SlideShare une entreprise Scribd logo
1  sur  30
Memórias de um 
Sargento de Milícias 
Manuel Antônio de Almeida
“Todo grande autor rompe com algo e introduz uma 
novidade (...) o grande autor tem um papel didático: ele 
reorienta o vetor das condutas de gosto. A grande obra 
inaugura, cria sua ascendência e reinventa a literatura.” 
Ronaldo Costa Fernandes
Manuel Antônio de Almeida esteve perpetuamente 
deslocado na sociedade, porque em verdade era antes 
um desses homens que, por anacronismo da sorte, mais 
pertencem ao futuro do que ao presente, que os 
desconhece. 
Augusto Emílio Zaluar
Fatores limitadores dos sucesso: 
•A originalidade com relação ao romance romântico – 
ausência da atmosfera lírica. 
•A independência com relação à moda do 
sentimentalismo. 
•A linguagem coloquial, simples, direta, sem metáforas 
ou refinamentos estilísticos.
As Características 
• A ausência do maniqueísmo > falta de culpabilidade 
- favorecimento de arranjos, transgressões e favores. 
• A inovação do nacional > usos e costumes do povo 
do RJ no começo do século XIX. 
• A sociedade da época > uma classe que passa 
despercebida pela estética ufanista do romantismo.
As Características 
• Sociedade marginalizada e dividida por grupos. 
• As personagens são identificados pela profissão ou 
condição social. 
• O heroísmo é substituído pelo humor.
As Características 
O registro social antecipa o episódio 
“O major Vidigal era o rei absoluto, o árbitro supremo 
de tudo que dizia respeito a esse ramo de 
administração; era o juiz que julgava e distribuía a 
pena, e ao mesmo tempo o guarda que dava caça aos 
criminosos; nas causas da sua imensa alçada não havia 
testemunhas, nem provas, nem razões, nem processo; 
ele resumia tudo em si; (...)”
Realismo Estético 
Caracterizar a sociedade dentro de uma 
verossimilhança possível – entretenimento. 
X 
Realismo de Escola 
Suporte científico – o romance de tese – edificação dos 
leitores.
A Dúvida 
• Novela picaresca: o protagonista é o fio condutor da 
narrativa - aparece em todos os capítulos. 
• Memórias: Leonardo aparece em 30 dos 48 
capítulos. 
• Os fundamentos da novela picaresca: viagem, 
servidão e narrativa autobiográfica. 
• Obs: afirmar que as Memórias são um romance 
picaresco é uma classificação arbitrária.
Leonardo 
•O surgimento do anti-heroi, o malandro carioca. 
•Protegido pela maioria das mulheres na narrativa. 
•Não pratica nenhuma ação para se dar bem. 
•Fala pouco na narrativa > falam por ele.
As Personagens 
• A personagem tipo: características marcantes e 
peculiaridades comportamentais universalizadas. 
• As convenções sociais vão sendo ridicularizadas pelo 
“jeitinho”. 
• A caricatura das personagens masculinas: 
decadência dos valores morais.
As Personagens 
Femininas 
• A ruptura com a sociedade tradicional: a mulher 
rompe a relação – revela-se forte, decidida e 
insensível ao sentimento do companheiro. 
• Seria o uso da força uma forma de justificação do 
poder do macho e um meio de ocultar a fraqueza 
decorrente da perda?
Luisinha 
“Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, 
porém que, tendo perdido as graças de menina, 
ainda não tinha adquirido a beleza de moça: era alta, 
magra, pálida: andava com o queixo enterrado no 
peito, trazia as pálpebras sempre baixas, e olhava a 
furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo, 
cortado, dava-lhe apenas até o pescoço, e como 
andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, 
uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos, 
como uma viseira.
Vidinha 
"Era uma mulatinha de dezoito anos a vinte anos, de 
altura regular, ombros largos, peito alteado, cintura 
fina e pés pequeninos; tinha os olhos muitos pretos e 
muito vivos, os lábios grossos e úmidos, os dentes 
claríssimos, a fala era um pouco descansada, doce e 
afinada. “
• A personagem secundária se incorpora à 
galeria feminina da literatura. 
• Vidinha rouba o posto da protagonista: não é 
ridicularizada pelo autor. 
• A face oculta: a proximidade com a realidade. 
“A formidável namoradeira.”
Luisinha e Vidinha 
(par simétrico) 
 Luisinha - plano da ordem 
A mocinha burguesa - não há relação viável 
fora do casamento 
(herança, parentela, posição e deveres) 
 Vidinha - o plano da desordem 
O amor sem casamento nem deveres
O comportamento feminino 
•Fuga da tutela masculina. 
• Transgride as normas de conduta. 
impostas pela sociedade patriarcal. 
•Ausência do ambiente doméstico para 
realizar-se afetivamente.
Nunca mais Luisinha vira o ar da rua senão às 
furtadelas, pelas frestas da rótula: então 
chorava ela aquela liberdade de que gozava 
outrora; aqueles passeios e aquelas palestras à 
porta em noite de luar; aqueles domingos de 
missa na Sé, ao lado de sua tia com o seu 
rancho de crioulinhas atrás; as visitas que 
recebiam, e o Leonardo de quem tinha 
saudades, e tudo aquilo enfim a que não dava 
nesse tempo muito apreço, mas que agora lhe 
parecia tão belo e tão agradável.
Tendo-se casado com José Manuel para seguir 
a vontade de D. Maria, votava a seu marido 
uma enorme indiferença, que é talvez o pior de 
todos os ódios. Pois a vida de Luisinha, depois 
de casada, representava com fidelidade a vida 
do maior número das moças que então se 
casavam: era por isso que as Vidinhas não 
eram raras.
Leonardo e Luisinha 
(O Casamento) 
•Uma forma de legitimar os valores burgueses. 
•Conferir o final desejado pelos leitores. 
•Submeter Leonardo à lei e à tradição. 
Obs: somente Luisinha consuma o casamento
“Desde o dia em que Leonardo fizera a sua declaração 
amorosa, uma mudança notável se começou a operar 
em Luisinha, cada hora se tornava mais sensível à 
diferença tanto de físico como do seu moral. Seus 
contornos começavam a redondar-se; seus braços, até 
ali finos e sempre caídos, engrossavam-se e tornavam-se 
mais ágeis;
suas faces magras e pálidas, enchiam-se e tomavam 
essa cor que só sabe ter o rosto da mulher em certa 
época da vida; a cabeça, que trazia habitualmente 
baixa, erguia-se agora graciosamente; os olhos, até ali 
amortecidos, começavam a despedir lampejos 
brilhantes; falava, movia-se, agitava-se.”
O Antirromantismo de Luisinha: 
“Estavam presentes algumas pessoas da vizinhança, e 
uma delas disse baixinho à outra, vendo o pranto de 
Luizinha: __ Não são lágrimas de viúva... __ E não eram, 
nós já o dissemos: o mundo faz disso as mais das vezes 
um crime. E os antecedentes? Porventura ante seu 
coração fora José Manuel marido de Luizinha? Nunca o 
fora senão ante as conveniências; para as 
conveniências aquelas lágrimas bastavam.”
“(...)chegamos por nossas investigações à 
conclusão de que o verdadeiro amor, ou são todos 
ou é um só, e neste caso não é o primeiro, é o 
último. O último é que é o verdadeiro, porque é o 
único que não muda. As leitoras que não 
concordarem com esta doutrina convençam-me do 
contrário, se são disso capazes.”
“(...) as ‘Memórias de um sargento de milícias’ criam um 
universo que parece liberto do erro e do pecado. Um 
universo sem culpabilidade e mesmo sem repressão, a 
não ser a repressão que pesa o tempo todo por meio do 
Vidigal e cujo desfecho já vimos. (...) A esta curiosidade 
corresponde uma visão muito tolerante, quase amena. 
As pessoas fazem coisas que poderiam ser qualificadas 
como reprováveis, mas também fazem outras dignas de 
louvor, que as compensam. E como todos têm defeitos, 
ninguém merece censura.” 
(Antônio Cândido – Dialética da Malandragem)
“(...) a malandragem é uma variante do ‘jeitinho’ (...), 
constituindo-se como uma outra forma de navegação 
social. O malandro, portanto, seria um agente 
profissional do ‘jeitinho’ e da arte de sobreviver nas 
situações mais difíceis: aquelas nas quais ele está 
claramente fora ou longe da lei.” 
O que é o Brasil?, Roberto DaMatta
O Malandro – Chico Buarque 
O malandro na dureza 
Senta à mesa do café 
Bebe um gole de cachaça 
Acha graça e dá no pé 
O garçom no prejuízo 
Sem sorriso sem freguês 
De passagem pela caixa 
Dá uma baixa no português 
O galego acha estranho 
Que o seu ganho tá um horror 
Pega o lápis soma os canos 
Passa os danos pro distribuidor
Mas o frete vê que ao todo 
Há engodo nos papéis 
E pra cima do alambique 
Dá um trambique de cem mil réis 
O usineiro nessa luta 
Grita ponte que partiu 
Não é idiota trunca a nota 
Lesa o Banco do Brasil 
Nosso banco tá cotado 
No mercado exterior 
Então taxa a cachaça 
A um preço assustador
Mas os ianques com seus tanques 
Têm bem mais o que fazer 
E proíbem os soldados 
Aliados de beber 
A cachaça tá parada 
Rejeitada no barril 
O alambique tem chilique 
Contra o Banco do Brasil 
O usineiro faz barulho 
Com orgulho de produtor 
Mas a sua raiva cega 
Descarrega no carregador
Este chega pro galego 
Nega arrego cobra mais 
A cachaça tá de graça 
Mas o frete como é que faz? 
O galego tá apertado 
Pro seu lado não tá bom 
Então deixa congelada 
A mesada do garçom 
O garçom vê um malandro 
Sai gritando pega ladrão! 
E o malandro autuado 
É julgado e condenado culpado 
Pela situação

Contenu connexe

Tendances

Memórias de um Sargento de Milícias - Manuel Antônio de Almeida
Memórias de um Sargento de Milícias - Manuel Antônio de AlmeidaMemórias de um Sargento de Milícias - Manuel Antônio de Almeida
Memórias de um Sargento de Milícias - Manuel Antônio de Almeida
vestibular
 
MemóRia De Um Sargento De MilíCias Pps
MemóRia De Um Sargento De MilíCias PpsMemóRia De Um Sargento De MilíCias Pps
MemóRia De Um Sargento De MilíCias Pps
martinsramon
 
A cartomante machado de assis
A cartomante machado de assisA cartomante machado de assis
A cartomante machado de assis
Geyse Ortega
 

Tendances (20)

Memórias de um Sargento de Milícias
Memórias de um Sargento de MilíciasMemórias de um Sargento de Milícias
Memórias de um Sargento de Milícias
 
Memorias de Um Sargento de Milicias - 2°A 2014 EEPSGLB
Memorias de Um Sargento de Milicias - 2°A 2014 EEPSGLBMemorias de Um Sargento de Milicias - 2°A 2014 EEPSGLB
Memorias de Um Sargento de Milicias - 2°A 2014 EEPSGLB
 
Memórias de um Sargento de Milícias - Manuel Antônio de Almeida
Memórias de um Sargento de Milícias - Manuel Antônio de AlmeidaMemórias de um Sargento de Milícias - Manuel Antônio de Almeida
Memórias de um Sargento de Milícias - Manuel Antônio de Almeida
 
Memórias de um Sargento de Milícias 3ª B - 2011
Memórias de um Sargento de Milícias   3ª B - 2011Memórias de um Sargento de Milícias   3ª B - 2011
Memórias de um Sargento de Milícias 3ª B - 2011
 
Memórias de um sargento de milícias
Memórias de um sargento de milíciasMemórias de um sargento de milícias
Memórias de um sargento de milícias
 
Memorias de um sargento de milicias 3ºANO - ENSINO MÉDIO - 2013
Memorias de um sargento de milicias 3ºANO - ENSINO MÉDIO - 2013Memorias de um sargento de milicias 3ºANO - ENSINO MÉDIO - 2013
Memorias de um sargento de milicias 3ºANO - ENSINO MÉDIO - 2013
 
Memórias de um sargento de milícias - Fuvest
Memórias de um sargento de milícias - FuvestMemórias de um sargento de milícias - Fuvest
Memórias de um sargento de milícias - Fuvest
 
MemóRia De Um Sargento De MilíCias 2
MemóRia De Um Sargento De MilíCias 2MemóRia De Um Sargento De MilíCias 2
MemóRia De Um Sargento De MilíCias 2
 
Memórias de um sargento de milícias
Memórias de um sargento de milíciasMemórias de um sargento de milícias
Memórias de um sargento de milícias
 
Memórias de um Sargento de Milícias - 3ª A - 2013
Memórias de um Sargento de Milícias - 3ª A - 2013Memórias de um Sargento de Milícias - 3ª A - 2013
Memórias de um Sargento de Milícias - 3ª A - 2013
 
Memórias de um sargento de melícias - Características da obra
Memórias de um sargento de melícias - Características da obra Memórias de um sargento de melícias - Características da obra
Memórias de um sargento de melícias - Características da obra
 
A cartomante
A cartomanteA cartomante
A cartomante
 
Memórias de um sargento de milícias (Versão detalhada)
Memórias de um sargento de milícias (Versão detalhada)Memórias de um sargento de milícias (Versão detalhada)
Memórias de um sargento de milícias (Versão detalhada)
 
MemóRia De Um Sargento De MilíCias Pps
MemóRia De Um Sargento De MilíCias PpsMemóRia De Um Sargento De MilíCias Pps
MemóRia De Um Sargento De MilíCias Pps
 
A cartomante machado de assis
A cartomante machado de assisA cartomante machado de assis
A cartomante machado de assis
 
Trabalho sargento de milicias
Trabalho sargento de miliciasTrabalho sargento de milicias
Trabalho sargento de milicias
 
Prova sobre o conto A cartomante de Machado de Assis 2015
Prova sobre o conto A cartomante de Machado de Assis 2015Prova sobre o conto A cartomante de Machado de Assis 2015
Prova sobre o conto A cartomante de Machado de Assis 2015
 
Outros cantos
Outros cantosOutros cantos
Outros cantos
 
A cartomante
A cartomanteA cartomante
A cartomante
 
Analise do conto A Cartomante
Analise do conto A CartomanteAnalise do conto A Cartomante
Analise do conto A Cartomante
 

Similaire à Memórias de um sargento de milícias

C:\Fakepath\Romantismo – O EspaçO Urbano Na Prosa Portuguesa
C:\Fakepath\Romantismo – O EspaçO Urbano Na Prosa PortuguesaC:\Fakepath\Romantismo – O EspaçO Urbano Na Prosa Portuguesa
C:\Fakepath\Romantismo – O EspaçO Urbano Na Prosa Portuguesa
Eneida da Rosa
 
Angústia – Graciliano Ramos - Aspectos Estruturais.pdf
Angústia – Graciliano Ramos - Aspectos Estruturais.pdfAngústia – Graciliano Ramos - Aspectos Estruturais.pdf
Angústia – Graciliano Ramos - Aspectos Estruturais.pdf
MaiteFerreira4
 
Luciola 2a-2011-110621133715-phpapp01
Luciola 2a-2011-110621133715-phpapp01Luciola 2a-2011-110621133715-phpapp01
Luciola 2a-2011-110621133715-phpapp01
Melissa Macêdo
 
A Geração De 45 - Prof. Kelly Mendes - Literatura
A Geração De 45 - Prof. Kelly Mendes - LiteraturaA Geração De 45 - Prof. Kelly Mendes - Literatura
A Geração De 45 - Prof. Kelly Mendes - Literatura
Hadassa Castro
 
Memórias póstumas de Brás Cubas
Memórias póstumas de Brás CubasMemórias póstumas de Brás Cubas
Memórias póstumas de Brás Cubas
Octávio Da Matta
 
10 livros para se ler
10 livros para se ler10 livros para se ler
10 livros para se ler
David Souza
 

Similaire à Memórias de um sargento de milícias (20)

Lucíola 2ª A - 2011
Lucíola   2ª A - 2011Lucíola   2ª A - 2011
Lucíola 2ª A - 2011
 
C:\Fakepath\Romantismo – O EspaçO Urbano Na Prosa Portuguesa
C:\Fakepath\Romantismo – O EspaçO Urbano Na Prosa PortuguesaC:\Fakepath\Romantismo – O EspaçO Urbano Na Prosa Portuguesa
C:\Fakepath\Romantismo – O EspaçO Urbano Na Prosa Portuguesa
 
Angústia – Graciliano Ramos - Aspectos Estruturais.pdf
Angústia – Graciliano Ramos - Aspectos Estruturais.pdfAngústia – Graciliano Ramos - Aspectos Estruturais.pdf
Angústia – Graciliano Ramos - Aspectos Estruturais.pdf
 
Livros essenciais da literatura brasileira
Livros essenciais da literatura brasileiraLivros essenciais da literatura brasileira
Livros essenciais da literatura brasileira
 
Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida
Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de AlmeidaMemórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida
Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida
 
História e Literatura: Um diálogo Possível
História e Literatura: Um diálogo PossívelHistória e Literatura: Um diálogo Possível
História e Literatura: Um diálogo Possível
 
O romantismo na literatura brasileira
O romantismo na literatura brasileiraO romantismo na literatura brasileira
O romantismo na literatura brasileira
 
Luciola 2a-2011-110621133715-phpapp01
Luciola 2a-2011-110621133715-phpapp01Luciola 2a-2011-110621133715-phpapp01
Luciola 2a-2011-110621133715-phpapp01
 
A Geração De 45 - Prof. Kelly Mendes - Literatura
A Geração De 45 - Prof. Kelly Mendes - LiteraturaA Geração De 45 - Prof. Kelly Mendes - Literatura
A Geração De 45 - Prof. Kelly Mendes - Literatura
 
Memórias póstumas de Brás Cubas
Memórias póstumas de Brás CubasMemórias póstumas de Brás Cubas
Memórias póstumas de Brás Cubas
 
Romantismo - prosa
Romantismo - prosaRomantismo - prosa
Romantismo - prosa
 
Realismo (3)
Realismo (3)Realismo (3)
Realismo (3)
 
Lacos de-familia
Lacos de-familiaLacos de-familia
Lacos de-familia
 
Realismo
Realismo Realismo
Realismo
 
Viagens na minha terra
Viagens na minha terraViagens na minha terra
Viagens na minha terra
 
10 livros para se ler
10 livros para se ler10 livros para se ler
10 livros para se ler
 
Apresentação sobre José de Alencar
Apresentação sobre José de AlencarApresentação sobre José de Alencar
Apresentação sobre José de Alencar
 
As vítimas algozes
As vítimas algozesAs vítimas algozes
As vítimas algozes
 
Rachel de Queiroz - O Quinze
Rachel de Queiroz - O QuinzeRachel de Queiroz - O Quinze
Rachel de Queiroz - O Quinze
 
Sargento milícias
Sargento milíciasSargento milícias
Sargento milícias
 

Plus de Octávio Da Matta (11)

Til José de Alencar
Til José de AlencarTil José de Alencar
Til José de Alencar
 
O romantismo
O romantismoO romantismo
O romantismo
 
Barroco
BarrocoBarroco
Barroco
 
O arcadismo
O arcadismoO arcadismo
O arcadismo
 
Pré modernismo e Vanguardas Europeias
Pré modernismo e Vanguardas EuropeiasPré modernismo e Vanguardas Europeias
Pré modernismo e Vanguardas Europeias
 
Pré modernismo e vanguardas europeias
Pré modernismo e vanguardas europeiasPré modernismo e vanguardas europeias
Pré modernismo e vanguardas europeias
 
Vidas secas final
Vidas secas   finalVidas secas   final
Vidas secas final
 
Til josé de alencar
Til josé de alencarTil josé de alencar
Til josé de alencar
 
O cortiço
O cortiçoO cortiço
O cortiço
 
A cidade e as serras anglo sj final 2
A cidade e as serras   anglo  sj final 2A cidade e as serras   anglo  sj final 2
A cidade e as serras anglo sj final 2
 
2a fase modernista - Capitães da Areia
2a fase modernista  - Capitães da Areia2a fase modernista  - Capitães da Areia
2a fase modernista - Capitães da Areia
 

Memórias de um sargento de milícias

  • 1. Memórias de um Sargento de Milícias Manuel Antônio de Almeida
  • 2. “Todo grande autor rompe com algo e introduz uma novidade (...) o grande autor tem um papel didático: ele reorienta o vetor das condutas de gosto. A grande obra inaugura, cria sua ascendência e reinventa a literatura.” Ronaldo Costa Fernandes
  • 3. Manuel Antônio de Almeida esteve perpetuamente deslocado na sociedade, porque em verdade era antes um desses homens que, por anacronismo da sorte, mais pertencem ao futuro do que ao presente, que os desconhece. Augusto Emílio Zaluar
  • 4. Fatores limitadores dos sucesso: •A originalidade com relação ao romance romântico – ausência da atmosfera lírica. •A independência com relação à moda do sentimentalismo. •A linguagem coloquial, simples, direta, sem metáforas ou refinamentos estilísticos.
  • 5. As Características • A ausência do maniqueísmo > falta de culpabilidade - favorecimento de arranjos, transgressões e favores. • A inovação do nacional > usos e costumes do povo do RJ no começo do século XIX. • A sociedade da época > uma classe que passa despercebida pela estética ufanista do romantismo.
  • 6. As Características • Sociedade marginalizada e dividida por grupos. • As personagens são identificados pela profissão ou condição social. • O heroísmo é substituído pelo humor.
  • 7. As Características O registro social antecipa o episódio “O major Vidigal era o rei absoluto, o árbitro supremo de tudo que dizia respeito a esse ramo de administração; era o juiz que julgava e distribuía a pena, e ao mesmo tempo o guarda que dava caça aos criminosos; nas causas da sua imensa alçada não havia testemunhas, nem provas, nem razões, nem processo; ele resumia tudo em si; (...)”
  • 8. Realismo Estético Caracterizar a sociedade dentro de uma verossimilhança possível – entretenimento. X Realismo de Escola Suporte científico – o romance de tese – edificação dos leitores.
  • 9. A Dúvida • Novela picaresca: o protagonista é o fio condutor da narrativa - aparece em todos os capítulos. • Memórias: Leonardo aparece em 30 dos 48 capítulos. • Os fundamentos da novela picaresca: viagem, servidão e narrativa autobiográfica. • Obs: afirmar que as Memórias são um romance picaresco é uma classificação arbitrária.
  • 10. Leonardo •O surgimento do anti-heroi, o malandro carioca. •Protegido pela maioria das mulheres na narrativa. •Não pratica nenhuma ação para se dar bem. •Fala pouco na narrativa > falam por ele.
  • 11. As Personagens • A personagem tipo: características marcantes e peculiaridades comportamentais universalizadas. • As convenções sociais vão sendo ridicularizadas pelo “jeitinho”. • A caricatura das personagens masculinas: decadência dos valores morais.
  • 12. As Personagens Femininas • A ruptura com a sociedade tradicional: a mulher rompe a relação – revela-se forte, decidida e insensível ao sentimento do companheiro. • Seria o uso da força uma forma de justificação do poder do macho e um meio de ocultar a fraqueza decorrente da perda?
  • 13. Luisinha “Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, porém que, tendo perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça: era alta, magra, pálida: andava com o queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras sempre baixas, e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo, cortado, dava-lhe apenas até o pescoço, e como andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos, como uma viseira.
  • 14. Vidinha "Era uma mulatinha de dezoito anos a vinte anos, de altura regular, ombros largos, peito alteado, cintura fina e pés pequeninos; tinha os olhos muitos pretos e muito vivos, os lábios grossos e úmidos, os dentes claríssimos, a fala era um pouco descansada, doce e afinada. “
  • 15. • A personagem secundária se incorpora à galeria feminina da literatura. • Vidinha rouba o posto da protagonista: não é ridicularizada pelo autor. • A face oculta: a proximidade com a realidade. “A formidável namoradeira.”
  • 16. Luisinha e Vidinha (par simétrico)  Luisinha - plano da ordem A mocinha burguesa - não há relação viável fora do casamento (herança, parentela, posição e deveres)  Vidinha - o plano da desordem O amor sem casamento nem deveres
  • 17. O comportamento feminino •Fuga da tutela masculina. • Transgride as normas de conduta. impostas pela sociedade patriarcal. •Ausência do ambiente doméstico para realizar-se afetivamente.
  • 18. Nunca mais Luisinha vira o ar da rua senão às furtadelas, pelas frestas da rótula: então chorava ela aquela liberdade de que gozava outrora; aqueles passeios e aquelas palestras à porta em noite de luar; aqueles domingos de missa na Sé, ao lado de sua tia com o seu rancho de crioulinhas atrás; as visitas que recebiam, e o Leonardo de quem tinha saudades, e tudo aquilo enfim a que não dava nesse tempo muito apreço, mas que agora lhe parecia tão belo e tão agradável.
  • 19. Tendo-se casado com José Manuel para seguir a vontade de D. Maria, votava a seu marido uma enorme indiferença, que é talvez o pior de todos os ódios. Pois a vida de Luisinha, depois de casada, representava com fidelidade a vida do maior número das moças que então se casavam: era por isso que as Vidinhas não eram raras.
  • 20. Leonardo e Luisinha (O Casamento) •Uma forma de legitimar os valores burgueses. •Conferir o final desejado pelos leitores. •Submeter Leonardo à lei e à tradição. Obs: somente Luisinha consuma o casamento
  • 21. “Desde o dia em que Leonardo fizera a sua declaração amorosa, uma mudança notável se começou a operar em Luisinha, cada hora se tornava mais sensível à diferença tanto de físico como do seu moral. Seus contornos começavam a redondar-se; seus braços, até ali finos e sempre caídos, engrossavam-se e tornavam-se mais ágeis;
  • 22. suas faces magras e pálidas, enchiam-se e tomavam essa cor que só sabe ter o rosto da mulher em certa época da vida; a cabeça, que trazia habitualmente baixa, erguia-se agora graciosamente; os olhos, até ali amortecidos, começavam a despedir lampejos brilhantes; falava, movia-se, agitava-se.”
  • 23. O Antirromantismo de Luisinha: “Estavam presentes algumas pessoas da vizinhança, e uma delas disse baixinho à outra, vendo o pranto de Luizinha: __ Não são lágrimas de viúva... __ E não eram, nós já o dissemos: o mundo faz disso as mais das vezes um crime. E os antecedentes? Porventura ante seu coração fora José Manuel marido de Luizinha? Nunca o fora senão ante as conveniências; para as conveniências aquelas lágrimas bastavam.”
  • 24. “(...)chegamos por nossas investigações à conclusão de que o verdadeiro amor, ou são todos ou é um só, e neste caso não é o primeiro, é o último. O último é que é o verdadeiro, porque é o único que não muda. As leitoras que não concordarem com esta doutrina convençam-me do contrário, se são disso capazes.”
  • 25. “(...) as ‘Memórias de um sargento de milícias’ criam um universo que parece liberto do erro e do pecado. Um universo sem culpabilidade e mesmo sem repressão, a não ser a repressão que pesa o tempo todo por meio do Vidigal e cujo desfecho já vimos. (...) A esta curiosidade corresponde uma visão muito tolerante, quase amena. As pessoas fazem coisas que poderiam ser qualificadas como reprováveis, mas também fazem outras dignas de louvor, que as compensam. E como todos têm defeitos, ninguém merece censura.” (Antônio Cândido – Dialética da Malandragem)
  • 26. “(...) a malandragem é uma variante do ‘jeitinho’ (...), constituindo-se como uma outra forma de navegação social. O malandro, portanto, seria um agente profissional do ‘jeitinho’ e da arte de sobreviver nas situações mais difíceis: aquelas nas quais ele está claramente fora ou longe da lei.” O que é o Brasil?, Roberto DaMatta
  • 27. O Malandro – Chico Buarque O malandro na dureza Senta à mesa do café Bebe um gole de cachaça Acha graça e dá no pé O garçom no prejuízo Sem sorriso sem freguês De passagem pela caixa Dá uma baixa no português O galego acha estranho Que o seu ganho tá um horror Pega o lápis soma os canos Passa os danos pro distribuidor
  • 28. Mas o frete vê que ao todo Há engodo nos papéis E pra cima do alambique Dá um trambique de cem mil réis O usineiro nessa luta Grita ponte que partiu Não é idiota trunca a nota Lesa o Banco do Brasil Nosso banco tá cotado No mercado exterior Então taxa a cachaça A um preço assustador
  • 29. Mas os ianques com seus tanques Têm bem mais o que fazer E proíbem os soldados Aliados de beber A cachaça tá parada Rejeitada no barril O alambique tem chilique Contra o Banco do Brasil O usineiro faz barulho Com orgulho de produtor Mas a sua raiva cega Descarrega no carregador
  • 30. Este chega pro galego Nega arrego cobra mais A cachaça tá de graça Mas o frete como é que faz? O galego tá apertado Pro seu lado não tá bom Então deixa congelada A mesada do garçom O garçom vê um malandro Sai gritando pega ladrão! E o malandro autuado É julgado e condenado culpado Pela situação

Notes de l'éditeur

  1. Os caminhos da mulher na época: tornar-se prostituta ou submeter-se aos mandos do marido (casamento).