Este documento apresenta uma coleção de poemas haicais e outros poemas curtos em português e japonês. Os poemas exploram temas como a natureza, as estações do ano, a passagem do tempo e a vida e a morte.
1. Ano X nº 66 Julho 2015 Distribuição Gratuita Editor: Antonio Cabral Filho
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HAICAIS
Ao chegares, meu filho,
Nos longes da minha idade,
Pensarás em mim.
João Justiniano da Fonseca – BA
Espalhadas flores
Quer pegar e pega apenas
O vento da chuva.
Fugiwara-no-Sadaye – Japão
Nas águas rasas
os peixes em frenesi :
rio de primavera.
Sergio Pichorim – PR
Primavera
Hibiscos vermelhos floridos
Pinhados de beija-flores.
Selmo Vasconcelos – RO
De mim se diga:
Vivia de caquis
E de poemas.
Masaoka Shiki – Japão
Luas e flores:
Quarenta e nove anos
De vida inútil.
Kobayashi Issa – Japão
No velho tanque
Uma rã mergulhando:
Barulho d’água.
Matsu Bashô – Japão
Adormecida
Sobre o sino do tempo:
A borboleta.
Yosa Buson – Japão
Sonhos de menino
entre bolhas de sabão...
- Mistério de um sopro.
Humberto Del Maestro – ES
Na banca flores,
um vaso chama a atenção –
gardênias azuis.
Renata Paccola – SP
Várias andorinhas
pousam na torre da igreja:
Procuram morada.
João Batista Serra – CE
Esquadria antiga –
Os meus rabiscos não dormem
Em noite de lua.
Neide Rocha Portugal – PR
Chuvinha vernal –
O lavrador agradece
De chapéu na mão.
Hazel de São Francisco – SP
Os balões no céu
Já não são inocentes:
Florestas em chamas.
Eliana Ruiz Jimenez – SC
Colibri esvoaça.
Tem rosa nova, solteira,
No jardim da praça.
Antonio Augusto de Assis – PR
Rebrilhando ao sol,
Um cardume de sardinhas...
Moedas no mar.
Hermoclydes S. Franco – RJ
Beleza e perfume.
Deus desabrocha no galho
Da rosa vermelha.
Fernando Vasconcelos – PR
Uma árvore nua
Aponta o céu. Numa ponta
Brota um fruto. A lua ?
Guilherme Figueiredo – SP
Muitos girassóis
em uma só direção
e o sol no poente. SF12
Manoel F. Menendez – SP
Brilho na mata:
Os ipês – amarelos
Estão florindo.
José Lira – PE
Bate breve o gongo.
Na amplidão do templo ecoa
O som lento e longo.
Helena Kolody – PR
Luzes no pinheiro
e o réveillon na varanda.
Jogos de artifício. SF0712
Larissa Lacerda Menendez – SP
O sol nasce para todos,
Mas a maioria prefere
Dormir um pouco mais.
Eno Teodoro Wanke – PR
Ouço um bem-te-vi,
Cujo canto espanta o frio
Dos ventos do Norte.
Edweine Loureiro – Japão
No jardim bem cedo,
Vi Louva-deus de mãos postas:
Caçador exímio.
&
Cigarras cantando,
Na manhã ensolarada:
Início de outono.
&
Enquanto garoa,
Lambaris dão cambalhotas
Sobre o espelho d’água.
&
Meu neto, nervoso,
Com a nuvem lá no céu:
Ela está voando!
Antonio Cabral Filho – RJ
2. TROVAS
Por não ser um astronauta,
é que vivo pela rua,
curtindo a paz que me assalta
quando vem surgindo a lua!
Gilson de Abreu Marinho – RJ
Duas vidas todos temos,
muitas vezes, sem saber.
A vida que nós vivemos
e a que sonhamos viver.
Luiz Otávio – RJ
Quando fores para o leito,
leva-me entre os teus seios,
que se mostram, em teu peito,
e mexem com meus (an)seios.
Silvério da Costa – SC
Basta de guerras, senhores
dos mais nefandos mercados.
Façam dos tanques, tratores;
das bombas, foices e arados.
Luis Antonio Pimentel – RJ
Paixão não se debilita...
mesmo longe, ainda te vê.
Qualbandeira em que está escrita
a saudade por você.
José Feldman – PR
Ver para crer, eis o lema,
o lema de São Tomé;
a desconfiança é o tema
para o enredo pouca-fé.
Arlindo Nóbrega – SP
No nascer da poesia,
entoei minha canção,
ser trovador: Alegria!
Muito amor no coração.
Osael de Carvalho – RJ
Tua beleza que atrai,
não a afogues na vaidade,
aproveite-a que ela vai,
um dia, virar saudade.
João Batista Serra – CE
O mundo gira, lascivo,
com todos os vícios seus,
violento, injusto, opressivo,
porque distante de Deus.
Arthur Filho – RS
Na velhice, uma cantada,
corpo ruim, mas alma acesa,
ela topar não foi nada,
dar certo é que foi surpresa.
Fernando Vasconcelos – PR
A manhã recita o salmo,
passa o vento, mais amigo
e é nesse momento calmo
que deus conversa comigo.
Humberto Del Maestro – ES
O canto do bentivi,
alegre, sempre a lembrar,
que a paz um dia eu senti
nos seus olhos a brilhar.
Henny Kropf – RJ
As graças que sempre faço,
têm o poder de encobrir
a tristeza que o palhaço
faz de conta não sentir...
Renata Paccola – SP
A neve cobrindo o campo
é um tapete de algodão,
é tão solitário e branco
tal minha alma – solidão.
Ivone Vebber – RS
Cidadania é saber
manter a honra constante,
ser sincero no dever
e servir ao semelhante.
Ruth Farah – RJ
Já de miolo torrado,
não percebo nem de leve:
- Que lucra o aposentado
que ameace entrar em greve?
Diamantino Ferreira – RJ
Questionado, Salomão
sobre o que ele queria,
respondeu, não sem razão:
Só quero sabedoria...
Gualberto Bruno de Almeida.ES
A voz não me sai dos lábios,
mas pensando sempre eu fico,
o rico nem sempre é sábio,
mas o sábio é sempre rico.
Antonio Pereira Mello – RS
As horas vão caminhando
através dos meses novos
e todos concretizando:
- Paz, união entre os povos.
Francisco A. Nascimento – GO
O berrante da tristeza
repica abrindo o sertão
e desperta a natureza
que habita meu coração.
Ziney Santos Moreira – SP
Quando mãe Eva, imprudente,
provou, também, da maçã,
a serpente foi semente
das gerações do amanhã.
Pedro Giusti – RJ
Uma surpresa graúda,
na vida de todos cabe:
quanto mais a gente estuda
vai vendo que menos sabe.
Nato Azevedo – PA
Mineirinho caloteiro,
perante o credor, se trai.
- Pague a dívida, mineiro!
- Eu não sou mineiro, uai !
Arlindo Tadeu Hagen – MG
Quero um amor que me valha,
e espero o tempo que for,
pois sou celeiro de palha
pronto a queimar por amor.
Eliana Ruiz Jimenez – SC
3. Na ajuda ao necessitado,
Sugiro-te esta postura:
Não lhe dês pronto o melado;
Antes dá-lhe a rapadura.
José Fabiano – MG
A vovó, quando inda em vida,
- Que fé alardeava ter!
- A qualquer dor concebida,
Vinha logo nos benzer.
Milton Mariano de Souza – MG
Se o meu silêncio diz tudo,
que a minha boca não diz,
o amor no peito é escudo
que me faz viver feliz.
Walter Siqueira – RJ
Vem o amor e depois...
Se houver entendimento,
há união entre os dois,
celebrada em casamento.
Euclides Cavaco – Canadá
Que mais desejo da vida,
além do que sempre quis ?
É que ao final desta lida,
possa dizer: Sou feliz!
Jessé Nascimento – RJ
Ouvi hoje tititis
A respeito da fofoca,
Dizem que por um só triz
Quase que virou pipoca.
&
O rosto que Deus nos deu,
Por ser sua semelhança,
Quem ocultar é ateu,
Não merece confiança.
&
Batatinha é mulher fácil,
Se esparrama até no chão,
Mamãezinha come alface,
Abre até o coração.
&
Bateu asa o tico-tico,
Mas ficou o sabiá.
Não sei vou nem se fico,
Mas não lhe dou meu fubá.
Derrotas, eu não conheço,
Vitórias, já tive muitas,
Todas a custo e apreço
Pois andaram sempre juntas.
&
No mar que remo sem remo,
Preciso ter muita fé;
Remar sem saber se temo,
Seguir sem ver a maré.
Antonio Cabral Filho – RJ
PEDRAS
No caminho do poeta
Havia uma pedra.
Mas ele a retirou
Com uma singela pluma.
Triste de quem
Não vê pedra alguma;
E caminha, vaidoso,
Perdido entre brumas...
Edweine Loureiro – Japão
Rumo
Sem rima
A canção da minha vida
É verso livre
Michelle C. Buss - (gp29)
PEPINO EM CONSERVA
Na parede quase nua
Em que a janela flerta a rua,
Mas se escancara para a lua,
Somente um quadro me observa.
Será que ele não se cansa
De me ver coçando a pança,
Levando essa vida rança
De pepino em conserva?
Denivaldo Piaia – SP
CANUDOS
Belo Monte de Canudos,
Alto Alegre o coração,
Descortinar entre as serras
Tanto sonho, plantação.
Essa vila sertaneja
Nasce da convicção
Nos olhos de quem mareja
A certeza de então.
Um conselho, companheiro,
Vem zunindo pela história
Resistindo o tempo inteiro
Na certeza da vitória.
Coelhão – Juazeiro – BA
SÓ, NETO
Amar o inexistente
É um árduo exercício
Que exige simplesmente
Mergulhar num precipício.
É preciso renunciar
A um amor de carne e osso
Para só se dedicar
À construção de um colosso.
Amar verdadeiramente
É amar o abstrato,
É querer nada e ninguém.
Apenas com um fio em mente,
É consigo só ter trato,
Sempre almejando ir além.
Aristides A. Soffiati Netto – Uff
METÁFORA
Poeta não é quem transa
A terra e o mangue
Poeta não é quem traça
A troça e o chiste
Poeta
É quem põe
A terra em transe.
Simão Pessoa-DF
CONTRAPONTO
Ruas & becos
Castelos & casebres
Mil & um
Menino
Sem canção de ninar
João B.S. Filho – SP
4. SIMPLESMENTE
A visão
Do destino
E o gear da alma
Provocaram-me,
Simplesmente,
Uma feliz
Grandeza humana.
Zanoto – MG
ARESTAS
Um sol que saiba pulsar,
Saiba ferir sem calor,
Ruminando com esgar
Até mesmo a própria dor.
Iacyr Anderson Freitas – MG
RES NON VERBA
Estrelas, sonhos de espera
longa. Ousadia de amar em
vão. Pintura, aquarela, borrão
de tinta a vagar lembranças
daqueles tempos crianças,
algazarras parques bolas
templos, pensamentos como
garras.
Alceu Brito Correa – DF
GONZAGUIANA
Em tronco de velho freixo
Exposto à lixa dos ventos
Ao vitríolo do tempo
Não gravo teu nome não:
Gravo-o no meu coração.
José Paulo Paes – SP
FRAGMANTO...
Quando me sentarei contigo
Na ternura das coisas justas
E tu me envolverás
Em teu perfume selvagem
E violento?
Quando te darei de presente
Minha alma inquieta?
José Jackson C. Sampaio-CE
TERCEIRA IDADE
Ainda gosto do resto
Que me resta.
Restando assim,
Dissabores e sabores
Na caminhada dos dias
Que ainda me sobram
Sou hoje sem futuro,
Só presente até partir.
Lírian Tabosa – RJ
NÃO DESISTA DE SEUS
SONHOS
Brigando comigo mesmo
Brigando com todo mundo
Brigando com a família
Filhos carteiro cachorro
E a minha própria sombra.
Brigando mas sem
perder o diálogo
E nem monologando:
Aprimorando a palavra.
Redescobrindo os caminhos
Que a briga respeitosa
Apresenta: compre esta briga,
E siga comigo!
Eduardo Waack – SP
RIO
Descem vacas
No cristal.
Param plantas
No cristal.
Descem ramos
No cristal.
O cristal permanece
Na superfície.
As águas não conseguem
Levar o reflexo.
Clovis Moura – BA
HISCÓRIA DO BRASIL
Ia começar a partida
Assaltantes x Assaltados,
Mas entrou em campo
O Extorção Footbol Club
Para decidir o jugo
Com o Scoria Club Socyete.
Aí acabou a graça,
Quer dizer, a grana.
VERSO MAL’ARMAICO
Não arranca-me nem um
tchum
Chamarem Malarmé de
simbolista
Pois não dependo de mestres
nem bajulo os escolistas.
A mim basta-me planar
Livremente o céu sem deuses
Pra desgraça de seus rapapés,
Feliz por ser uma
alm’anarca!
CEMITÉRIO DE MARINES
Ninguém navega mais
Que este que aqui jáz,
Ninguém conhece maior
porto
Que este em que jaz posto,
Ninguém tem menos razão
Que quem serviu como cão,
Ninguém marchou mais largo
Que quem legou-se ao diabo,
Ninguém requer mais olvido
Que quem humilha um
oprimido.
Antonio Cabral Filho – RJ