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JB




Indisciplina e
Disfuncionalidade




JORGE NUNES BARBOSA

FEVEREIRO, 2012




                     iBooks Author
IV.	

 Apêndice Remediativo	


Índice                                                          Intervenção Educativa em Problemas de Comportamen-
                                                                to	


                                                                Questões prévias:	


                                                                Plano de Intervenção	


                                                                Passos a respeitar num Plano de Intervenção	


                                                                Intervenção Ecológica	


Prólogo	

                                                      Consequências e Gestão de Crises	


I.	

   Indisciplina e Disfunção Institucional	

               Aquisição de Comportamentos Ajustados	


1.1.	

 O Individualismo	

                                     Código de Conduta	


1.2.	

 A Burocracia	

                                         V. Conclusão	


1.2.1.	

    A Estrutura Disfuncional	

                        Notas Finais

II.	

 Uma Abordagem Ecológica	


2.1.	

 Implicações Educativas e Organizacionais	


III.	

 A Proposta	


1.	

   Unidades de Funcionamento	


1.1.	

 Aspetos Organizacionais	



                                                                                                                 1




                                                         iBooks Author
pusesse em evidência os aspetos mais valorizados
Prólogo                                               nas atitudes de alunos, professores e pais parecia
                                                      estar mais de acordo com o estabelecimento des-
                                                      se consenso, do que um regulamento interno de-
                                                      masiado extenso e muito difícil de ser traduzido
                                                      em condutas positivas.
                                                      No meu espírito sempre esteve clara a necessida-
                                                      de imperativa de fundamentar esse código de con-
                                                      duta e a sua pertinência. Estava nas intenções sub-
                                                      jetivas do compromisso assumido que essa funda-
                                                      mentação deveria ser curta e assertiva, como pare-
                                                      ce convir nestas situações. Só que o caminho se-
Este documento nasce originariamente de um
                                                      guido deu-se a si mesmo uma dimensão que nem
compromisso assumido com os meus colegas de
                                                      com boa vontade pode ser considerada curta. Por
Departamento Curricular. Analisava-se a discre-
                                                      outro lado, coincidências inesperadas entre aqui-
pância entre juízos de alunos, professores e pais
                                                      lo que se assemelhava a uma encomenda e outro
sobre a indisciplina na escola. Fazia sentido que a
                                                      tipo de solicitações, fizeram juntar, num só, um
comunidade escolar estivesse segura de que parti-
                                                      documento de trabalho interno e um documento
lhava um conceito consensual de disciplina e de
                                                      reflexivo que, de qualquer modo, correspondendo
indisciplina, que pudesse sustentar um diálogo
                                                      a outro tipo de compromisso, era necessário que
produtivo entre perspetivas diferentes sobre o as-
                                                      ficasse pronto num período de tempo quase coin-
sunto. Neste quadro de referência, um código de
                                                      cidente. Por estas razões, e só por estas, este docu-
conduta, um documento não judicializado, que
                                                      mento é bastante mais longo do que seria desejá-
                                                                                                         ii




                                               iBooks Author
vel. Mas não menos assertivo do que era a inten-        cas e as propostas, neste documento, são conser-
ção inicial, espero eu.                                 vadoras.
O que agora é divulgado corresponde a uma ver-          Uma ideia geral estrutura todo o documento: só
são, apesar de tudo, simplificada e reduzida sobre      poderemos proteger o atual imaginário de escola,
os conceitos de disciplina e organização institucio-    se formos capazes de focar os seus aspetos nuclea-
nal e sobre uma abordagem ecológica das organi-         res e desvalorizar as suas componentes distrati-
zações. Contém também uma visão geral sobre as          vas e circunstanciais. O conceito de imaginário,
linhas de força que devem nortear as reformas           aqui utilizado, não coincide em todos os seus pon-
educativas, ou o projeto educativo da escola, con-      tos, com o conceito de imaginário do senso co-
soante o patamar de intervenção em que cada um          mum. Entendamo-nos, portanto.
se situe. É defendido ainda um modelo de inter-         Em estudos meus, que levam já muito, talvez ex-
venção educativa, não aversiva, nos comporta-           cessivo, tempo sem publicação, sobre aquilo a
mentos difíceis de alunos e, obviamente, são apre-      que agora se chama “deficiências da inteligência e
sentadas as linhas gerais de um código de condu-        do desenvolvimento”, tem sido útil distinguir dois
ta.                                                     tipos de “lógica” que presidem à nossa forma hu-
Em termos gerais, a postura ideológica aqui assu-       mana de pensar. Uma é, digamos, uma “lógica
mida é, num certo sentido, conservadora. Com            analógica” (imaginário), isto é, uma “lógica” que
efeito, é preservado o imaginário de escola como        não é ilógica, mas também não é lógica, no senti-
um espaço e um tempo de integração dos novos            do matemático do termo. A outra é a lógica digital
elementos na sociedade e de salvaguarda de valo-        ou matemática. Ambas correspondem a podero-
res, social e democraticamente, partilhados, que        sas organizações da informação - daí o nome de
lhes pré-existem. Neste e só neste sentido, as críti-   “lógica” que ambas merecem -, mas o imaginário
                                                        corresponde a uma lógica adaptativa (inteligen-
                                                                                                       iii




                                                iBooks Author
te), mas pouco adaptável (persistente), e a lógica     Ora, o imaginário de escola que aqui se preserva é
digital é simultaneamente adaptativa (inteligen-       justamente esse que aglutina no seu interior con-
te) e adaptável (provisória). A nossa vida do quoti-   tradições adaptativas (inteligentes) e que vive
diano é sobretudo dominada pela lógica analógi-        bem com elas. Neste sentido, o imaginário é realis-
ca, porque, sem conflitos, sem dissonâncias, e         ta, não é uma fantasia, uma fuga à realidade, mas,
com uma enorme estabilidade, responde com efi-         pelo contrário, uma tentativa de adequação a ela.
cácia e superior inteligência à maior parte dos pro-   Traduzido em narrativa, este imaginário será o
blemas que nos são colocados. Quando um con-           mito, se quisermos aprofundar as coisas. Há, por-
junto dessas informações se mostra, em certas cir-     tanto, uma narrativa mítica da escola a que não
cunstâncias, menos adaptativo, pode ser gerado         devemos fugir. Agora, se quisermos que a escola
um outro, por acumulação e reorganização de in-        não estruture uma “deficiência da inteligência e
formações, mas sem destruir o anterior: ficamos,       do desenvolvimento”, não podemos ficar por aí.
portanto, com duas soluções no repertório. Na ló-      É, então, no respeito pelo imaginário, pelo mito,
gica digital, quando o mesmo acontece, dá-se lu-       da escola que aqui se propõe a construção de no-
gar a uma reformulação do conjunto de informa-         vos imaginários, que, seguramente, não farão mal
ções em causa, sendo uma substituída pela outra.       algum ao que já se tem, e serão o embrião da sua
O imaginário é, então, um conjunto de informa-         própria preservação.
ções organizadas, geradoras e conservadoras de         Concluído em Vila Nova de Gaia, 13 de fevereiro
identidades, que se dá bem com a contradição:          de 2012
essa é uma das suas principais características; A
                                                       Jorge Barbosa
lógica matemática, pelo contrário, usa a contradi-
ção para se reestruturar.


                                                                                                       iv




                                                iBooks Author
C APÍTULO 1



Indisciplina e
Disfunção
Institucional

O conceito de indisciplina não é inteligí-
vel, muito menos operacionalizável, se
não for abordado na sua complexidade.
Neste, como em muitos outros casos, a
adoção de perspetivas analíticas estritas,
embora satisfaça a nossa ambição explica-
tiva, atira-nos para fora do campo, onde
o objeto se estrutura e adquire sentido.



                                      iBooks Author
I NDISCIPLINA E D ISFUNÇÃO I NSTITUCIONAL               disciplina não terá origem na própria disciplina,
                                                        ou na sua prática. De facto, quando os educado-
                                                        res reconhecem que algo deve ser feito no domí-
O conceito de indisciplina não é inteligível, muito
                                                        nio da disciplina, raramente equacionam o proble-
menos operacionalizável, se não for abordado na
                                                        ma da disciplina como um estilo de vida em comu-
sua complexidade 1. Neste, como em muitos ou-
                                                        nidade, para o reduzirem, analiticamente, a um
tros casos, a adoção de perspetivas analíticas estri-   conjunto de regras que, por não estarem a ser
tas, embora satisfaça a nossa ambição explicativa,      cumpridas, devem ser reforçadas, apregoadas ou
atira-nos para fora do campo, onde o objeto se es-      simplesmente traduzidas em processos sanciona-
trutura e adquire sentido. Podemos, então, encon-       tórios. Ora, a disciplina é, ou deve ser, uma forma
trar sábias explicações para quase tudo, sem que        de viver em comunidade, da qual devem decorrer
nos seja dado entender o que quer que seja. É o         as regras de convivência, não o contrário.
que, por exemplo, acontece teimosamente com os
                                                        Numa primeira abordagem, então, a indisciplina
debates sobre o insucesso escolar: não nos faltam
                                                        pode ser considerada uma manifestação, por ve-
explicações científicas do fenómeno, mas, perante
                                                        zes dolorosa, da disfuncionalidade organizacional
uma situação particular, elas revelam-se de uma
                                                        da comunidade ou da instituição. É, muitas vezes,
inutilidade confrangedora, quando não prejudici-
                                                        com efeito, o primeiro sintoma e o mais óbvio de
al, para a sua compreensão.
                                                        que a instituição escolar se encontra na vertente
Ora, a indisciplina, por ser um assunto que preo-       decadente do seu percurso.
cupa fundamentalmente os educadores, é sistema-
                                                        Não cabe nesta generalização o descuido de não
ticamente encarada, numa faina analítica ou sim-
                                                        identificar características individuais, de alunos e
plificadora, como um problema com origem nos
                                                        professores, que provocam ou agudizam as mani-
educandos. Raramente se cuida de saber se a in-
                                                        festações de indisciplina. Bem antes pelo contrá-
                                                                                                          6




                                                iBooks Author
rio. Só que manda o bom senso que saibamos dis-       Pede-se, então, à escola que seja capaz de gerir
tinguir as situações de indisciplina que envolvem     um conflito que se estrutura e se desenvolve no in-
uma percentagem reduzida da população escolar,        terior de si mesma: que conserve valores do passa-
daquelas outras que se manifestam de forma gene-      do, aqueles mesmos que sustentam a sobrevivên-
ralizada ou numa percentagem elevada de alunos,       cia do passado e, desse modo, da sociedade tal
de modo contínuo e quase como um ritual que,          como é, e que, ao mesmo tempo, promova a inova-
ele, pode flexibilizar-se em função das circunstân-   ção, a criatividade e o questionamento do estabe-
cias, mas não a adesão a ele dos alunos. A discre-    lecido como certo, para que essa mesma socieda-
pância, entre os 1% a 2% de alunos que adotam         de não morra.
habitualmente comportamentos de gestão difícil        Não é próprio de um educador profissional negar
e os 15% a 20% que são identificados como indis-      a valia do presente e temer o futuro, do mesmo
ciplinados, deve conduzir-nos a procurar outras       modo que não lhe é adequado desvalorizar o pas-
razões para a origem do problema, para além das       sado e apresentar o futuro como única solução
que associam o comportamento de crianças e jo-        para o presente. Encarar o presente como uma de-
vens à desgraça em que o nosso tempo está a cair      cadência do passado não é muito diferente de en-
por via da deficiente formação dos elementos que      carar o próximo futuro como a decadência do pre-
só recentemente começaram fazer parte da socie-       sente atual. A decadência e o progresso são concei-
dade. Precisamente à educação, sistematizada ou       tos vazios: não são nada, enquanto não forem ins-
não, cabe a tarefa essencial de garantir que as so-   titucionalizados: dito por outras palavras, care-
ciedades humanas não destruam esses novos ele-        cem de institucionalização para serem algo. Não
mentos e que estes não destruam a sociedade que       são, portanto, os valores, muito menos o tempo,
os acolhe.                                            que entram em decadência; são, isso sim, as insti-
                                                      tuições, quando deixam de aceitar e de responder
                                                                                                       7




                                               iBooks Author
ao presente e se refugiam em soluções do passa-        da leitura. A escola, na sua missão de gerir o con-
do, ou em miragens do futuro, descuidando o tem-       flito de conservar e de inovar, em períodos de
po em que vivem. Podemos tomar como exemplo            transição difícil, como aquele em que parece que
um dos valores mais caros à escola: o gosto e a        vivemos, é, muitas vezes, a responsável pela des-
prática da leitura. Dispensemos a tarefa de o justi-   valorização real daquilo mesmo que gostaria de
ficar, e admitamo-lo como valor a preservar, sem       valorizar. É ela que está decadente e não o gosto
outro fundamento que não seja o de esclarecer o        pela leitura, ou pela matemática ou pelo que quer
meu pensamento. Ora, se persistirmos em o asso-        que seja, do mesmo modo que não é a moral que
ciar à prática da leitura de livros em papel, numa     está decadente, mas as instituições moralizado-
época em que eles podem ser lidos em suporte di-       ras.
gital, um suporte mais barato e até mais ecológi-      Ora, o problema de uma indisciplina generalizada
co, estaremos a promover escandalosamente a            não pode ser simplesmente visto como o resulta-
desvalorização desse valor. De pouco nos adianta-      do da “desautorização dos professores”, ou, pior
rá rasgar as vestes e arrancar os cabelos perante o    ainda, como resultando de uma crise de valores
desinteresse que as novas gerações lhe atribuem:       que afeta unicamente as novas gerações, como se
nós próprios nos estaríamos a encarregar de ali-       uma eventual crise desse género pudesse ter o cui-
mentar esse desinteresse, reduzindo a sua valida-      dado de ser tão seletiva como seria necessário
de a um período histórico e a circunstâncias limi-     para ter tal efeito. Este pensamento mágico que
tadas a um tempo, justamente identificado com o        atribui a conceitos poderes divinos, incluindo o
passado. Seria a nossa cegueira, ou a nossa dificul-   de selecionar o seu povo, neste caso, as crianças e
dade em viver no nosso tempo, isto é, de aceitar       os jovens, é muito útil para as nossas conversas
o imperativo de adequação a novas realidades, as       que não tenham a mínima intenção de superar as
principais responsáveis pela decadência do valor       dificuldades, mas tão só a inebriante satisfação de
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se bastarem a si mesmas e ao nosso insaciável de-     uso privado é o de escola inclusiva, abundante-
sejo de comunicar, nem que sejam só cumplicida-       mente testemunhada pelos meios de comunica-
des, afetos ou desafetos. Mas temos de o superar,     ção social. Não falta quem responsabilize "esta
se quisermos alimentar a esperança de encontrar       ideia peregrina de escola inclusiva, essa tonteria"
uma ou duas ideias que nos ajudem a ultrapassar       por, se não todos, pelo menos, um grande núme-
constrangimentos ao nosso ideal de escola, de so-     ro dos problemas que a escola enfrenta. Ora, en-
ciedade ou do que quer quer seja.                     quanto não se provar que o desejo de comer bolos
Não é de grande ajuda nesta tarefa a tendência        engorda mais, ou, pelo menos, tanto como comê-
crescente dos comentadores do quotidiano para         los, é absurdo pensar que uma coisa idealizada e
fabricarem os seus próprios conceitos sobre a         não colocada em prática pode ser responsabiliza-
vida e sobre a realidade com o objetivo único de      da pelo que quer que seja. Com efeito, o conceito
exercitarem o seu valiosíssimo sentido crítico.       de escola inclusiva corresponde a uma convenção
Constroem ideias e soluções que são só suas, para     que define princípios e critérios de consecução
depois discordarem delas. Comportam-se como           muito claros, ao nível do funcionamento das esco-
aquela gaivota que, não sabendo já por onde anda      las e da administração da educação, que estão
o vento, decide voar contra aquele que ela própria    muito longe de estar em vigor em Portugal. Essa
produz ao bater as asas: voa e voa bem, mas não       convenção foi patrocinada pela UNESCO e tra-
sai do sítio, e, como um carrossel que, ora está em   duz-se numa declaração, da qual o Estado portu-
cima, ora está em baixo, e nunca sai do seu lugar,    guês é signatário, tal como muitos estados mem-
um dia está bem no outro está mal, sem que nada       bros da ONU. Podemos concordar ou discordar
se tenha alterado, numa neurose maníaco-depres-       dessa Declaração universalizada aos estados mem-
siva sem cura aparente. Um dos melhores exem-         bros da UNESCO2, mas não temos o direito de dis-
plos desta construção maníaca de conceitos de         cordar dela por, mesmo antes de ser aplicada, já

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serem evidentes os seus efeitos perniciosos. Fica-    didas estruturais” também já foi corrompido pelo
nos bem, todavia, agradecer a esses comentado-        seu uso privado, tal como muitos outros concei-
res o facto de nos estimularem a imaginação para      tos. Cada um pensa dele o que quer, sendo que
recorrer a outras palavras, que digam o mesmo,        aos políticos importa querer convencer os outros
mas que ainda não tenham sido corrompidas pela        de que estão no caminho certo: “medidas estrutu-
vã glória de influenciar a opinião dos outros, mes-   rais” passa a significar “medidas que não estamos
mo a respeito daquilo de que não têm sequer uma       dispostos a discutir com ninguém”, mesmo que,
pálida ideia.                                         em boa verdade, sejam circunstanciais e tenham
Com efeito, uma equação dos problemas que não         tão só a ver com a dita falta de dinheiro, ou de
seja a adequada - que seja uma inadequação -          ideias, para fazer melhor.
dará inevitavelmente origem a soluções ciclópi-
cas, isto é, gigantescas e vesgas, de um só olho.
Esta tendência para as soluções ciclópicas parece
ser a vertigem dos nossos políticos e das organiza-
ções dos profissionais da educação que, embora
contestando, acabam sempre por concordar com
a agenda “reformista” dos políticos. Por sorte, ou
porque é esse o destino que merecem, essas solu-
ções duram pouco mais do que o tempo que é pre-
ciso para as debater. Passado o conflito, passam a
integrar o quadro decadente que as precede. De
pouco adianta que alguém se refira a elas como
“medidas estruturais”, porque este termo de “me-
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SECÇÃO 1                                             Numa época pouco confiante no mundo do espíri-

    O Individualismo                                 to e na conversão por adesão voluntária, a estraté-
                                                     gia é a de forçar a mudança de vida dos indivídu-
                                                     os através da introdução de procedimentos meri-
                                                     tocráticos, e ficar à espera que, desse modo, ou en-
                                                     tão milagrosamente, a organização encontre o ca-
                                                     minho para o seu aperfeiçoamento. Há, de facto,
                                                     professores que evidenciam dificuldades no exer-
                                                     cício da sua profissão. Este elemento de uma pe-
A tendência analítica, perante o gigantismo de       quena parte do problema é generalizado ao todo,
um problema, gerado sobretudo pela inadequa-         justificando assim que a “medida estrutural” ina-
ção da sua equação, encontra, por via de regra,      diável seja a da adoção de um modelo de avalia-
uma solução engenhosa: reduzir o complexo - a        ção que “separe o trigo do joio”. Do mesmo modo,
organização e o seu dinamismo - à soma das suas      há alunos que revelam dificuldades na escola. A
partes, para encontrar uma ou mais característi-     “medida estrutural” é, então, um novo estatuto do
cas de cada uma delas e depois as generalizar ao     aluno, e um aumento da exigência.
todo. Aplicada à escola, esta tendência encontra     Esta forma inebriante de destilar os problemas só
na conversão dos indivíduos a solução para todos     se torna popular, aos olhos dos próprios professo-
os problemas. Com efeito, os indivíduos são consi-   res, obviamente nos aspetos que não lhes dizem
derados os principais responsáveis pela ineficiên-   diretamente respeito, porque é um descanso para
cia da organização, no caso, da escola. Consoante    a mente haver sempre uma justificação, nem que
a abordagem, ora são os professores, ora são os      seja absurda, que se compagine confortavelmente
alunos, aqueles que devem converter-se.
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com o horror ao silêncio, à suspensão da palavra       a não ser o nível de exclusão que se pretende que
para pensar antes de falar.                            a escola passe a promover. Não só o erro é doloro-
Na verdade, a avaliação do desempenho dos pro-         samente consolidado, betonizado mesmo, como
fessores, sem alterações no próprio funcionamen-       tem efeitos práticos que reduzem drasticamente a
to da escola, só serve para consolidar o seu funcio-   eficiência da escola na sua missão social, de for-
namento atual, agregando todos os fragmentos,          ma particularmente subtil porque, num primeiro
todo o cascalho, numa massa de cimento dentro          momento, a ineficiência se traduzirá em melhores
de uma betoneira conformista, isto é, só serve         resultados nos exames, embora articulados com
para normalizar o erro. Muitos erros tornam-se         um aumento proporcional de insucesso escolar re-
invisíveis deste modo, mas como nada fica resolvi-     al. É como um motor que, antes de gripar, solta
do, só imerso em nevoeiro, é absolutamente im-         as suas engrenagens num frenesim de velocidade
prescindível encontrar outros responsáveis pela        fatal. Basta tentar subir uma ligeira colina para
ineficiência. Aqueles que estão mais a jeito são os    que as peças se soldem umas nas outras. Bastará,
alunos. Transforma-se, então, o estatuto do aluno      no caso dos alunos, tentar gerir os resultados da
num código penal, e fazem-se apelos a uma maior        exclusão, para que o sistema educativo, e, com
exigência em termos académicos. A alteração do         ele, a qualidade de vida na sociedade, encontre o
estatuto do aluno acaba por ter o mesmo efeito         precipício que pensou estar a evitar, e aquilo que,
que tem a avaliação do desempenho dos professo-        provisoriamente se poupou na educação se trans-
res, mas o dito aumento da exigência académica         forme numa despesa insustentável.
não é tão neutro como se possa pensar. De facto,       Ora, esta abordagem individualista, também ao
evitando a dificuldade que consiste em alterar a       nível da gestão da disciplina ou do combate à in-
natureza da exigência na escola, procura-se au-        disciplina, é ineficaz. De novo, convém lembrar
mentar aquela que já existe para que nada mude,        que não é o comportamento difícil de alguns, pou-
                                                                                                       12




                                                iBooks Author
cos alunos, que está aqui em causa, mas o desas-
sossego constante que afeta um grande número
de alunos e de turmas. Só minimizando os danos
da indisciplina generalizada, ou de difícil conten-
ção em limiares suportáveis para uma vida agra-
dável na escola, poderemos, com algumas hipóte-
ses de sucesso, encarar os problemas de gestão de
comportamentos mais raros e mais problemáti-
cos. A experiência diz que o contrário raramente
nos conduz a algo de frutuoso: a aplicação e o
anúncio público de penas disciplinares não corri-
ge o tal desassossego que tanto incomoda o traba-
lho nas salas de aula. Graças a uma misteriosa sa-
bedoria, os alunos também conseguem distinguir
as duas situações, mesmo recorrendo tão só às mí-
nimas das suas capacidades de entendimento do
mundo. Seria escandaloso que os professores o
não fizessem, e os alunos não esperam isso deles.




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SECÇÃO 2                                              Foi reconhecido, desde o nascimento deste concei-

    A Burocracia                                      to científico4, o perigo de desumanização que a bu-
                                                      rocracia poderia envolver. Apesar de tudo, ela era
                                                      vista como uma parte central da racionalização da
                                                      sociedade na idade moderna: em vez de confia-
                                                      rem em crenças e costumes tradicionais, espera-
                                                      va-se que os modernos tomassem decisões racio-
                                                      nais orientadas para um objetivo concreto, tendo
                                                      em conta registos rigorosos dos percursos e das
O conceito de burocracia é um dos que mais fre-       metas a perseguir, dos direitos atribuídos e a atri-
quentemente está sujeito a fenómenos de privati-      buir e das obrigações respeitadas e a respeitar. Si-
zação conceptual. Na verdade, cada um se sente        gnificava, entre outras coisas, o poder da escrita
no direito, e até no dever, de contestar a burocra-   sobre a tradição ou o testemunho oral. Por outro
cia, interpretando, o mais das vezes, como buro-      lado, a autoridade burocrática foi chamada a de-
crata tudo aquilo que exige um esforço adicional,     sempenhar o papel regulador das sociedades mo-
para além da própria tarefa que quer ou é solicita-   dernas e industrializadas: os contratos coletivos
do a realizar.                                        de trabalho são um bom exemplo desta missão da
No entanto, a burocracia é um conceito sociológi-     burocracia; nos sistemas educativos, os processos
co3 que pretende descrever as estruturas e os pro-    de transição de ano ou de ciclo escolar, os certifi-
cessos de regulação da acção social em sociedades     cados e os diplomas, a definição das condições de
e organizações complexas, isto é, de preservação      acesso a cada um dos níveis académicos é outro
de direitos e de garantia de cumprimento dos de-      excelente exemplo da autoridade burocrática: a tí-
veres, por parte dos indivíduos e das instituições.   tulo de exemplo, se, por engano, um aluno recebe

                                                                                                       14




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uma nota positiva e ela é publicada na respetiva       corresponder mais a uma oratória panfletária do
pauta, aquilo que conta não é o facto de o aluno       que discursiva5, põe em evidência as contradições
não estar preparado para prosseguir estudos, mas       do nosso tempo que, resumidamente, podem con-
o facto de burocraticamente ter sido registado         formar a ideia de uma estranhíssima e pouco razo-
que ele obteve uma nota positiva, e, portanto,         ável ditadura liberal. A linha de força parece ser,
mesmo que devesse reprovar de acordo com a opi-        no entanto, a desenhada pela necessidade de ins-
nião oralmente transmitida pelos seus professo-        taurar sistemas sucessórios na gestão do poder.
res, aquilo que é validado é a nota escrita na pau-    Com efeito, a burocracia, definindo critérios im-
ta. Na sua verdadeira essência, a burocracia é isto    pessoais, democratizou o acesso à formação aca-
mesmo que aqui é exemplificado, e não o traba-         démica e o acesso a certos cargos importantes nas
lho que dá.                                            organizações, tapando, num momento de crise e
Este esclarecimento prévio de conceitos - isto é,      de prolongamento da vida dos cidadãos, lugares
do conceito que aqui está a ser utilizado - é funda-   que sempre foram destinados aos jovens filhos da
mental para que se entenda o que a seguir será de-     nova aristocracia burguesa, entretanto, ela pró-
fendido e argumentado.                                 pria, em grande parte gerada por essa democrati-
                                                       zação burocrata. Desta linha de força nasce o im-
Nesta ordem de ideias, fica, no mínimo, bizarro
                                                       perativo de destruir os laços burocráticos, associa-
que haja quem defenda um aumento de regulação
                                                       dos aos “direitos adquiridos”, estabelecendo pro-
social, seja através de exames aos alunos ou aos
                                                       cedimentos de avaliação dos indivíduos, tão assí-
professores, seja através do acompanhamento
                                                       duos quanto seja necessário destruir ideias de
das atividades financeiras especulativas ou outras
                                                       competência, construídas a partir das suas históri-
quaisquer, e simultaneamente apregoe uma redu-
                                                       as de vida, ou dos simples registo biográficos, ou
ção da burocracia. Este discurso, só inteligível se
                                                       do tempo de serviço.
for separado nos seus fragmentos e, portanto, se
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Assim, uma das linhas de força que contesta a bu-     der de reformular e reorganizar a instituição, mas
rocracia não pretende reduzir a burocracia, a não     o de normalizar procedimentos corresponde, isso
ser naquele seu aspeto em que pode ser identifica-    sim, a uma manifestação desse pensamento mági-
da com um excesso de democratização. Este ex-         co que culpa o excesso de democratização6 pela
cesso de democratização é identificado como o pe-     disfuncionalidade da escola.
cado original que os deuses se estão a encarregar     A minha crítica à burocracia não segue, portanto,
de punir ferozmente nos tempos que correm. As         o caminho que propõe, no final de contas, a desre-
danças da chuva, as promessas de arrependimen-        gulação seletiva, isto é, a desregulação daquilo
to e os sacrifícios humanos talvez acalmem a fúria    que prejudica o exercício do poder, seja ele políti-
dos deuses, mas não é este o ponto de vista que co-   co, ou financeiro, ou outro.
manda esta reflexão. Pelo contrário, as alterações    Na verdade, a realidade da escola, mas também
recentemente introduzidas no modelo de gestão         de outras organizações sociais, parece revelar a
das escolas - que se manteve, de resto, tal como      progressiva desburocratização dos processos de
estava enquanto modelo - seguem religiosamente        dominação, e o aumento da burocratização como
este pensamento mágico e encantatório, mas peri-      processo de submissão e normalização, isto é, de
goso, que consiste em pensar que um melhor fun-       controlo, já não de regulação, dos que são chama-
cionamento das escolas depende do perfil do seu       dos a submeter-se. Ora, esta é uma das disfun-
diretor, que, por isso, é empossado de uma acres-     ções, a par da promoção do individualismo, mais
cida autoridade, sem o correspondente poder ou        óbvias da escola.
autonomia. Autoridade sem poder real significa
                                                      Com efeito, pela via da redução - eliminação em
arbitrariedade, isto é, desburocratização, desregu-
                                                      alguns aspetos fundamentais - 1) dos processos in-
lação. Encavalitar o funcionamento da escola no
                                                      ternos de controlo e regulação do poder, 2) do au-
perfil de uma pessoa a quem se atribui, não o po-
                                                      mento da burocracia com vista à normalização
                                                                                                       16




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dos indivíduos, 3) da redução do tempo de valida-       de traduz-se na adesão, por vezes entusiasta, a
de destes processos burocráticos, e 4) do aumen-        um conjunto de rituais sem nexo e sem outra utili-
to dos processos de controlo externo, a escola atin-    dade que não seja a do próprio ritual: os rituais re-
giu níveis de disfuncionalidade que mereceriam          petem-se incessantemente para que simplesmen-
ser considerados como muito preocupantes.               te não deixem de se repetir.
A burocratização que diz respeito aos processos         A escola moderna sempre foi burocrática e, por-
de normalização e de promoção do conformismo            tanto, o apelo à ritualização da vida na escola é
é ostensivamente ocultada pela redução do tempo         consentâneo com a sua tradição modernista. Des-
de validade dos procedimentos burocratas, o que,        de muito cedo, as decisões burocráticas, como a
tecnicamente, corresponde a uma violenta mani-          certificação escolar, a transição de ano ou de ciclo
pulação das vontades e da capacidade reflexiva e        de estudos, assumiram uma função sobreordena-
crítica: aquilo que hoje é defendido e criticado,       da face à tarefa subordinada de ensinar e apren-
amanhã já não tem validade, mas mantém-se o             der. Ensina-se e aprende-se para passar de ano,
procedimento na sua essência sem qualquer alte-         não para se saber. Só que nunca como agora, os
ração de substância, só de forma.                       procedimentos burocráticos alcançaram tanto pre-
Esta tendência manipuladora recebe, apesar de           domínio sobre os procedimentos de ensino e
tudo, o apoio de muitos dos manipulados, por-           aprendizagem. Os currículos, os programas, as
que, de facto, a heteronomia, a responsabilização       próprias aulas parecem estar mais ao serviço des-
de quem decide, é muito mais repousante do que          sa decisão burocrática de sucesso e insucesso, do
a autonomia, a responsabilização que cada um as-        que ao serviço do sucesso na aprendizagem. Este
sume de si e para si. A resposta positiva a este ape-   cenário torna-se ainda mais preocupante quando
lo à conformidade, ao conformismo, ou, como pre-        um conjunto muito vasto de atividades dos profes-
firo dizer para não deixar dúvidas, à mediocrida-       sores se subordinam quase inteiramente mais à
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necessidade de responder à burocracia do que aos      daqueles que usou, 20, 30 ou mais anos antes, du-
problemas. Algumas são idealizadas para que se        rante o seu estágio para ingresso na profissão. Ser
possa construir um plano anual de atividades, ou-     excelente é não ter evoluído, ou, pelo menos, não
tras para construir um projeto curricular de tur-     mostrar o quanto a experiência o enriqueceu e o
ma e ainda outras para obter uma classificação        quanto ela o dispensa de formulários de treino
agradável na avaliação do desempenho; fazem-se        para principiantes ou iniciados. Aplicado este cri-
reuniões para preencher formulários; já nem se-       tério a um pianista, ser um pianista excelente se-
quer falta a oportunidade de fazer reuniões para      ria ocultar a sua competência para interpretar
que se façam atas delas. A tragédia é que este ce-    uma obra de Chopin e demonstrar que ainda sa-
nário é particularmente sedutor, pelo relaxamen-      bia tocar as escalas que lhe serviram de treino ini-
to que induz, sem deixar de proporcionar catarses     cial e que, de vez em quando, ainda precisa de
de contestação inconsequente: um equilíbrio abso-     usar para desenferrujar os dedos, ou quando a ins-
lutamente paralisante.                                piração lhe foge.
Precisamente, esta é uma primeira dimensão, tal-      Ora, esta burocracia estritamente normativa, sem
vez a mais óbvia e que, sendo-o, passa facilmente     substância, sem outro objetivo que não seja o de
despercebida, da disfuncionalidade estrutural da      promover o conformismo, corresponde justamen-
escola. A burocracia deixou de ser um processo de     te ao risco desde há muito tempo temido de que
regulação numa organização complexa, e passou         se viesse a transformar em alguma variante, ain-
a ser o seu principal objetivo e uma das evidênci-    da desconhecida, mas reconhecidamente virulen-
as mais valorizadas nas avaliações externas. Só as-   ta, de desumanidade. A disfuncionalidade da esco-
sim se poderá compreender como é possível, para       la é, então, numa primeira abordagem, a sua desu-
se ter uma menção de excelente, exigir de um pro-     manidade.
fessor que use instrumentos da mesma natureza
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Num contexto ritualizado, os comportamentos in-         só serve para adormecer crianças. A generaliza-
cómodos são, por um lado, mais facilmente dete-         ção de uma postura desorganizada dos alunos na
táveis, e, por outro lado, mais frequentes, pela fal-   sala de aula é só a manifestação menos grave, por-
ta de sentido da própria vida no interior da organi-    que visível e denunciadora do mal-estar, da dis-
zação. O aumento da frequência de comportamen-          funcionalidade da escola.
tos de difícil gestão e a facilidade da sua deteção
nos alunos acabam por se potenciar mutuamente,
originando uma espiral de problemas que nem o
bom senso, por vezes, consegue superar.
Chegados aqui, é oportuno formular uma primei-
ra conclusão: o contexto escolar sobrevive mal à
gestão do conflito que lhe é próprio, o de conser-
var inovando, mas o núcleo central do seu proble-
ma encontra-se sobretudo na disfuncionalidade
da organização, espartilhada num conflito insaná-
vel entre o individualismo e a burocracia, entre a
destruição das memórias e das histórias de vida e
a formação de pessoas, entre a forma sem subs-
tância e o ideal de bem fazer. O bem que a escola
possa fazer não pode ficar no domínio das inten-
ções e da justificação simples do mal-estar que
gera em alunos e professores: a ideia de que é por
bem que a escola faz o mal é uma justificação que
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SECÇÃO 3                                             prática e adquire um estatuto seráfico, de persis-
        A Estrutura Disfuncional                     tente homenageado pelos serviços prestados, ago-
                                                     ra às portas da morte. Essa perda de relevância
                                                     prática tem origem em dois processos antagóni-
                                                     cos, mas que se potenciam mutuamente:
                                                     ๏ A conservação do conceito de “turma” e
                                                       de “conselho de turma”: estes conceitos fo-
                                                       ram mantidos nas condições de um passado
                                                       que, felizmente, não voltará, e já não respon-
Estabelecida uma burocracia que se tem a si mes-       dem, nem bem nem mal, às características do
ma como o principal objetivo mensurável e susce-       nosso tempo. Na verdade, se o conselho de tur-
tível de se afirmar como evidência, o aparelho de      ma corresponde a uma unidade estabilizada,
gestão do quotidiano da escola, a nomenclatura,        do lado da componente que diz respeito aos alu-
ajusta-se, em termos estruturais, à irracionalida-     nos, já na componente dos professores ela reve-
de daquilo mesmo que lhe dá origem e sustento.         la-se instável, na justa medida em que fazem
A primeira e mais visível consequência é a frag-       parte de mais 3, 4 ou cinco unidades do mesmo
mentação das estruturas de gestão do quotidiano,       género. Por outras palavras, aquilo que é a uni-
começando pela pulverização do próprio núcleo          dade funcional para os alunos não o é para os
de toda atividade escolar e pela distribuição dos      professores. Por outro lado, a unidade funcio-
estilhaços por um conjunto muito vasto de estru-       nal estável para os professores - o departamen-
turas compensatórias. A unidade funcional da es-       to curricular ou o grupo disciplinar (já falare-
cola, isto é, o conjunto formado pelos grupos de       mos deste assunto) - não é sequer uma unida-
professores e pelos seus alunos perde relevância       de para os alunos, como é bom de ver e fácil de
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aceitar. A escola não dispõe, por isso, de uma      de facto, uma boa ideia, só que, não tendo sido
  unidade que congregue um conjunto de profes-        feita a rutura com a estrutura que as equipas
  sores e um conjunto de alunos, devidamente es-      educativas deveriam substituir, foram manti-
  tabilizada e duradoura, que seja capaz de con-      das as turmas e acrescentadas as equipas educa-
  duzir a bom termo um projeto comum, seja um         tivas. Ora, esta sobreposição constitui uma ou-
  projeto curricular de turma, ou outro qualquer.     tra grave disfunção das estruturas escolares.
  Cada conjunto de alunos pode ser envolvido          Com efeito, considerar a turma como unidade
  num projeto comum, mas o conjunto de proje-         de base, ou considerar como unidade de base a
  tos não reúne equipas sólidas de professores e      equipa educativa, correspondem a modelos de
  alunos. A componente dos professores, por si        funcionamento que, nem à custa de muito boa
  só, pode ser sólida, a componente dos alunos,       vontade dos professores, conseguem subsistir
  por si só, também é, mas a reunião das duas         em simultâneo. A convivência destas duas es-
  não é, porque pulveriza as atividades dos pro-      truturas, independentemente das vontades in-
  fessores por um conjunto de turmas que, no          dividuais, conduz à auto-desvalorização mú-
  seu conjunto, não constituem uma unidade.           tua.
๏ A adição das equipas educativas sem al-
  teração do conceito de turma: era bom de          Muitos podem ver, nesta disfunção, uma simples
  ver que o conceito de turma não era suscetível    irracionalidade, como muitas das que governam a
  de se constituir numa unidade, capaz de ser o     nossa vida do quotidiano, sem outra consequên-
  combustível, a energia, e o motor do projeto      cia que não seja a de duplicar atividades e tarefas,
  educativo da escola ou do plano anual de ativi-   uma consequência que, no final de contas, até po-
  dades. Em honra desse reconhecimento, cui-        deria ser vantajosa, tendo em conta os benefícios
  dou-se de criar as equipas educativas. Esta é,    da redundância nos processos de refinamento de
                                                                                                     21




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competências. Mas as consequências, sendo irraci-      O mesmo fenómeno de complicação do que seria
onais, são, como convém, racionalizadas através        simples, se o modelo de funcionamento da escola
da multiplicação de mecanismos de burocratiza-         não fosse contraditório na sua própria equação, é
ção ritualista, com efeitos muito perniciosos, quer    visível no processo de substituição de professores
na promoção das aprendizagens, quer no estabele-       em falta. Um assunto desta natureza, resolvido no
cimento de um estilo de vida na escola - de uma        interior da equipa educativa, nem carecia de ne-
disciplina - que gere consensos e bem-estar nos        nhuma formalidade, à exceção da comunicação
professores e nos alunos.                              da falta do professor em causa. Não sendo assim,
Assim, sendo detetados problemas de aprendiza-         cria-se uma nova equipa de coordenação, inven-
gem em alguns alunos, assunto que, na esmagado-        tam-se formulários, grelhas, mecanismos de veri-
ra maioria dos casos, deveria ser resolvido no qua-    ficação do cumprimento das tarefas, fazem-se
dro da acção da equipa educativa sem necessida-        ajustamentos de horários de professores avulsos,
de de intervenção externa, o que acontece é que        provocam-se irritações e por aí fora, só para coor-
esses alunos são encaminhados para uma outra           denar o processo de substituição dos professores.
equipa, de sala de estudo, de apoio educativo,         Começa, espero eu, a ficar clara a indisciplina,
para superarem as suas dificuldades. Desta op-         isto é, a falta de qualidade de vida que, por esta
ção, resulta, entre outras coisas, a imperativa ne-    via é gerada na escola.
cessidade de elaborar relatórios periódicos para       Mas o funcionamento da escola fica ainda mais
articular aquilo que nunca deveria ter sido desarti-   complicado, porque a gestão dos comportamen-
culado. A distribuição de tarefas, entre os profes-    tos difíceis é levada a cabo dentro do mesmo en-
sores das equipas educativas, para não ser neces-      quadramento disfuncional. A equipa educativa,
sário “articular” aquilo que se “desarticulou”, de-    que deveria estar concentrada quase exclusiva-
veria contemplar esse tipo de respostas.               mente nas atividades com os alunos, seria a estru-
                                                                                                       22




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tura que disporia dos meios e da competência         vre” do que o que seria desejável, para eles e para
para gerir a esmagadora maioria das situações de     a escola.
indisciplina. A conflitualidade interna do modelo    Analisados só estes aspetos, talvez não fosse ne-
de funcionamento da escola atribui essa tarefa ao    cessário insistir mais na tecla da disfuncionalida-
diretor de turma e ao conselho de turma, que,        de para que a ideia aqui transmitida ficasse clara.
como se viu, tem condições para detetar o proble-    Só que o ambiente “indisciplinado” da escola não
ma, mas não tem espaço de manobra para o supe-       fica por aqui. A duplicação de tarefas, a redundân-
rar. É que, para além de fazerem parte de um de-     cia paralisante, a burocracia inútil inundam todo
terminado conselho de turma, o seu diretor e os      o contexto escolar. Demonstração disto mesmo é
restantes professores ainda fazem parte de um ou-    a multiplicação incessante de equipas, de coorde-
tro conjunto de equipas de trabalho que esgotam      nadores e de coordenadores de coordenadores,
completamente as suas disponibilidades7 e que        com origem na tentativa de superar a desorganiza-
são concebidas para isso mesmo, para ocupar          ção pela quantidade de coisas a fazer e a coorde-
todo o tempo disponível de cada um. Daqui resul-     nar e a articular. Todos os projetos - clubes, salas
ta que, mesmo comportamentos que, embora ca-         de estudo, apoio educativo e outros - funcionam
reçam de retificação, não demonstram complexi-       no exterior das equipas educativas e dos conse-
dade que incapacite uma pessoa de bom senso a        lhos de turma, sugando toda a energia e tempo
encontrar uma ou duas soluções adequadas, são        disponível que os professores deveriam dedicar,
motivo para encaminhar alunos para uma outra         com os mesmos ou outros projetos, aos seus pró-
equipa paralela, para que os resolva, como se isso   prios alunos, num quadro de cooperação entre si.
fosse possível. Deste modo, aqueles alunos, cujos    Desta opção quase anárquica de organização esco-
comportamentos solicitam uma intervenção mais        lar resulta uma percentagem elevadíssima de co-
cuidadosa, acabam por se sentir mais “em roda li-    ordenadores, entre os professores, se contarmos
                                                                                                      23




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com os diretores de turma, os coordenadores de       rável dos cargos levou a que os decisores políticos
cada projeto, os coordenadores dos coordenado-       esquecessem a origem histórica do fenómeno e,
res dos projetos, os coordenadores de departa-       de uma forma quase leviana, viessem a terreiro
mento curricular, os coordenadores de grupo dis-     denunciar as regalias abusivas dos encarregados
ciplinar: enfim, poucos são os professores que       dos cargos. Na verdade, embora os agraciados
não coordenam alguma coisa, inflacionando o          não ganhassem nada com a situação, as ditas be-
conceito de coordenação a um ponto tal, que dei-     nesses custavam dinheiro. E acabaram8. Agora,
xa de ter qualquer valor, para além da eventual e    as coordenações podem envolver a esmagadora
ingénua satisfação de se pertencer à nomenclatu-     maioria dos professores numa escola porque são
ra. Esta generosíssima distribuição de cargos de     absolutamente gratuitas, embora tenham custos
coordenação já se teria convertido na mais acirra-   na qualidade de funcionamento incalculáveis.
da avareza, não fosse dar-se o caso de esta profu-   Um grande número de professores pode, portan-
são e diluição de responsabilidades se ter implan-   to, exercer alguma forma de coordenação, mau
tado nas escolas sem qualquer custo adicional.       grado a mais do que evidente ineficácia e falta de
Historicamente, esta tradição barata de pulveriza-   proveito para os próprios e para a escola. No en-
ção de responsabilidades tem origem na ideia de      tanto, a ineficácia e a falta de proveito são só um
que estar com o poder já é gratificação bastante e   problema menor face à incoerência, à indiscipli-
que, por ela, os agraciados têm de se deschapelar    na, à falta de respeito pela própria atividade de co-
e ficar obrigados, de alguma forma, pelo reconhe-    ordenação que essa pulverização gera. Com efei-
cimento público do seu valor simbólico. Inicial-     to, basta pensarmos no sentido que faz um dire-
mente, a distribuição de cargos era menor e com-     tor de turma ser avaliado no seu desempenho do-
pensada, não com aumentos de salários, mas com       cente por um dos professores do seu conselho de
benesses no regime de trabalho. O aumento impa-      turma, só porque este é coordenador de departa-
                                                                                                       24




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mento. Afinal qual é o papel do diretor de turma?     deu conta de que, se fossem agrupados em depar-
Não será o de coordenar a atividade docente dos       tamentos, os custos seriam reduzidos e os provei-
professores do conselho de turma? Talvez não          tos ficariam como já estavam. Talvez alguns ou-
seja prudente dar mais exemplos deste outro ní-       tros tivessem pensado também que os departa-
vel de disfuncionalidade da escola, porque, de fac-   mentos configurariam uma reformulação na for-
to, não é minha intenção criar resistências desne-    mação dos professores e na promoção de alguma
cessárias a uma perspetiva diferente sobre como       polivalência docente. Esta ideia articulava-se me-
a escola se deve organizar.                           nos mal com a outra da constituição de equipas
Todavia, parece-me importante dar relevo a uma        educativas. Mas o que é que ficou de facto? Tiran-
tendência xistosa do nosso sistema educativo, que     do a redução de custos e a manutenção do provei-
opera as suas “reformas” por acumulação de ca-        to nulo, foi construída mais uma placa sobre aque-
madas sucessivas, talvez na esperança de que o        la que já lá estava.
peso das placas acabe por fazer rebentar nas pro-     Podemos não querer enfrentar o absurdo da vida
fundezas um qualquer poço de petróleo que, final-     da escola, mas recusarmo-nos a vê-lo, agora que
mente, resolva todos os problemas. Assim é com        está à frente dos olhos a inutilidade das “refor-
as turmas e as equipas educativas, como vimos:        mas” empreendidas, não é uma atitude que pare-
mantêm-se as turmas e acrescenta-se-lhes uma          ça promissora, nem do ponto de vista da qualida-
nova placa, as equipas educativas, para sedimen-      de do trabalho dos professores, nem do ponto de
tar bem as coisas. Ora, o mesmo acontece do ou-       vista do rendimento e da adesão a uma vida disci-
tro lado das equipas de trabalho, agora dos profes-   plinada por parte dos alunos.
sores. No tempo em que as coordenações de gru-        Sabendo da possibilidade de uma análise crua da
po disciplinar correspondiam a custos sem pro-        realidade da escola poder ofender inadvertida-
veito - as reduções dos tempos letivos - alguém se    mente sentimentos genuínos de dedicação à pro-
                                                                                                     25




                                               iBooks Author
fissão docente, que, se fossem de outro tipo, pou-
ca diferença me faria, é com passos miúdos e sal-
tando alguns obstáculos que me fui movimentan-
do nesta parte deste documento. Nem por isso se-
ria honesto não denunciar esta tendência a criar,
a cada vez, novas camadas de soluções mais pro-
blemáticas do que razoáveis, sedimentando, a
cada passo, aquilo que se devia refrescar, como
sendo o último, aqui a ser referido, dos níveis de
disfuncionalidade da escola.
A mudança não é a ocultação para debaixo do ta-
pete dos problemas; não é mesmo a compra de
um novo tapete para tapar o velho, já roto, apo-
drecendo-se o novo por tapar o velho, como está
acontecendo com a nossa escola.




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C APÍTULO 2



Uma
Abordagem
Ecológica
Com frequência se ouve atribuir a proble-
mas familiares uma boa parte da respon-
sabilidade pelos comportamentos desa-
justados dos alunos. Por outras palavras,
admite-se, sem grandes constrangimen-
tos, que um número variável, mas em
todo o caso muito elevado de famílias,
tendo em conta o número de alunos afeta-
dos, apresenta alguma forma de disfunci-
onalidade.



                                     iBooks Author
U MA A BORDAGEM E COLÓGICA                            dação e, por conseguinte, dificulta a sincronia e a
                                                      sintonia de funcionamento das estruturas sociais.
                                                      Com efeito, as mutações não respeitam as conve-
Com frequência se ouve atribuir a problemas fa-
                                                      niências sociais, nem de qualquer outra natureza,
miliares uma boa parte da responsabilidade pelos
                                                      e manifestam-se, na forma e no ritmo, de modo
comportamentos desajustados dos alunos. Por ou-
                                                      distinto e, por vezes, conflituoso nas diferentes es-
tras palavras, admite-se, sem grandes constrangi-
                                                      truturas sociais, isto é, nas famílias, nas empre-
mentos, que um número variável, mas em todo o
                                                      sas, nas escolas e por aí fora. Neste contexto, se-
caso muito elevado de famílias, tendo em conta o
                                                      ria muito preocupante que a escola fosse a única
número de alunos afetados, apresenta alguma for-
                                                      instituição social poupada a essas pressões de mu-
ma de disfuncionalidade. Ora, admitindo que esta
                                                      dança, ou que a forma e o ritmo, com que elas se
forma de pensar seja razoável, isto é, que algo es-
                                                      exercem no seu interior, fossem completamente
teja a acontecer nas nossas sociedades que tenha
                                                      alheios ao que se passa nas famílias, nas empre-
influência bastante para gerar confusões de pa-
                                                      sas, nas organizações políticas, etc.
peis e de estatutos nas estruturas familiares, pen-
                                                      Por muito conveniente que pareça ser encontrar
sar que a escola só seria abordada por um proble-
                                                      fora da escola todas, ou quase todas, as razões
ma desta envergadura pelo flanco dos alunos reti-
                                                      para as dificuldades no seu interior, a verdade é
ra a esse raciocínio qualquer legitimidade razoá-
                                                      que, de um ponto de vista menos estreito, faz pou-
vel.
                                                      co sentido separar o interior do exterior. O proble-
Não custa acreditar, é até muito óbvio, que a nos-
                                                      ma que se deve colocar é outro: até que ponto a es-
sa vida em sociedade está a sofrer mutações de
                                                      cola atualiza, no seu interior, as perturbações e as
grande envergadura a um ritmo que dificulta ou
                                                      dificuldades que, pela natureza das coisas e pela
até, muitas vezes, impede os processos de acomo-
                                                      distorção do ponto de vista, são mais facilmente
                                                                                                        28




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detetáveis no seu exterior? Nós nunca nos fala-       sível testar as regras, os comandos adultos, sem
mos a nós mesmos olhos nos olhos, a não ser atra-     supervisão, entre pares. A dinâmica entre estes
vés de um mediador: o reflexo de um espelho ou        dois contextos é responsável por um equilíbrio,
alguma modalidade de reflexão. A escola precisa       embora instável - porque sujeito a ajustamentos
de se ver ao espelho, para não continuar a chapi-     em função das idades, e das características indivi-
nhar água para todo o lado, para aprender a na-       duais -, fundamental no processo do desenvolvi-
dar, sem molhar os transeuntes.                       mento da autonomia moral ou da auto-disciplina:
Uma dessas mutações sociais, ao nível dos micros-     por um lado, é necessário conhecer as regras, por
sistemas de desenvolvimento humano 9, revela-se       outro lado, é necessário assumi-las como também
particularmente relevante para a compreensão do       suas.
problema da indisciplina, na medida em que, pre-      Ora, a mutação, aqui em causa, traduz-se pela se-
cisamente, ela se manifesta na escola e na família,   paração dos dois contextos, e pela redução da di-
de um modo sincronizado e sintonizado.                nâmica entre eles à rigidez de cada um, de forma
Dois tipos de contexto, no quadro dos microssiste-    a corresponderem cada vez mais a modelos educa-
mas, eram apreciados por pais e professores, ain-     tivos distintos e cada vez menos a dois ambientes
da que não lhes dessem estes nomes ou qualquer        educativos igualmente importantes para a educa-
outro: o contexto primordial e o contexto secundá-    ção dos mais novos, qualquer que seja o modelo.
rio. O primeiro (contexto primordial) pode, muito     Na verdade, eles são mais importantes do que os
resumidamente, ser caracterizado como o contex-       modelos educativos, mas na nossa sociedade fo-
to da supervisão, das regras estabelecidas e feitas   ram reduzidos, na prática, à, pelos vistos, impera-
cumprir por adultos; o segundo (contexto secun-       tiva necessidade de distinguir os “bons” dos
dário) corresponde ao espaço de autonomia dos         “maus” pais, a “boa” da “má” educação. Por ou-
humanos em desenvolvimento, aquele onde é pos-
                                                                                                      29




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tras palavras, foram reduzidos à sua insignificân-   que é aconselhado pelo seu relógio biológico. Ex-
cia, à sua falta de significado e sentido.           perimentar, autonomamente, regras de conduta
Então, “bons pais” são aqueles que reduzem dras-     com os seus pares, sem supervisão, ao três anos,
ticamente o acesso dos seus filhos a contextos se-   não é seguramente a mesma coisa que começar a
cundários, e “maus pais” são aqueles outros que      ter essa oportunidade aos treze, nem tem os mes-
não conseguem estruturar contextos primordiais       mo riscos. Não correr riscos aos três anos é segu-
para os seus filhos. Do mesmo modo, a “boa esco-     ramente perigoso quando for necessário corrê-los
la” reduz o espaço de autonomia aos seus alunos,     aos treze.
por oposição a uma ideia, mais fantasmática do       Se formos rigorosos, no entanto, teremos de admi-
que outra coisa, de uma escola sem supervisão,       tir que as crianças, por força da sua humanidade,
isto é, de uma escola não-escola.                    testam, de qualquer modo, essa autonomia na re-
Não nos devemos, no entanto, deixar levar pela       lação com os pares, só que o fazem nos espaços
tentação de, agora, por novas razões responsabili-   de supervisão adulta, por falta de outros. Daqui,
zarmos o ambiente familiar por esta dicotomia        resulta uma aprendizagem poderosa, porque es-
malfazeja para o desenvolvimento das crianças.       truturada muito precocemente e de forma siste-
Na verdade, as crianças são escolarizadas muito      mática: os contextos de supervisão só se distin-
precocemente e a sua escolarização é um dos me-      guem dos contextos de autonomia, pelas necessi-
canismos sociais mais poderosos de legitimação       dades de afirmação da criança, e não pelas carac-
das atitudes que conduzem à eliminação dos espa-     terísticas educativas desses espaços ou momen-
ços de autonomia, na família e, depois, em outras    tos. A sala de aula transforma-se assim em mais
instituições. Digamos, para abreviar, que, com o     um momento possível de realização autónoma, e
contributo indispensável da escola, as crianças      sem regras adultas, das interações entre pares.
são mantidas crianças muito para além daquilo        Muitos alunos têm mesmo sinceras dificuldades
                                                                                                    30




                                              iBooks Author
em perceber por que razão os professores interfe-     tão que fazem das suas interações com os pares. A
rem nesse processo interativo, “que não tem nada      não ser que se pretenda destruir toda a possibili-
de mal”. Na verdade, corresponde a uma necessi-       dade de esses alunos terem “companhias”, o que
dade vital que não encontra, por aprendizagem,        seria a supervisão levada ao limite da irracionali-
outro espaço para se realizar, mesmo que, por ve-     dade e da desumanidade, não devemos ser tão
zes, a alternativa possa estar diante dos seus        simplistas. Na verdade, parece precisarem que o
olhos. Esta cegueira é uma cegueira aprendida, e,     espaço de autonomia seja, ele também, supervisio-
portanto, tem a vantagem de poder ser desapren-       nado, isto é: não sabem ser bem educados, embo-
dida, só que a escola não tem as características de   ra saibam como é que se faz.
funcionamento que poderiam facilitar a reapren-       No pólo oposto, encontramos os “mal educados”,
dizagem da autonomia. Ela teme, tal como a famí-      aqueles que, por falta de condições de supervisão,
lia, os perigos, mais do que a certeza de estar a     tiveram de fabricar um conjunto de regras com os
proceder mal, e até perigosamente mal. O perigo,      seus pares por conta própria. Alguns destes “até
o risco suposto é, pelos vistos, muito mais ameaça-   não se portam muito mal” na sala de aula, porque
dor e muito mais “perigoso” do que o perigo em        lhes é mais fácil distinguir o “seu próprio” espaço,
ato, talvez, precisamente, pela ilusão do poder       do espaço gerido por adultos. O que surpreende é
magnífico que é atribuído à supervisão e às regras    que, sendo “mal educados”, como é que conse-
dos adultos.                                          guem ser menos perturbadores do que muitos
Deste modo, é fabricado um conjunto vasto de alu-     dos “bem educados”. Na verdade, por via de re-
nos “bem educados”, que se porta mal. A atenção,      gra, não se portam tão bem quanto à primeira vis-
a supervisão, o interesse dos pais são prova de       ta possa parecer: a sua disposição vai mais no sen-
boa educação. Aquilo que os prejudica “são as         tido de desvalorizar e até desprezar as tarefas e as
companhias”, dito por outras palavras, a má ges-      regras desse espaço adulto, o que, normalmente,
                                                                                                       31




                                               iBooks Author
lhes gera limitações nos processos de adesão a ati-   isto é, por via da própria avaliação da consistên-
vidades de aprendizagem e consequentes dificul-       cia das competências comportamentais, suposta-
dades escolares, de intensidade variável, mas sem-    mente adquiridas por esses alunos.
pre significativas. Se, por qualquer razão, algo os   A redução, a tentativa mesmo de destruição, da
faz “portar-se mal” (adotar comportamentos per-       dinâmica entre contextos primordiais e contextos
turbadores), é este desprezo e esta desvalorização    secundários nos microssistemas não consegue ob-
que se tornam evidentes, de uma forma que, o          ter um sucesso real e mensurável, como se depre-
mais das vezes, é sentida pelos professores como      ende do dito nos últimos parágrafos. O que acon-
extraordinariamente ofensiva. Ainda que este          tece é que as instituições educativas ficam do lado
“portar mal” seja menos frequente do que o dos        de fora dessa dinâmica, mantendo uma ideia resi-
“bem educados”, a intensidade da ofensa cria a        dual do que ela possa ser, para efeitos de oratória.
ilusão da frequência. De facto, um comportamen-       Na verdade, ela continua, por força da humanida-
to desajustado destes alunos “mal educados”           de dos sujeitos, gerando uma variedade de situa-
pode corresponder a dez ou mais comportamen-          ções tão vasta quanto os sistemas interativos e di-
tos desajustados, mas menos graves, dos alunos        nâmicos podem construir num processo sabida-
“bem educados”. Por outro lado, o grau de ofensa,     mente aleatório. Os resultados obtidos, ainda por
sentido pelo adulto, ou o seu sentido de responsa-    cima, raramente caem na tipologia atrás mencio-
bilidade como educador, que sente como tarefa         nada. Pelo contrário, não só são inesperados e dís-
da sua responsabilidade impedir certos excessos,      pares num tempo dado, como a sua evolução é im-
conduz à alimentação dos comportamentos desa-         previsível, desatualizando qualquer tentativa de
justados destes “mal educados”, por via da siste-     retificação das consequências, que não tenha a co-
mática testagem, por vezes, inconsciente, da sua      ragem de abordar o problema pelo seu lado ecoló-
capacidade para respeitar as regras de conduta,       gico, ou bioecológico para ser mais preciso.
                                                                                                       32




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SECÇÃO 1                                                      co ambiente que escapou aos problemas que gostaria
    Implicações Educativas e Organizacinais                   de ver corrigidos fora de si, para não os ter. As famílias,
                                                              as empresas, enfim, todas as restantes organizações so-
                                                              ciais teriam de corrigir-se, para que a escola não preci-
                                                              sasse de o fazer. Seguir este caminho seria o mesmo
                                                              que trilhar uma perigosa senda que remeteria a escola
                                                              para um lugar sem referências, onde o norte e o sul se
                                                              misturariam, para o vazio da mais absoluta inutilidade:
                                                              uma escola, tão perfeita que se afastasse das imperfei-
                                                              ções do que a rodeia e lhe dá sentido, seria desejavel-
Não seria completamente ilegítimo pretender que os
                                                              mente descartável.
problemas decorrentes de alterações dramáticas nas di-
nâmicas dos microssistemas externos - família, vizi-          Apesar de tudo, faz sentido que nos questionemos so-
nhança - fossem objeto de intervenção social no senti-        bre o que queremos como modelo de sociedade e, sen-
do da sua superação, na expectativa de que, por essa          do assim, que reflitamos sobre se os modelos macrossis-
via, a escola fosse poupada a ter de os enfrentar. Talvez     témicos - política de trabalho, de saúde, de educação,
não seja ilegítimo, mas seria completamente absurdo.          de segurança social - não estarão a potenciar perigosa-
É que a escola é, também ela, um microssistema, e as          mente a destruição dos ambientes ecológicos que julga-
interações entre microssistemas - o mesossistema - são        mos serem os ideais para a formação da juventude. É
tão dinâmicas e poderosas como as que se estabelecem          que as crianças e os jovens não “decidem”, num eventu-
ao nível de cada microssistema, já não tanto ao nível da      al congresso ou por outros meios, que vão dedicar-se a
interferência direta no comportamento individual, mas         criar problemas à sociedade (ou à escola) que os rece-
mais na forma como cada um dos microssistemas des-            be, como às vezes parece, se levarmos a sério certas con-
envolve a sua dinâmica interna. O absurdo seria cons-         versas que nós, adultos, vamos tendo entre nós. Pelo
truir a ilusão de que a escola é, no atual contexto, o úni-   contrário, são as crianças que, em primeira mão, so-

                                                                                                                       33




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frem os problemas e as disfuncionalidades da socieda-      mais eruditos e muito mais argutos chamam pós-mo-
de de que se pretende que venham a fazer parte inte-       dernismo. Os moinhos de vento só não são castelos,
grante. O sofrimento da escola é um sofrimento em se-      são masmorras pútridas, cheias de nada ou de resíduos
gunda mão, já cheio de tiques e de malformações que        mal espalhados e mal varridos da modernidade, que se
lhe vêm do primeiro uso.                                   insinuam debaixo de tapetes rotos, para os quais já não
Só que uma abordagem global deste tipo, embora te-         há fio que os cosa: daí, a fragmentação de que nos fa-
nha de estar presente na sua forma de consciência polí-    lam alguns pensadores contemporâneos.
tica, não pode tornar-se num obstáculo intransponível.     Ora, o dinamismo da escola, como microssistema, é,
A reflexão crítica deve, portanto, incidir mais sobre a    cada vez mais, reprodutor daquilo mesmo que se pro-
dinâmica do que sobre os componentes, ou os indivídu-      põe corrigir. Saber ler não é seguramente saber pedir
os, ou os meios de que dispõem os diferentes patama-       ajuda a um professor para associar grafemas e fone-
res do sistema social. É na dinâmica que podemos en-       mas, a cada palavra nova que surja. Pelo contrário, é,
contrar os pontos comuns que nos permitem transitar        tendo aprendido essa tarefa em 28, ou mais ou menos
entre os diferentes níveis do sistema - micro, meso,       palavras, ser capaz de fazer o mesmo em todas as novas
exo, macro e cronossistema - sem cairmos na tentação       que surjam ou venham a ser inventadas. É mesmo não
reducionista dos analistas estreitos. O debate sobre os    ser capaz de fazer outra coisa, ainda que o conjunto de
indivíduos ou os meios deve submeter-se a uma ideia        letras agrupadas não constitua uma palavra genuína. A
de dinâmica e não o contrário10. As políticas educativas   este processo, chama-se aprendizagem significativa,
atuais são inoperantes, precisamente porque partem         isto é, aprendizagem que se estrutura numa memória
do pressuposto de que a manipulação dos indivíduos e       semântica praticamente indestrutível, embora sempre
dos meios vai produzir retificações nas dinâmicas. E       renovável e suscetível de aperfeiçoamento. Distingue-
não produz outra coisa que não seja o conformismo, a       se este tipo de aprendizagens das aprendizagens instru-
ilusão de mudança e a revolta contra essa mesma ilu-       mentais, isto é, daquelas que, organizando-se sobretu-
são, em resumo, um quixotismo invertido, a que alguns      do na memória episódica, são indispensáveis para al-

                                                                                                                34




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cançar as primeiras, mas formam uma estrutura frágil,       direta do professor. Sabe o que o professor ensina, mas
sujeita a processamento intensivo nos períodos de           para saber à sua maneira. O bom aluno é aquele que
sono, responsáveis pelos sonhos, pela criatividade, mas     apoia a aprendizagem instrumental com trabalho autó-
incapazes de sustentar-se a si mesmas. São as aprendi-      nomo. Para alguns deles, momentos relativamente cur-
zagens significativas que as sustentam no tempo, embo-      tos e assíduos de apoio à aprendizagem são o bastante,
ra sejam elas que, a cada momento, ajudam a organizar       para outros esses momentos têm de ser mais longos e
estas aprendizagens significativas.                         menos assíduos, e ainda para outros, a gestão desse
Se a escola pretende ser um espaço de aprendizagem es-      apoio é variável consoante a matéria de aprendizagem.
truturada, não pode, nem poupar-se ao trabalho de in-       Mas nenhum dispensa essa gestão. Há ainda um núme-
sistir nas aprendizagens instrumentais, nem insistir de     ro sempre crescente de alunos que, por razões que não
tal modo nelas que reduza as aprendizagens significati-     vão agora ser aqui repetidas, precisam que a sua pró-
vas (de cariz semântico) a processamentos de informa-       pria autonomia seja supervisionada pelos pais ou por
ção de natureza instrumental. Ora, se a aprendizagem        centros de estudo, explicadores ou outros. Na verdade,
instrumental é sobretudo aquilo que o ensino, no seu        este é um dos sintomas mais evidentes de que a escola,
sentido mais restrito, pode assegurar, dependendo por-      ao longo dos vários ciclos de aprendizagem, não dá
tanto da supervisão, a aprendizagem significativa, essa,    oportunidades de gestão autónoma das aprendizagens,
nasce da autonomia do aprendiz, da construção do alu-       isto é, não permite, ou impede mesmo, a aprendizagem
no11. As aprendizagens de valores, de teorias, de concei-   da autonomia. É natural que, nas primeiras idades, a
tos são aprendizagens de tipo semântico. Implicam,          aprendizagem da autonomia careça de supervisão, de
para que sejam estruturantes, a construção do sujeito       ensino instrumental, mas começa a ser preocupante
aprendiz. Por outras palavras, implicam autonomia,          que alunos com 12, 13 anos e, pior ainda, com idades
isto é, trabalho mental sem supervisão direta e simultâ-    mais avançadas ainda se sintam completamente despro-
nea. O bom aluno é aquele que adquire as aprendiza-         tegidos na sua autonomia.
gens por via do ensino e as organiza fora da supervisão

                                                                                                                 35




                                                    iBooks Author
Ora, a escola tem de se organizar de modo a promover         pela impossibilidade prática de essas modalidades de
as aprendizagens instrumentais e as aprendizagens es-        intervenção se universalizarem a todos os alunos. As-
truturantes. Para isso, não pode ter o modelo rígido de      sim, não sendo atividades disponíveis para todos os
funcionamento que lhe conhecemos atualmente. Diga-           que delas necessitam, e não sendo aproveitadas por to-
mos, para abreviar, que não se superam as limitações         dos para quem são disponibilizadas, têm o mérito de se
da escola criando “salas de estudo”, “estudo acompa-         constituírem como mais uma oportunidade para articu-
nhado”, “aulas de apoio”, num contexto em que tudo o         lar aquilo que não deveria ter sido desarticulado, isto é,
que seja criado de novo acaba sempre por fortalecer a        de se constituírem numa poderosa afirmação da buro-
rigidez daquilo que já existe e parece insuficiente. Estas   cracia auto-justificada e auto-alimentada.
compensações só compensam aqueles alunos que, por            Ao nível da indisciplina, sobretudo aquela que se mani-
mérito próprio, são pouco afetados pelas limitações da       festa de baixa intensidade e de alta frequência, este mo-
escola. Os outros, muitas vezes, evitam confrontar-se        delo de escola pulverizado para fora das equipas educa-
com a confirmação da sua incompetência que estas es-         tivas, descentrado da sua atividade nuclear, é particu-
tratégias compensadoras se limitam a pôr em evidên-          larmente gerador de problemas e incapaz de enfrentar
cia. Compensar um erro não é corrigi-lo, é tentar man-       com sucesso aqueles outros que possam ser gerados ou
tê-lo, disfarçando-o tanto quanto possível, nem que          potenciados no seu exterior.
seja só através da hiperatividade burocrática ou da hi-
                                                             Seria insensato supor sequer a possibilidade de uma or-
perventilação dos agentes compensadores. Os concei-
                                                             ganização social alcançar um ponto tal de perfeição que
tos de sala de estudo, de estudo acompanhado e de
                                                             anulasse todos os tipos de conflitualidade no seu interi-
apoio educativo dão conta da insuficiência do modelo
                                                             or ou na sua relação com o exterior. Não só seria insen-
de escola que temos, mas não são compatíveis com ele.
                                                             sato como, no limite, seria opressor e perigosamente
Em aplicação, limitam-se a acrescentar às dificuldades
                                                             inibidor do desenvolvimento e melhoria da própria or-
já existentes algumas mais. Este acrescento de dificul-
                                                             ganização. Essa “perfeição” só poderia ser a mais abo-
dades é, apesar de tudo, invisibilizado e até camuflado
                                                             minável imperfeição. Não se tratará, aqui, portanto, de
                                                                                                                     36




                                                      iBooks Author
encontrar um modelo de organização da escola que
saia em busca dessa quimérica perfeição. Pelo contrá-
rio, o modelo, que aqui se pesquisa, procura, sobretu-
do, ser um modelo que suporte com eficiência a dinâmi-
ca da escola, não que solucione os problemas de hoje
ou de amanhã, mas que se dote dos meios necessários
para os superar, ao nível do seu próprio funcionamen-
to.




                                                                  37




                                                 iBooks Author
C APÍTULO 3



A Proposta



O modelo de escola aqui proposto procu-
ra deliberadamente ser um modelo de di-
nâmica, isto é, um modelo funcional, ope-
ratório, mais do que um modelo pura-
mente conceptual ou abstrato.




                                      iBooks Author
A P ROPOSTA                                           Ora, precisamente, o que aqui se propõe é uma al-
                                                      teração radical deste estado de coisas. Trata-se de
                                                      uma proposta que deve enformar o projeto educa-
O modelo de escola aqui proposto procura delibe-
                                                      tivo da escola e traduzir-se em planos anuais de
radamente ser um modelo de dinâmica, isto é,
                                                      atividades que correspondam à execução anual
um modelo funcional, operatório, mais do que
                                                      do projeto, por um período estimado de quatro/
um modelo puramente conceptual ou abstrato.
                                                      cinco anos.
Esta opção não significa a ausência desse concei-
to de escola, mas uma opção de economia, tendo
em conta o propósito deste documento.
Nos capítulos anteriores, a crítica ao funciona-
mento atual da escola, em resumo, aponta para a
denúncia de uma dinâmica, em que os circuitos
de informação e de gestão do quotidiano provo-
cam “engarrafamentos”, disfunções, que, para
além de criarem enormes dificuldades à direção
da organização, afastam os professores, no seu
tempo não letivo, para fora do centro da sua ativi-
dade profissional nuclear. Com efeito, nesses tem-
pos, os professores continuam, muitas vezes, a de-
dicar-se a atividades com alunos, desde que não
façam parte da suas turmas.


                                                                                                      39




                                               iBooks Author
SECÇÃO   1                                              conceitos de senso comum em uso genuíno na lín-
    Unidades de Funcionamento                           gua portuguesa.
                                                        Por outro lado, considera-se que a função educati-
                                                        va do professor corresponde a uma inevitabilida-
                                                        de que resulta da sua função de ensinar. Fazer
                                                        apelo a essa função educativa no professor signifi-
                                                        ca sobretudo fazer um apelo à tomada de consci-
                                                        ência sobre essa inevitabilidade. Dito de outro
                                                        modo, evitar essa tomada de consciência não tem
As unidades de funcionamento devem aproxi-              qualquer impacto na redução da função educati-
mar-se o mais possível de uma posição isomorfa          va, só a remete para a inconsciência, com todos
da atividade nuclear da escola - ensinar e apren-       os riscos que isso comporta. Consequentemente,
der. As culturas, em cuja base linguística os con-      ser-se bom professor implica ser-se um educador
ceitos de educar e instruir, e os de ensinar e apren-   consciente, não sendo, todavia, verdade o inver-
der adquirem matizes que, ou os reduzem artifici-       so. Nesta ordem de ideias, a componente educati-
almente um ao outro (“educado” como sinónimo            va do professor deve traduzir-se na criação de con-
de “instruído”), ou os juntam numa mesma pala-          dições favoráveis à aprendizagem, seja no domí-
vra (“apprendre” como significando aprender e           nio dos conhecimentos e informações cultural-
ensinar), dominam as investigações científicas so-      mente relevantes, seja no domínio do contexto
bre estes conceitos, como é compreensível. Para         em que ela se realiza, ao nível das condutas dos
evitar malentendidos, os termos “ensinar” e             alunos e dos professores, dos materiais, da quali-
“aprender”, neste documento, correspondem aos           dade da comunicação e por aí fora.


                                                                                                        40




                                                iBooks Author
Ora, em resumo, a atividade nuclear da escola,         cas para responder o mais eficientemente que lhe
aquela que lhe dá algum sentido distintivo de ou-      seja possível à evolução inevitável das sociedades,
tras também informativas e educativas, é justa-        fortalecendo, a cada passo, a sua atividade nucle-
mente a de ensinar e aprender em condi-                ar. Assim,
ções favoráveis, significando, em coerência            ๏ As equipas educativas devem ser a estru-
com o acima enunciado, que ela não é nunca com-          tura funcional nuclear da escola. A) Por
pleta - na verdade, não será nada - se algum dos         equipa educativa entende-se um conjunto de
três elementos que a compõem (ensinar, apren-            alunos, professores e auxiliares de educação
der e condições favoráveis) estiver ausente.             que desenvolvem, em conjunto, a atividade nu-
Discutir analiticamente cada um desses conceitos         clear da escola. Não coincide este conceito de
e encontrar um solução para eles, na tentativa de        equipa educativa com a prática atual que a iden-
fundamentar previamente um modelo de funcio-             tifica com o grupo de professores que traba-
namento de escola, seria uma das tais tarefas ci-        lham com os mesmos alunos. Pelo contrário, a
clópicas que nunca estaria concluída, e, ou a solu-      equipa educativa é aqui concebida como uma
ção seria uma dissolução dos conceitos num ou vá-        unidade funcional para realização de todas as
rios preconceitos, ou a busca de solução seria o         tarefas que possam caber nessa atividade cen-
seu adiamento permanente.                                tral da escola. B) O conceito de estrutura funci-
Por estas razões, aqui muito sinteticamente expos-       onal nuclear corresponde, por outro lado, à
tas, alimento a crença de que quaisquer que se-          base estrutural de todo o edifício organizacio-
jam as teorias científicas, ideológicas ou outras, e     nal da escola. Na verdade, significa a sua so-
sendo elas sempre provisórias, a escola deve pro-        breordenação face a qualquer outra estrutura:
curar instaurar dentro de si mesma, através do           departamento curricular, grupo disciplinar, clu-
seu modelo de funcionamento, as condições práti-         bes, etc.
                                                                                                       41




                                                iBooks Author
๏ As equipas educativas devem ser dimen-                não o inverso. A formação de grupos de traba-
  sionadas, a partir do número de alunos a              lho (os grupos reduzidos mais importantes)
  envolver em cada uma delas. Nos documentos            deve responder, como veremos, à avaliação dos
  legais reguladores do “lançamento do ano leti-        níveis de autonomia na realização das tarefas
  vo”, surge, desde há vários anos, a indicação de      escolares, quer dos professores, quer dos alu-
  que a constituição das turmas deve resultar da        nos, isto é, as condições subjetivas de ensino e
  definição prévia das equipas educativas. Esta         de aprendizagem devem ser valorizadas, mais
  orientação tem sido obviamente absorvida da           do que as condições que resultam daquilo que
  única forma que é possível, não lhe sendo dada        cada um pensa que sabe objetivamente. Por
  qualquer relevância. Com efeito, as atuais práti-     exemplo, ser capaz de aprender, de realizar
  cas de formação de turmas e de organização de         uma tarefa de aprendizagem, sem supervisão
  equipas educativas não se compaginam, de              de um adulto é um critério mais seguro para or-
  modo a viabilizar a concretização dessa orienta-      ganização dos grupos de trabalho do que a ava-
  ção talvez bem intencionada, mas sem nexo no          liação do que já se sabe.
  atual contexto escolar. No entanto, sendo corri-    ๏ As equipas educativas devem ter níveis
  gidas essas práticas, esta orientação adquire         de autonomia alargados no interior da orga-
  todo o sentido. Assim, as equipas devem dispor        nização escolar. Numa escola com um pouco
  dos recursos humanos, materiais, e eventual-          mais de 1 000 alunos, podemos antever a neces-
  mente outros, que se ajustem às necessidades          sidade de 8, 9, talvez, 10 equipas educativas.
  de, aproximadamente, 100 a 200 alunos. A for-         Isto corresponderia à criação de igual número
  mação de grupos de identificação mais reduzi-         de coordenações, em substituição dos atuais
  dos (“turmas”) é, tudo leva a crer, muito útil,       cerca de 50 diretores de turma12 que tal núme-
  mas deve resultar da constituição das equipas e       ro de alunos implica. Ora, ser-se coordenador
                                                                                                     42




                                               iBooks Author
num quadro deste género não poderá ser um              los, de organizar atividades de enriquecimento,
apêndice, nem sempre fácil de plantar, num             de apoio à aprendizagem, de retificação de con-
vasto conjunto de outras atividades. Deve dedi-        dutas indesejadas, etc.
car-se por inteiro a essa tarefa, o que, de modo     ๏ Os coordenadores das equipas educati-
nenhum, implica que deixe de ter responsabili-         vas devem constituir o principal órgão
dades letivas, antes pelo contrário. Por outro         de assessoria do diretor de escola. Em coe-
lado, admitindo a redução ou eliminação mes-           rência com o que é afirmado antes, o diretor
mo da democracia representativa na escolha do          deve ser, antes de tudo o mais, o gestor de últi-
coordenador da equipa educativa, tal como já           ma instância, não o de primeira, da atividade
sucede atualmente em todos os cargos de res-           nuclear da escola. A sua equipa de assessores
ponsabilidade, é vital, para a eficiência da esco-     deve, portanto, formar-se a partir das unidades
la, que seja cultivada a democracia participati-       funcionais nucleares, assegurando-lhe os mei-
va. Assim, devendo o coordenador reportar di-          os que lhe permitam exercer as suas funções,
retamente ao diretor da escola, sendo mesmo            recorrendo o menos possível a informações
escolhido por ele, faz todo o sentido que o dire-      avulsas.
tor não tenha de se envolver na gestão do quoti-
                                                     ๏ Devem ser criadas outras unidades fun-
diano da equipa. Pelo contrário, deve manter a         cionais, para além das equipas educativas. As
distância prudente, que lhe permita intervir           equipas educativas devem ser estruturadas em
sensatamente, em caso de necessidade impera-           torno do core curricular de cada ciclo de estu-
tiva. A autonomia, a que aqui se faz referência,       dos ou de cada curso, pelo menos numa primei-
é a de elaborar e gerir os horários dos professo-      ra fase de mudança. A opção por outras unida-
res e dos alunos, de os ajustar às necessidades        des funcionais deve corresponder a uma afirma-
da equipa, de flexibilizar a gestão dos currícu-       ção da identidade da escola. Assim, pode ser cri-
                                                                                                     43




                                             iBooks Author
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Indisciplina e Disfuncionalidade

  • 1. JB Indisciplina e Disfuncionalidade JORGE NUNES BARBOSA FEVEREIRO, 2012  iBooks Author
  • 2. IV. Apêndice Remediativo Índice Intervenção Educativa em Problemas de Comportamen- to Questões prévias: Plano de Intervenção Passos a respeitar num Plano de Intervenção Intervenção Ecológica Prólogo Consequências e Gestão de Crises I. Indisciplina e Disfunção Institucional Aquisição de Comportamentos Ajustados 1.1. O Individualismo Código de Conduta 1.2. A Burocracia V. Conclusão 1.2.1. A Estrutura Disfuncional Notas Finais II. Uma Abordagem Ecológica 2.1. Implicações Educativas e Organizacionais III. A Proposta 1. Unidades de Funcionamento 1.1. Aspetos Organizacionais 1  iBooks Author
  • 3. pusesse em evidência os aspetos mais valorizados Prólogo nas atitudes de alunos, professores e pais parecia estar mais de acordo com o estabelecimento des- se consenso, do que um regulamento interno de- masiado extenso e muito difícil de ser traduzido em condutas positivas. No meu espírito sempre esteve clara a necessida- de imperativa de fundamentar esse código de con- duta e a sua pertinência. Estava nas intenções sub- jetivas do compromisso assumido que essa funda- mentação deveria ser curta e assertiva, como pare- ce convir nestas situações. Só que o caminho se- Este documento nasce originariamente de um guido deu-se a si mesmo uma dimensão que nem compromisso assumido com os meus colegas de com boa vontade pode ser considerada curta. Por Departamento Curricular. Analisava-se a discre- outro lado, coincidências inesperadas entre aqui- pância entre juízos de alunos, professores e pais lo que se assemelhava a uma encomenda e outro sobre a indisciplina na escola. Fazia sentido que a tipo de solicitações, fizeram juntar, num só, um comunidade escolar estivesse segura de que parti- documento de trabalho interno e um documento lhava um conceito consensual de disciplina e de reflexivo que, de qualquer modo, correspondendo indisciplina, que pudesse sustentar um diálogo a outro tipo de compromisso, era necessário que produtivo entre perspetivas diferentes sobre o as- ficasse pronto num período de tempo quase coin- sunto. Neste quadro de referência, um código de cidente. Por estas razões, e só por estas, este docu- conduta, um documento não judicializado, que mento é bastante mais longo do que seria desejá- ii  iBooks Author
  • 4. vel. Mas não menos assertivo do que era a inten- cas e as propostas, neste documento, são conser- ção inicial, espero eu. vadoras. O que agora é divulgado corresponde a uma ver- Uma ideia geral estrutura todo o documento: só são, apesar de tudo, simplificada e reduzida sobre poderemos proteger o atual imaginário de escola, os conceitos de disciplina e organização institucio- se formos capazes de focar os seus aspetos nuclea- nal e sobre uma abordagem ecológica das organi- res e desvalorizar as suas componentes distrati- zações. Contém também uma visão geral sobre as vas e circunstanciais. O conceito de imaginário, linhas de força que devem nortear as reformas aqui utilizado, não coincide em todos os seus pon- educativas, ou o projeto educativo da escola, con- tos, com o conceito de imaginário do senso co- soante o patamar de intervenção em que cada um mum. Entendamo-nos, portanto. se situe. É defendido ainda um modelo de inter- Em estudos meus, que levam já muito, talvez ex- venção educativa, não aversiva, nos comporta- cessivo, tempo sem publicação, sobre aquilo a mentos difíceis de alunos e, obviamente, são apre- que agora se chama “deficiências da inteligência e sentadas as linhas gerais de um código de condu- do desenvolvimento”, tem sido útil distinguir dois ta. tipos de “lógica” que presidem à nossa forma hu- Em termos gerais, a postura ideológica aqui assu- mana de pensar. Uma é, digamos, uma “lógica mida é, num certo sentido, conservadora. Com analógica” (imaginário), isto é, uma “lógica” que efeito, é preservado o imaginário de escola como não é ilógica, mas também não é lógica, no senti- um espaço e um tempo de integração dos novos do matemático do termo. A outra é a lógica digital elementos na sociedade e de salvaguarda de valo- ou matemática. Ambas correspondem a podero- res, social e democraticamente, partilhados, que sas organizações da informação - daí o nome de lhes pré-existem. Neste e só neste sentido, as críti- “lógica” que ambas merecem -, mas o imaginário corresponde a uma lógica adaptativa (inteligen- iii  iBooks Author
  • 5. te), mas pouco adaptável (persistente), e a lógica Ora, o imaginário de escola que aqui se preserva é digital é simultaneamente adaptativa (inteligen- justamente esse que aglutina no seu interior con- te) e adaptável (provisória). A nossa vida do quoti- tradições adaptativas (inteligentes) e que vive diano é sobretudo dominada pela lógica analógi- bem com elas. Neste sentido, o imaginário é realis- ca, porque, sem conflitos, sem dissonâncias, e ta, não é uma fantasia, uma fuga à realidade, mas, com uma enorme estabilidade, responde com efi- pelo contrário, uma tentativa de adequação a ela. cácia e superior inteligência à maior parte dos pro- Traduzido em narrativa, este imaginário será o blemas que nos são colocados. Quando um con- mito, se quisermos aprofundar as coisas. Há, por- junto dessas informações se mostra, em certas cir- tanto, uma narrativa mítica da escola a que não cunstâncias, menos adaptativo, pode ser gerado devemos fugir. Agora, se quisermos que a escola um outro, por acumulação e reorganização de in- não estruture uma “deficiência da inteligência e formações, mas sem destruir o anterior: ficamos, do desenvolvimento”, não podemos ficar por aí. portanto, com duas soluções no repertório. Na ló- É, então, no respeito pelo imaginário, pelo mito, gica digital, quando o mesmo acontece, dá-se lu- da escola que aqui se propõe a construção de no- gar a uma reformulação do conjunto de informa- vos imaginários, que, seguramente, não farão mal ções em causa, sendo uma substituída pela outra. algum ao que já se tem, e serão o embrião da sua O imaginário é, então, um conjunto de informa- própria preservação. ções organizadas, geradoras e conservadoras de Concluído em Vila Nova de Gaia, 13 de fevereiro identidades, que se dá bem com a contradição: de 2012 essa é uma das suas principais características; A Jorge Barbosa lógica matemática, pelo contrário, usa a contradi- ção para se reestruturar. iv  iBooks Author
  • 6. C APÍTULO 1 Indisciplina e Disfunção Institucional O conceito de indisciplina não é inteligí- vel, muito menos operacionalizável, se não for abordado na sua complexidade. Neste, como em muitos outros casos, a adoção de perspetivas analíticas estritas, embora satisfaça a nossa ambição explica- tiva, atira-nos para fora do campo, onde o objeto se estrutura e adquire sentido.  iBooks Author
  • 7. I NDISCIPLINA E D ISFUNÇÃO I NSTITUCIONAL disciplina não terá origem na própria disciplina, ou na sua prática. De facto, quando os educado- res reconhecem que algo deve ser feito no domí- O conceito de indisciplina não é inteligível, muito nio da disciplina, raramente equacionam o proble- menos operacionalizável, se não for abordado na ma da disciplina como um estilo de vida em comu- sua complexidade 1. Neste, como em muitos ou- nidade, para o reduzirem, analiticamente, a um tros casos, a adoção de perspetivas analíticas estri- conjunto de regras que, por não estarem a ser tas, embora satisfaça a nossa ambição explicativa, cumpridas, devem ser reforçadas, apregoadas ou atira-nos para fora do campo, onde o objeto se es- simplesmente traduzidas em processos sanciona- trutura e adquire sentido. Podemos, então, encon- tórios. Ora, a disciplina é, ou deve ser, uma forma trar sábias explicações para quase tudo, sem que de viver em comunidade, da qual devem decorrer nos seja dado entender o que quer que seja. É o as regras de convivência, não o contrário. que, por exemplo, acontece teimosamente com os Numa primeira abordagem, então, a indisciplina debates sobre o insucesso escolar: não nos faltam pode ser considerada uma manifestação, por ve- explicações científicas do fenómeno, mas, perante zes dolorosa, da disfuncionalidade organizacional uma situação particular, elas revelam-se de uma da comunidade ou da instituição. É, muitas vezes, inutilidade confrangedora, quando não prejudici- com efeito, o primeiro sintoma e o mais óbvio de al, para a sua compreensão. que a instituição escolar se encontra na vertente Ora, a indisciplina, por ser um assunto que preo- decadente do seu percurso. cupa fundamentalmente os educadores, é sistema- Não cabe nesta generalização o descuido de não ticamente encarada, numa faina analítica ou sim- identificar características individuais, de alunos e plificadora, como um problema com origem nos professores, que provocam ou agudizam as mani- educandos. Raramente se cuida de saber se a in- festações de indisciplina. Bem antes pelo contrá- 6  iBooks Author
  • 8. rio. Só que manda o bom senso que saibamos dis- Pede-se, então, à escola que seja capaz de gerir tinguir as situações de indisciplina que envolvem um conflito que se estrutura e se desenvolve no in- uma percentagem reduzida da população escolar, terior de si mesma: que conserve valores do passa- daquelas outras que se manifestam de forma gene- do, aqueles mesmos que sustentam a sobrevivên- ralizada ou numa percentagem elevada de alunos, cia do passado e, desse modo, da sociedade tal de modo contínuo e quase como um ritual que, como é, e que, ao mesmo tempo, promova a inova- ele, pode flexibilizar-se em função das circunstân- ção, a criatividade e o questionamento do estabe- cias, mas não a adesão a ele dos alunos. A discre- lecido como certo, para que essa mesma socieda- pância, entre os 1% a 2% de alunos que adotam de não morra. habitualmente comportamentos de gestão difícil Não é próprio de um educador profissional negar e os 15% a 20% que são identificados como indis- a valia do presente e temer o futuro, do mesmo ciplinados, deve conduzir-nos a procurar outras modo que não lhe é adequado desvalorizar o pas- razões para a origem do problema, para além das sado e apresentar o futuro como única solução que associam o comportamento de crianças e jo- para o presente. Encarar o presente como uma de- vens à desgraça em que o nosso tempo está a cair cadência do passado não é muito diferente de en- por via da deficiente formação dos elementos que carar o próximo futuro como a decadência do pre- só recentemente começaram fazer parte da socie- sente atual. A decadência e o progresso são concei- dade. Precisamente à educação, sistematizada ou tos vazios: não são nada, enquanto não forem ins- não, cabe a tarefa essencial de garantir que as so- titucionalizados: dito por outras palavras, care- ciedades humanas não destruam esses novos ele- cem de institucionalização para serem algo. Não mentos e que estes não destruam a sociedade que são, portanto, os valores, muito menos o tempo, os acolhe. que entram em decadência; são, isso sim, as insti- tuições, quando deixam de aceitar e de responder 7  iBooks Author
  • 9. ao presente e se refugiam em soluções do passa- da leitura. A escola, na sua missão de gerir o con- do, ou em miragens do futuro, descuidando o tem- flito de conservar e de inovar, em períodos de po em que vivem. Podemos tomar como exemplo transição difícil, como aquele em que parece que um dos valores mais caros à escola: o gosto e a vivemos, é, muitas vezes, a responsável pela des- prática da leitura. Dispensemos a tarefa de o justi- valorização real daquilo mesmo que gostaria de ficar, e admitamo-lo como valor a preservar, sem valorizar. É ela que está decadente e não o gosto outro fundamento que não seja o de esclarecer o pela leitura, ou pela matemática ou pelo que quer meu pensamento. Ora, se persistirmos em o asso- que seja, do mesmo modo que não é a moral que ciar à prática da leitura de livros em papel, numa está decadente, mas as instituições moralizado- época em que eles podem ser lidos em suporte di- ras. gital, um suporte mais barato e até mais ecológi- Ora, o problema de uma indisciplina generalizada co, estaremos a promover escandalosamente a não pode ser simplesmente visto como o resulta- desvalorização desse valor. De pouco nos adianta- do da “desautorização dos professores”, ou, pior rá rasgar as vestes e arrancar os cabelos perante o ainda, como resultando de uma crise de valores desinteresse que as novas gerações lhe atribuem: que afeta unicamente as novas gerações, como se nós próprios nos estaríamos a encarregar de ali- uma eventual crise desse género pudesse ter o cui- mentar esse desinteresse, reduzindo a sua valida- dado de ser tão seletiva como seria necessário de a um período histórico e a circunstâncias limi- para ter tal efeito. Este pensamento mágico que tadas a um tempo, justamente identificado com o atribui a conceitos poderes divinos, incluindo o passado. Seria a nossa cegueira, ou a nossa dificul- de selecionar o seu povo, neste caso, as crianças e dade em viver no nosso tempo, isto é, de aceitar os jovens, é muito útil para as nossas conversas o imperativo de adequação a novas realidades, as que não tenham a mínima intenção de superar as principais responsáveis pela decadência do valor dificuldades, mas tão só a inebriante satisfação de 8  iBooks Author
  • 10. se bastarem a si mesmas e ao nosso insaciável de- uso privado é o de escola inclusiva, abundante- sejo de comunicar, nem que sejam só cumplicida- mente testemunhada pelos meios de comunica- des, afetos ou desafetos. Mas temos de o superar, ção social. Não falta quem responsabilize "esta se quisermos alimentar a esperança de encontrar ideia peregrina de escola inclusiva, essa tonteria" uma ou duas ideias que nos ajudem a ultrapassar por, se não todos, pelo menos, um grande núme- constrangimentos ao nosso ideal de escola, de so- ro dos problemas que a escola enfrenta. Ora, en- ciedade ou do que quer quer seja. quanto não se provar que o desejo de comer bolos Não é de grande ajuda nesta tarefa a tendência engorda mais, ou, pelo menos, tanto como comê- crescente dos comentadores do quotidiano para los, é absurdo pensar que uma coisa idealizada e fabricarem os seus próprios conceitos sobre a não colocada em prática pode ser responsabiliza- vida e sobre a realidade com o objetivo único de da pelo que quer que seja. Com efeito, o conceito exercitarem o seu valiosíssimo sentido crítico. de escola inclusiva corresponde a uma convenção Constroem ideias e soluções que são só suas, para que define princípios e critérios de consecução depois discordarem delas. Comportam-se como muito claros, ao nível do funcionamento das esco- aquela gaivota que, não sabendo já por onde anda las e da administração da educação, que estão o vento, decide voar contra aquele que ela própria muito longe de estar em vigor em Portugal. Essa produz ao bater as asas: voa e voa bem, mas não convenção foi patrocinada pela UNESCO e tra- sai do sítio, e, como um carrossel que, ora está em duz-se numa declaração, da qual o Estado portu- cima, ora está em baixo, e nunca sai do seu lugar, guês é signatário, tal como muitos estados mem- um dia está bem no outro está mal, sem que nada bros da ONU. Podemos concordar ou discordar se tenha alterado, numa neurose maníaco-depres- dessa Declaração universalizada aos estados mem- siva sem cura aparente. Um dos melhores exem- bros da UNESCO2, mas não temos o direito de dis- plos desta construção maníaca de conceitos de cordar dela por, mesmo antes de ser aplicada, já 9  iBooks Author
  • 11. serem evidentes os seus efeitos perniciosos. Fica- didas estruturais” também já foi corrompido pelo nos bem, todavia, agradecer a esses comentado- seu uso privado, tal como muitos outros concei- res o facto de nos estimularem a imaginação para tos. Cada um pensa dele o que quer, sendo que recorrer a outras palavras, que digam o mesmo, aos políticos importa querer convencer os outros mas que ainda não tenham sido corrompidas pela de que estão no caminho certo: “medidas estrutu- vã glória de influenciar a opinião dos outros, mes- rais” passa a significar “medidas que não estamos mo a respeito daquilo de que não têm sequer uma dispostos a discutir com ninguém”, mesmo que, pálida ideia. em boa verdade, sejam circunstanciais e tenham Com efeito, uma equação dos problemas que não tão só a ver com a dita falta de dinheiro, ou de seja a adequada - que seja uma inadequação - ideias, para fazer melhor. dará inevitavelmente origem a soluções ciclópi- cas, isto é, gigantescas e vesgas, de um só olho. Esta tendência para as soluções ciclópicas parece ser a vertigem dos nossos políticos e das organiza- ções dos profissionais da educação que, embora contestando, acabam sempre por concordar com a agenda “reformista” dos políticos. Por sorte, ou porque é esse o destino que merecem, essas solu- ções duram pouco mais do que o tempo que é pre- ciso para as debater. Passado o conflito, passam a integrar o quadro decadente que as precede. De pouco adianta que alguém se refira a elas como “medidas estruturais”, porque este termo de “me- 10  iBooks Author
  • 12. SECÇÃO 1 Numa época pouco confiante no mundo do espíri- O Individualismo to e na conversão por adesão voluntária, a estraté- gia é a de forçar a mudança de vida dos indivídu- os através da introdução de procedimentos meri- tocráticos, e ficar à espera que, desse modo, ou en- tão milagrosamente, a organização encontre o ca- minho para o seu aperfeiçoamento. Há, de facto, professores que evidenciam dificuldades no exer- cício da sua profissão. Este elemento de uma pe- A tendência analítica, perante o gigantismo de quena parte do problema é generalizado ao todo, um problema, gerado sobretudo pela inadequa- justificando assim que a “medida estrutural” ina- ção da sua equação, encontra, por via de regra, diável seja a da adoção de um modelo de avalia- uma solução engenhosa: reduzir o complexo - a ção que “separe o trigo do joio”. Do mesmo modo, organização e o seu dinamismo - à soma das suas há alunos que revelam dificuldades na escola. A partes, para encontrar uma ou mais característi- “medida estrutural” é, então, um novo estatuto do cas de cada uma delas e depois as generalizar ao aluno, e um aumento da exigência. todo. Aplicada à escola, esta tendência encontra Esta forma inebriante de destilar os problemas só na conversão dos indivíduos a solução para todos se torna popular, aos olhos dos próprios professo- os problemas. Com efeito, os indivíduos são consi- res, obviamente nos aspetos que não lhes dizem derados os principais responsáveis pela ineficiên- diretamente respeito, porque é um descanso para cia da organização, no caso, da escola. Consoante a mente haver sempre uma justificação, nem que a abordagem, ora são os professores, ora são os seja absurda, que se compagine confortavelmente alunos, aqueles que devem converter-se. 11  iBooks Author
  • 13. com o horror ao silêncio, à suspensão da palavra a não ser o nível de exclusão que se pretende que para pensar antes de falar. a escola passe a promover. Não só o erro é doloro- Na verdade, a avaliação do desempenho dos pro- samente consolidado, betonizado mesmo, como fessores, sem alterações no próprio funcionamen- tem efeitos práticos que reduzem drasticamente a to da escola, só serve para consolidar o seu funcio- eficiência da escola na sua missão social, de for- namento atual, agregando todos os fragmentos, ma particularmente subtil porque, num primeiro todo o cascalho, numa massa de cimento dentro momento, a ineficiência se traduzirá em melhores de uma betoneira conformista, isto é, só serve resultados nos exames, embora articulados com para normalizar o erro. Muitos erros tornam-se um aumento proporcional de insucesso escolar re- invisíveis deste modo, mas como nada fica resolvi- al. É como um motor que, antes de gripar, solta do, só imerso em nevoeiro, é absolutamente im- as suas engrenagens num frenesim de velocidade prescindível encontrar outros responsáveis pela fatal. Basta tentar subir uma ligeira colina para ineficiência. Aqueles que estão mais a jeito são os que as peças se soldem umas nas outras. Bastará, alunos. Transforma-se, então, o estatuto do aluno no caso dos alunos, tentar gerir os resultados da num código penal, e fazem-se apelos a uma maior exclusão, para que o sistema educativo, e, com exigência em termos académicos. A alteração do ele, a qualidade de vida na sociedade, encontre o estatuto do aluno acaba por ter o mesmo efeito precipício que pensou estar a evitar, e aquilo que, que tem a avaliação do desempenho dos professo- provisoriamente se poupou na educação se trans- res, mas o dito aumento da exigência académica forme numa despesa insustentável. não é tão neutro como se possa pensar. De facto, Ora, esta abordagem individualista, também ao evitando a dificuldade que consiste em alterar a nível da gestão da disciplina ou do combate à in- natureza da exigência na escola, procura-se au- disciplina, é ineficaz. De novo, convém lembrar mentar aquela que já existe para que nada mude, que não é o comportamento difícil de alguns, pou- 12  iBooks Author
  • 14. cos alunos, que está aqui em causa, mas o desas- sossego constante que afeta um grande número de alunos e de turmas. Só minimizando os danos da indisciplina generalizada, ou de difícil conten- ção em limiares suportáveis para uma vida agra- dável na escola, poderemos, com algumas hipóte- ses de sucesso, encarar os problemas de gestão de comportamentos mais raros e mais problemáti- cos. A experiência diz que o contrário raramente nos conduz a algo de frutuoso: a aplicação e o anúncio público de penas disciplinares não corri- ge o tal desassossego que tanto incomoda o traba- lho nas salas de aula. Graças a uma misteriosa sa- bedoria, os alunos também conseguem distinguir as duas situações, mesmo recorrendo tão só às mí- nimas das suas capacidades de entendimento do mundo. Seria escandaloso que os professores o não fizessem, e os alunos não esperam isso deles. 13  iBooks Author
  • 15. SECÇÃO 2 Foi reconhecido, desde o nascimento deste concei- A Burocracia to científico4, o perigo de desumanização que a bu- rocracia poderia envolver. Apesar de tudo, ela era vista como uma parte central da racionalização da sociedade na idade moderna: em vez de confia- rem em crenças e costumes tradicionais, espera- va-se que os modernos tomassem decisões racio- nais orientadas para um objetivo concreto, tendo em conta registos rigorosos dos percursos e das O conceito de burocracia é um dos que mais fre- metas a perseguir, dos direitos atribuídos e a atri- quentemente está sujeito a fenómenos de privati- buir e das obrigações respeitadas e a respeitar. Si- zação conceptual. Na verdade, cada um se sente gnificava, entre outras coisas, o poder da escrita no direito, e até no dever, de contestar a burocra- sobre a tradição ou o testemunho oral. Por outro cia, interpretando, o mais das vezes, como buro- lado, a autoridade burocrática foi chamada a de- crata tudo aquilo que exige um esforço adicional, sempenhar o papel regulador das sociedades mo- para além da própria tarefa que quer ou é solicita- dernas e industrializadas: os contratos coletivos do a realizar. de trabalho são um bom exemplo desta missão da No entanto, a burocracia é um conceito sociológi- burocracia; nos sistemas educativos, os processos co3 que pretende descrever as estruturas e os pro- de transição de ano ou de ciclo escolar, os certifi- cessos de regulação da acção social em sociedades cados e os diplomas, a definição das condições de e organizações complexas, isto é, de preservação acesso a cada um dos níveis académicos é outro de direitos e de garantia de cumprimento dos de- excelente exemplo da autoridade burocrática: a tí- veres, por parte dos indivíduos e das instituições. tulo de exemplo, se, por engano, um aluno recebe 14  iBooks Author
  • 16. uma nota positiva e ela é publicada na respetiva corresponder mais a uma oratória panfletária do pauta, aquilo que conta não é o facto de o aluno que discursiva5, põe em evidência as contradições não estar preparado para prosseguir estudos, mas do nosso tempo que, resumidamente, podem con- o facto de burocraticamente ter sido registado formar a ideia de uma estranhíssima e pouco razo- que ele obteve uma nota positiva, e, portanto, ável ditadura liberal. A linha de força parece ser, mesmo que devesse reprovar de acordo com a opi- no entanto, a desenhada pela necessidade de ins- nião oralmente transmitida pelos seus professo- taurar sistemas sucessórios na gestão do poder. res, aquilo que é validado é a nota escrita na pau- Com efeito, a burocracia, definindo critérios im- ta. Na sua verdadeira essência, a burocracia é isto pessoais, democratizou o acesso à formação aca- mesmo que aqui é exemplificado, e não o traba- démica e o acesso a certos cargos importantes nas lho que dá. organizações, tapando, num momento de crise e Este esclarecimento prévio de conceitos - isto é, de prolongamento da vida dos cidadãos, lugares do conceito que aqui está a ser utilizado - é funda- que sempre foram destinados aos jovens filhos da mental para que se entenda o que a seguir será de- nova aristocracia burguesa, entretanto, ela pró- fendido e argumentado. pria, em grande parte gerada por essa democrati- zação burocrata. Desta linha de força nasce o im- Nesta ordem de ideias, fica, no mínimo, bizarro perativo de destruir os laços burocráticos, associa- que haja quem defenda um aumento de regulação dos aos “direitos adquiridos”, estabelecendo pro- social, seja através de exames aos alunos ou aos cedimentos de avaliação dos indivíduos, tão assí- professores, seja através do acompanhamento duos quanto seja necessário destruir ideias de das atividades financeiras especulativas ou outras competência, construídas a partir das suas históri- quaisquer, e simultaneamente apregoe uma redu- as de vida, ou dos simples registo biográficos, ou ção da burocracia. Este discurso, só inteligível se do tempo de serviço. for separado nos seus fragmentos e, portanto, se 15  iBooks Author
  • 17. Assim, uma das linhas de força que contesta a bu- der de reformular e reorganizar a instituição, mas rocracia não pretende reduzir a burocracia, a não o de normalizar procedimentos corresponde, isso ser naquele seu aspeto em que pode ser identifica- sim, a uma manifestação desse pensamento mági- da com um excesso de democratização. Este ex- co que culpa o excesso de democratização6 pela cesso de democratização é identificado como o pe- disfuncionalidade da escola. cado original que os deuses se estão a encarregar A minha crítica à burocracia não segue, portanto, de punir ferozmente nos tempos que correm. As o caminho que propõe, no final de contas, a desre- danças da chuva, as promessas de arrependimen- gulação seletiva, isto é, a desregulação daquilo to e os sacrifícios humanos talvez acalmem a fúria que prejudica o exercício do poder, seja ele políti- dos deuses, mas não é este o ponto de vista que co- co, ou financeiro, ou outro. manda esta reflexão. Pelo contrário, as alterações Na verdade, a realidade da escola, mas também recentemente introduzidas no modelo de gestão de outras organizações sociais, parece revelar a das escolas - que se manteve, de resto, tal como progressiva desburocratização dos processos de estava enquanto modelo - seguem religiosamente dominação, e o aumento da burocratização como este pensamento mágico e encantatório, mas peri- processo de submissão e normalização, isto é, de goso, que consiste em pensar que um melhor fun- controlo, já não de regulação, dos que são chama- cionamento das escolas depende do perfil do seu dos a submeter-se. Ora, esta é uma das disfun- diretor, que, por isso, é empossado de uma acres- ções, a par da promoção do individualismo, mais cida autoridade, sem o correspondente poder ou óbvias da escola. autonomia. Autoridade sem poder real significa Com efeito, pela via da redução - eliminação em arbitrariedade, isto é, desburocratização, desregu- alguns aspetos fundamentais - 1) dos processos in- lação. Encavalitar o funcionamento da escola no ternos de controlo e regulação do poder, 2) do au- perfil de uma pessoa a quem se atribui, não o po- mento da burocracia com vista à normalização 16  iBooks Author
  • 18. dos indivíduos, 3) da redução do tempo de valida- de traduz-se na adesão, por vezes entusiasta, a de destes processos burocráticos, e 4) do aumen- um conjunto de rituais sem nexo e sem outra utili- to dos processos de controlo externo, a escola atin- dade que não seja a do próprio ritual: os rituais re- giu níveis de disfuncionalidade que mereceriam petem-se incessantemente para que simplesmen- ser considerados como muito preocupantes. te não deixem de se repetir. A burocratização que diz respeito aos processos A escola moderna sempre foi burocrática e, por- de normalização e de promoção do conformismo tanto, o apelo à ritualização da vida na escola é é ostensivamente ocultada pela redução do tempo consentâneo com a sua tradição modernista. Des- de validade dos procedimentos burocratas, o que, de muito cedo, as decisões burocráticas, como a tecnicamente, corresponde a uma violenta mani- certificação escolar, a transição de ano ou de ciclo pulação das vontades e da capacidade reflexiva e de estudos, assumiram uma função sobreordena- crítica: aquilo que hoje é defendido e criticado, da face à tarefa subordinada de ensinar e apren- amanhã já não tem validade, mas mantém-se o der. Ensina-se e aprende-se para passar de ano, procedimento na sua essência sem qualquer alte- não para se saber. Só que nunca como agora, os ração de substância, só de forma. procedimentos burocráticos alcançaram tanto pre- Esta tendência manipuladora recebe, apesar de domínio sobre os procedimentos de ensino e tudo, o apoio de muitos dos manipulados, por- aprendizagem. Os currículos, os programas, as que, de facto, a heteronomia, a responsabilização próprias aulas parecem estar mais ao serviço des- de quem decide, é muito mais repousante do que sa decisão burocrática de sucesso e insucesso, do a autonomia, a responsabilização que cada um as- que ao serviço do sucesso na aprendizagem. Este sume de si e para si. A resposta positiva a este ape- cenário torna-se ainda mais preocupante quando lo à conformidade, ao conformismo, ou, como pre- um conjunto muito vasto de atividades dos profes- firo dizer para não deixar dúvidas, à mediocrida- sores se subordinam quase inteiramente mais à 17  iBooks Author
  • 19. necessidade de responder à burocracia do que aos daqueles que usou, 20, 30 ou mais anos antes, du- problemas. Algumas são idealizadas para que se rante o seu estágio para ingresso na profissão. Ser possa construir um plano anual de atividades, ou- excelente é não ter evoluído, ou, pelo menos, não tras para construir um projeto curricular de tur- mostrar o quanto a experiência o enriqueceu e o ma e ainda outras para obter uma classificação quanto ela o dispensa de formulários de treino agradável na avaliação do desempenho; fazem-se para principiantes ou iniciados. Aplicado este cri- reuniões para preencher formulários; já nem se- tério a um pianista, ser um pianista excelente se- quer falta a oportunidade de fazer reuniões para ria ocultar a sua competência para interpretar que se façam atas delas. A tragédia é que este ce- uma obra de Chopin e demonstrar que ainda sa- nário é particularmente sedutor, pelo relaxamen- bia tocar as escalas que lhe serviram de treino ini- to que induz, sem deixar de proporcionar catarses cial e que, de vez em quando, ainda precisa de de contestação inconsequente: um equilíbrio abso- usar para desenferrujar os dedos, ou quando a ins- lutamente paralisante. piração lhe foge. Precisamente, esta é uma primeira dimensão, tal- Ora, esta burocracia estritamente normativa, sem vez a mais óbvia e que, sendo-o, passa facilmente substância, sem outro objetivo que não seja o de despercebida, da disfuncionalidade estrutural da promover o conformismo, corresponde justamen- escola. A burocracia deixou de ser um processo de te ao risco desde há muito tempo temido de que regulação numa organização complexa, e passou se viesse a transformar em alguma variante, ain- a ser o seu principal objetivo e uma das evidênci- da desconhecida, mas reconhecidamente virulen- as mais valorizadas nas avaliações externas. Só as- ta, de desumanidade. A disfuncionalidade da esco- sim se poderá compreender como é possível, para la é, então, numa primeira abordagem, a sua desu- se ter uma menção de excelente, exigir de um pro- manidade. fessor que use instrumentos da mesma natureza 18  iBooks Author
  • 20. Num contexto ritualizado, os comportamentos in- só serve para adormecer crianças. A generaliza- cómodos são, por um lado, mais facilmente dete- ção de uma postura desorganizada dos alunos na táveis, e, por outro lado, mais frequentes, pela fal- sala de aula é só a manifestação menos grave, por- ta de sentido da própria vida no interior da organi- que visível e denunciadora do mal-estar, da dis- zação. O aumento da frequência de comportamen- funcionalidade da escola. tos de difícil gestão e a facilidade da sua deteção nos alunos acabam por se potenciar mutuamente, originando uma espiral de problemas que nem o bom senso, por vezes, consegue superar. Chegados aqui, é oportuno formular uma primei- ra conclusão: o contexto escolar sobrevive mal à gestão do conflito que lhe é próprio, o de conser- var inovando, mas o núcleo central do seu proble- ma encontra-se sobretudo na disfuncionalidade da organização, espartilhada num conflito insaná- vel entre o individualismo e a burocracia, entre a destruição das memórias e das histórias de vida e a formação de pessoas, entre a forma sem subs- tância e o ideal de bem fazer. O bem que a escola possa fazer não pode ficar no domínio das inten- ções e da justificação simples do mal-estar que gera em alunos e professores: a ideia de que é por bem que a escola faz o mal é uma justificação que 19  iBooks Author
  • 21. SECÇÃO 3 prática e adquire um estatuto seráfico, de persis- A Estrutura Disfuncional tente homenageado pelos serviços prestados, ago- ra às portas da morte. Essa perda de relevância prática tem origem em dois processos antagóni- cos, mas que se potenciam mutuamente: ๏ A conservação do conceito de “turma” e de “conselho de turma”: estes conceitos fo- ram mantidos nas condições de um passado que, felizmente, não voltará, e já não respon- Estabelecida uma burocracia que se tem a si mes- dem, nem bem nem mal, às características do ma como o principal objetivo mensurável e susce- nosso tempo. Na verdade, se o conselho de tur- tível de se afirmar como evidência, o aparelho de ma corresponde a uma unidade estabilizada, gestão do quotidiano da escola, a nomenclatura, do lado da componente que diz respeito aos alu- ajusta-se, em termos estruturais, à irracionalida- nos, já na componente dos professores ela reve- de daquilo mesmo que lhe dá origem e sustento. la-se instável, na justa medida em que fazem A primeira e mais visível consequência é a frag- parte de mais 3, 4 ou cinco unidades do mesmo mentação das estruturas de gestão do quotidiano, género. Por outras palavras, aquilo que é a uni- começando pela pulverização do próprio núcleo dade funcional para os alunos não o é para os de toda atividade escolar e pela distribuição dos professores. Por outro lado, a unidade funcio- estilhaços por um conjunto muito vasto de estru- nal estável para os professores - o departamen- turas compensatórias. A unidade funcional da es- to curricular ou o grupo disciplinar (já falare- cola, isto é, o conjunto formado pelos grupos de mos deste assunto) - não é sequer uma unida- professores e pelos seus alunos perde relevância de para os alunos, como é bom de ver e fácil de 20  iBooks Author
  • 22. aceitar. A escola não dispõe, por isso, de uma de facto, uma boa ideia, só que, não tendo sido unidade que congregue um conjunto de profes- feita a rutura com a estrutura que as equipas sores e um conjunto de alunos, devidamente es- educativas deveriam substituir, foram manti- tabilizada e duradoura, que seja capaz de con- das as turmas e acrescentadas as equipas educa- duzir a bom termo um projeto comum, seja um tivas. Ora, esta sobreposição constitui uma ou- projeto curricular de turma, ou outro qualquer. tra grave disfunção das estruturas escolares. Cada conjunto de alunos pode ser envolvido Com efeito, considerar a turma como unidade num projeto comum, mas o conjunto de proje- de base, ou considerar como unidade de base a tos não reúne equipas sólidas de professores e equipa educativa, correspondem a modelos de alunos. A componente dos professores, por si funcionamento que, nem à custa de muito boa só, pode ser sólida, a componente dos alunos, vontade dos professores, conseguem subsistir por si só, também é, mas a reunião das duas em simultâneo. A convivência destas duas es- não é, porque pulveriza as atividades dos pro- truturas, independentemente das vontades in- fessores por um conjunto de turmas que, no dividuais, conduz à auto-desvalorização mú- seu conjunto, não constituem uma unidade. tua. ๏ A adição das equipas educativas sem al- teração do conceito de turma: era bom de Muitos podem ver, nesta disfunção, uma simples ver que o conceito de turma não era suscetível irracionalidade, como muitas das que governam a de se constituir numa unidade, capaz de ser o nossa vida do quotidiano, sem outra consequên- combustível, a energia, e o motor do projeto cia que não seja a de duplicar atividades e tarefas, educativo da escola ou do plano anual de ativi- uma consequência que, no final de contas, até po- dades. Em honra desse reconhecimento, cui- deria ser vantajosa, tendo em conta os benefícios dou-se de criar as equipas educativas. Esta é, da redundância nos processos de refinamento de 21  iBooks Author
  • 23. competências. Mas as consequências, sendo irraci- O mesmo fenómeno de complicação do que seria onais, são, como convém, racionalizadas através simples, se o modelo de funcionamento da escola da multiplicação de mecanismos de burocratiza- não fosse contraditório na sua própria equação, é ção ritualista, com efeitos muito perniciosos, quer visível no processo de substituição de professores na promoção das aprendizagens, quer no estabele- em falta. Um assunto desta natureza, resolvido no cimento de um estilo de vida na escola - de uma interior da equipa educativa, nem carecia de ne- disciplina - que gere consensos e bem-estar nos nhuma formalidade, à exceção da comunicação professores e nos alunos. da falta do professor em causa. Não sendo assim, Assim, sendo detetados problemas de aprendiza- cria-se uma nova equipa de coordenação, inven- gem em alguns alunos, assunto que, na esmagado- tam-se formulários, grelhas, mecanismos de veri- ra maioria dos casos, deveria ser resolvido no qua- ficação do cumprimento das tarefas, fazem-se dro da acção da equipa educativa sem necessida- ajustamentos de horários de professores avulsos, de de intervenção externa, o que acontece é que provocam-se irritações e por aí fora, só para coor- esses alunos são encaminhados para uma outra denar o processo de substituição dos professores. equipa, de sala de estudo, de apoio educativo, Começa, espero eu, a ficar clara a indisciplina, para superarem as suas dificuldades. Desta op- isto é, a falta de qualidade de vida que, por esta ção, resulta, entre outras coisas, a imperativa ne- via é gerada na escola. cessidade de elaborar relatórios periódicos para Mas o funcionamento da escola fica ainda mais articular aquilo que nunca deveria ter sido desarti- complicado, porque a gestão dos comportamen- culado. A distribuição de tarefas, entre os profes- tos difíceis é levada a cabo dentro do mesmo en- sores das equipas educativas, para não ser neces- quadramento disfuncional. A equipa educativa, sário “articular” aquilo que se “desarticulou”, de- que deveria estar concentrada quase exclusiva- veria contemplar esse tipo de respostas. mente nas atividades com os alunos, seria a estru- 22  iBooks Author
  • 24. tura que disporia dos meios e da competência vre” do que o que seria desejável, para eles e para para gerir a esmagadora maioria das situações de a escola. indisciplina. A conflitualidade interna do modelo Analisados só estes aspetos, talvez não fosse ne- de funcionamento da escola atribui essa tarefa ao cessário insistir mais na tecla da disfuncionalida- diretor de turma e ao conselho de turma, que, de para que a ideia aqui transmitida ficasse clara. como se viu, tem condições para detetar o proble- Só que o ambiente “indisciplinado” da escola não ma, mas não tem espaço de manobra para o supe- fica por aqui. A duplicação de tarefas, a redundân- rar. É que, para além de fazerem parte de um de- cia paralisante, a burocracia inútil inundam todo terminado conselho de turma, o seu diretor e os o contexto escolar. Demonstração disto mesmo é restantes professores ainda fazem parte de um ou- a multiplicação incessante de equipas, de coorde- tro conjunto de equipas de trabalho que esgotam nadores e de coordenadores de coordenadores, completamente as suas disponibilidades7 e que com origem na tentativa de superar a desorganiza- são concebidas para isso mesmo, para ocupar ção pela quantidade de coisas a fazer e a coorde- todo o tempo disponível de cada um. Daqui resul- nar e a articular. Todos os projetos - clubes, salas ta que, mesmo comportamentos que, embora ca- de estudo, apoio educativo e outros - funcionam reçam de retificação, não demonstram complexi- no exterior das equipas educativas e dos conse- dade que incapacite uma pessoa de bom senso a lhos de turma, sugando toda a energia e tempo encontrar uma ou duas soluções adequadas, são disponível que os professores deveriam dedicar, motivo para encaminhar alunos para uma outra com os mesmos ou outros projetos, aos seus pró- equipa paralela, para que os resolva, como se isso prios alunos, num quadro de cooperação entre si. fosse possível. Deste modo, aqueles alunos, cujos Desta opção quase anárquica de organização esco- comportamentos solicitam uma intervenção mais lar resulta uma percentagem elevadíssima de co- cuidadosa, acabam por se sentir mais “em roda li- ordenadores, entre os professores, se contarmos 23  iBooks Author
  • 25. com os diretores de turma, os coordenadores de rável dos cargos levou a que os decisores políticos cada projeto, os coordenadores dos coordenado- esquecessem a origem histórica do fenómeno e, res dos projetos, os coordenadores de departa- de uma forma quase leviana, viessem a terreiro mento curricular, os coordenadores de grupo dis- denunciar as regalias abusivas dos encarregados ciplinar: enfim, poucos são os professores que dos cargos. Na verdade, embora os agraciados não coordenam alguma coisa, inflacionando o não ganhassem nada com a situação, as ditas be- conceito de coordenação a um ponto tal, que dei- nesses custavam dinheiro. E acabaram8. Agora, xa de ter qualquer valor, para além da eventual e as coordenações podem envolver a esmagadora ingénua satisfação de se pertencer à nomenclatu- maioria dos professores numa escola porque são ra. Esta generosíssima distribuição de cargos de absolutamente gratuitas, embora tenham custos coordenação já se teria convertido na mais acirra- na qualidade de funcionamento incalculáveis. da avareza, não fosse dar-se o caso de esta profu- Um grande número de professores pode, portan- são e diluição de responsabilidades se ter implan- to, exercer alguma forma de coordenação, mau tado nas escolas sem qualquer custo adicional. grado a mais do que evidente ineficácia e falta de Historicamente, esta tradição barata de pulveriza- proveito para os próprios e para a escola. No en- ção de responsabilidades tem origem na ideia de tanto, a ineficácia e a falta de proveito são só um que estar com o poder já é gratificação bastante e problema menor face à incoerência, à indiscipli- que, por ela, os agraciados têm de se deschapelar na, à falta de respeito pela própria atividade de co- e ficar obrigados, de alguma forma, pelo reconhe- ordenação que essa pulverização gera. Com efei- cimento público do seu valor simbólico. Inicial- to, basta pensarmos no sentido que faz um dire- mente, a distribuição de cargos era menor e com- tor de turma ser avaliado no seu desempenho do- pensada, não com aumentos de salários, mas com cente por um dos professores do seu conselho de benesses no regime de trabalho. O aumento impa- turma, só porque este é coordenador de departa- 24  iBooks Author
  • 26. mento. Afinal qual é o papel do diretor de turma? deu conta de que, se fossem agrupados em depar- Não será o de coordenar a atividade docente dos tamentos, os custos seriam reduzidos e os provei- professores do conselho de turma? Talvez não tos ficariam como já estavam. Talvez alguns ou- seja prudente dar mais exemplos deste outro ní- tros tivessem pensado também que os departa- vel de disfuncionalidade da escola, porque, de fac- mentos configurariam uma reformulação na for- to, não é minha intenção criar resistências desne- mação dos professores e na promoção de alguma cessárias a uma perspetiva diferente sobre como polivalência docente. Esta ideia articulava-se me- a escola se deve organizar. nos mal com a outra da constituição de equipas Todavia, parece-me importante dar relevo a uma educativas. Mas o que é que ficou de facto? Tiran- tendência xistosa do nosso sistema educativo, que do a redução de custos e a manutenção do provei- opera as suas “reformas” por acumulação de ca- to nulo, foi construída mais uma placa sobre aque- madas sucessivas, talvez na esperança de que o la que já lá estava. peso das placas acabe por fazer rebentar nas pro- Podemos não querer enfrentar o absurdo da vida fundezas um qualquer poço de petróleo que, final- da escola, mas recusarmo-nos a vê-lo, agora que mente, resolva todos os problemas. Assim é com está à frente dos olhos a inutilidade das “refor- as turmas e as equipas educativas, como vimos: mas” empreendidas, não é uma atitude que pare- mantêm-se as turmas e acrescenta-se-lhes uma ça promissora, nem do ponto de vista da qualida- nova placa, as equipas educativas, para sedimen- de do trabalho dos professores, nem do ponto de tar bem as coisas. Ora, o mesmo acontece do ou- vista do rendimento e da adesão a uma vida disci- tro lado das equipas de trabalho, agora dos profes- plinada por parte dos alunos. sores. No tempo em que as coordenações de gru- Sabendo da possibilidade de uma análise crua da po disciplinar correspondiam a custos sem pro- realidade da escola poder ofender inadvertida- veito - as reduções dos tempos letivos - alguém se mente sentimentos genuínos de dedicação à pro- 25  iBooks Author
  • 27. fissão docente, que, se fossem de outro tipo, pou- ca diferença me faria, é com passos miúdos e sal- tando alguns obstáculos que me fui movimentan- do nesta parte deste documento. Nem por isso se- ria honesto não denunciar esta tendência a criar, a cada vez, novas camadas de soluções mais pro- blemáticas do que razoáveis, sedimentando, a cada passo, aquilo que se devia refrescar, como sendo o último, aqui a ser referido, dos níveis de disfuncionalidade da escola. A mudança não é a ocultação para debaixo do ta- pete dos problemas; não é mesmo a compra de um novo tapete para tapar o velho, já roto, apo- drecendo-se o novo por tapar o velho, como está acontecendo com a nossa escola. 26  iBooks Author
  • 28. C APÍTULO 2 Uma Abordagem Ecológica Com frequência se ouve atribuir a proble- mas familiares uma boa parte da respon- sabilidade pelos comportamentos desa- justados dos alunos. Por outras palavras, admite-se, sem grandes constrangimen- tos, que um número variável, mas em todo o caso muito elevado de famílias, tendo em conta o número de alunos afeta- dos, apresenta alguma forma de disfunci- onalidade.  iBooks Author
  • 29. U MA A BORDAGEM E COLÓGICA dação e, por conseguinte, dificulta a sincronia e a sintonia de funcionamento das estruturas sociais. Com efeito, as mutações não respeitam as conve- Com frequência se ouve atribuir a problemas fa- niências sociais, nem de qualquer outra natureza, miliares uma boa parte da responsabilidade pelos e manifestam-se, na forma e no ritmo, de modo comportamentos desajustados dos alunos. Por ou- distinto e, por vezes, conflituoso nas diferentes es- tras palavras, admite-se, sem grandes constrangi- truturas sociais, isto é, nas famílias, nas empre- mentos, que um número variável, mas em todo o sas, nas escolas e por aí fora. Neste contexto, se- caso muito elevado de famílias, tendo em conta o ria muito preocupante que a escola fosse a única número de alunos afetados, apresenta alguma for- instituição social poupada a essas pressões de mu- ma de disfuncionalidade. Ora, admitindo que esta dança, ou que a forma e o ritmo, com que elas se forma de pensar seja razoável, isto é, que algo es- exercem no seu interior, fossem completamente teja a acontecer nas nossas sociedades que tenha alheios ao que se passa nas famílias, nas empre- influência bastante para gerar confusões de pa- sas, nas organizações políticas, etc. peis e de estatutos nas estruturas familiares, pen- Por muito conveniente que pareça ser encontrar sar que a escola só seria abordada por um proble- fora da escola todas, ou quase todas, as razões ma desta envergadura pelo flanco dos alunos reti- para as dificuldades no seu interior, a verdade é ra a esse raciocínio qualquer legitimidade razoá- que, de um ponto de vista menos estreito, faz pou- vel. co sentido separar o interior do exterior. O proble- Não custa acreditar, é até muito óbvio, que a nos- ma que se deve colocar é outro: até que ponto a es- sa vida em sociedade está a sofrer mutações de cola atualiza, no seu interior, as perturbações e as grande envergadura a um ritmo que dificulta ou dificuldades que, pela natureza das coisas e pela até, muitas vezes, impede os processos de acomo- distorção do ponto de vista, são mais facilmente 28  iBooks Author
  • 30. detetáveis no seu exterior? Nós nunca nos fala- sível testar as regras, os comandos adultos, sem mos a nós mesmos olhos nos olhos, a não ser atra- supervisão, entre pares. A dinâmica entre estes vés de um mediador: o reflexo de um espelho ou dois contextos é responsável por um equilíbrio, alguma modalidade de reflexão. A escola precisa embora instável - porque sujeito a ajustamentos de se ver ao espelho, para não continuar a chapi- em função das idades, e das características indivi- nhar água para todo o lado, para aprender a na- duais -, fundamental no processo do desenvolvi- dar, sem molhar os transeuntes. mento da autonomia moral ou da auto-disciplina: Uma dessas mutações sociais, ao nível dos micros- por um lado, é necessário conhecer as regras, por sistemas de desenvolvimento humano 9, revela-se outro lado, é necessário assumi-las como também particularmente relevante para a compreensão do suas. problema da indisciplina, na medida em que, pre- Ora, a mutação, aqui em causa, traduz-se pela se- cisamente, ela se manifesta na escola e na família, paração dos dois contextos, e pela redução da di- de um modo sincronizado e sintonizado. nâmica entre eles à rigidez de cada um, de forma Dois tipos de contexto, no quadro dos microssiste- a corresponderem cada vez mais a modelos educa- mas, eram apreciados por pais e professores, ain- tivos distintos e cada vez menos a dois ambientes da que não lhes dessem estes nomes ou qualquer educativos igualmente importantes para a educa- outro: o contexto primordial e o contexto secundá- ção dos mais novos, qualquer que seja o modelo. rio. O primeiro (contexto primordial) pode, muito Na verdade, eles são mais importantes do que os resumidamente, ser caracterizado como o contex- modelos educativos, mas na nossa sociedade fo- to da supervisão, das regras estabelecidas e feitas ram reduzidos, na prática, à, pelos vistos, impera- cumprir por adultos; o segundo (contexto secun- tiva necessidade de distinguir os “bons” dos dário) corresponde ao espaço de autonomia dos “maus” pais, a “boa” da “má” educação. Por ou- humanos em desenvolvimento, aquele onde é pos- 29  iBooks Author
  • 31. tras palavras, foram reduzidos à sua insignificân- que é aconselhado pelo seu relógio biológico. Ex- cia, à sua falta de significado e sentido. perimentar, autonomamente, regras de conduta Então, “bons pais” são aqueles que reduzem dras- com os seus pares, sem supervisão, ao três anos, ticamente o acesso dos seus filhos a contextos se- não é seguramente a mesma coisa que começar a cundários, e “maus pais” são aqueles outros que ter essa oportunidade aos treze, nem tem os mes- não conseguem estruturar contextos primordiais mo riscos. Não correr riscos aos três anos é segu- para os seus filhos. Do mesmo modo, a “boa esco- ramente perigoso quando for necessário corrê-los la” reduz o espaço de autonomia aos seus alunos, aos treze. por oposição a uma ideia, mais fantasmática do Se formos rigorosos, no entanto, teremos de admi- que outra coisa, de uma escola sem supervisão, tir que as crianças, por força da sua humanidade, isto é, de uma escola não-escola. testam, de qualquer modo, essa autonomia na re- Não nos devemos, no entanto, deixar levar pela lação com os pares, só que o fazem nos espaços tentação de, agora, por novas razões responsabili- de supervisão adulta, por falta de outros. Daqui, zarmos o ambiente familiar por esta dicotomia resulta uma aprendizagem poderosa, porque es- malfazeja para o desenvolvimento das crianças. truturada muito precocemente e de forma siste- Na verdade, as crianças são escolarizadas muito mática: os contextos de supervisão só se distin- precocemente e a sua escolarização é um dos me- guem dos contextos de autonomia, pelas necessi- canismos sociais mais poderosos de legitimação dades de afirmação da criança, e não pelas carac- das atitudes que conduzem à eliminação dos espa- terísticas educativas desses espaços ou momen- ços de autonomia, na família e, depois, em outras tos. A sala de aula transforma-se assim em mais instituições. Digamos, para abreviar, que, com o um momento possível de realização autónoma, e contributo indispensável da escola, as crianças sem regras adultas, das interações entre pares. são mantidas crianças muito para além daquilo Muitos alunos têm mesmo sinceras dificuldades 30  iBooks Author
  • 32. em perceber por que razão os professores interfe- tão que fazem das suas interações com os pares. A rem nesse processo interativo, “que não tem nada não ser que se pretenda destruir toda a possibili- de mal”. Na verdade, corresponde a uma necessi- dade de esses alunos terem “companhias”, o que dade vital que não encontra, por aprendizagem, seria a supervisão levada ao limite da irracionali- outro espaço para se realizar, mesmo que, por ve- dade e da desumanidade, não devemos ser tão zes, a alternativa possa estar diante dos seus simplistas. Na verdade, parece precisarem que o olhos. Esta cegueira é uma cegueira aprendida, e, espaço de autonomia seja, ele também, supervisio- portanto, tem a vantagem de poder ser desapren- nado, isto é: não sabem ser bem educados, embo- dida, só que a escola não tem as características de ra saibam como é que se faz. funcionamento que poderiam facilitar a reapren- No pólo oposto, encontramos os “mal educados”, dizagem da autonomia. Ela teme, tal como a famí- aqueles que, por falta de condições de supervisão, lia, os perigos, mais do que a certeza de estar a tiveram de fabricar um conjunto de regras com os proceder mal, e até perigosamente mal. O perigo, seus pares por conta própria. Alguns destes “até o risco suposto é, pelos vistos, muito mais ameaça- não se portam muito mal” na sala de aula, porque dor e muito mais “perigoso” do que o perigo em lhes é mais fácil distinguir o “seu próprio” espaço, ato, talvez, precisamente, pela ilusão do poder do espaço gerido por adultos. O que surpreende é magnífico que é atribuído à supervisão e às regras que, sendo “mal educados”, como é que conse- dos adultos. guem ser menos perturbadores do que muitos Deste modo, é fabricado um conjunto vasto de alu- dos “bem educados”. Na verdade, por via de re- nos “bem educados”, que se porta mal. A atenção, gra, não se portam tão bem quanto à primeira vis- a supervisão, o interesse dos pais são prova de ta possa parecer: a sua disposição vai mais no sen- boa educação. Aquilo que os prejudica “são as tido de desvalorizar e até desprezar as tarefas e as companhias”, dito por outras palavras, a má ges- regras desse espaço adulto, o que, normalmente, 31  iBooks Author
  • 33. lhes gera limitações nos processos de adesão a ati- isto é, por via da própria avaliação da consistên- vidades de aprendizagem e consequentes dificul- cia das competências comportamentais, suposta- dades escolares, de intensidade variável, mas sem- mente adquiridas por esses alunos. pre significativas. Se, por qualquer razão, algo os A redução, a tentativa mesmo de destruição, da faz “portar-se mal” (adotar comportamentos per- dinâmica entre contextos primordiais e contextos turbadores), é este desprezo e esta desvalorização secundários nos microssistemas não consegue ob- que se tornam evidentes, de uma forma que, o ter um sucesso real e mensurável, como se depre- mais das vezes, é sentida pelos professores como ende do dito nos últimos parágrafos. O que acon- extraordinariamente ofensiva. Ainda que este tece é que as instituições educativas ficam do lado “portar mal” seja menos frequente do que o dos de fora dessa dinâmica, mantendo uma ideia resi- “bem educados”, a intensidade da ofensa cria a dual do que ela possa ser, para efeitos de oratória. ilusão da frequência. De facto, um comportamen- Na verdade, ela continua, por força da humanida- to desajustado destes alunos “mal educados” de dos sujeitos, gerando uma variedade de situa- pode corresponder a dez ou mais comportamen- ções tão vasta quanto os sistemas interativos e di- tos desajustados, mas menos graves, dos alunos nâmicos podem construir num processo sabida- “bem educados”. Por outro lado, o grau de ofensa, mente aleatório. Os resultados obtidos, ainda por sentido pelo adulto, ou o seu sentido de responsa- cima, raramente caem na tipologia atrás mencio- bilidade como educador, que sente como tarefa nada. Pelo contrário, não só são inesperados e dís- da sua responsabilidade impedir certos excessos, pares num tempo dado, como a sua evolução é im- conduz à alimentação dos comportamentos desa- previsível, desatualizando qualquer tentativa de justados destes “mal educados”, por via da siste- retificação das consequências, que não tenha a co- mática testagem, por vezes, inconsciente, da sua ragem de abordar o problema pelo seu lado ecoló- capacidade para respeitar as regras de conduta, gico, ou bioecológico para ser mais preciso. 32  iBooks Author
  • 34. SECÇÃO 1 co ambiente que escapou aos problemas que gostaria Implicações Educativas e Organizacinais de ver corrigidos fora de si, para não os ter. As famílias, as empresas, enfim, todas as restantes organizações so- ciais teriam de corrigir-se, para que a escola não preci- sasse de o fazer. Seguir este caminho seria o mesmo que trilhar uma perigosa senda que remeteria a escola para um lugar sem referências, onde o norte e o sul se misturariam, para o vazio da mais absoluta inutilidade: uma escola, tão perfeita que se afastasse das imperfei- ções do que a rodeia e lhe dá sentido, seria desejavel- Não seria completamente ilegítimo pretender que os mente descartável. problemas decorrentes de alterações dramáticas nas di- nâmicas dos microssistemas externos - família, vizi- Apesar de tudo, faz sentido que nos questionemos so- nhança - fossem objeto de intervenção social no senti- bre o que queremos como modelo de sociedade e, sen- do da sua superação, na expectativa de que, por essa do assim, que reflitamos sobre se os modelos macrossis- via, a escola fosse poupada a ter de os enfrentar. Talvez témicos - política de trabalho, de saúde, de educação, não seja ilegítimo, mas seria completamente absurdo. de segurança social - não estarão a potenciar perigosa- É que a escola é, também ela, um microssistema, e as mente a destruição dos ambientes ecológicos que julga- interações entre microssistemas - o mesossistema - são mos serem os ideais para a formação da juventude. É tão dinâmicas e poderosas como as que se estabelecem que as crianças e os jovens não “decidem”, num eventu- ao nível de cada microssistema, já não tanto ao nível da al congresso ou por outros meios, que vão dedicar-se a interferência direta no comportamento individual, mas criar problemas à sociedade (ou à escola) que os rece- mais na forma como cada um dos microssistemas des- be, como às vezes parece, se levarmos a sério certas con- envolve a sua dinâmica interna. O absurdo seria cons- versas que nós, adultos, vamos tendo entre nós. Pelo truir a ilusão de que a escola é, no atual contexto, o úni- contrário, são as crianças que, em primeira mão, so- 33  iBooks Author
  • 35. frem os problemas e as disfuncionalidades da socieda- mais eruditos e muito mais argutos chamam pós-mo- de de que se pretende que venham a fazer parte inte- dernismo. Os moinhos de vento só não são castelos, grante. O sofrimento da escola é um sofrimento em se- são masmorras pútridas, cheias de nada ou de resíduos gunda mão, já cheio de tiques e de malformações que mal espalhados e mal varridos da modernidade, que se lhe vêm do primeiro uso. insinuam debaixo de tapetes rotos, para os quais já não Só que uma abordagem global deste tipo, embora te- há fio que os cosa: daí, a fragmentação de que nos fa- nha de estar presente na sua forma de consciência polí- lam alguns pensadores contemporâneos. tica, não pode tornar-se num obstáculo intransponível. Ora, o dinamismo da escola, como microssistema, é, A reflexão crítica deve, portanto, incidir mais sobre a cada vez mais, reprodutor daquilo mesmo que se pro- dinâmica do que sobre os componentes, ou os indivídu- põe corrigir. Saber ler não é seguramente saber pedir os, ou os meios de que dispõem os diferentes patama- ajuda a um professor para associar grafemas e fone- res do sistema social. É na dinâmica que podemos en- mas, a cada palavra nova que surja. Pelo contrário, é, contrar os pontos comuns que nos permitem transitar tendo aprendido essa tarefa em 28, ou mais ou menos entre os diferentes níveis do sistema - micro, meso, palavras, ser capaz de fazer o mesmo em todas as novas exo, macro e cronossistema - sem cairmos na tentação que surjam ou venham a ser inventadas. É mesmo não reducionista dos analistas estreitos. O debate sobre os ser capaz de fazer outra coisa, ainda que o conjunto de indivíduos ou os meios deve submeter-se a uma ideia letras agrupadas não constitua uma palavra genuína. A de dinâmica e não o contrário10. As políticas educativas este processo, chama-se aprendizagem significativa, atuais são inoperantes, precisamente porque partem isto é, aprendizagem que se estrutura numa memória do pressuposto de que a manipulação dos indivíduos e semântica praticamente indestrutível, embora sempre dos meios vai produzir retificações nas dinâmicas. E renovável e suscetível de aperfeiçoamento. Distingue- não produz outra coisa que não seja o conformismo, a se este tipo de aprendizagens das aprendizagens instru- ilusão de mudança e a revolta contra essa mesma ilu- mentais, isto é, daquelas que, organizando-se sobretu- são, em resumo, um quixotismo invertido, a que alguns do na memória episódica, são indispensáveis para al- 34  iBooks Author
  • 36. cançar as primeiras, mas formam uma estrutura frágil, direta do professor. Sabe o que o professor ensina, mas sujeita a processamento intensivo nos períodos de para saber à sua maneira. O bom aluno é aquele que sono, responsáveis pelos sonhos, pela criatividade, mas apoia a aprendizagem instrumental com trabalho autó- incapazes de sustentar-se a si mesmas. São as aprendi- nomo. Para alguns deles, momentos relativamente cur- zagens significativas que as sustentam no tempo, embo- tos e assíduos de apoio à aprendizagem são o bastante, ra sejam elas que, a cada momento, ajudam a organizar para outros esses momentos têm de ser mais longos e estas aprendizagens significativas. menos assíduos, e ainda para outros, a gestão desse Se a escola pretende ser um espaço de aprendizagem es- apoio é variável consoante a matéria de aprendizagem. truturada, não pode, nem poupar-se ao trabalho de in- Mas nenhum dispensa essa gestão. Há ainda um núme- sistir nas aprendizagens instrumentais, nem insistir de ro sempre crescente de alunos que, por razões que não tal modo nelas que reduza as aprendizagens significati- vão agora ser aqui repetidas, precisam que a sua pró- vas (de cariz semântico) a processamentos de informa- pria autonomia seja supervisionada pelos pais ou por ção de natureza instrumental. Ora, se a aprendizagem centros de estudo, explicadores ou outros. Na verdade, instrumental é sobretudo aquilo que o ensino, no seu este é um dos sintomas mais evidentes de que a escola, sentido mais restrito, pode assegurar, dependendo por- ao longo dos vários ciclos de aprendizagem, não dá tanto da supervisão, a aprendizagem significativa, essa, oportunidades de gestão autónoma das aprendizagens, nasce da autonomia do aprendiz, da construção do alu- isto é, não permite, ou impede mesmo, a aprendizagem no11. As aprendizagens de valores, de teorias, de concei- da autonomia. É natural que, nas primeiras idades, a tos são aprendizagens de tipo semântico. Implicam, aprendizagem da autonomia careça de supervisão, de para que sejam estruturantes, a construção do sujeito ensino instrumental, mas começa a ser preocupante aprendiz. Por outras palavras, implicam autonomia, que alunos com 12, 13 anos e, pior ainda, com idades isto é, trabalho mental sem supervisão direta e simultâ- mais avançadas ainda se sintam completamente despro- nea. O bom aluno é aquele que adquire as aprendiza- tegidos na sua autonomia. gens por via do ensino e as organiza fora da supervisão 35  iBooks Author
  • 37. Ora, a escola tem de se organizar de modo a promover pela impossibilidade prática de essas modalidades de as aprendizagens instrumentais e as aprendizagens es- intervenção se universalizarem a todos os alunos. As- truturantes. Para isso, não pode ter o modelo rígido de sim, não sendo atividades disponíveis para todos os funcionamento que lhe conhecemos atualmente. Diga- que delas necessitam, e não sendo aproveitadas por to- mos, para abreviar, que não se superam as limitações dos para quem são disponibilizadas, têm o mérito de se da escola criando “salas de estudo”, “estudo acompa- constituírem como mais uma oportunidade para articu- nhado”, “aulas de apoio”, num contexto em que tudo o lar aquilo que não deveria ter sido desarticulado, isto é, que seja criado de novo acaba sempre por fortalecer a de se constituírem numa poderosa afirmação da buro- rigidez daquilo que já existe e parece insuficiente. Estas cracia auto-justificada e auto-alimentada. compensações só compensam aqueles alunos que, por Ao nível da indisciplina, sobretudo aquela que se mani- mérito próprio, são pouco afetados pelas limitações da festa de baixa intensidade e de alta frequência, este mo- escola. Os outros, muitas vezes, evitam confrontar-se delo de escola pulverizado para fora das equipas educa- com a confirmação da sua incompetência que estas es- tivas, descentrado da sua atividade nuclear, é particu- tratégias compensadoras se limitam a pôr em evidên- larmente gerador de problemas e incapaz de enfrentar cia. Compensar um erro não é corrigi-lo, é tentar man- com sucesso aqueles outros que possam ser gerados ou tê-lo, disfarçando-o tanto quanto possível, nem que potenciados no seu exterior. seja só através da hiperatividade burocrática ou da hi- Seria insensato supor sequer a possibilidade de uma or- perventilação dos agentes compensadores. Os concei- ganização social alcançar um ponto tal de perfeição que tos de sala de estudo, de estudo acompanhado e de anulasse todos os tipos de conflitualidade no seu interi- apoio educativo dão conta da insuficiência do modelo or ou na sua relação com o exterior. Não só seria insen- de escola que temos, mas não são compatíveis com ele. sato como, no limite, seria opressor e perigosamente Em aplicação, limitam-se a acrescentar às dificuldades inibidor do desenvolvimento e melhoria da própria or- já existentes algumas mais. Este acrescento de dificul- ganização. Essa “perfeição” só poderia ser a mais abo- dades é, apesar de tudo, invisibilizado e até camuflado minável imperfeição. Não se tratará, aqui, portanto, de 36  iBooks Author
  • 38. encontrar um modelo de organização da escola que saia em busca dessa quimérica perfeição. Pelo contrá- rio, o modelo, que aqui se pesquisa, procura, sobretu- do, ser um modelo que suporte com eficiência a dinâmi- ca da escola, não que solucione os problemas de hoje ou de amanhã, mas que se dote dos meios necessários para os superar, ao nível do seu próprio funcionamen- to. 37  iBooks Author
  • 39. C APÍTULO 3 A Proposta O modelo de escola aqui proposto procu- ra deliberadamente ser um modelo de di- nâmica, isto é, um modelo funcional, ope- ratório, mais do que um modelo pura- mente conceptual ou abstrato.  iBooks Author
  • 40. A P ROPOSTA Ora, precisamente, o que aqui se propõe é uma al- teração radical deste estado de coisas. Trata-se de uma proposta que deve enformar o projeto educa- O modelo de escola aqui proposto procura delibe- tivo da escola e traduzir-se em planos anuais de radamente ser um modelo de dinâmica, isto é, atividades que correspondam à execução anual um modelo funcional, operatório, mais do que do projeto, por um período estimado de quatro/ um modelo puramente conceptual ou abstrato. cinco anos. Esta opção não significa a ausência desse concei- to de escola, mas uma opção de economia, tendo em conta o propósito deste documento. Nos capítulos anteriores, a crítica ao funciona- mento atual da escola, em resumo, aponta para a denúncia de uma dinâmica, em que os circuitos de informação e de gestão do quotidiano provo- cam “engarrafamentos”, disfunções, que, para além de criarem enormes dificuldades à direção da organização, afastam os professores, no seu tempo não letivo, para fora do centro da sua ativi- dade profissional nuclear. Com efeito, nesses tem- pos, os professores continuam, muitas vezes, a de- dicar-se a atividades com alunos, desde que não façam parte da suas turmas. 39  iBooks Author
  • 41. SECÇÃO 1 conceitos de senso comum em uso genuíno na lín- Unidades de Funcionamento gua portuguesa. Por outro lado, considera-se que a função educati- va do professor corresponde a uma inevitabilida- de que resulta da sua função de ensinar. Fazer apelo a essa função educativa no professor signifi- ca sobretudo fazer um apelo à tomada de consci- ência sobre essa inevitabilidade. Dito de outro modo, evitar essa tomada de consciência não tem As unidades de funcionamento devem aproxi- qualquer impacto na redução da função educati- mar-se o mais possível de uma posição isomorfa va, só a remete para a inconsciência, com todos da atividade nuclear da escola - ensinar e apren- os riscos que isso comporta. Consequentemente, der. As culturas, em cuja base linguística os con- ser-se bom professor implica ser-se um educador ceitos de educar e instruir, e os de ensinar e apren- consciente, não sendo, todavia, verdade o inver- der adquirem matizes que, ou os reduzem artifici- so. Nesta ordem de ideias, a componente educati- almente um ao outro (“educado” como sinónimo va do professor deve traduzir-se na criação de con- de “instruído”), ou os juntam numa mesma pala- dições favoráveis à aprendizagem, seja no domí- vra (“apprendre” como significando aprender e nio dos conhecimentos e informações cultural- ensinar), dominam as investigações científicas so- mente relevantes, seja no domínio do contexto bre estes conceitos, como é compreensível. Para em que ela se realiza, ao nível das condutas dos evitar malentendidos, os termos “ensinar” e alunos e dos professores, dos materiais, da quali- “aprender”, neste documento, correspondem aos dade da comunicação e por aí fora. 40  iBooks Author
  • 42. Ora, em resumo, a atividade nuclear da escola, cas para responder o mais eficientemente que lhe aquela que lhe dá algum sentido distintivo de ou- seja possível à evolução inevitável das sociedades, tras também informativas e educativas, é justa- fortalecendo, a cada passo, a sua atividade nucle- mente a de ensinar e aprender em condi- ar. Assim, ções favoráveis, significando, em coerência ๏ As equipas educativas devem ser a estru- com o acima enunciado, que ela não é nunca com- tura funcional nuclear da escola. A) Por pleta - na verdade, não será nada - se algum dos equipa educativa entende-se um conjunto de três elementos que a compõem (ensinar, apren- alunos, professores e auxiliares de educação der e condições favoráveis) estiver ausente. que desenvolvem, em conjunto, a atividade nu- Discutir analiticamente cada um desses conceitos clear da escola. Não coincide este conceito de e encontrar um solução para eles, na tentativa de equipa educativa com a prática atual que a iden- fundamentar previamente um modelo de funcio- tifica com o grupo de professores que traba- namento de escola, seria uma das tais tarefas ci- lham com os mesmos alunos. Pelo contrário, a clópicas que nunca estaria concluída, e, ou a solu- equipa educativa é aqui concebida como uma ção seria uma dissolução dos conceitos num ou vá- unidade funcional para realização de todas as rios preconceitos, ou a busca de solução seria o tarefas que possam caber nessa atividade cen- seu adiamento permanente. tral da escola. B) O conceito de estrutura funci- Por estas razões, aqui muito sinteticamente expos- onal nuclear corresponde, por outro lado, à tas, alimento a crença de que quaisquer que se- base estrutural de todo o edifício organizacio- jam as teorias científicas, ideológicas ou outras, e nal da escola. Na verdade, significa a sua so- sendo elas sempre provisórias, a escola deve pro- breordenação face a qualquer outra estrutura: curar instaurar dentro de si mesma, através do departamento curricular, grupo disciplinar, clu- seu modelo de funcionamento, as condições práti- bes, etc. 41  iBooks Author
  • 43. ๏ As equipas educativas devem ser dimen- não o inverso. A formação de grupos de traba- sionadas, a partir do número de alunos a lho (os grupos reduzidos mais importantes) envolver em cada uma delas. Nos documentos deve responder, como veremos, à avaliação dos legais reguladores do “lançamento do ano leti- níveis de autonomia na realização das tarefas vo”, surge, desde há vários anos, a indicação de escolares, quer dos professores, quer dos alu- que a constituição das turmas deve resultar da nos, isto é, as condições subjetivas de ensino e definição prévia das equipas educativas. Esta de aprendizagem devem ser valorizadas, mais orientação tem sido obviamente absorvida da do que as condições que resultam daquilo que única forma que é possível, não lhe sendo dada cada um pensa que sabe objetivamente. Por qualquer relevância. Com efeito, as atuais práti- exemplo, ser capaz de aprender, de realizar cas de formação de turmas e de organização de uma tarefa de aprendizagem, sem supervisão equipas educativas não se compaginam, de de um adulto é um critério mais seguro para or- modo a viabilizar a concretização dessa orienta- ganização dos grupos de trabalho do que a ava- ção talvez bem intencionada, mas sem nexo no liação do que já se sabe. atual contexto escolar. No entanto, sendo corri- ๏ As equipas educativas devem ter níveis gidas essas práticas, esta orientação adquire de autonomia alargados no interior da orga- todo o sentido. Assim, as equipas devem dispor nização escolar. Numa escola com um pouco dos recursos humanos, materiais, e eventual- mais de 1 000 alunos, podemos antever a neces- mente outros, que se ajustem às necessidades sidade de 8, 9, talvez, 10 equipas educativas. de, aproximadamente, 100 a 200 alunos. A for- Isto corresponderia à criação de igual número mação de grupos de identificação mais reduzi- de coordenações, em substituição dos atuais dos (“turmas”) é, tudo leva a crer, muito útil, cerca de 50 diretores de turma12 que tal núme- mas deve resultar da constituição das equipas e ro de alunos implica. Ora, ser-se coordenador 42  iBooks Author
  • 44. num quadro deste género não poderá ser um los, de organizar atividades de enriquecimento, apêndice, nem sempre fácil de plantar, num de apoio à aprendizagem, de retificação de con- vasto conjunto de outras atividades. Deve dedi- dutas indesejadas, etc. car-se por inteiro a essa tarefa, o que, de modo ๏ Os coordenadores das equipas educati- nenhum, implica que deixe de ter responsabili- vas devem constituir o principal órgão dades letivas, antes pelo contrário. Por outro de assessoria do diretor de escola. Em coe- lado, admitindo a redução ou eliminação mes- rência com o que é afirmado antes, o diretor mo da democracia representativa na escolha do deve ser, antes de tudo o mais, o gestor de últi- coordenador da equipa educativa, tal como já ma instância, não o de primeira, da atividade sucede atualmente em todos os cargos de res- nuclear da escola. A sua equipa de assessores ponsabilidade, é vital, para a eficiência da esco- deve, portanto, formar-se a partir das unidades la, que seja cultivada a democracia participati- funcionais nucleares, assegurando-lhe os mei- va. Assim, devendo o coordenador reportar di- os que lhe permitam exercer as suas funções, retamente ao diretor da escola, sendo mesmo recorrendo o menos possível a informações escolhido por ele, faz todo o sentido que o dire- avulsas. tor não tenha de se envolver na gestão do quoti- ๏ Devem ser criadas outras unidades fun- diano da equipa. Pelo contrário, deve manter a cionais, para além das equipas educativas. As distância prudente, que lhe permita intervir equipas educativas devem ser estruturadas em sensatamente, em caso de necessidade impera- torno do core curricular de cada ciclo de estu- tiva. A autonomia, a que aqui se faz referência, dos ou de cada curso, pelo menos numa primei- é a de elaborar e gerir os horários dos professo- ra fase de mudança. A opção por outras unida- res e dos alunos, de os ajustar às necessidades des funcionais deve corresponder a uma afirma- da equipa, de flexibilizar a gestão dos currícu- ção da identidade da escola. Assim, pode ser cri- 43  iBooks Author