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ECONOMIA
E se a crise vergar Madrid e Roma? É o
fim do euro ou um novo começo?
04 Agosto 2011 | 00:01
Eva Gaspar - egaspar@negocios.pt
O fogo dos mercados já galgou os muros da "periferia". Ameaça agora Espanha e Itália.
E depois será a Bélgica e a Áustria. E depois?
Durante longos meses, a crise
da dívida foi vista, sobretudo em
Berlim, como o resultado dos
excessos de um pequeno grupo
de países que, à boleia do euro,
tem vivido – é facto – acima das
suas possibilidades. A causa
próxima da crise – juros altos –
seria, portanto, a fonte da cura.
Mas o fogo dos mercados já
galgou os muros da “periferia”.
Ameaça agora Espanha e Itália.
E depois será a Bélgica? E depois
a Áustria. E depois?
Na semana em que os Estados
Unidos chegaram “in extremis” a
um acordo para evitar entrar em
incumprimento, os mercados
parecem ter-se “vingando-se” na
Europa.
Indiferentes às decisões tomadas há apenas duas semanas, no sentido de quase duplicar a ajuda à Grécia
e de reforçar os mecanismos de estabilidade financeira no seio da Zona Euro precisamente para travar os
riscos de contágio, as taxas de juro da dívida espanhola e italiana voltaram a disparar para níveis
alarmantes.
Muitos analistas consideram agora que, com juros a caminho dos 6,5% (lembram-se dos 7% temidos por
Teixeira dos Santos?) e “spreads” a roçar os 400 pontos-base face aos pagos pela Alemanha, Espanha e
Itália tenham ultrapassaram o ponto de não-retorno: A Europa estará a começar a ver nas capitais de dois
“pesos-pesados” do euro o mesmo filme que, neste último ano, passou por Atenas, Dublin e Lisboa.
"Mea-culpa"
Durão Barroso não tem poupado nas palavras. Diz estar “profundamente preocupado” com a escalada dos
juros que considera “completamente injustificada” à luz da situação financeira e económica dos dois países.
Mas passou a repartir publicamente as culpas com os Governos do euro, que têm respondido a conta-gotas
a uma crise que só muito recentemente admitiram ser “sistémica”.
“As tensões nos mercados obrigacionistas reflectem uma preocupação crescente entre os investidores
sobre a capacidade de a Zona Euro, como um todo, responder a uma crise em evolução”.
Neste momento, afirma sem rodeios, “é evidente que não estamos mais a gerir uma crise limitada à
periferia da Zona Euro”.
Uma explicação que choca com a tese longamente defendida pela Alemanha de que a desconfiança dos
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investidores se devia, e resumia, a um pequeno
grupo de países periféricos que, à boleia do euro,
tem vivido acima das suas possibilidades.
E agora?
Se as taxas persistirem em alta, Espanha e Itália
poderão não ter outra escolha senão também
recorrer a ajuda, apelando ao cada vez mais
reduzido conjunto de parceiros do euro que está
em condições de a dar: Alemanha, França,
Holanda, Áustria, Luxemburgo e Finlândia – o
clube que ainda dispõe de “rating” máximo, “AAA”.
Até porque passa a fazer pouco sentido – ainda
que na estrita racionalidade económica – estes
países enfrentarem a voracidade do mercado
quando nas últimas emissões de dívida já tiveram
de prometer juros bem acima dos cerca de 3,5%
que Portugal, Grécia e Irlanda passarão a pagar
pelas próximas fatias dos empréstimos europeus.
Mais bocas, a mesma carteira
A última cimeira do euro flexibilizou o Fundo
Europeu de Estabilização Financeira (FEEF),
permitindo-lhe, por exemplo, ceder linhas de
crédito, a título preventivo e a juros razoáveis, aos
países que estejam a ser confrontados com preços
exorbitantes nos mercados para se financiarem.
Este pode ser um expediente que, numa primeira
fase, Espanha e Itália podem deitar mão.
Mas a flexibilização do FEEF –
que poderá também financiar a
recapitalização de bancos e, em
circunstâncias absolutamente
excepcionais desenhadas para a
Grécia, recomprar dívida no
mercado secundário –
permanece, de momento, no
domínio das intenções.
As alterações acordadas em 21
de Julho terão de ser ainda
aprovadas no seio da União
Europeia (Conselho de Ministros
e Parlamento) e pelos
parlamentos dos países do euro.
Possivelmente, só no Outono o processo estará concluído – e no pressuposto de que não haverá percalços,
designadamente em Helsínquia, onde o pedido de ajuda de Portugal esteve em risco de ficar atolado.
Depois há ainda o problema dos cifrões. O FEEF, que até agora só pode financiar programas de assistência
em parceria com o FMI, está prestes a ganhar mais três “braços”, mas o dinheiro que pode mobilizar
permaneceu inalterado – 440 mil milhões de euros –, tendo a Comissão Europeia já avisado que também
aqui é preciso reforçar rapidamente as munições europeias.
Miguel Frasquilho, deputado do PSD e ex-secretário de Estado das Finanças, escreveu esta semana no
Negócios um artigo em que põe o dedo precisamente nesta ferida: 440 mil milhões é “suficiente para
acudir a países como Grécia, Irlanda ou Portugal, que em conjunto representam menos de 6% do PIB da
Zona Euro e cujas necessidades de financiamento conjuntas até 2014 se situam abaixo de 400 mil
milhões”, mas não dá de todo para pôr a mão debaixo de uma Espanha ou de uma Itália.
Chegou a hora dos “eurobonds”?
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Os seus cálculos coincidem com os que têm sido divulgados por “think-tanks” europeus que há muito
reclamam que a dotação do FEEF seja triplicada e que, paralelamente, defendem que se caminhe
firmemente para um modelo de emissão conjunta, ainda que parcial, de dívida pública: as tão badaladas
obrigações europeias.
Numa primeira etapa, o próprio FEEF poderá dar rapidamente esse passo, caso seja autorizado a comprar
dívida no mercado primário, ou seja, concorrer com os privados no momento em que os Estados colocam
novas obrigações no mercado.
Paul De Grauwe, economista
belga e conselheiro regular da
Comissão Europeia, discorda.
Defende que é o Banco Central
Europeu (BCE), e não o FEEF,
que tem de passar a assumir a
responsabilidade de, na ausência
de alternativas, garantir liquidez
– não apenas aos bancos, mas
também aos Estados do euro.
Porquê? Porque “o FEEF nunca
terá a necessária credibilidade
para travar o contágio da crise
porque não pode imprimir
moeda”, escreveu no “Financial
Times”.
A grande vantagem das
obrigações europeias é que
harmonizaria o preço pago pelos
Estados do euro quando estes se financiam.
No imediato, travariam o risco de mais crises de liquidez e, no longo prazo, criariam condições de
financiamento mais equipáveis para países como Portugal ou Grécia que, de outro modo, se arriscam a ver
o seu estatuto de periféricos cristalizar-se indefinidamente. Só que esta harmonização tenderá a traduzir-
se, em contrapartida, em taxas de juro mais elevadas para países como a Alemanha. E é aqui que a “porca
torce o rabo”.
Ansgar Belke, director do departamento de análise do instituto DIW, calcula que esta transferência de
custos signifique que, anualmente, a Alemanha tenha de pagar mais 15 mil milhões de euros para se
financiar, por comparação com a situação actual, em que é – de longe – o país a quem os investidores
exigem menos juros.
“União de transferências”? Jamais!
Estas hipóteses e cálculos são,
no entanto, muito contestados
pelos adeptos das obrigações
europeias que alegam que a
criação deste novo produto
financeiro, num mercado menos
fragmentado e com os Estados
Unidos também mergulhados
numa forte crise, faria do euro
uma verdadeira moeda de
reserva – designadamente para
os países asiáticos e do Médio
Oriente, que estão a ser
forçados a reduzir a sua
exposição ao dólar.
No cenário ideal, obrigações
europeias trariam mais
investidores à Zona Euro e, logo,
taxas de juro mais baixas. Até
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mesmo para a Alemanha.
Dificilmente, porém, uma proposta desta natureza passaria por Berlim sem ser catalogada como um passo
de gigante para o “abismo” – léxico que, além Reno, significa por estes dias “União de transferências”, ou
seja, suportar dívidas de quem não soube viver à medida das suas possibilidades. Com eleições gerais
marcadas para 2013, será que Angela Merkel dará uma oportunidade às “eurobonds”?
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