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1. Ser e não ser
ilustrador
em Portugal
O mercado do livro infantil expandiu-se.
Há mais e melhores títulos e novas editoras.
Mas os ilustradores portugueses ainda são
também professores, designers, pintores.
Uma exposição que percorre a Europa mostra
o trabalho de 13 autores. Texto de Rita Pimenta
José Miguel Ribeiro
2. CHAPEUZINHO AMARELO, EDIÇÕES QUASI
A
João Vaz de Carvalho
André Letria: “Nem
para o autor das imagens. Ou seja, se a editora
oferta do livro ilus-
prevê 12 por cento do preço de capa para os
trado aumentou
todos os escritores
autores, seis por cento serão para o escritor e
nos últimos dez
aceitam partilhar
seis por cento para o ilustrador. “Quando corre
a 15 anos, a quali-
bem, é assim.”
dade também. A
os direitos de autor
E quando não corre? “Há escritores que não
relação das edito-
com os ilustradores”
aceitam, mesmo se sabemos que alguns livros
ras com os ilustra-
não seriam o êxito que são sem as imagens. Aí
dores melhorou
a editora é que decide como pagar.” Mas André
bastante. Já há
Letria já não prescinde dos direitos de autor
contratos dignos,
que lhe são devidos, normalmente num inter-
devolução de originais e pagamento de direitos de
valo entre os quatro e os seis por cento.
autor — até na mesma proporção de quem assina
Duas vezes por ano há informações da Socie-
o texto (cinco a seis por cento do preço para cada
dade Portuguesa de Autores sobre as vendas
um). Isto se o escritor aceitar. O nome de quem
dos livros, “mas se eu fizer um livro para sair no
ilustra também já aparece na capa, mesmo se por
Natal deste ano, nem no Natal seguinte recebo
vezes em letra mais pequena.
Mas não é fácil ser ilustrador profissional em ainda o resto do dinheiro por aquele trabalho”.
Portugal. Do grupo de ilustradores que fazem Daí “a gestão difícil dos rendimentos”.
parte da exposição “Ilustrações.pt — Ilustração No momento em que falou à Pública tinha
Portuguesa Contemporânea para a Infância” acabado de receber uma proposta como “não
— actualmente na Feira Leer de León, Espanha recebia há algum tempo” e que ia recusar. Pre-
—, apenas André Letria é “só” ilustrador. Em tom texto para recordar como dantes, depois de
brincalhão, diz não ser “pobrezinho”, mas ter concluído o trabalho, “se afastava o ilustrador
de conviver com “uma gestão difícil”. do resto da vida do livro”. Era um pagamento
Vale-lhe a quantidade apreciável de títulos que único e, mesmo com reedições, o ilustrador
já tem no mercado e para os quais negociou nada mais recebia. Também houve tempos em
contratos que prevêem a atribuição de direitos que era difícil recuperar os originais.
de autor. E explica como estes se processam Dois trabalhos recentes permitiram-lhe algum
actualmente: há um pagamento “à cabeça”, fôlego financeiro: “As colecções de livros infantis
calculado sobre 30 por cento de uma tiragem para o ‘Expresso’ e para o ‘Sol’ facultaram-me
inicial de 3000 exemplares, o que pode signifi- um bom rendimento e, sobretudo, eu sabia o que
car “qualquer coisa como 500 ou 600 euros”. ia receber e quando”, realçando que a irregula-
Depois, aguarda-se a entrega de direitos de ridade de pagamentos é o principal problema.
autor sobre as vendas. O mais comum é haver Até porque as colaborações periódicas com os
uma divisão equitativa para o autor do texto e jornais diminuíram nos últimos tempos.
André Letria
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3. Alain Corbel
Alain Corbel: “Fiquei
“Não tenho ordenado”, mas esse aspecto do mercado do livro infanto-juvenil, as livrarias
também tem outro lado, que às vezes é positivo: privilegiam as novidades, por isso se um livro
nos EUA porque apesar
“De vez em quando sabe bem receber direitos não se vende num ano ou dois, nunca mais nin-
da fama em Portugal
de livros que já fiz há muito tempo, que corre- guém o vê”, diz Caetano, premiado em 1995 na
ram bem e continuam a vender.” E dá o exemplo Bienal de Ilustração de Bratislava e em 2001
nunca consegui
de dois trabalhos que assina com o seu pai, José com o Prémio Nacional de Ilustração.
Jorge Letria, e de que recebeu recentemente
pagar as facturas
“três mil e tal euros”: “Versos de Fazer Ó-Ó” Alain Corbel, bretão que escolheu ser também
no prazo certo”
(Prémio Nacional de Ilustração 1999) e “Lendas português e recebeu o Prémio Nacional de
do Mar” (1998), ambos da Terramar e com suces- Ilustração 2005, acabou por mudar-se para os
sivas reedições. Quando assim é, há uma mar- Estados Unidos da América, ainda que proviso-
gem para “apostar em projectos que rendem riamente. É de lá que nos envia, por correio elec-
menos em termos financeiros, mas são experi- trónico, a sua história: “Sim eu era ilustrador a
ências artisticamente mais interessantes”. tempo inteiro. Nunca fiz outra coisa em Portu-
Todos os outros ilustradores presentes na mos- gal (dei algumas horas de curso de ilustração no
tra acumulam essa actividade com a de desig- IADE, mas poucas). Quando recebi um convite
ners (casos de Madalena Matoso, Bernardo Car- para dar aulas durante um semestre nos EUA,
valho, Danuta Wojciechowska e Marta Torrão), não pensava ficar. Mas, depois de ter ganho um
com a de professores (Teresa Lima, Gémeo Luís concurso para ser professor a tempo inteiro, era
e José Manuel Saraiva), com a de pintura ( João difícil recuar e voltar para Lisboa. Ou seja, se
Vaz de Carvalho e Cristina Valadas) e, final- fiquei aqui, é precisamente porque, apesar de
mente, com a de cinema de animação ( José ter alguma fama em Portugal, nunca, economi-
Miguel Ribeiro). camente, consegui ultrapassar uma meta: ser
rico e pagar as facturas no prazo certo!”
Os progressos recentes no mercado editorial Assim sendo, Corbel divide-se entre as activi-
“não garantem, no entanto, a continuidade nos dades de professor, autor e ilustrador: “Isso
trabalhos”, diz João Caetano, que começou a quer dizer que, depois das aulas (três dias por
ilustrar livros escolares (1981) e só chegou aos semana), trabalho para mim. Também foi por
títulos infanto-juvenis em 1993. É professor de isso que fiquei nos Estados Unidos. Em Portu-
Educação Visual (8.º ano) e de História da Cul- gal trabalhava sete dias por semana, quase 365
tura e das Artes (11.º ano), mas gostava de ser dias por ano, sem nunca conseguir realmente
“só” ilustrador. “Apesar do dinamismo actual realizar os meus projectos, mesmo se tive
Bernardo Carvalho
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4. João Caetano
João Caetano: “Gostava
a sorte de publicar bons livros com bons da Ilustrarte, com o apoio da Direcção-Geral do
autores. Acabei por publicar só na Caminho, Livro e das Bibliotecas (DGLB). Durante o mês
de ser ‘só’ ilustrador,
porque gosto das condições e das pessoas e de Maio, esta mostra do trabalho de 13 ilustra-
mas não há garantia
porque tive alguns desgostos com outras edi- dores portugueses vai estar em León (Espanha)
toras portuguesas.” e seguirá depois para Paris. Aos comissários da
de continuidade
Tem mais dois anos de contrato com o Departa- mostra, Ju Godinho e Eduardo Filipe, chegaram
nos trabalhos”
mento de Ilustração do Maryland Institute Col- também pedidos para Roma, EUA e Japão.
lege of Art, mas gostava de se dedicar também A escolha, dizem por “e-mail”, foi difícil:
à banda desenhada: “Tenho como parceiros o “Critérios como qualidade e originalidade
Richard Câmara, ilustrador português que vive são subjectivos e difíceis de definir. Antes de
em Madrid, o John Hallinan (para uma história mais, é uma escolha pessoal, por isso assinada.
sobre Lisboa) e a Sue Kelly (para uma história Tivemos contudo em atenção alguns aspectos:
sobre São Tomé), dois jovens americanos. Além dado tratar-se de uma exposição também de
de projectos que desejo realizar sozinho.” livros, privilegiámos autores com obra publi-
Corbel não desiste, no entanto, de regressar: cada; a participação da DGLB como entidade
“Não sei muito bem o que fazer a seguir. Portu- promotora fez-nos ter em atenção autores dis-
gal é de certeza um lugar para voltar (mais do tinguidos com o Prémio Nacional de Ilustração;
que a Bretanha), mas se pudesse ia viver desde procurámos conseguir uma selecção em que
já em terras quentes onde também se fala por- estivessem presentes autores consagrados e
tuguês, na Guiné ou em São Tomé.” novas gerações e que apresentasse uma boa
variedade de linguagens estéticas, estilos e
A “Ilustrações.pt — Ilustração Portuguesa Con- técnicas.” a
temporânea para a Infância” (design de Rui
Mendonça) esteve em Bolonha na Feira Inter- As imagens foram retiradas do catálogo
Danuta Wojciechowska
nacional do Livro Infantil, numa organização de “Ilustrações.pt”
Aspecto geral
da exposição
em Bolonha
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