2. por João Aníbal Henriques
Existem lugares que estão prenhes de memórias
e de vida. Neles subsistem memórias ancestrais,
marcadas nas rochas firmes que as sustentam,
em laivos de ritos que se repetem milenarmente
e que quase tocam a eternidade. Castro
Laboreiro, no Concelho de Melgaço, no Norte de
Portugal, é um excelente exemplo de um espaço
assim. Nele convivem muitas gerações que se
cruzam nos seus quereres, nos seus sonhos e nas
suas emoções, repetindo-se num monumento
cíclico eterno que surge perenes nas paredes, no
chão e nas rochas do lugar.
Castro Laboreiro
3. Com uma história ancestral, provavelmente contemporânea do nascimento da espécie humana na Terra,
Castro Laboreiro ganha o seu topónimo do seu velho e vetusto castelo – ou castro – que estrategicamente
colocado no topo do morro nos deixa perceber que importância teve este lugar na definição dos limites
territoriais do nosso País.
Castro Laboreiro
4. Castro Laboreiro
O castelo ou castro, atribuído na literatura mais antiga ao
período romano, surge durante o romantismo como sendo de
origem árabe, facto que se sustenta na efectiva influência que
os norte-africanos tiveram na consolidação do espaço
territorial do El-Andaluz. Sabe-se hoje, no entanto, que o
castelo é muito mais velho do que isto e que, no deambular
transumante da pré-história, seria já um local de extrema
importância, pelo menos durante o período de veraneio.
As suas raízes celtas, imbuídas no espírito das muitas tribos
que aqui estavam sedeadas e que se digladiavam de forma
permanente protegendo-se nos fortes e contra-fortes que as
serranias proporcionavam, é uma certeza inultrapassável que
ajuda a percebe melhor a forma consentânea que o espaço
apresenta quando relacionada com a existência ambígua dos
seus primeiros ocupantes.
Parque Nacional da Peneda-Gerês
5. Hoje, milhares de anos depois desse período áureo de Castro Laboreiro, a população continua a viver de forma
cruza entre as “inverneiras”, ou seja, os espaços de habitação situados nos vales que envolvem o lugar,
como Bico, Cailheira, Curveira, Bago de Cima e Bago de Baixo, Ameijoeira, Laceiras, Ramisqueira, João Lavo,
Barreiro, Acuceira, Podre, Alagoa, Dorna, Entalada, Pontes, Mareco, Ribeiro de cima e Ribeiro de Baixo e as
“brandas” os espaços ocupados durante o período estival e situados na regiões mais altas que envolvem a
localidade. As principais “brandas” são Vila, Várzea Travessa, Picotim, Vido, Portelinha, coriscadas, Falagueiras,
Queimadelo , Outeiro, Adofreire, Antões, Rodeiro, portela, Formarigo, Teso, Campelo, Curral do Gonçalo, Eiras,
Padresouro, Seara, e Portos. O ritual de passagem de trecos e tarecos entre as duas casas pelas famílias
castrejas, repete-se ainda hoje numa espécie de ritual cíclico que perpetua a própria Alma Lusitana neste lugar
tão especial.
Castro Laboreiro
6. Os dólmenes situados junto à localidade, ainda
hoje motivo que redobra o interesse por uma
visita, atestam e testemunham a herança simbólica
e sagrada de um espaço que provavelmente só
assim explica a sua longevidade.
De facto, com uma situação geográfica extrema,
Castro Laboreiro viveu durante milénio num
isolamento muito profundo, facto que
contextualiza a excelente preservação dos seus
monumentos mas, também, a manutenção quase
se poderia dizer inusitada de uma estrutura de
pensamento que se consolida à medida em que os
séculos vão passando. Certo, no entanto, é que as
agruras do tempo e do clima e até a própria
produtividade da terra são insuficientes para
explicar a teimosia humana em permanecer por
aqueles lados, isto se não tivermos em linha de
conta a beleza natural que envolve todo o espaço e
que é de tal forma impactante que se torna difícil
de descrever.
Situada em pleno Parque Nacional da Peneda-
Gerês, que seria por si só motivo que chegaria para
explicar o interesse de a visitar, a localidade de
Castro Laboreiro vale ainda a pena pelos seus
excelentes restaurantes e magnífica gastronomia
que oferecem aromas e sabor a uma visita ao local.
7. Mas no alto, alcandorado nas penhas que protegem a fronteira, o castelo sobrevive ainda, assente nas
ruínas que sobreviveram a um raio que o destruiu por completo no Século XIV e que Dom Dinis mandou
reconstruir.
O caminho íngreme e difícil, num acesso que só é possível fazer-se durante o Verão, transporta-nos até a
mais de 1000 metros de altura, deixando antever, aqui e ali, pequenos panos das antigas muralhas. Só
quando chegamos lá acima, já bem perto das enormes rochas onde está alicerçada a entrada principal,
começamos a perceber o assombroso daquele local. Uma paisagem sem fim, num conjunto de planos
infinitos que reforçam a sensação de pequenez e de insignificância que este tipo de locais sempre nos trás.
Classificado como Monumento
Nacional desde 1944, o Castelo de
Castro Laboreiro foi conquistado por
Dom Afonso Henriques em 1141
que lhe terá construído uma torre
de menagem isolada que lhe
conferiu a configuração tradicional
dos castelos românicos.
Castro Laboreiro
8. Castro Laboreiro
Depois de consolidada a Nacionalidade e de
terminadas as lutas fratricidas que deram
corpo à independência de Portugal, Castro
Laboreiro nunca perdeu da sua importância
estratégica, facto que se percebe através de
uma análise linear à forma como se situa a
sua muralha relativamente à fronteira galega.
No seu interior, abaixo do marco geodésico
que ocupa o espaço onde estava outrora a
torre medieval, existe ainda o redil onde se
juntava o gado das redondezas, protegido
pelos muros grossos das investidas sempre
terríveis de inimigos e animais selvagens.
Em suma, Castro Laboreiro e o seu velho
castelo são uma das pérolas inesquecíveis de
Portugal. Valem a distância necessária para lá
chegar e justificam por si só o passar por lá
uns dias de férias.
Parque Nacional da Peneda-Gerês