1. Tópicos de Biologia-Matemática
Roberto André Kraenkel, IFT
http://www.ift.unesp.br/users/kraenkel
http://web.me.com/kraenkel/jornadas09
Aula IV
Instituto de Física Teórica
Julho de 2012
2. A aula de hoje
1 Densidade & Difusão
2 Reação e Difusão
3. O espaço
Até aqui, em todos os modelos que estudamos, assumimos
implicitamente que todos os indivíduos estão localizados numa dada
região do espaço.
Esta região não influi no desenvolvimento temporal da população .
A região é homogênea.
A população é "bem misturada".
NO ENTANTO...
Indivíduos se movem, e o espaço pode não ser homogêneo.
Muitos fatores podem torna-lo heterogêneo:
clima
solo
vegetação
composição
4. Densidade
Vamos começar a nos ocupar da distribuição de uma população no
espaço.
Não mais falaremos do número de indivíduos numa região.
Ao invés disto, consideraremos a densidade de indivíduos.
Ou seja: o número de indivíduos por unidade de espaço.
Usualmente, denotamos tal densidade por ρ(x, t). Como indicado, é uma
função do tempos e do espaço.
Em alguns contextos, ao invés de densidade utilizamos a palavra
concentração .
5. Difusão
Vamos supor que os indivíduos se movimentam de forma aleatória.
No fundo, pensamos que eles se movem como se fossem partículas de
um gás.
Olhando uma população que se movimenta assim de
uma escala de espaço muito maior que o do movimento dos indivíduos,
veremos um fenômeno macroscópico chamado de difusão .
Partículas num gas obedecem a lei de Fick.
Vamos assumir que os indivíduos de nossa população também obedecem.
M AS O QUE É A LEI DE F ICK ?
6. Fick
A lei de difusão fickiana nos diz que:
O fluxo de J de material ( que pode ser animais, células, etc) é
proporcional ao gradiente da densidade do material:
∂ρ ∂ρ
J = −D ρ ≡ −D( , )
∂x ∂y
Acima, consideramos o espaço bidimensional.
Para prosseguirmos de uma maneira simples, vamos considerá-lo
uni-dimensional:
∂ρ
J∼−
∂x
7. Conservação de Matéria
Vamos agora impor a seguinte lei de conservação :
A taxa de variação (no tempo) da quantidade de matéria numa região do
espaço é igual ao fluxo de material pelas fronteiras desta região.
ou seja ( em uma dimensão , sendo (x0 − x1 ) o tamanho da região):
∂ x1
ρ(x, t)dx = J(x0 , t) − J(x1 , t)
∂t x0
8. Conservação da matéria II
∂ x1
∂t x0
ρ(x, t)dx = J(x0 , t) − J(x1 , t)
Podemos escrever a equação anterior em forma diferencial:
Façamos x1 = x0 + ∆x.
Assim, para ∆x → 0:
R x1
x0
ρ(x, t)dx → ρ(x0 , t)∆x
“ ”
J(x1 , t) → J(x0 , t) + ∆x ∂J(x,t)
∂x
x=x0
De modo que: „ «
∂ρ ∂J(x, t)
∆x = −∆x
∂t ∂x
ou, por fim, pela lei de Fick:
∂ρ ∂J(x, t) ∂2ρ
=− =D 2
∂t ∂x ∂x
9. A equação de difusão
∂ρ 2
∂t
= D∂ ρ
∂x2
A equação acima é conhecida por equação de difusão .
Em duas dimensões teríamos:
∂ρ 2
=D ρ
∂t
2ρ ∂2ρ ∂2ρ
onde ≡ ∂x2
+ ∂y2
Trata-se da mesma equação que descreve a difusão do calor, se
interpretarmos ρ como a temperatura.
R ECORDEMOS RAPIDAMENTE ALGUNS FATOS SOBRE ESTA EQUAÇÃO
.
10. Equação de difusão
A equação de difusão é uma equação diferencial a derivadas parciais, uma EDP.
É linear, a coeficientes constantes.
Pode ser resolvida analiticamente.
Observação matemática
Para se falar em solução de uma equação diferencial, devemos precisar condições
suplementares.
No caso, da equação de difusão , devemos dar a condição inicial ρ(x, 0) além dos valores
de ρ(x, t) nos limites do intervalo de solução ou para x → ±∞.
Resolve-la analiticamente, quer dizer que podemos achar uma fórmula que nos liga
ρ(x, t) a ρ(x, 0).
Baixe um mini-curso sobre a equação do site do Caltech:
http://www.rpgroup.caltech.edu/ natsirt/aph162/diffusion.pdf
11. Gauss
A equação de difusão possui uma solução importante: uma função
gaussiana.
Em uma dimensão temos, para t > 0:
Q 2 /(4Dt)
ρ(x, t) = e−x
2(πDt)1/2
onde Q é uma constante.
É uma função gaussiana que vai "abrindo" com o tempo.
Corresponde a uma condição inicial concentrada em x = 0.
Vejamos graficamente.
14. Difusão:biologia
Vamos por alguma biologia nesta aula!
Vamos tentar dar um sentido biológico ao que encontramos até agora.
Suponha que no tempo t = 0 soltamos uma certa população de N
indivíduos em x = 0.
Depois de um certo tempo, queremos saber qual será a extenção ocupada
pela população .
Sejamos mais específicos: queremos saber a extenção da região que
contêm 95% da população .
15. Difusão:biologia
Sabendo a densidade uma população pode-se saber a população numa
certa região. Em 1D temos:
+L
População entre −L e L = NL = ρ(x, t)dx.
−L
Se inserirmos a função gaussiana para ρ(x, t), fizermos a integral ( e
usarmos uma tabela de √integrais), obteremos que 95% da população está
num raio de tamanho 2 2Dt.
Ou seja, o alcance da população cresce com o tempo, proporcional à t1/2 .
Ou, a uma velocidade proporcional à t−1/2 . Decrescente.
16. Difusão + Crescimento
No entanto, esta hipotética população é uma que não cresce....
O crescimento da população pode ser facilmente incorporado:
∂ρ ∂2ρ
= D 2 + aρ(x, t)
∂t ∂x
É ainda uma equação linear.
Mas evidentemente, como já aprendemos nas aulas anteriores, podemos introduzir
tambésm um termo afeito à competição intra-específica:
∂ρ ∂2ρ
= D 2 + aρ(x, t) − bρ2 (x, t)
∂t ∂x
17. Fisher-Kolmogorov
∂ρ 2
∂t
= D ∂ ρ + aρ(x, t) − bρ2 (x, t)
∂x2
A equação acima é a equação dita de
Fisher-Kolmogorov.
É a equação mais simples descrevendo a difusão ,
crescimento e auto-competição de uma espécie.
É não-linear.
Figure: Robert. A. Fisher
Faz parte de uma classe de equações ditas de
“reação -difusão ”.
Esta nomenclatura vem da química.
A sua generalização bi-dimensional é óbvia:
∂ρ 2
=D ρ + aρ − bρ2
∂t
Figure: Alexander N. Kolmogorov
18. Fisher-Kolmogorov
∂ρ 2
∂t
= D ∂ ρ + aρ(x, t) − bρ2 (x, t)
∂x2
Vamos agora voltar a nos ocupar da situação em que uma população é solta num ponto
(x = 0), e se espalha pelo espaço.
Mas agora, esta população obedece a equação de Fisher-Kolmogorov (e não mais, a
equação de difusão simples).
Não temos mais a mesma fórmula gaussiana para a solução .
Graficamente temos o seguinte:
19. Fisher-Kolmogorov
∂ρ 2
∂t
= D ∂ ρ + aρ(x, t) − bρ2 (x, t)
∂x2
A frente de onda da equação de Fisher-Kolmogorov move-se com velocidade constante
√
v = 2 aD.
Lembre-se: no caso da difusão simples, a velocidade decrescia com o tempo.
Isso nos permite comparações com observações de campo.
O que devemos observar é a velocidade de avanço de uma espécie.
20. Skellam
Note: a velocidade não depende de b.
Assim, na realidade a velocidade de propagação constante é um
fenômeno independente da saturação logística.Só foi introduzida para
evitarmos funções ilimitadas.
A equação
∂ρ ∂ 2ρ
=D + aρ(x, t)
∂t ∂x2
é dita equação de Skellam.
21. O exemplo clássico
O rato almiscarado
O rato almiscarado (muskrat), uma espécie nativa do continente
americano, foi introduzido na Europa.
Em 1905, cinco indivíduos foram introduzidos em Praga.
Hoje, existem milhões na Europa.
Na próxima transparência, a sua expansão ao redor de Praga nos 17
primeiros anos.
28. Skellam!
A partir das medidas, podemos fazer o gráfico da "frente de onda" em
função do tempo.
Ei-lo:
Uma reta. A velocidade é constante. Skellam dixit!.
30. Micro X macro
Da teoria do movimento browniano poderíamos estimar o coeficiente D
como sendo o deslocamento quadrático médio por unidade de tempo.
Podemos estimar a ordem de grandeza D a partir de considerações sobre
as escalas de espaço e tempo sobre os quais se move um indivíduo.
No mais das vezes, obteríamos valor de D errados. Grandes demais.
Por que?
31. Área de vida
Muitso animais têm área de vida.
A área de vida vem de diversos fatores: a necessidade buscar alimentos,
mas também " voltar para a toca".
Assim, o avanço difusivo é sempre mais lento
E então, o que faço com o termo difusivo na equação ?
F ICA F RIO.Está tudo bem com ele.
Considere-o como sendo um coeficiente fenomenológico.
32. Exemplo;:Hantavirus
Em 2000, uma nova espécie de Hantavirus foi descoberta, causando uma
síndrome respiratória grave em humanos.Isso no Panamá.
O hospedeiro é o Oligoryzomys fulvescens. Ei-lo:
Onde há o rato, há o hantavirus.
A doença se espalha seguindo o hospedeiro.
33. Hantavirus II
A difusão do hospedeiro é bem modelada por um termo difusivo.
Mas D é pequeno.
O Oligoryzomys fulvescens possui tocas e tem uma área de vida limitada.
Mas ele se difunde pela migração de ratos juvenis.
O evento é estatisticamente raro.
Mas induz uma difusão da espécie.
O coeficiente D em nossa equação é um resumo final deste processo de
movimento animal.
34. Além da terra firme
Podemos pensar em mudar algumas das hipóteses que estão subjacentes
a estes resultados clássicos
Desta forma, podemos descrever casos que não são bem descritos pelos
modelos anteriores.
Em particular, podemos:
considerar espécies interagentes;
considerar dinâmicas mais complexas para uma dada espécie;
modificar a hipótese de movimento browniano
35. Referências
J.D. Murray: Mathematical Biology I e II (Springer, 2002)
N.F. Britton: Essential Mathematical Biology ( Springer, 2003).
R.S. Stephen e C. Cosner: Spatial Ecology via Reaction-Diffusion
Equations (Wiley, 2003).
A. Okubo e S.A. Levin: Diffusion and Ecological Problems (Springer,
2001).
Obrigado pela atenção