de extrema importância, embora a referida pesquisa tenha trabalhado com uma amostra reduzida de jovens rurais (19% do total da população pesquisada – 669 jovens rurais). Em relação ao trabalho e formação profissional dos jovens, a pesquisa destaca que 90% dos jovens entrevistados não passaram por nenhum curso de capacitação e a profissionalização é feita por meio do aprendizado direto na prática; 95% consideram a escola importante para o seu futuro profissional e 80% a consideram importante para conseguiram um emprego hoje; 7 Desenvolvida e coordenada pelo Instituto Cidadania em 2004, organizada por Maria José Carneiro. 16
  • 17. somente 30% dos jovens residentes no campo e que trabalham na cidade têm carteira de trabalho assinada; os demais são assalariados sem registro ou fazem “bico”; dos que trabalham ou trabalharam (independe do local de residência), 42% ganham meio salário mínimo e 27% ganham entre meio e um salário mínimo; dos 24% que trabalham no campo, 14% estão inseridos em estabelecimentos de agricultura familiar, enquanto apenas 8% são assalariados sem registro e 2% são ajudantes familiares sem remuneração. Entre outros aspectos da pesquisa é destacado que 24% dos jovens demandam por atividades culturais (cinema, teatro, shows, etc), apesar de ocuparem os fins de semana assistindo TV, ajudando em casa ou encontrando os amigos; 60% dos jovens rurais declararam ler ou assistir noticiários sobre política; 81% dos jovens rurais nunca participaram de associações ou grupos comunitários. Na compreensão dos jovens a ausência de espaços de lazer é um dos fatores responsáveis pela avaliação negativa do campo e do desejo de migrar; do mesmo modo manifestam o desejo de permanecer na localidade de origem, desde que ocupados em atividades não agrícolas. 2.3. Agricultura Familiar O ProJovem Campo – Saberes da Terra concebe a Agricultura Familiar como forma histórica de viver e produzir, na qual predominam relações de solidariedade recíproca, interdependência/interrelação com os recursos naturais e cooperação mútua, com uma organização do trabalho onde planejamento, execução, controles e outras tarefas de gestão são realizados em conjunto pelas pessoas que compõem o núcleo familiar e se beneficiam coletivamente dos resultados obtidos. A produção (cultivo, extração e/ou beneficiamento) destina-se prioritariamente ao sustento da própria família e o excedente é comercializado, contribuindo para a criação de uma atividade econômica fundamental para o desenvolvimento socioeconômico do campo e do país. Para a Secretaria da Agricultura Familiar (SAF/MDA), é uma forma de produção onde predomina a interação entre gestão e trabalho. São os agricultores familiares que dirigem o processo produtivo, dando ênfase na diversificação e utilizando o trabalho familiar, eventualmente complementado pelo trabalho assalariado. Estima-se que no Brasil existam cerca de 4.859.864 (quatro milhões, oitocentos e cinqüenta e nove mil, oitocentos e sessenta e quatro) estabelecimentos rurais (IBGE, 1996). Destes cerca de 85,2% são de estabelecimentos familiares. Estes dados são confirmados pelo 17
  • 18. Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e o Fundo das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), para os quais aproximadamente 85% do total de propriedades rurais do país pertencem a grupos familiares. O agricultor familiar agrega em seu trabalho diversas especializações, indissociadas e simultâneas. É culturalmente pluriativo por assumir diversas ocupações, na maioria das vezes, realizando atribuições típicas de agricultor (cultivo e produção vegetal e animal), agrônomo, operador de máquinas, mecânico, meteorologista empírico, pescador, construtor, eletricista, administrador, comerciante, industriador8 , artesão, ecologista, extrativista, líder comunitário e de organização, entre outros. Transversalmente a essas atribuições é, à sua maneira e por excelência, um observador e formulador de suas próprias deduções e abstrações, indispensáveis ao desenvolvimento das suas atividades e à melhoria de suas condições de vida, fazendo jus ao título de agricultor- pesquisador ou agricultor-experimentador que recebe em algumas regiões do continente e do planeta. Nessa diversidade cultural e produtiva, a Agricultura Familiar possui uma importância fundamental no processo de desenvolvimento do país em suas várias dimensões. Do ponto de vista da garantia da sobrevivência das famílias, percebe-se que a produção para o consumo garante a segurança alimentar de inúmeras famílias que moram no campo. Além do autoconsumo, a produção na agricultura familiar possui a capacidade de fornecer volumes de alimentos ao mercado, ampliar o acesso aos alimentos e garantir a reciprocidade entre produção e consumo nas relações campo e cidade. A ênfase na Agricultura Familiar justifica-se pela importância histórica, social e econômica que esta modalidade de organização social e produtiva apresenta no campo brasileiro. Considerando que é uma atividade produtiva complexa, os agricultores familiares se revestem de uma particularidade que os diferenciam dos trabalhadores urbanos ou dos produtores rurais, que atuam nas propriedades de grande porte e dependem de mão de obra externa maior que a mão de obra da família. A propriedade do agricultor familiar é considerada “pequena” com poucos módulos rurais e, via de regra, insuficiente para a manutenção de todos membros da família. Historicamente, o agricultor familiar produz nesse espaço praticamente tudo o que é necessário para garantir a existência dos seus filhos, tais como alimentos, lazer e abrigo. Em decorrência desse processo produtivo, existe nesse ambiente uma forte tendência à solidariedade, apesar de 8 Aquele que industria, ou seja, que tem habilidade ou aptidão para realizar algo, especialmente para executar trabalho manual; arte, destreza, perícia capacidade de criar, de produzir com arte, habilidade, sensibilidade; artifício, criatividade, engenho ato de colocar essas habilidades em prática; ação, atividade, obra. 18
  • 19. que estes valores têm sido afetados intensamente, nas últimas décadas, com a multiplicação e massificação do meios de difusão ideológica, propagadores de ideais de mercado como competitividade e individualismo, com influência bastante negativa nas relações históricas de vizinhança e cooperação. O vizinho - histórico aliado e parceiro incondicional - passa a ser visto como concorrente ou, no mínimo, como alguém a ser tratado com indiferença quando em situação de dificuldade. Neste tipo de organização social nem sempre é necessária uma divisão rígida das atividades. Dessa forma, o modo de produção está fundado no trabalho solidário da família consanguínea e a família comunitária, ao passo que a circulação de moeda é menor que a circulação de mercadorias e serviços. Ainda pode-se observar a prática dos mutirões, traição ou surpresa9 , troca de dias, aluguel de mão-de-obra entre outras formas produtivas que representam o universo do trabalho no campo. Dada a sua vitalidade para garantir a qualidade de vida dos povos do campo, das águas e das florestas, a Agricultura Familiar torna-se o eixo articulador no processo educacional do ProJovem Campo – Saberes da Terra simbioticamente integrada ao desenvolvimento sustentável. Ela representa a base do fazer pedagógico, do currículo e da metodologia do Programa, centrada na formação dos jovens agricultores com vistas à construção de um novo projeto de educação e sociedade do campo, voltado para o aprendizado e multiplicação de conceitos, princípios e práticas necessárias à construção de um país que, socializando o trabalho, garanta os direitos, promova a solidariedade e distribua os resultados da produção coletiva, rumo à crescente eliminação das desigualdades, preconceitos e injustiças. 9 Atividades coletivas que simbolizam a solidariedade, o festejar coletivo, a cultura do campo, entre outras manifestações, onde o beneficiado é surpreendido pela comunidade que, reunida, vem prestar seu apoio e solidariedade na realização de trabalhos necessários na unidade familiar. 19
  • 20. 3. PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO INTEGRADO 3.1. Objetivo Geral Desenvolver políticas públicas de Educação do Campo e de Juventude que oportunizem a jovens agricultores (as) familiares excluídos do sistema formal de ensino a escolarização em Ensino Fundamental na modalidade de Educação de Jovens e Adultos, integrado à qualificação social e profissional. 3.2. Objetivos Específicos Elevar a escolaridade e proporcionar a qualificação profissional inicial de agricultores(as) familiares; Estimular o desenvolvimento sustentável, com recorte agroecológico e enfoque territorial, como possibilidade de vida, trabalho e constituição de sujeitos cidadãos no campo; Fortalecer o desenvolvimento de propostas pedagógicas e metodologias adequadas à modalidade de EJA no campo; Realizar formação continuada em metodologias e princípios político- pedagógicos voltados às especificidades do campo para educadores(as) atuantes no Programa; Fornecer e publicar materiais pedagógicos que sejam apropriados ao desenvolvimento da proposta pedagógica; Conceder auxílio financeiro aos educandos, minorando carências materiais que poderiam impedir sua frequência ou manutenção no curso. 20
  • 21. 3.3. Público beneficiário Jovens agricultores(as) familiares na faixa etária de 18 a 29 anos, residentes no campo, que saibam ler e escrever, mas que não concluíram o Ensino Fundamental. São considerados agricultores familiares os educandos que cumpram os requisitos do art. 3º da Lei nº 11.326. de 24 de julho de 2006. 3.3.1. Inscrição, matrícula e organização das turmas É responsabilidade do proponente a inscrição, a matrícula e a organização das turmas. Cada turma deve ser constituída de no mínimo 25 alunos e no máximo de 35 alunos. Para inscrever-se no ProJovem Campo – Saberes da Terra, o interessado deverá: • ser alfabetizado, ou seja, apresentar domínio da leitura e da escrita e ter noções matemáticas (que possam ser detectados através de preenchimento de ficha de inscrição, preenchida pelo próprio interessado); • ser agricultor/a familiar10 , na faixa etária, entre 18 e 29 anos; • residir ou trabalhar nas regiões de abrangência do projeto aprovado, especialmente em municípios localizados nos territórios de cidadania; • não ter concluído o Ensino Fundamental; • não estar matriculado em curso regular. 3.4. Metas O ProJovem Campo – Saberes da Terra tem meta prevista no PPA o atendimento de 275 (duzentos e setenta e cinco) mil jovens agricultores(as) familiares, sendo: 35 (trinta e cinco) mil em 2008, 24 mil (vinte e quatro mil) em 2009, 80 (oitenta) mil em 2010 e 85 (oitenta e cinco) mil em 2011. 10 Serão considerados agricultores familiares os educandos que cumpram os requisitos do art. 3º da Lei no 11.326, de 24 de julho de 2006. 21
  • 22. 3.5. Pressupostos do ProJovem Campo – Saberes da Terra O ProJovem Campo – Saberes da Terra se orienta, principalmente, pelos seguintes pressupostos: • A educação como afirmação, reconhecimento, valorização e legitimação das diferenças culturais, étnico-raciais, de geração, de gênero, da diversidade de orientação sexual e socioambiental, visando a superação dos preconceitos, a eliminação das desigualdades e o fortalecimento da solidariedade; • Independente do nível de escolaridade, os povos do campo, das águas e das florestas são sujeitos de direito e de conhecimento; • A EJA é elemento constitutivo da política pública nos sistemas de ensino dos entes federativos, direito dos povos do campo, instrumento de emancipação e uma estratégia viável para fortalecer o desenvolvimento sustentável com enfoque territorial; • A efetivação do dever do Estado com educação escolar pública, mediante a garantia de ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria e, a oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola; • O trabalho e a qualificação profissional como direitos dos povos do campo, devendo a educação escolar vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social; • Além das políticas públicas de educação do campo, existem sujeitos sociais que possuem projetos político pedagógicos próprios. 3.6. Aspectos Legais A legislação educacional brasileira apresenta uma sólida base legal para a instituição de políticas públicas diferenciadas, destinadas ao atendimento escolar das pessoas que vivem e trabalham no campo. Construir um Projeto Político-Pedagógico que possa inserir o calendário escolar às condições climáticas e ao ciclo agrícola, contextualizar a organização curricular e as 22
  • 23. metodologias de ensino às características e realidades da vida dos povos do campo são determinações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 (LDBEN). Desse modo, o presente Programa fundamenta-se na e trata da implementação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº 9.394/96. Em seu Art. 4º, a referida lei estabelece que: O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; (...) VII - oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola. A LDBEN determina em seu Art. 5º que “o acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder Público para exigí-lo”. Para assegurar a obrigatoriedade escolar o poder público deverá criar “formas de acesso aos diferentes níveis de ensino, independentemente da escolarização anterior” (Art. 5º § 5º). É garantido ainda na LDBEN em seu Art. 37 que “A Educação de Jovens e Adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria”. Nos parágrafos desse artigo são estabelecidos que: § 1º. Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames. § 2º. O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si. Reconhecendo as especificidades da Educação do Campo, a referida Lei estabelece no seu Art. 28o que: Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias a sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente: 23
  • 24. I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural; II - organização escolar própria incluindo a adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas; III - adequação ao trabalho na zona rural. Sobre as formas de organização da Educação Básica a lei prevê em seu Art. 23: A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não-seriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar. § 2º. O calendário escolar deverá adequar-se às peculiaridades locais, inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino, sem com isso reduzir o número de horas letivas previsto nesta Lei. (Art. 23º). Esse aspecto é de fundamental importância para a integração entre trabalho e escolarização, pois possibilita a permanência dos estudantes na escola, o que torna a adequação do calendário escolar um fator significativo para o acesso e progressão dos estudantes no sistema educacional. A dimensão da qualificação profissional inicial do Programa é assegurada legalmente com os seguintes Artigos da LDBEN Lei nº 9394/96: Art. 39. A educação profissional, integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva. § único. O aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a possibilidade de acesso à educação profissional. Art. 40. A educação profissional será desenvolvida em articulação com o ensino regular ou por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições especializadas ou no ambiente de trabalho. Art. 41. O conhecimento adquirido na educação profissional, inclusive no trabalho, poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e certificação para prosseguimento ou conclusão de estudos. O Decreto nº 5.154/2004 que regulamenta os artigos de 39 a 41 da LDBEN, apresentados acima, determina que a educação profissional será desenvolvida por meio de: 24
  • 25. Cursos e programas de formação inicial e continuada nos formatos capacitação, aperfeiçoamento, especialização e atualização em todos os níveis de escolaridade, ofertados segundo itinerários formativos, objetivando o desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva e social (Art. 3º). Estabelece ainda o § 2º do Art. 3º do mesmo Decreto: Os cursos mencionados (...) articular-se-ão preferencialmente, com cursos de educação de jovens e adultos, objetivando a qualificação para o trabalho e a elevação do nível de escolaridade do trabalhador, o qual, após a conclusão com aproveitamento dos referidos cursos, fará jus a certificados de formação inicial ou continuada para o trabalho. O Plano Nacional de Educação (Lei 10.172/2001) prevê que o Estado deve: Assegurar, em cinco anos, a oferta de educação de jovens e adultos equivalente às quatro séries iniciais do ensino fundamental para 50% da população de 15 anos e mais que não tenha atingido este nível de escolaridade. Assegurar, até o final da década, a oferta de curso equivalentes às quatro séries finais do ensino fundamental para toda a população de 15 anos e mais que concluiu as quatro séries iniciais. Estabelecer programa nacional de fornecimento, pelo Ministério da Educação, de material didático-pedagógico, adequado a clientela, para os cursos em nível de ensino fundamental para jovens e adultos. Assegurar que os sistemas estaduais de ensino, em regime de colaboração com os demais entes federativos, mantenham programas de formação de educadores de jovens e adultos. Dobrar em cinco anos e quadruplicar em dez anos a capacidade de atendimento nos cursos de nível médio para jovens e adultos. De acordo com o Art. 3º das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (2002): O Poder Público, considerando a magnitude da importância da educação escolar para o exercício da cidadania plena e para o desenvolvimento de um país cujo paradigma tenha como referências a justiça social, a solidariedade e o diálogo entre todos, independentemente de sua inserção em áreas urbanas ou rurais, deverá garantir a universalização do acesso da população do campo à Educação Básica e à Educação Profissional de Nível Técnico. 25
  • 26. A Resolução 01/2002 do CNE/CEB, em seu Art. 6º estabelece: O Poder Público no cumprimento das suas responsabilidades com o atendimento escolar e à luz da diretriz legal do regime de colaboração entre a União, os estados, o Distrito federal e os municípios, proporcionará Educação infantil e Ensino Fundamental nas comunidades rurais, inclusive para aqueles que não o concluíram na idade prevista, (...). Na Resolução supracitada é estabelecido no Art. 7º: É de responsabilidade dos respectivos sistemas de ensino, por meio de seus órgãos normativos, regulamentar as estratégias específicas de atendimentos escolar do campo e a flexibilização da organização do calendário escolar, salvaguardando, nos diversos espaços pedagógicos e tempos de aprendizagem, os princípios da política da igualdade. O Plano Nacional de Juventude11 ao enfocar a juventude rural, propõe como objetivos e metas disseminar programas de capacitação e formação profissional na área rural, implantar programas de estímulo a agroecologia e à produção orgânica; buscar capacitação para a juventude rural em organização da produção, entre outros objetivos. O ProJovem Campo – Saberes da Terra vem ao encontro dos fundamentos, objetivos e metas do referido Plano. As possibilidades e, mais que isso, as exigências apontadas pela legislação educacional brasileira e os instrumentos da política de juventude, aliadas a uma proposta de educação brasileira que coloca na agenda pública de um governo democrático popular a diversidade, a inclusão e a cidadania fortalecem a importância e necessidade de uma política de Estado para as populações do campo. Por ser uma política pública nova e recente, exige dos entes federativos e seus respectivos conselhos e sistemas de ensino, a regulamentação e adequação de suas leis, normas, no que for necessário, para viabilizar as condições necessárias à sua implementação. 3.7. Bases conceituais de referência do Programa O ProJovem Campo – Saberes da Terra caracteriza-se por levar em conta as especificidades do campo e as condições de vida dos (as) jovens agricultores (as) familiares. Responder efetivamente esse desafio pedagógico requer a definição de bases conceituais que criam a referência político-pedagógica do Programa, entre elas a concepção de campo, 11 Projeto de Lei 4.530/2004. 26
  • 27. educação do campo, educação de jovens e adultos, desenvolvimento sustentável, trabalho, economia solidária e qualificação social e profissional. 3.7.1. Campo Concebe-se o campo como um universo socialmente integrado ao conjunto da sociedade brasileira e ao contexto atual das relações econômicas internacionais, mantendo particularidades históricas, sociais, culturais e ecológicas que o diferenciam de qualquer espaço social e produtivo. A manutenção dessas particularidades é o reflexo da compreensão de campo enquanto produto e produtor de culturas, não se supondo, portanto a sua existência como um universo isolado, autônomo em relação ao conjunto da sociedade e que tem uma lógica exclusiva de funcionamento e reprodução. O campo compreendido a partir do conceito de territorialidade é o lugar marcado pelo humano e pela diversidade cultural, étnico-racial, pela multiplicidade de geração e recriação de conhecimentos-saberes que são organizados com lógicas diferentes, de lutas, de mobilização social, de estratégias de sustentabilidade. Espaço emancipatório, quando associado à construção da democracia e de solidariedade de lutas pelo direito à terra, à educação, à saúde, à organização da produção e pela preservação da vida. Assim, o desenvolvimento humano, ampliação e socialização do patrimônio cultural, por meio dos vínculos sociais, culturais e de relações de pertencimento a um determinado lugar como um espaço vivido, são imprescindíveis para o desenvolvimento territorial sustentável12 . Mais do que um perímetro não-urbano, o campo expressa um conjunto de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria produção das condições da existência social, material e imaterial, e com as realizações da humanidade. Toda essa diversidade de coletivos humanos apresenta formas específicas de produção de conhecimentos- saberes, ciência, tecnologias, valores e culturas, devem ser respeitadas e incorporadas nas políticas públicas e nos projetos pedagógicos. Por isso, o campo e a cidade ou o rural e o urbano são apreendidos como duas partes intercomplementares de um continuum, com especificidades que não se anulam e nem se isolam, mas, antes de tudo, articulam-se. 12 Conceito difundido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Proposta técnica de intercâmbios de experiências inovadoras de educação e cultura para o fortalecimento do desenvolvimento territorial, s.d. (mimeo.) 27
  • 28. 3.7.2. Educação do Campo O ProJovem Campo – Saberes da Terra concebe a Educação do Campo como um projeto de desenvolvimento da sociedade do campo que incorpora os espaços das florestas, das águas, acolhendo a si os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos, extrativistas, entre outros, e fundamentando-se nas práticas sociais constitutivas dessas populações: os seus conhecimentos, habilidades, potencialidades, sentimentos, valores, modo de ser e de produzir, de se relacionar com a terra e formas de compartilhar a vida. Fundamentada nas práticas sociais dos agricultores familiares, a Educação do Campo enfrenta os processos de alienação dirigidos contra si, tais como, o esvaziamento e a precarização da produção, da cultura e da escola do campo. Segundo essa visão de alienação, existe um esvaziamento cultural do trabalho e da educação, provocado pela desvalorização crescente da escola e da cultura do campo diante do avanço da modernização da agricultura no Brasil. Sobre essa lógica, Arroyo (2004) enfatiza que a modernização da agricultura nunca foi um potencial de desenvolvimento da escola do campo, pelo contrário, aquela considera esta como um espaço vazio, inculto, através da qual para trabalhar com a enxada poucas letras bastam e que o agronegócio provoca a expulsão da terra e aumenta a precarização da força humana que trabalha na terra. A Educação do Campo sustenta-se na valorização da vida do campo com o objetivo de construir políticas públicas que garantam o direito de trabalhar e estudar no campo satisfatoriamente, o que significa construir um paradigma solidário e sustentável nas relações entre a educação, Agricultura Familiar e os demais aspectos culturais e produtivos dos povos do campo. As Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (CNE/CEB, 2002), expressam no Art. 2º, § Único, uma compreensão de Educação do Campo que vincula a identidade da escola à valorização da vida camponesa: A identidade da escola do campo é definida pela sua vinculação as questões inerentes a sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida coletiva no país. (Grifo nosso) Considerando que a educação do campo não se resume à escola, as Diretrizes Operacionais incentivam a construção de Projetos Institucionais das escolas do campo que devam ser a “expressão do trabalho compartilhado” e constituindo-se num “espaço público de investigação e articulação de experiências e estudos direcionados para o mundo do trabalho”, a 28
  • 29. fim de se buscar um “desenvolvimento socialmente justo, economicamente viável e ecologicamente sustentável” das práticas sociais dos povos do campo (Art. 4º). Como se vê, a Educação do Campo compreende que os sujeitos têm história, participam de lutas sociais, têm nome e rostos, gêneros, raças, etnias e gerações diferenciadas. O que significa que um projeto de educação do campo leva em conta as pessoas e os conhecimentos que estas possuem, por apropriação ou produção, mediadas pelos conflitos das relações sociais. Dois aspectos precisam ser considerados na Educação do Campo: o primeiro, diz respeito à superação da dicotomia entre rural e urbano e o segundo, à necessidade de recriar os vínculos de pertença dos sujeitos ao campo. Esses dois aspectos somados à diversidade dos povos do campo exigem um processo educativo que afirme a educação como um processo ao longo da vida. Essa compreensão resulta na promoção de uma identidade coletiva que fortalece a criação de cooperação entre os diversos segmentos sociais, visando a criação de políticas públicas por meio de novas experiências de escolarização e de transformações no processo educacional. O ProJovem Campo – Saberes da Terra fundamenta-se nesses marcos teóricos e operacionais de Educação do Campo e propõe a construção de um projeto educativo onde os cidadãos do campo sejam respeitados como sujeitos das suas produções, das suas culturas e que possam utilizar os recursos naturais de modo sustentável na produção e reprodução de sua própria existência. 3.7.3. Educação de jovens e adultos (EJA) O Art. 3º da Declaração de Hamburgo, realizada em 1997, na qual foram firmados compromissos pautados na concepção de educação de jovens e adultos na perspectiva da educação continuada ao longo da vida, afirma que: A educação de adultos engloba todo o processo de aprendizagem formal ou informal, onde pessoas consideradas “adultas” pela sociedade desenvolvem suas habilidades, enriquecem seu conhecimento e aperfeiçoam suas qualificações técnicas e profissionais, direcionando-as para a satisfação de suas necessidades e as de sua sociedade. A educação de adultos inclui a educação formal, a educação não-formal e o espectro da aprendizagem informal e incidental disponível numa sociedade multicultural, onde os estudos baseados na teoria e na prática devem ser reconhecidos. 29
  • 30. Essa concepção permite superar a de EJA como política compensatória, cujo único papel seria repor a escolarização de pessoas que não tiveram acesso à escola em fase anterior da sua vida. Essa modalidade de ensino deve “contemplar os diferentes espaços de aprendizagem, formais ou não-formais, por meio dos quais os jovens e adultos possam desenvolver suas aptidões, conhecimentos e qualificações”. Desse modo, a EJA deve possibilitar “a transformação dos indivíduos em sujeitos com maior autonomia e melhores condições de enfrentamento das questões que envolvem a sociedade brasileira.13 ”. O Programa tem nos jovens de 18 a 29 anos o seu foco principal, mas orienta-se também pela legislação da EJA. A Resolução CNE/CEB 1/2000 que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA determina no Art. 5º, parágrafo único: (...) a identidade própria da Educação de Jovens e Adultos considerará as situações, os perfis dos estudantes, as faixas etárias e se pautará pelos princípios de eqüidade, diferença e proporcionalidade na apropriação e contextualização das Diretrizes Curriculares Nacionais e na proposição de um modelo pedagógico próprio de modo a assegurar: I.Quanto à eqüidade, a distribuição específica dos componentes curriculares a fim de proporcionar um patamar igualitário de formação e restabelecer a igualdade de direitos e de oportunidades face ao direito à educação; II.Quanto à diferença, à identificação e ao reconhecimento da alteridade própria é inseparável dos jovens e dos adultos em seu processo formativo, da valorização do mérito de cada qual e do desenvolvimento de seus conhecimentos e valores; III.Quanto à proporcionalidade, a disposição e alocação adequadas dos componentes curriculares face às necessidades próprias da EJA com espaços e tempos nos quais as práticas pedagógicas assegurem aos seus estudantes identidade formativa comum aos demais participantes da escolarização básica. As Diretrizes Curriculares para a EJA destacam ainda que a identidade específica dos(as) estudantes que frequentam a EJA é diferente dos estudantes presentes nos cursos regulares e recomendam que “o perfil dos estudantes da EJA e suas situações reais devem constituir o núcleo da organização da proposta pedagógica” a ser desenvolvida. Para tanto, o desafio deste Programa integrar em sua organização curricular o trabalho à elevação de escolaridade. 13 MEC. Educação de Jovens e Adultos, 2004, p. 1 (Mimeo.) 30
  • 31. 3.7.4. Desenvolvimento sustentável O ProJovem Campo – Saberes da Terra entende que o desenvolvimento e a sustentabilidade são relativos quanto ao tempo e ao espaço. São, portanto, históricos e geográficos, econômicos, políticos, culturais, sociais e ambientais. O desenvolvimento sustentável traz a promessa de conciliar eqüidade social, crescimento econômico, mercado e preservação do meio ambiente no que diz respeito aos padrões de uso e sustentabilidade dos recursos naturais e à promoção da sociedade. No caso mais particular do campo, o desenvolvimento sustentável localmente estabelecido prima pela manutenção dos ecossistemas, dos agroecossistemas e das culturas locais, sendo fundamental estabelecer sua ligação, interação e relação com o todo; mas esse desenvolvimento começa com as práticas imediatas e as vivências dos povos do campo e toda a sua riqueza e diversidade socioculturais e etnoculturais. Portanto, seus conhecimentos-saberes e tradições. Para se tornarem eficazes, as estratégias de desenvolvimento sustentável do campo devem incorporar não somente dimensões tecnológicas e/ou restrito à substituição de insumos. Desenvolvimento sustentável, como a própria agroecologia - presente nas práticas de famílias, grupos, associações e redes de agricultores familiares, - pressupõe a abrangência das questões sociais, econômicas e políticas. A sustentabilidade e o meio ambiente implicam que, nas investigações, nas pesquisas que os sujeitos educativos efetuam e elaboram sobre o campo, devem remeter sua análise aos aspectos sociais, econômicos e ecológicos, de modo a promover a compreensão da sustentabilidade como um todo e, mais em particular, a agrária-agrícola- camponesa, bem como os fenômenos relativos aos processos culturais e às relações socioambientais que os agricultores familiares vivenciam. 3.7.5. Trabalho e economia solidária Para o ProJovem Campo – Saberes da Terra, o trabalho e a economia solidária representam a construção de um novo modelo de mundo e educação do campo. O trabalho é o processo pelo qual os sujeitos do campo reconstroem a sua história por meio da transformação da natureza e das relações sociais, produzindo culturas e um conjunto de aprendizagens que criam sentido às relações dos seres humanos com os outros e com o mundo. A economia solidária surge como resgate da luta histórica dos(as) trabalhadores(as) na defesa contra a exploração do trabalho humano e como alternativa ao modo capitalista de organizar as relações sociais dos seres humanos entre si e destes com a natureza (FBES, 2003). 31
  • 32. Compreende-se então que trabalho e economia solidária adquirem centralidade na formação dos jovens agricultores no Brasil por se tornarem um poderoso instrumento de garantia de condições fundamentais à emancipação e alternativas de enfrentamento das sucessivas crises da sociedade capitalista. Ambos apresentam uma alternativa viável de geração de emprego e renda por meio de ações de cooperação, associativismo, crédito comunitário, entre outras formas coletivas de atuar e produzir valores solidários nas relações de produção. Os espaços de trocas solidárias e comercialização justa, preferencialmente de contato direto entre os agricultores familiares e os consumidores, são também espaços privilegiados de pesquisa, produção e socialização de conhecimentos, aprendizado e emancipação. 3.7.6. Qualificação social e profissional A qualificação social e profissional (relação social construída pela interação dos agentes sociais do trabalho em torno da propriedade, significado e uso do conhecimento construído no e pelo trabalho) é um complexo construto social. Por ser intimamente ligado à produção e reprodução da força de trabalho, têm um enorme papel na possibilidade dos indivíduos adentrarem, permanecerem ou serem excluídos do processo produtivo (embora estas relações possam extrapolar a esfera da produção). O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) enfatiza que a qualificação profissional pode ser entendida como: • Parte indissolúvel das Políticas de Trabalho, Emprego e Renda, sejam elas urbanas ou rurais; públicas ou privadas; resultem em relações assalariadas, empreendedoras individuais ou solidárias; • Uma forma de educação profissional (formação inicial e continuada), devendo estar articulada com a educação de jovens e adultos, a educação do campo e a educação profissional de nível técnico e tecnológico; • Um processo de construção de políticas afirmativas de gênero, etnia e geração, ao reconhecer a diversidade do trabalho e demonstrar as múltiplas capacidades; • Uma forma de reconhecimento social do conhecimento do trabalhador, ou seja, de certificação profissional e ocupacional que deve estar articulada com classificações de ocupações, profissões, carreiras e competências; 32
  • 33. • Uma necessidade para o/a jovem e o/a adulto/a, em termos de orientação profissional para sua inserção no mundo do trabalho; • Um objeto de disputa de hegemonia, com a negociação coletiva da qualificação e certificação profissionais devendo integrar um sistema democrático de relações de trabalho. Por esta multidimensionalidade, a qualificação nunca é apenas “profissional” (dimensão técnica), mas sempre “social” (dimensão sociolaboral). Fala-se, portanto, em qualificação social e profissional para denominar as ações de formação voltadas para uma inserção autônoma, solidária e empoderada no mundo do trabalho. A qualificação social e profissional permite a inserção e atuação do cidadão no mundo do trabalho, com efetivo impacto para a vida e o trabalho das pessoas14 . Para isso, faz-se necessário no decorrer do processo formativo: A promoção de atividades político-pedagógicas baseadas em metodologias inovadoras dentro de um pensamento emancipatório de inclusão, tendo o trabalho como princípio educativo; o direito ao trabalho como um valor estruturante da cidadania; a qualificação como uma política de inclusão social e um suporte indispensável do desenvolvimento sustentável, a associação entre a participação social e a pesquisa como elementos articulados na construção desta política e na melhoria da base de informação sobre a relação trabalho-educação- desenvolvimento. (MTE, 2003, p. 25). Tomando como referência essas diretrizes para a qualificação social e profissional, o ProJovem Campo – Saberes da Terra contém o desafio de efetivar a integração entre escolaridade e qualificação social e profissional relacionada aos processos produtivos do campo, como possibilidade de melhoria das condições de trabalho e da qualidade social de vida da população. 3.8. Princípios Político-Pedagógicos15 Os princípios político-pedagógicos que sustentam/norteiam o Programa são orientados pelas Referências para uma Política Nacional de Educação do Campo e pelas Diretrizes Curriculares Nacionais. São elas: 14 MTE. Plano Nacional de Qualificação 2003-2007, 2003, p. 24. 15 MEC. Referências para uma Política Nacional de Educação do Campo, 2004. 33
  • 34. 3.8.1. A escola formadora de sujeitos articulada a um projeto de emancipação humana Pauta-se pela necessidade de estimular os sujeitos da educação em sua capacidade de criar com outros um espaço humano de convivência social desejável. Possibilitando aos sujeitos constituírem-se enquanto seres sociais responsáveis e livres, capazes de refletir sobre suas atividades, capazes de ver e corrigir os erros, capazes de cooperar e se relacionar eticamente, porque não desaparece nas suas relações com o outro. Portanto, a educação como formação humana é também uma ação cultural. Esse processo que envolve atitudes, valores e comportamentos deve refletir também na dimensão institucional de forma permanente e sistemática e deve atravessar toda a vida escolar. 3.8.2. A valorização dos diferentes saberes no processo educativo A escola precisa valorizar os conhecimentos que estudantes, seus núcleos familiares e comunidades possuem, estabelecendo um diálogo permanente com os saberes produzidos nas diferentes áreas de conhecimento. O diálogo entre esses conhecimentos precisa garantir elementos para a melhoria da qualidade de vida dos sujeitos envolvidos. 3.8.3. A compreensão dos tempos e espaços de formação dos sujeitos educativos A Educação no Campo ocorre tanto em espaços escolares como fora deles. Envolve conhecimentos-saberes, métodos, tempos e espaços físicos diferenciados. Portanto, não são apenas os saberes construídos na escola, mas também aqueles construídos na produção, na família, na convivência social, na cultura, no lazer e nos movimentos sociais. A escola do campo é um espaço específico de sistematização, análise e de síntese das aprendizagens, se constituindo assim, num local de encontro das diferenças, pois, é nela que se produzem novas formas de ver, estar e se relacionar com o mundo. 34
  • 35. 3.8.4. A escola vinculada à realidade dos sujeitos A escola do campo está vinculada à realidade dos sujeitos, realidade esta que não se limita ao espaço geográfico, mas que se refere, principalmente, aos elementos socioculturais que constituem os modos de vida desses sujeitos. Construir uma educação do campo significa pensar numa escola sustentada no enriquecimento das experiências de vida, não em nome da permanência nem da redução destas experiências, mas em nome de uma reconstrução dos modos de vida, pautada na ética da valorização humana e do respeito à diferença. Uma escola que possibilite aos educandos/as condições de optarem sobre o lugar onde desejam viver e produzir as suas existências. 3.8.5. A educação como estratégia para o desenvolvimento sustentável A educação para o desenvolvimento leva em conta a sustentabilidade ambiental, agrícola, agrária, econômica, social, política, cultural, a eqüidade de gênero, racial, étnica e intergeracional. Realizar uma educação com o desenvolvimento sustentável é considerar que o local e o território podem ser reinventados por meio das suas potencialidades. Uma das formas de trazer à tona essas potencialidades está na revitalização da importância do coletivo como método de participação popular, de gestão das políticas e das comunidades onde vivem. 3.8.6. A autonomia e colaboração entre os sujeitos do campo e o sistema nacional de ensino É preciso estar atento para a diversidade existente entre os povos do campo. Isso significa que não se pode construir uma política de educação idêntica para todos os povos do campo. Neste sentido, adquire importância a ampla participação dos movimentos sociais e organizações da sociedade civil na construção das políticas educacionais para que a identidade do campo na sua complexa diversidade, e o compromisso com um projeto de desenvolvimento sustentável para o mesmo estejam intrinsecamente articulados aos projetos pedagógicos. 3.8.7. O trabalho como princípio educativo O trabalho como prática social e princípio educativo orienta teórico-metodologicamente o desenvolvimento do Programa. Considerando aqui o trabalho como produção da existência humana na relação com a natureza, num processo de humanização de homens e mulheres. 35
  • 36. A formulação de projetos político-pedagógicos, na perspectiva da formação humana e da garantia de direitos, é uma tarefa histórica a ser enfrentada por coletivos que reconheçam a educação e a escola como estratégicas para a manutenção de um modo de vida e de sociedade. Todo o conhecimento seja ele científico ou da prática social, é dado pela ação dos seres humanos sobre a natureza e da sociedade pelo trabalho. Portanto, o eixo de todo conhecimento é o trabalho humano. O trabalho como princípio educativo orienta o desenvolvimento do Programa, de modo a resgatar os valores do trabalho coletivo e contribuir para a autonomia e o empoderamento dos jovens agricultores familiares. 3.8.8. A pesquisa como princípio educativo A pesquisa é princípio de todo o processo formativo. Como forma de intervenção da e na realidade estrutura todo o processo elencado neste Projeto, assumindo, assim, a direção das ações que pode ser visualizada no Plano de Pesquisa, nos debates em turma, na partilha de saberes, nos círculos de diálogos, entre outras atividades que podem ser consultadas no Percurso Formativo. A realização da pesquisa é uma estratégia pedagógica para o estudo e o conhecimento da realidade, para auxiliar os processos de transformação social, cultural, político e econômico. Ela implica um trabalho conjunto de discussão e execução, no qual participam educadores e educandos mediatizados sempre pela realidade a ser conhecida e transformada, confrontando conceitos existentes, novas hipóteses e indagações significativas para a formulação de novos conceitos, novas hipóteses e novas indagações que, por sua vez, realimentam o círculo virtuoso da pesquisa-ação. 3.9. Organização Curricular Antes de ser uma proposta pré-definida, o currículo orienta-se pelo diálogo constante com a realidade, na interação dos sujeitos com a comunidade, estruturando-se em questões desencadeadoras que articulam os conteúdos a partir da realidade prática dos educandos. Esta concepção está em sintonia com o Plano Nacional de Qualificação: 2003-2007 (2003, p. 30) quando orienta que uma educação integral do/a trabalhador/a supere as práticas de qualificação profissional tidas como treinamento operacional, imediatista, segmentado e pragmático. A concepção de currículo integrado requer: • Um projeto pedagógico que tenha como eixos gerais articuladores os temas do trabalho e da cidadania, para propiciar aos/às educandos/as uma 36
  • 37. articulação virtuosa entre sua inserção no mundo do trabalho e sua participação social e política; • Uma construção curricular que envolva as dimensões técnico-científica, sociopolítica, econômica, metodológica e ético-cultural. O Programa Saberes da Terra baseia-se na construção de um currículo que tem como referência principal a formação humana e o modo de produção e reprodução da vida, ou seja, as relações sócio-históricas, políticas e culturais das comunidades do campo e, em âmbito maior, do estado e do país. O foco do Programa é o jovem agricultor familiar, enquanto sujeito histórico, na dialética de sua realidade, problemática, projetos e potencialidades. A formação pretendida objetiva atender a uma formação geral integrada com a qualificação social e profissional aportada em itinerários formativos. Nela, a atualização dos conhecimentos necessários ao mundo do trabalho no campo sempre em mudança, deve necessariamente reconhecer, por um lado, o conhecimento-saber acumulado pelos(as) agricultores(as) familiares em sua cultura e sua trajetória e, por outro, a dimensão tecnológica e organizacional cada vez mais presente no campo. Para que a formação seja de fato integrada é necessário construir pontes entre os conhecimento-saberes das áreas do ensino fundamental geral e os da qualificação social e profissional, de modo a garantir a (re-)significação e/ou apropriação de tecnologias específicas, dos processos de transformação presentes no campo, das temáticas de gestão e de controle dos processos produtivos, da organização do trabalho e da organização da produção em constante diálogo com as áreas de estudo que compõem o ensino fundamental. Nesta perspectiva a organização curricular está fundamentada no eixo curricular articulador Agricultura Familiar e Sustentabilidade que dialogará com os eixos temáticos: Agricultura Familiar: Identidade, Cultura, Gênero e Etnia; Desenvolvimento Sustentável e Solidário com Enfoque Territorial; Sistemas de Produção e Processos de Trabalho no Campo; Economia Solidária e Cidadania, Organização Social e Políticas Públicas. Os eixos temáticos agregam conhecimentos da formação profissional e das áreas de estudos para a elevação de escolaridade. Como apresenta o diagrama abaixo os Eixos Temáticos compõem partes integradas que se articulam entre si e com o eixo articulador Agricultura Familiar e Sustentabilidade. Às coordenações estaduais, comissões de educação do campo, instituições formadoras, conselhos estaduais de educação e responsáveis pelos setores jurídico-administrativos coloca-se o desafio de recriar, no âmbito de suas atribuições específicas, as condições, instrumentos, rotinas, controles e regulamentos necessários e adequados para atender a esta política de educação adequada aos jovens do campo. 37
  • 38. 3.9.1. Mudanças exigidas Importante! - Como visto ao longo deste Projeto Base, o ProJovem Campo – Saberes da Terra, embasado na legislação geral, na legislação específica da educação e nas normativas da Educação do Campo, constitui-se como um programa de inclusão educacional bastante diferenciado do modelo convencional de ensino. Esta diferenciação, imprescindível para tornar- se adequada às características e necessidades dos jovens a que se destina, pressupõe, para sua implementação, a criação e a garantia de condições também diferenciadas, nos estados. Só para citar alguns exemplos: a) Adequação do calendário escolar – que respeite/valorize o calendário de produção (agrícola, extrativista, pesqueiro) e o regime de alternância mais apropriado ao desenvolvimento do curso e participação dos educandos. As atividades do tempo-escola poderão ocorrer, de acordo com a realidade de cada turma, diariamente, em etapas intensivas, em finais de semana ou numa combinação entre as opções anteriores, sempre intercaladas com atividades do tempo- comunidade a serem desenvolvidas nas unidades familiares e/ou comunidades, individualmente ou em grupos. b) Organização das alternâncias de tempos e espaços pedagógicos – Observando que as atividades do tempo-comunidade precisam ser devidamente planejadas, durante o tempo- escola e, na sua execução, acompanhadas pelos educadores responsáveis pela turma. c) Exigência de formação continuada dos profissionais em exercício – abordando as temáticas da organização curricular e outros temas necessários ao conhecimento e domínio da concepção teórico e prática do Programa e da Educação do Campo. d) Forma de contratação, carga horária e forma de atuação da equipe de educadores – A concepção do programa transcende a lógica do ensino fragmentado em disciplinas, completamente inadequado aos propósitos do Programa e às necessidades educacionais e de qualificação social e profissional dos jovens participantes. Materializar a concepção do Programa exige, neste aspecto, uma atuação diferenciada dos educadores que deverão trabalhar colegiadamente, em equipe, com atribuições intercomplementares. Diferentemente da escola convencional, o ProJovem Campo – Saberes da Terra exige planejamento coletivo da equipe, no mínimo semanalmente, para que as atividades do tempo- escola e do tempo-comunidade sejam executadas coerentemente com o que se propõe. Assim como o profissional das Ciências Agrárias deve participar ativamente no planejamento e execução do conjunto das atividades, como educador da turma, o acompanhamento às atividades do tempo-comunidade também são de responsabilidade de toda equipe. Obviamente, dependendo do tema e do foco da atividade, um ou outro profissional terá papel diferenciado de coordenação, conforme sua experiência e área específica de formação. 38
  • 39. No tempo-comunidade, embora a condução das atividades agrárias tenha maior responsabilidade do profissional das Ciências Agrárias, simultaneamente, os educadores de outras áreas acompanharão sempre, contribuindo no desenvolvimento da atividade, identificando temas a serem trabalhados no tempo-escola e auxiliando o(s) educando(s) a desenvolver(em), no seu espaço, habilidades que na escola demonstre(m) alguma dificuldade. Portanto, é inviável conceber uma forma de contratação destes educadores em condições idênticas às dos contratados para trabalhar de maneira individualizada, por disciplinas isoladas, na rede escolar seriada. A contratação dos profissionais para o ProJovem Campo – Saberes da Terra precisa garantir que eles possam participar dos tempos coletivos de planejamento/preparação, das etapas de formação continuada e da realização colegiada das atividades do tempo-escola e do tempo-comunidade. Dependendo da dinâmica de alternâncias e da localização das turmas, cada equipe de educadores poderá atender, alternadamente, a duas turmas. 3.10. Estrutura do Currículo 39 Sistemas de Produção e Processo de Trabalho no Campo Agricultura Familiar, Identidade, Cultura, Gênero e Etnia Desenvolvimento Sustentável e Solidário com Enfoque Territorial Economia Solidária Cidadania, Organização Social e Políticas Públicas AGRICULTURA FAMILIAR E SUSTENTABILIDADE
  • 40. 3.10.1 – Eixos Temáticos Os Eixos Temáticos agregam conhecimentos da formação profissional e das áreas do conhecimento para a elevação da escolaridade. Objetivam a formação de jovens agricultores que se apropriem dos conhecimentos humanos e, que compreendam a tecnologia, as ciências e a cultura como partes de uma única realidade, criada pela capacidade do ser humano pensar e atuar sobre o mundo, pela sua capacidade de produzir cultura, técnica e conhecimentos. A ementa básica de cada Eixo Temático é a seguinte, devendo ser adequada e complementada em cada estado/região de acordo com suas características específicas:  Agricultura Familiar, Identidade, Cultura, Gênero e Etnia – Estudo das relações sociais no processo histórico de produção econômica e cultural da Agricultura Familiar, seus problemas e potencialidades culturais nas dimensões de gênero, etnia, geração e de identidade. Estudo das ocupações e transformações do ambiente, das diferentes concepções de Agricultura Familiar e das relações campo-cidade.  Sistemas de Produção e Processos de Trabalho no Campo - Estudo sobre questões relacionadas à Agricultura Familiar e suas relações com os sistemas de produção; o papel da família e da comunidade na transformação dos ecossistemas em agroecossistemas; a sucessão vegetal e os possíveis limites, potencialidades e desafios dessa transformação ecológica; as práticas dos sistemas de produção locais e sua reprodução social; a produção e reprodução familiar, sua territorialidade e influências das relações de trabalho internas e externas ao estabelecimento rural; compreender os processos de trabalho no campo, inclusive os papéis dos membros da família e das pessoas da comunidade; estudo das principais políticas agrárias e agrícolas que influenciam na produção familiar e realidades do campo.  Cidadania, Organização Social e Políticas Públicas - Estudo das organizações sociais, da relação entre Estado e Sociedade Civil a partir do contexto sócio-histórico, discutindo conceito de cidadania e princípios de ética; Análise dos conceitos de Estado, Governo, Democracia suas relações com a legislação (Federal, Estadual, Municipal); Conhecimento da trajetória dos Movimentos Sociais e das Organizações Sociais e suas implicações na definição de Políticas Públicas; as estratégias organizativas locais; jovens como foco de políticas públicas; educação no meio rural brasileiro e educação do campo. Refletir as políticas públicas voltadas para o desenvolvimento do ensino e a valorização 40
  • 41. das manifestações culturais e sociais; refletir sobre as políticas de saúde, educação, esporte e lazer; Conselhos municipais e Cartas de Direito; Compreender as políticas para a Agricultura Familiar: crédito, assistência técnica, seguro safra, geração de trabalho e renda, mercados.  Economia Solidária - Estudo do campo como local de formação de pessoas, de relações sociais e econômicas; sistemas sociais e econômicos ao longo da história; modos de produção e organização social; Legislação agrária e ambiental. Refletir sobre as formas de economia solidária no Brasil: cooperativismo, associativismo, micro-crédito e sistemas de crédito; Mercados solidários; Comercio justo. Análise conceitos de solidariedade; relações sociais e econômicas presentes na sociedade em geral; desenvolvimento humano e solidário.  Desenvolvimento Sustentável e Solidário com Enfoque Territorial - Estudar, pesquisar e refletir sobre conceitos básicos de desenvolvimento e sustentabilidade; evolução histórica do termo Desenvolvimento Sustentável; desafios, limites e potencialidades para o desenvolvimento sustentável; princípios e fundamentos da Agroecologia; importância do uso racional dos recursos naturais; Políticas Públicas; experiências de promoção do desenvolvimento local e territorial sustentável; práticas sustentáveis nas unidades familiares de produção, microbacias hidrográficas e biomas específicos. A partir do eixo articulador Agricultura Familiar e Sustentabilidade, serão desdobrados os conhecimentos que garantam uma base teórica fundamental e o desenvolvimento de habilidades e competências gerais do ser humano – científicas, pedagógicas, técnicas, éticas, morais, políticas e estéticas. Cada área de conhecimento deverá indicar os conhecimentos necessários para desenvolver o pensamento científico dos educandos, organizando um programa curricular básico. As áreas do conhecimento chamadas a dialogar com os eixos temáticos são: Linguagem, códigos e suas tecnologias; Ciências da natureza e linguagem matemática; Ciências humanas; e, Ciências agrárias. Estas áreas estabelecem um diálogo entre si e, ao mesmo tempo, cada uma contribui para ampliar a compreensão das práticas sociais como produtoras de significados, servindo de referência para que as áreas de estudos ressignifiquem o conteúdo de sua contribuição na explicitação da temática estudada. 41
  • 42. Sendo assim, deverão ser construídas problemáticas que possibilitem perceber as relações entre as áreas do conhecimento e os eixos temáticos, por exemplo: • Quais as contribuições das ciências sociais, das ciências da natureza, das linguagens e das linguagens matemáticas entre outras, para a compreensão e explicação dos conhecimentos presentes nos eixos temáticos? • Quais as articulações desses conhecimentos com o arco ocupacional? Para o desenvolvimento da qualificação profissional inicial foi construído um arco ocupacional que congrega um conjunto de atividades diversas realizadas pelos agricultores familiares. 3.10.2. Arcos Ocupacionais Arcos ocupacionais são conjuntos de ocupações relacionadas, ou seja, que possuem base técnica comum, neste caso a agroecologia. Estes arcos devem abranger as esferas da produção e da circulação (produção rural, agroindústria, comércio, prestação de serviços), garantindo uma formação mais ampla e aumentando as possibilidades de inserção ocupacional do/a trabalhador/a, seja como agricultor familiar, assalariado, auto-emprego ou associado/cooperativado (economia solidária). No âmbito do ensino fundamental cada instituição ao elaborar o projeto educativo promoverá, junto com os educandos, educadores, organizações sociais e outro partícipes do programa, estratégias para a escolha das atividades que apresentam possibilidades na região ou aquelas que potencialmente poderão ser desenvolvidas. Estabelecer mecanismos de análise para determinar aquilo que não está sendo desenvolvido, mas que existem possibilidades concretas ou interesse em desenvolver, os educadores e professores através de consultas aos educandos poderão encontrar quais são as atividades a serem escolhidas como tema de estudo. O arco Produção Rural Familiar é composto por 5 ocupações e servirá como eixo orientador e facilitador do processo de formação social e profissional, variando o(s) foco(s) de acordo com as características de cada realidade e turma. 42
  • 43. O arco Produção rural familiar deverá contemplar de modo transversal estudos em meio ambiente, gestão e administração. Os conteúdos do currículo do ensino formal são trabalhados em um processo de reflexão e aprofundamento das questões desencadeadas pelos temas específicos de cada grupo de educandos, assim como os conceitos desenvolvidos nos cursos dialogam com a experiência vivida pelo/a agricultor/a familiar. As ocupações descritas no arco têm como base a Resolução n º 4/1999 do CNE: ARCO OCUPAÇÕES PRODUÇÃO RURAL FAMILIAR 1. Sistemas de Cultivo 2. Sistemas de Criação 3. Extrativismo 4. Agroindústria 5. Aquicultura 3.11. Ementa da qualificação social e profissional A) AGRICULTURA FAMILIAR • A multifuncionalidade da Agricultura Familiar. • Agricultura Familiar e a conservação da biodiversidade. • Agricultura Familiar e a segurança alimentar e nutricional. • O papel da mulher na Agricultura Familiar. • O papel do jovem na Agricultura Familiar. B) PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL • Princípios da agroecologia. • Sistemas de produção – orgânico, ecológico, em transição. • Visão holística e sistêmica. • Relação da Agricultura Familiar com o meio ambiente. 43 3.11.1. Formação Geral