Comunicação apresentada na Faculdade São Luiz, Brusque-SC, em 22 de outubro de 2015.
Intuito de esclarecer a posição ética do filósofo medieval Tomás de Aquino sobre o aborto
2. Problemáticas éticas implicadas no problema
Teoria da hominização
Legislação medieval sobre o aborto
Posição de Tomás de Aquino sobre o aborto
SITUANDO O DEBATE
3. Debate atual centralizado no plano do início da vida;
Dificuldades de consenso sobre o estatuto do embrião e do
feto;
Diversas legislações ao redor do mundo sobre o mesmo tema;
Questões religiosas e ideológicas implicadas no debate;
Amplo debate sobre saúde pública e direitos da mulher na
atualidade;
Impregnação da doutrina da
procriação;
Falta de consenso
histórico.
PROBLEMÁTICAS ÉTICAS SOBRE O
ABORTO
4. Santo Agostinho, bispo de Hipona, escreve em seu
Enchiridion:
“A grande interrogação sobre a alma não se decide
apressadamente com juízos não discutidos e opiniões
imprudentes; de acordo com a lei, o aborto não é considerado
um homicídio, porque ainda não se pode dizer que exista uma
alma viva em um corpo que carece de sensação, uma vez que
ainda não se formou a carne e não está dotada de sentidos”;
Porém o aborto é pecado pois destrói a conexão entre o ato
sexual conjugal e a finalidade da procriação;
HOMINIZAÇÃO TARDIA E POSSIBILIDADE
DE ABORTO?
5. Santo Agostinho:
“Uma vez que este fato está estabelecida, então, em primeiro
lugar, vem a pergunta sobre fetos abortados, que são de fato
"nascidos" no ventre da mãe, mas nunca são para que eles
pudessem ser "renascido". Pois, se dizemos que há uma
ressurreição para eles, então podemos concordar que, pelo
menos, tanto é verdade dos fetos que estão totalmente
formados. Mas, em relação a fetos não desenvolvidos, que
não iria mais facilmente pensar que perecem, como sementes
que não germinaram?”
Distinção de 40 (homens) a 90 (mulheres) dias depois da
concepção para que o sêmen chegasse até o útero e formasse
um corpo para receber a alma (animação).
Aqui a distinção entre o feto inanimado e o feto animado.
Este último, caso fosse abortado constituiria sim um pecado
moral, pois priva o mesmo da futura graça do batismo.
HOMINIZAÇÃO TARDIA E POSSIBILIDADE
DE ABORTO?
6. Santo Tomás de Aquino também defende a teoria da
hominização tardia.
Para entender essa teoria no pensamento do Aquinate, é
necessário compreender sua antropologia e seu estudo sobre
a alma.
Alma como forma substancial única. Quanto mais elevada a
forma, tanto mais ser ela contém virtualmente em si.
Graus de diferenciação entre os animais e os seres humanos.
Tomás discorre longamente sobre esse tema em suas
Questões disputadas sobre a alma, q. XI), tratando da geração
das almas e da unidade das almas no caso do ser humano.
HOMINIZAÇÃO TARDIA E POSSIBILIDADE
DE ABORTO?
7. “(...) como ensina Aristóteles (II Sobre a Geração dos animais
3, 736b), existe primeiro o feto animal, depois o homem. Ora,
sendo animal e não homem, tem primeiro a alma sensitiva e
não a intelectiva. Não há dúvida alguma de que a alma
sensitiva procede da potência ativa do sêmen, como se dá nos
outros animais. Ora, tal alma sensitiva está em potência para
a intelectiva, como tal animal está em potência para ser
racional (...)” (Suma contra os gentios, Livro II, cap. 88, n. 2)
Artigo semelhante se encontra na Suma Teológica I, questão
118, artigo 2.
HOMINIZAÇÃO TARDIA E POSSIBILIDADE
DE ABORTO?
8. Decreto de Graciano (1140-1142);
Decretais do papa Gregório IX (1234);
Legislação sobre a vida (aborto, incesto, infanticídios, suicídio
e outros crimes correlatos sofreram severa proibição);
Em tese, aceitam a teoria da hominização tardia, porém, sem
permitir o aborto.
LEGISLAÇÃO MEDIEVAL SOBRE O
ABORTO
9. Concílio de Vienne, França (1311-1312), convocado pelo papa
Clemente V;
Pensamento de Tomás de Aquino relacionado sobre a
hominização tardia foi confirmado.
Aborto do feto animado proibido, não visto como homicídio,
mas um crime contra a concepção e o matrimônio.
LEGISLAÇÃO MEDIEVAL SOBRE O
ABORTO
10. Constituição Criminal de Carlos V, rei da França (1338-1380);
Aborto e infanticídio como crimes gravíssimos. O criminoso
deveria ser enterrado vivo ou afogado.
Primeiro registro de punição civil.
LEGISLAÇÃO MEDIEVAL SOBRE O
ABORTO
11. Frade Dominicano que se tornou arcebispo de Florença;
Escreveu um tratado de teologia moral intitulado Suma
Theologica Moralis;
Favorável ao aborto no início da gravidez com o intuito de
salvar a vida da mãe (STM III, título 7, cap.2);
Canonizado em 1523 pelo papa Adriano VI.
ANTONINO DE FLORENÇA (1389-1459)
12. Poucos escritos Tomás explicitamente cita o aborto:
Em De decem pracetis escreve da “(...) destruição da gravidez:
são matadas pois as crianças em corpo e alma.” (artigo 7)
Fala isso com relação aos que matam impedindo a vida de
graça (o Batismo)
Na Suma Teológica escreve: “Ao dito em segundo lugar que
aquele que bate em mulher grávida faz uma ação de coisa
ilícita. E com isso se é seguida de morte ou da mulher ou da
criança viva, não escapa de crime de homicídio, sobretudo
porque de tal batida segue imediatamente a morte.” (II-II, q.
64, a.8, ad 2)
TOMÁS DE AQUINO E O ABORTO
13. Em seu comentário às Sentenças de Pedro Lombardo, o Aquinate,
ele descreve uma situação de possível união entre um homem e
mulher somente por causa da incontinência.
“Os que (...) procuram o filtro amoroso da esterilidade não são os
cônjuges, mas os fornicadores. Este pecado, de qualquer modo,
seja grave, seja computado tanto entre os malefícios, quanto
contra a natureza, porque também esperam a fecundação do
animal; contudo é menor que o homicídio, porque ainda poderia
impedir de outro modo a concepção. Nem é para ser julgado
irregular, a não ser que procure o aborto já no parto. As
sementes e as demais coisas são formadas aos poucos. Daí
segue no terceiro dístico, d. 3. E depois que o ventre da mulher
crescer, não percam os filhos (...)” (continua)
TOMÁS DE AQUINO E O ABORTO
14. “(continuação) (...) De qualquer modo a mãe não seja usada
após a gravidez; contudo no prazer, como diz Avicena, seja
movida e aberta; e disso acontece o perigo do aborto; e daí
Jerônimo censura o acesso do homem à mulher grávida; não,
contudo sempre que seja pecado grave; a não ser que porventura
quando provavelmente se teme o perigo do aborto. Nem se deve
nele transformar em uso, o que é contra a natureza. O uso contra
a natureza do cônjuge é, quando negligencia o recipiente
depositado, ou negligencia o débito tanto instituído pela
natureza quanto pela situação, e no primeiro sempre é pecado
mortal, porque não pode suceder a prole, onde a total intenção
da natureza é frustrada; mas no sungo modo não sempre é
pecado moral, porque como dizem alguns, mas pode ser um
sinal de concupiscência moral; e também pode ser sem pecado,
quando a disposição do corpo não padece de outro modo (...)” (In
IV Sent, d. 31, q.2, a.3, exp.)
TOMÁS DE AQUINO E O ABORTO
15. Aborto na relação da ação justa ou injustiça: a ação designa a
atualização e o empenho da liberdade, fonte e determinação
da responsabilidade, em relação ao resultado ou efeito
produzido pelo agir. A ação visa o outro, assegurando ou
violando o que lhe é devido, praticando, portanto, a justiça ou
a injustiça. A ação é causadora de bem ou de mal a outrem
O aborto torna-se um ato ilícito pois há uma intenção ilícita
que o causa (intenção de matar, raiz da injustiça),pois há uma
orientação para o mal. Faz-se lembrar que a intenção é o
primeiro grau do ato humano (os demais, subsequentes, são o
conselho, o consentimento e a eleição).
Há também, citado na Suma Teológica (II-II, q. 64, a.6, arg.3)
TOMÁS DE AQUINO E O ABORTO
16. Aborto voluntário e aborto involuntário
“(...) se alguém sabe que está a golpear; sabe com o que
golpeia, ou seja, o instrumento; bem como a finalidade do
golpe. (...) para que um ato seja voluntário, que não se
execute por coerção, como, por exemplo, quando alguém
toma a mão de uma pessoa violentamente e, com esta,
golpeia outro” (Da Justiça, Livro XIII)
Questões elucidadas do ponto de vista da razão
Ignorância invencível para os casos onde não há
racionalidade? (Ex: traumas causados pelo estupro.
Argumento de Bernhard Häring)
PARA FINALIZAR: QUESTÕES EM ABERTO
PARA O DEBATE
17. AGOSTINHO. Enchiridion. Disponível em:
http://www.tertullian.org/fathers/augustine_enchiridion_02_trans.h
tm
AQUINO, Tomás. De decem pracetis. Disponível em
http://www.corpusthomisticum.org/cac.html
_______.Da Justiça. Campinas: Vide Editorial, 2012.
_______. Questões disputadas sobre a alma. São Paulo: Realizações,
2012.
_______. Scriptum super Sententiis. Disponível em:
http://www.corpusthomisticum.org/iopera.html
_______. Suma contra os gentios – Vol 1. Porto Alegre: Sulina, 1990.
_______. Summa Theologiae. Disponível em:
http://www.corpusthomisticum.org/iopera.html
BOEHNER, Philotheus e GILSON, Etienne. História da Filosofia Cristã.
8. ed. Petrópolis: Vozes, 2003.
JOSAPHAT, Carlos. Paradigma Teológico de Tomás de Aquino. São
Paulo: Paulus, 2012.
VILLEY, Michel. Questões de Tomás de Aquino sobre direito e
política. São Paulo: Martins Fontes,2014.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS