DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
A Língua do meio - Ensaio sobre interlíngua
1. A língua do meio
Ens
aio sobre interlíngua e sua importância no processo de aprendizagem de segunda língua
Lenílson da Costa Silva
Este ensaio versa sobre as questões da interlíngua, dialogando com uma proposta
conceitualista, bem como sua relevância no processo de aprendizagem de segunda língua
(L2) a fim de compreender de que forma esse processo interlinguístico interfere positiva ou
negativamente na aprendizagem de L2. De início, é preciso responder a seguinte pergunta: o
que é interlíngua?
Interlíngua é um sistema de transição criado pelo aprendiz durante o seu processo de
assimilação de uma segunda língua ou língua estrangeira; e é bem verdade que essa
interlíngua varia dependendo de quem a fala e de quais insumos linguísticos o aprendiz
possui, além de qual é a língua materna (LM) desse aprendiz.
Ao abordar as questões da interlíngua, é preciso compreender outros dois conceitos
importantes: o de interferência e o de fossilização. A saber: interferência é a ocorrência das
formas de uma língua, em primeiro momento, a LM, em outra língua, L2. Essa ocorrência de
formas causa desvios perceptíveis no que se refere à pronúncia, vocabulário, estruturação de
frases, assim como desvios nos níveis idiomáticos e culturais.
Já a fossilização referese
aos erros e desvios no uso da língua que se está
aprendendo, esses erros são internalizados pelo aprendiz e por isso são de difícil eliminação.
Tanto a interferência quanto a fossilização elucidam os percalços no desenvolvimento
gradativo de uma L2.
A interlíngua se caracteriza pela ocorrência das formas da LM que inevitavelmente
aparecerão na fala do aprendiz. Segundo Harpaz (2003) a pessoa que aprende uma
segunda língua, estrutura suas ideias de forma mais monitorada; articula os sons dessa nova
língua e deveria evitar hábitos linguísticos de sua LM, porém, os mecanismos estruturação
de ideias e fonação relativos
à LM são difíceis de serem evitados, visto que ao depararse
com um novo sistema, o aprendiz se vê dependente desses hábitos. Por essa razão, para
um adulto, já com seu sistema linguístico estabelecido aprender
uma segunda língua
demanda muito mais tempo do que para uma criança, sem esse sistema arraigado.
2. Exemplifico o que foi dito relatando, brevemente, minha experiência pessoal no
processo de aprendizagem da Língua de Sinais Brasileira (LSB) como L2.
Várias interferências da Língua Portuguesa (LP) ocorreram durante meu processo de
aprendizagem da LSB, costumava falar uma língua intermediária entre a LP e a LSB, uma
interlíngua comumente chamada de português sinalizado. A medida que fui ganhando mais
insumos linguísticos da língua alvo (LAL) fui declinando dessa interlíngua e ganhando mais
propriedade no sistema linguístico da L2. Contudo, embora já sabendo diferenciar o que é
LP, LSB e português sinalizado, ainda restam alguns desvios fossilizados que aparecem
frente às necessidades comunicativas, por exemplo, em expressões idiomáticas inexistentes
em uma das línguas.
A minha exposição à LSB se deu de forma intensa, o que minimiza significativamente
os meus hábitos provindos da LM. O mesmo não ocorre no meu aprendizado da língua
espanhola, onde os meus inputs linguísticos são insuficientes o que pode acarretar numa
tendência maior à fossilização dos desvios, isto porque minhas necessidades de
comunicação em língua espanhola demanda uma frequente criação de uma interlíngua,
comumente chamada de portunhol, que se não for assistida por inputs autênticos, poderá
causar uma internalização precoce das formas do portunhol.
Levando em conta o que foi observado, a interlíngua pode ser vista de maneira
positiva, quando esta, utilizandose
dos insumos da LM pode colaborar no aprendizado de
L2, de modo a transferir as habilidades linguísticas da língua materna no decurso de
assimilação de segunda língua, ou seja, transferindo essas habilidades; não obstante, a
interlíngua poderá assumir um caráter negativo quando esta fossiliza velhos hábitos
linguístico do aprendiz e os transferem para a segunda língua dificultando ainda mais seu
aprendizado, nesse momento a figura do professor se faz necessária no sentido de
apresentar metodologias assertivas, expondo o aprendiz aos inputs autênticos da L2 em
questão, respeitando as interlínguas desses aprendizes, evidenciando que elas são apenas
um trampolim para se chegar à língua alvo.
3. Referências Bibliográficas
ALMEIDA FILHO, J.C.P. (org.) (1995) Português para estrangeiros: interface com o
Espanhol. Campinas: Pontes.
Harpaz, Yehouda. Myths and misconceptions in Cognitive Science. Human Cognition in the
Human Brain. <http://humanbrain.
org/myths.html>. Online. Nov 1, 2003.
LANZETTI, Rafael. Aprendizado de Línguas Estrangeiras. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=GitvTUpuYpQ. Acesso em: 20 de novembro de 2014
QUADROS,R. M. Educação de surdos: aquisição da linguagem. Artes Médicas. Porto Alegre.
1997.