1. 5 VERDADES E UM BÔNUS SOBRE O BOICOTE AOS POSTOS BR
Ok. Como diria Jack, vamos por parte. Há alguns dias circula pela internet um e-mail que convida os
leitores a boicotarem os Postos BR na esperança de que o valor da gasolina diminua. O e-mail é tão
cheio de absurdos que resisti ao máximo para não responder. Não adiantou. Então, amigos, não se
ofendam, mas vamos a algumas verdades:
Verdade #1: A gasolina no Paraguai realmente custa R$1,45. Os preços na Argentina, Chile e
Uruguai também. E não, em nenhum desses países há adição de álcool. Então pergunto, você se
mudaria para um desses países? Humm... acho que não.
Essa comparação é tão absurda que chega a ser risível. É impossível extrapolar dados econômicos
entre estados, imagina então, querido leitor, entre países. E, apesar do preço do combustível
depender de vários aspectos, mas vamos nos concentrar agora em apenas um: poder aquisitivo. A
forma mais fácil de calcular o poder aquisitivo de um país é utilizando o famoso Índice Big Mac. O
Índice Big Mac é uma série de cálculos feitos pelos economistas da The Economist, revista
americana respeitadíssima, e que aponta o valor do Big Mac em mais de 100 países.
Comparando Brasil e Argentina, como citado acima, o índice aponta que o custo de vida da
Argentina é 1.432 mais caro que no Brasil. Eu acho que é mais, devido à crise econômica que a
Argentina está mergulhada há décadas graças a políticas assistencialistas da década de 90 (ops, isso
lembra algo?). Mas, vamos voltar aos números. Seguindo essa lógica temos que o litro de
combustível na Argentina custa R$2,4344. Muito mais baixo que no Brasil, certo? Certo se este
valor fosse livre de impostos. Então vamos acrescentar 13% de CIDE, PIS/PASEP e COFINS e mais
27% de ICMS. Resultado: R$3,16472. Mais barato?
Segundo o economista José Eduardo Amato Balian, da BB Consult, o imposto é o componente de
maior valor no preço do combustível no Brasil. Pergunto: boicotar os Postos BR vai diminuir a taxa
de imposto?
Verdade #2: Segundo o e-mail, desde 2007 o Brasil é auto-suficiente em petróleo. Meia verdade.
Ou, como diria Albert Einstein, depende do ponto de vista do observador. Se olharmos pela
quantidade, o Brasil é, sim, auto-suficiente. Mas se olharmos pela qualidade, ainda somos
dependentes de petróleo importado. Como assim, Bial? Existem dois tipos básicos de petróleo, e
isso o governo não explica em suas propagandas: petróleo leve, destinado para extrair gasolina e
outros componentes nobres e o petróleo pesado, destinado para fazer asfalto e combustível de
máquina. Apenas 6% da nossa produção é de petróleo leve. Isso não significa que o Brasil é auto-
suficiente apenas em asfalto, significa que, para conseguir extrair gasolina de petróleo pesado, a
Petrobras precisa importar óleos nobres e misturar nas suas refinarias. Importar, leram?
E o pré-sal com isso? O pré-sal ainda é, note que escrevi “ainda”, um devaneio ufanista de um
governo desesperado para anunciar algo impactante. O pré-sal é, sim, a maior reserva de petróleo
do mundo. O pré-sal é, sim, brasileiro. Mas o petróleo do pré-sal está tão fundo no oceano que é
impossível de ser extraído. Como eu sei disso? Logo após o anúncio da descoberta do pré-sal, o ex-
presidente Itamar Franco recebeu uma carta (a carta está disponível no blog do senador Álvaro Dias
para simples conferência de quem duvidar) do ex Ministro de Minas e Energias onde dizia
exatamente isso: “(...) tenho que tirar o chapéu para a capacidade do Presidente Lula em criar
2. novidades sobre coisas antigas. Quando eu era o Ministro de Minas e Energia em seu Governo, a
Petrobras já sabia da existência destas reservas que iam de Santos a Santa Catarina. O problema é
que estão a mais de 2500 metros e, hoje, foi comprovado que se encontram a mais de 3200
metros. Qual era o problema? Em 1993 não havia (e nem há hoje), tecnologia para se chegar a essa
profundidade (...)”. Entenderam a dimensão da coisa? Não há no mundo tecnologia para extrair
petróleo do pré-sal. A Petrobrás já está investindo muito dinheiro em pesquisas e você sabe de
onde vem 18% desse dinheiro? Do valor que você paga na bomba!
Verdade #3: Busca desenfreada por lucros da nossa querida e estimada estatal brasileira me fez rir
de novo. Por lei, a Petrobras retém 28% do valor de bomba do litro de gasolina. Esse valor sofre
reajuste baseado no valor do barril de petróleo e ano passado caiu (!) 4,5% e é chamado de
“Realização Petrobras”. Suba ou caia, a Petrobrás continua lucrando a mesma coisa.
Verdade #4: O e-mail alega que se não mais comprarmos gasolina nos postos BR o preço irá baixar.
Que isto é Lei de Mercado e Concorrência. Vamos aos fatos: pela Lei Federal 9.478/97 (Lei do
Petróleo), a Petrobras é impedida de vender combustível diretamente para o consumidor. Ou seja,
todos os Postos BR são controlados por donos de postos autônomos. Ou seja novamente,
boicotando uma bandeira, no incrível devaneio que a ideia dê certo, quem vai pagar o pato serão
os donos de postos e seus funcionários. Muitos dos postos funcionam em locais alugados, e o
aluguel esta absurdamente alto; o valor da energia elétrica água é escandaloso; os salários e
encargos trabalhistas esfolam qualquer empresário; há necessidade constante de manutenção; há
o risco de assaltos e roubos, o que gera a necessidade de pagar um seguro, também muito caro. E
se o posto trabalha sob franquia, existe a cobrança de fee. Quem, então, será realmente
prejudicado? Provavelmente vai sobrar para o pobre funcionário. Lado mais fraco nessa guerra.
Forçar uma guerra de preços até seria divertido de ver, mas acho pouco provável que aconteça por
um motivo simples: a lei impede. Quando um estabelecimento baixa os seus preços além dos seus
custos entra em campo a Portaria número 70 de 12 de dezembro de 2002 e isso é chamado de
preço predatório. Será que o “economista brasileiro, muito criativo e com experiência em relações
de mercado” não sabia disso?
Verdade #5: Quanto maior a demanda, maior o preço. Esta é a principal verdade de todas.
Considerando isso como regra, certamente conseguiremos baixar os preços. Segundo a lógica
econômica, se há um aumento na demanda o preço sobe automaticamente para reequilibrar o
mercado a um nível de preços mais elevado. Nome disso? Inflação. É como se o mercado fizesse um
leilão para selecionar os consumidores mais aptos, financeiramente falando, em detrimento aos
com menos poder aquisitivo. Exemplo simples: se você é a única pessoa no mundo que faz o que
você faz, você continuaria cobrando o que cobra?
Mas por que essa verdade é a mais importante? Porque o contrário também é válido. Menor
demanda, menor preço. O problema do preço dos combustíveis não se resume a Petrobras ou aos
donos de postos, ele se estende até as nossas próprias casas e nos envolve sobremaneira, pois
somos um povo acostumado a reclamar, mas não fazemos nada de efetivo para mudar o quadro
que nos incomoda. Quando há uma campanha para compartilhar seu carro com um vizinho, por
exemplo, você adere a ela ou continua fazendo questão de ter a liberdade de ir e vir nos horários
que mais o convém? Quando você precisa ir até a padaria ou até o mercado, você vai a pé ou
3. mantém o vício de se locomover apenas com o seu carro? Você tem coragem de ir a algum lugar de
bicicleta?
A grande maioria dos brasileiros dá mais importância a um carro, a um celular e a um aparelho de
TV do que a casa própria. Este é o nosso problema. E o Governo – que não é burro – sobretaxa tudo
que é mais consumido.
Qual é a saída para fazer os preços baixarem?
O dia mundial sem carro é celebrado em todo o mundo dia 22 de setembro. Celebre-o uma vez por
semana. Sua economia inicial será de 13%. Convoque seus amigos e vizinhos a fazerem o mesmo e
logo estarão economizando muito mais, pois só com a diminuição da demanda teremos redução
dos preços. Neste particular o autor do e-mail que vem circulando tem razão.
De quebra, você ganhará uma cidade menos poluída e com menor risco de acidentes.
Autor: Rafael Zatti – rafael@ideias.me