1. Vocacionado? Eu?
Em minhas viagens internas onde tento me encontrar, busco entender o sentido de
minha existência. Acredito que não sou o único. Afinal o que estamos fazendo aqui e
agora, ou, o que seremos e faremos no espaço de tempo que chamamos de futuro?
Admiro aqueles jovens decididos, que quando questionados sobre seu futuro não
titubeiam e de pronto, com brilhos nos olhos, respondem: “Serei isso, ou farei isso!”.
Mas cá pra nós poucos possuem essa audácia e essa certeza. Acredito que a maioria, e
há alguns anos me incluía nela, não consegue delinear seu ímpeto vocativo de maneira
tão clara e definida. A verdade é que o futuro não nos é confortável e, misturado a isso,
ainda temos a falta de propósitos.
Perdidos com a incerteza do futuro e uma vida desprovida de proposito muitos jovens se
perdem na estrutura capitalista, servindo de massa de produção e com isso deixam de
lado a subjetividade para alcançar o que as empresas, onde estão locados, exigem. Esses
são descaracterizados e sem rostos, tornam-se apenas mais um na busca pelo “sonho
americano”. Outros se perdem no consumismo, na busca pelo prazer a qualquer custo,
nas distorções de imagem, comportamento. Há ainda aqueles poucos, que se entregam a
militâncias ou se agregam alguma cultura vivendo um estilo de vida alternativo.
Independentemente da escolha que se faz, trará consigo o reflexo e consequências
profundas na vida e no modo como se enxerga a vida. É muito importante para todos
descobrirem suas vocações, mas para o jovem de hoje isso é crucial.
É na vocação que se encontra sentido na vida. A vocação válida a vida. Vocação, ou
chamado (aqui tratados como sinônimos), não se reduz a profissão, mas diz respeito
também ao chamado de Deus para cada um de nós e para o seu povo. Vocação é aquilo
que somos chamados a ser e a realizar, como pessoas, tanto coletiva como
individualmente1.
Em se tratando de vocação, é necessário falar de dois aspectos, o mandato cultural e
mandato missional. No mandato cultural lembramos de Adão e Eva em suas atribuições
em reger o Éden. Gillis resume o mandato cultural da seguinte forma:
A identidade de gênero, a sexualidade, o casamento, a família, a sociedade,
as nações, o cuidado com meio ambiente, o trabalho, a economia, a governança
política, a cultura e a espiritualidade estão contidos na benção-vocação
comunicadas por Deus à humanidade como um todo (Mandato Cultural) e que
permanece essencialmente inalterada desde as origens. Responder à
convocação divina e cumprir a agenda proposta pelo Criador como pessoas,
por meio do corpo, na história, nas interações uns comos outros e coma Terra
é encontrar o sentido básico para a existência humana, pessoal e coletiva.2
1 Disponível em: http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/355/vocacao-e-juventude, em 24/10/15.
2 Disponível em: http://ultimato.com.br/conteudo/viver-a-vocacao-valida-a-vida,em 24/10/15.
2. Max Weber em sua famosa obra “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”,
mostra um elemento teológico que transformou radicalmente a noção do trabalho, esse
foi o conceito de “vocação”. Até a Reforma vocação era limitada àqueles que se
dedicavam à vida monástica. O movimento da Reforma trouxe o entendimento que
vocação incluía todas as ocupações honestas, criando assim um novo sentido às
atividades tidas como seculares.
Lutero considerou o labor diário em um emprego secular como vocação
divina, assim trazendo o impulso religioso para dentro da sociedade. Calvino
foi mais longe ainda, ao afirmar que o cristão deve servir a Deus não apenas
“dentro” da sua vocação, num espírito um tanto passivo, mas “por meio” da
sua vocação, num espírito mais ativo e empreendedor. Em suma, a vocação
envolveria uma adequação entre indivíduos e seus trabalhos, conectando-nos
com o propósito mais elevado que podemos ter -- o serviço de Deus3
.
É bom salientar que o protestantismo ajudou no desenvolvimento positivo do
capitalismo, mas as mazelas criadas por este sistema são consequências do pecado e da
não aplicação integral do evangelho.
Encontrar o sentido em todos os âmbitos relacionais do homem é a maneira que
entendemos o mandato cultural. Há termo teológico que encontramos em Weber é o
conceito da glória de Deus na sociedade, transformar os aspectos da vida social como
um todo de modo que tudo que se faz torna-se meio de honrar a Deus. Sua profissão,
sua família, suas relações, seu modo de amar e fazer arte, antes visto como algo secular
e tolerado por Deus, reveste-se de um novo sentido, com o entendimento que pela graça
e misericórdia do Criador tudo que fazemos pode glorificar à Deus. O sofrimento
acontece quando escolhemos uma vida baseada nas pressões de mercado, ou na
ganancia desenfreada, ou, ainda, no desejo de acumulo de bens. Jesus foi certeiro ao
falar: “Que adianta ganhar o mundo inteiro e perder sua alma?”.
O mandato missional não altera a vocação cultural que o ser humano possui, porém dá
uma nova dimensão a vocação. Essa nova dimensão é o resgate e a reorganização da
criação corrompida. Nesse âmbito todos, nascidos de novo, são responsáveis por uma
faceta desse aspecto.
Todos os redimidos foram chamados por Deus e para Deus (Isaías 43.7). Somos
chamados não por homens ou instituições, mas por Deus e o nosso serviço também
estará direcionado à Ele. Dessa forma toda a igreja é chamada, convocado a salvação,
santidade, comunhão e missão. A nossa existência não é despropositada, sem nexo, sem
compromisso, sem valor.
Você nasceu em Cristo com o propósito de servi-lo sendo sal e luz
onde estiver. Assim, a evangelização, plantio de igrejas,
encorajamento dos crentes, serviço social e ensino da Palavranão são
responsabilidade de um grupo seleto de pastores e missionários, mas
3 Disponível em: http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/355/a-terceirizacao-total-e-a-visao-crista-
do-trabalho,em 24/10/15.
3. de toda a Igreja. Se você é discípulo de Cristo, já está convocado a
servi-lo com tudo o que você é e tudo o que você tem. Suas forças,
competência, oportunidades, emprego, inteligência, relacionamentos,
finanças e família.4
A vocação perpassa toda nossa caminhada. E é nessa caminhada que servimos a Deus.
Nossos relacionamentos são únicos. Nossos amigos, nossos familiares, por onde
andamos, isso somente nós poderemos fazer, e somente nós, tendo em vista nossa
vocação, iremos manifestar Deus e Seu reino nessa trilha.
Mas há ainda um chamado especifico, uma vocação especifica. São os dons que Cristo
distribuiu a igreja (Efésios 4.12). Através desses dons, presentes, que Sua igreja é
edificada. Dons específicos e que desenvolvem funções especificas. Aqueles que
recebem essa vocação, não recebem para se tornarem superiores aos demais, mas
justamente o contrario, servir.
O chamado será para exercício, para ser realizado, ele é funcional e não se limitará a um
lugar especifico. Afinal a vocação é dada a pessoas, e isso será exercido
independentemente onde elas estiverem inseridas. Isso vai contra a ideia de “para onde
Deus me chamou”. Na realidade Ele nos chamou para exercer nossos dons onde
estivermos. Vocação é o que fazemos e não onde iremos. O artesão não será artesão por
estar em local especifico. Ele é artesão. Os pastores serão pastores independentemente
onde estejam, são pastores. Os mestres ensinarão a palavra onde quer que estejam, são
mestres.
Quando você for chamado por Deus para um ministério não fique aflito qual local irá
exercê-lo, pode ser na praça do outro da sua casa, o Deus que te chamou te guiará para
que Sua vontade seja plenamente cumprida.
Lembre-se somente disso, todos somos chamados e vocacionados para fazer algo no
reino de Deus. Deus não nos chama para inutilidade ou uma vida sem propósitos.
Conheça mais a Ele, dedique sua vida ao reino, coloque seus talentos a serviço do Rei,
Ele te usará.
4 LINDÓRIO, Ronaldo; Vocacionados.Editora Betânia,2014,p9.