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CAROL
      RECANTO DAS LETRAS
Acrósticos ( 03)
Amigos
Amigos
Multiplicam os sorrisos
Iluminam o caminho
Grandes mestres a ensinar
O valor do carinho e do amor
Sem amigos, a vida é como uma casa sem janelas...
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 11/12/2006
Código do texto: T315138

Doce melodia do mundo
DOce melodia do mundo
REstabelece a alma partida
MIlagre criativo do homem
FAz a pele arrepiar, o corpo estremecer
SOLta as amarras do ser
LÁgrimas rolam pelas cascatas do sonho
SInal divino da transformação, pela
DOce melodia do mundo...
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 03/04/2006
Código do texto: T133015

Poesia
Poesia, sensibilidade e emoção desenhada no papel
Obra-prima do homem, Deus da palavra
Expressando vida, forma mais pura da criação
Suaviza os corações dos homens apaixonados
Inspira paixões...
Abranda a vida

***

Sinônimo de poeta, para mim, é Mario Quintana. Foi este velhinho [na época em que o
conheci era um velhinho lindo, de cabelos brancos] que me fez amar com tanta força esta
arte. Quando era adolescente e me perguntavam quem era meu ídolo, respondia: Mário
Quintana [aposto como imaginaram a cara do meu interlocutor... em que banda ele toca?!
                                                                                          1
Hahahaha]. Era, sim, meu ídolo, e ainda é, pois foi ele quem me fez chorar pela primeira
vez ao ler uma poesia. Foi na morte dele que chorei, pela primeira vez, por alguém que não
conhecia pessoalmente, mas que, ao mesmo tempo, tanto conhecia de sua alma.
Por isso hoje, no dia da poesia, desejo homenagear este e todos os poetas que sonham,
amam, vivem e escrevem a vida. Continuem criando emoções e encantando o mundo com
sua arte! Muita sorte!
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 14/03/2006
Código do texto: T123021



CARTAS (02)
Perdão!
Perdão!
Por nunca ter acreditado em nada além da matéria...
Por ter ignorado os diversos avisos que os que me amam tentaram, em vão, me alertar.
Agora, encaro a verdade, da forma mais infeliz e triste possível, pois um sentimento de
impotëncia e destruição invadem meu ser. Tive oportunidade de melhorar tendências e
vícios numa encarnação cercada de afeto e amor, os quais, mesmo após meu desencarne,
presentes ainda se mostram, e as vibrações plasmam força e acalentam o medo e essa
frustração.
Hoje, percebo quão afortunada fui e sou. E peço perdão pela cegueira da alma, agradecendo
tanto amor e pedindo uma nova chance de burilamento da minha alma e coração.
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 17/12/2006
Código do texto: T321175

Carta de um pai
Meu filho,
Não vi te tornares homem!
Não vi teus primeiros passos, tuas primeiras palavras, teus primeiros machucados...
Não pude auxiliar com teus deveres na escola, tampouco pude estender meu ombro quando
a vida foi dura e amarga contigo.
Não pude expressar o meu amor e nem a vergonha de não ter tido coragem de assumir
minhas responsabilidades. Vergonha por não ter sido homem, ser humano, quando chegada
a hora de me posicionar... simplesmente parti.
Vergonha de não ter sido pai para ti. E o arrependimento mostrou-se a mim todos os dias da
minha existência, através de lágrimas e amargura.
Hoje, só o que peço, se é que algo me é permitido pedir, é o perdão.
Perdão! Por todas as vezes que faltei na tua vida, por todos os sentimentos que não pude
demonstrar e também por aqueles que não tive.
E quando, finalmente, puderes me perdoar, serás também melhor pessoa, e melhor pai.

Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 09/04/2006
Código do texto: T136098



                                                                                         2
Carta para meu eu do passado
Se você pudesse receber essa carta que lhe escrevo agora, provavelmente ela não existiria...
pois você teria vivido plenamente... deixo claro, porém, que não me arrependo do que fiz,
somente acho que poderia ter feito mais...

Aproveite melhor a sua infância, pois quando crescemos adquirimos, a cada dia, mais e
mais responsabilidades, o tempo parece que passa mais ligeiro, a cada dia você terá menos
lazer e prazer e muito mais trabalho e problemas. As pessoas não farão amizades tão
facilmente quanto as crianças. Será muito mais difícil explicar seus sentimentos e expô-
los... quase impossível... Irão taxá-la de idiota se você simplesmente quiser abraçar alguém.
Se quiser pedir algo emprestado, deverá dar uma explicação completa. E quando quiser dar
sua opinião, não poderá ser espontânea, deverá utilizar máscaras, pois o homem adulto não
está preparado para a verdade. A verdade lhe dói mais do que cortes, machucados. E não
fazer seus deveres implicará em muito mais do que castigos...

Aproveite mais a adolescência, pois rebeldia depois dos 18 não é mais admissível. Namorar
vai ficar mais difícil e trará conseqüências insuportáveis se você for intransigente...
Aproveite agora para gritar os seus direitos, pois quando virar adulta, haverá muita
burocracia, e você acabará tendo que apelar para o tribunal... Aproveite para telefonar para
seus amigos, pois quando eles também estiverem grandes como você, ninguém terá mais
tempo de falar e contar as novidades ao telefone, mal e mal deixarão uma mensagem
enviada por computador.

Saia mais, tenha mais amigos, mais namorados, não seja tão tímida – a timidez faz com que
você perca preciosas oportunidades de fazer amigos e conhecer pessoas que farão diferença
na sua vida. Leia mais livros, pois agora você não tem mais tanto tempo livre para eles, e
muitas vezes, saber sobre algum assunto faz falta pra você.

Não sonhe tanto com o futuro, viva mais o presente, pois um dia você irá lembrar quantas
coisas você poderia ter feito e não fez.

Viaje mais e curta mais os lugares por onde passa... Não fique com vergonha de você
mesma, pois é mais inteligente do que imagina e tem mais capacidade do que desejava ter...
um dia você olhará para trás e verá que sempre conseguiu tudo o que queria.

Pense melhor antes de tomar decisões e utilize mais a razão do que o coração.

Tenha mais voz ativa quando estiver num relacionamento, pois tem tendência a se anular...

É impossível voltar atrás, espero que tenha compreendido meus conselhos, faça mais por
você no presente... viva melhor e faça mais do que ter uma simples e ordinária vida.

Escrevo esta carta, para lembrar, que é sempre tempo de recomeçar...
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 05/04/2006
Código do texto: T134096



Contos ( 05)
                                                                                            3
O Cortejo
Sofia acordou feliz... conseguira pular da cama cedo, conforme programado em seu
“relógio mental”. Não era sempre que conseguia cumprir sua meta... sua vida era
definitivamente “toda torta”, como ela costumava definir, pois tinha uma vida com muitas
facetas, era mãe e pai, tinha um emprego em tempo integral em uma repartição pública,
fazia trabalhos extras para “engordar” o orçamento apertado, e ainda possuía uma mente
muito criativa, que não a deixava parada... fazia com que ela se consumisse criando...
escrevendo, principalmente. Por todos esses motivos, quase não dormia, ou dormia muito
pouco.

Mas hoje seu dia renderia muito, pois acordando no horário, conseguiria aproveitar seus
momentos mais preciosos, que eram os passados com sua filha, com seus amigos, ou
mesmo fazendo pequenas tarefas do dia, como tomar um banho ou sentir o vento bater em
seus cabelos. E o dia começou bem humorado, conforme o estado de espírito do primeiro
raio da manhã.

Após levar sua filha na escola, foi para a academia, e mal havia começado a andar na
esteira, viu passar um cortejo. “Alguém muito importante deve ter falecido”, pensou. Eram
carros muito bonitos, com flores e coroas muito caras e coloridas, podia ver que as pessoas
dentro dos carros estavam em trajes muito elegantes também.

A imaginação de Sofia iniciou uma nova exploração em seus sentidos... começando a
ponderar o sentido daquele cortejo... Qual seria o sentido de todas aquelas flores, de toda
aquela gente reunida... só pra dizer Adeus?

Imaginou o valor de cada coroa de flores, o valor também de cada presença ali, pois pelos
carros, poder-se-ia imaginar que eram pessoas muito, muito ocupadas, que provavelmente,
não tinham tempo de se reunir em uma ocasião “normal”.

E o que Sofia gostaria para seu próprio cortejo? Ela tinha ficado tão absorta em suas
elucubrações, que tinha se esquecido de que estava andando na esteira já fazia mais de meia
hora. O suor pingava em seu rosto, mas ela nem se detinha a esses meros “expectadores” de
seus pensamentos.

Nessa orgasmia mental em que se encontrava, perguntas e respostas vieram à sua mente:
“Qual é o objetivo em ter meus amigos velando meu corpo a noite inteira, se o que mais
quero é tê-los comigo durante minha vida, nas minhas horas de aflição, quando mais
preciso de um ombro para chorar, nas minhas horas de vitória, quando preciso de
companhia para celebrar, nos momentos de decepção, quando preciso de uma mão amiga e
de uma palavra de consolação, quando estiver perdida nos labirintos da vida ou
descaminhos, precisando de alguém que me puxe à realidade, quando estiver aflita, alguém
que me dê uma notícia, enfim... preciso de amigos para me velarem a vida!”

“Qual é o objetivo de ter meus amigos comprando coroas de flores com mensagens
bonitas? Quero que meus amigos me mandem mensagens por e-mail, por carta, no Natal,
na Páscoa, no meu Aniversário, ou mesmo um recado, só para dizer olá... para lembrarem-
me de que tenho amigos próximos, distantes, que mesmo que não estejam presentes no meu
dia-a-dia, estão pertos do meu coração. Presentes da minha alma. São relíquias. E ao invés
de comprarem coroas de flores, que se esvairão no cemitério, junto aos corpos mortos de
tantas idas vidas... plantem em seu jardim, ou num vaso bem à vista, uma flor bem colorida,
e todos os dias, ao vê-la ou regá-la, olhe bem pra ela e diga: Essa flor foi plantada pra
minha amiga Sofia... assim, ao mesmo tempo em que lembram de mim, é como se me
                                                                                              4
mandassem um beijo, no pensamento de um beija-flor.”

“Qual o objetivo de deixarem seus trabalhos para saírem em seus carros em um cortejo até
o meu enterro? Prefiro, ao invés disso... que ainda em vida, separem um tempo para me ver,
 visitar-me, ou mesmo combinarmos uma saída alegre, cheia de bate-papo e bebida, para
rirmos à vontade, contarmos causos de vida, piadas, falarmos de alheia vida... ou mesmo de
nossos problemas, passado e planos para o futuro... o que importa, é estarmos juntos. Pois
de que adianta, em meu funeral, olharem meu inerte corpo, já sem vida? Já não serei mais
eu, será pedaço de carne, osso e fluidos migrantes... minha alma lá já não mais estará,
portanto, meus amigos, aproveitem que cá neste mundo ainda estamos, e vamos nos reunir
em cortejo à vida!”

“E se um dia, eu vier a deixar este mundo, e numa cova qualquer de algum cemitério
estiver meu corpo inerte enterrado, e num dia comum ou especial vocês tiverem a intenção
de deixar-me um agrado... primeiro retornem aqui e leiam este recado: „Vá à livraria mais
próxima e compre um livro ao seu bem amado. Faça uma dedicatória, colocando nela toda
sua alma. Feche-a assim: Um dia, uma poeta escreveu que é preciso amar a vida. Não
escreveu nenhuma novidade. A única novidade é que ela colocou em prática o que dizia.
Poderás colocar um EU TE AMO também, caso o queiras, pois sempre é muito bom dizer
isso a quem amamos...‟”

Sofia sorriu, satisfeita. Estava pronto seu réquiem! Olhou para a esteira, havia andado uma
hora, sem ao menos perceber... uma poça de suor e de alívio em ver que sabia do que é feita
a vida ali resplandecia. Alongou-se, com o corpo em maresia.

Um verdadeiro poeta é aquele que vive sua própria poesia, pensou. E a partir daquele dia,
sempre que sabe da morte de alguém, conhecido ou desconhecido, compra um livro, e o
oferta a alguém que ama. Sempre que sente saudades de alguém que já se foi, telefona para
apaziguar a saudade de alguém que ainda está vivo. Pois, para Sofia, a vida é para ser
vivida no presente, aproveitando cada momento com as pessoas que ainda fazem parte da
nossa existência e dos que se foram, restam as lembranças dos momentos felizes, que os
mantêm eternos na memória.

Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 26/04/2007
Código do texto: T464480
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Muitas vidas
Marco ficou na ponta dos pés. Apesar de estar maior do que no mês anterior (sua mãe vive
dizendo que cresce feito batatinha...), não conseguia enxergar através da janelinha da porta.
Olhou pra trás, e, como não via ninguém, adentrou o quarto onde seu avô, já muito pálido
“pela falta de sol”, como explicava. Estava recostado, lendo.

Seu Savassi olhou por cima dos óculos, e foi como se o sol se abrisse num dia nublado...
seu sorriso expressou sua alegria ao ver seu neto tão amado. “Já é quase um homem”,
pensou.

O filho de sua única filha se aproximou e, como sempre fazia desde pequeno, beijou-lhe a
testa.

A conversa entre eles, apesar da tamanha diferença de idade, fluía. Sempre tinham muito a
                                                                                            5
dizer e contar um ao outro. Eram bons amigos. E dessa vez não foi diferente: Marco queria
saber como seu avô conhecia tantos lugares e sabia tantas coisas do mundo...

Foi então que seu Savassi contou-lhe que, durante muitos anos, vivera em países distantes,
conhecendo lugares surpreendentes e línguas e culturas maravilhosas...

Sua primeira paixão, a França. Contou-lhe sobre Paris, seu cafés, suas gente. Depois,
discorreu sobre o Egito, com suas pirâmides, seus monumentos e toda a história e os
mistérios contidos lá. Falou sobre a Inglaterra, a Índia, e muitos outros países com riqueza
de detalhes. Mencionou as comidas, os cheiros, as artes, a música, as enebriantes sensações.

Em sua imaginação, Marco fez uma rápida viagem, na qual visualizava cada ponto
turístico, imaginava as pessoas, os costumes, as diferentes línguas...

Estava admirado. Sabia que seu avô tinha muita cultura, mas também sabia da situação
financeira da família. Como seu avô poderia ter ido a tantos lugares? Conhecer tantas
línguas? Ter experimentado tantas comidas diferentes? E por que nunca lhe contara nada?
Nem vovó e mamãe! Por que nunca comentaram nada com ele?

Ele precisaria de muitas vidas para tudo isso, concluiu.

Vendo o questionamento no olhar de seu neto, Savassi pousou um olhar pensativo no
horizonte e, como se estivesse recordando bons momentos, disse-lhe:

- Venha cá, meu filho. Quero dar as passagens para que você possa também conhecer tantos
lugares. Está naquele canto. Vá até lá e pegue.

Marco não pode conter a ansiedade e correu ao local indicado pelo avô, chegando a uma
pilha de livros. Os títulos, os mais variados: “Conheça Paris”, “Viaje à Europa sem sair do
lugar”, “Mistérios do Taj Mahal”,...

Marco compreendeu. Virou-se para seu avô. Queria agradecer-lhe... mas este já havia
partido para sua última viagem...
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 17/05/2006
Código do texto: T157981

Um raio de sol
Nem sempre temos noção do significado das pequenas coisas da vida. Atos, palavras,
pensamentos que transformam o universo. Posturas ante situações que, se pensadas,
refletem mais do que gostaríamos de mostrar de nós mesmos...

A reflexão que se faz ao caminhar pode ser considerada uma das melhores terapias,
verdadeira meditação do dia-a-dia.

Ana passava pelas pessoas, pelos lugares, muitas vezes sem os notar, submersa em
pensamentos. Mas havia uma pessoa, que ela sempre notava. Um velho, mendigo, sentado
no chão, ao lado de sua cadeira de rodas. Tinha um olhar tranqüilo e um meio-riso
constante, os quais tornavam seu semblante um tanto curioso.

Duas vezes por semana atravessava aquela praça e, ao passar pelo velhinho, sorria. Dava
um daqueles seus sorrisos mais bonitos. E ia-se embora.
                                                                                              6
Podia chover, que lá estava ele, com a mesma expressão fagueira e amistosa. E, muitas
vezes, Ana sentia-se mal por não ter nada a oferecer ao tão sofrido senhor.

Certa vez, estava muito apressada e, como um temporal se anunciava, decidiu correr até seu
destino... porém, ao passar pela praça, notou a ausência de algo. Parou, olhou ao redor, e
notou que aquele bondoso e necessitado senhor não estava ali.

Deu de ombros, “deve ter ido se esconder da chuva”, continuou sua corrida.

Passou-se uma semana e a ausência dele a inquietava. Após vários dias úmidos e frios, Ana
avista-o de longe.

Desta vez, além do costumeiro sorriso Ana pergunta-lhe a razão do desaparecimento. Este a
responde com outro sorriso e depois completa: “Estava muito adoentado. Pneumonia.
Quase não agüentei desta vez. Mas eu tinha uma razão muito forte para melhorar e voltar
para cá”.

“E qual seria uma razão muito forte para alguém desejar voltar para as ruas, para
mendigar?!”, pensou Ana, atônita. E arriscou perguntar:

“E que razão foi essa?”

“Não poderia morrer sem nunca mais ver o teu sorriso”...

Os olhos de Ana encheram-se de lágrimas, e seu coração parecia que ia pular pela boca...
“Como um estranho poderia dar tanto valor ao seu sorriso? Como um homem,
aparentemente rude e ignorante, poderia ter tamanha sensibilidade?” Às vezes ela se achava
meio boba, pois sorria para todos, inclusive desconhecidos... adorava sorrir para as
crianças, pois estas, com a inclusão de alguns velhinhos, as únicas a rebaterem com outro.

Depois deste dia, Ana nunca mais o viu, mas a memória dele ainda vive em seu coração,
principalmente por ter-lhe mostrado o valor de pequenos gestos, como o sorriso, que pode
ser o único raio de sol na vida de um ser, que só quer ser humano...
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 28/04/2006
Código do texto: T146716

Ciranda da vida
Roberto acordou, sua cabeça doía. Olhou ao redor, buscou o marcador do relógio. Deu um
salto! “Meu Deus! Perdi a hora!” Levantou-se, bufando, e entrou no chuveiro de pijamas
mesmo. Sabia que não podia demorar mais, tinha uma reunião importante.

Cinco minutos, terminou o banho. “Cadê minha toalha?” Chamou sua mulher. Nada. Gritou
pela toalha. O silêncio continuava. “Puta merda!” Foi buscar a toalha, batendo os pés e
esbravejando.

Passou pela cozinha antes de sair, queria tomar um café. Mas... “onde está Marianna? Cadê
o cheirinho gostoso de café que emanava pela casa todos os dias? E o pão quentinho recém
buscado da padaria?”

“Deixa pra lá... estou com pressa”.
                                                                                           7
No caminho pro trabalho, lembrou-se de sua vida quando pequeno. Morava no interior, não
tinha nada, não era nada. Resolveu tentar a vida na cidade grande. Foi quando conheceu
Marianna.

Ela apareceu-lhe primeiramente em sonhos. Depois, em carne e osso. Parecia uma visão
angelical... suave, serena, inteligente. Tudo o que sempre desejara em uma mulher. Perfeita.
Perguntava-se como poderia tê-lo amado à primeira vista... Mas amou. E era sua mulher.

Pensava nas artimanhas que criou para mantê-la junto dele. Lembrou-se de todas as vezes
que quis dizer-lhe que a amava, que ela era a mulher da sua vida, mas não sabia por quê
nunca conseguia. A palavra engasgava. Trancava-lhe a garganta.

Por causa disso, plasmou uma barreira em torno de si. Foi aí que começou a perdê-la... Mas
ele não sabia disso. Não queria saber.

Agora se perguntava por que estaria a pensar nisso. Logo hoje, que estava atrasado.
Precisava se concentrar. Afinal, tinha uma reunião importante.

Marianna não havia lhe deixado bilhete. “O silêncio dirá tudo, pois no silêncio, cabe tudo.
E nada”.

Quando voltou pra casa, transtornado pela reunião que não fora muito bem sucedida,
pensou nos braços de Marianna, naquele abraço que tirava toda sua inquietação, naquela
boca que beijava a sua como se fosse a primeira vez.

Mas Marianna não estava lá. Não havia cheiro de janta. Não havia seu perfume no ar.
Tampouco suas palavras de amor.

O chão continuava manchado da água do banho da manhã. As flores estavam meio
desmaiadas pelo calor e abafamento do apartamento. Marianna não estivera ali, constatou.
“Será que arrumou um amante”?, perguntou-se.

A noite chegava e ele, sem notícias. Telefonou para o celular dela, mas o aparelho estava
desligado. Ligou para amigos, nenhuma notícia. Encontrou o número de uma colega de
trabalho e teve que sentar para conseguir digerir a notícia: “Marianna pediu demissão
ontem pela manhã. Você não sabia?”

Roberto nem se despediu. Desligou o telefone e deixou-se ficar inerte, perdido em seus
pensamentos. Refez os últimos passos da esposa. Lembrou-se do abraço e do silêncio da
noite anterior.

“Marianna foi embora. Perdi seu amor, como ela havia me avisado.”

Por um momento, Roberto sentiu alívio. Não precisaria mais demonstrar força, poder. Não
precisaria mais procurar as fraquezas na mulher para diminuir sua auto-estima. Não
precisaria mais buscar motivos para mostrar-lhe que só ele poderia amá-la na vida.

Mas os dias se passaram, as roupas acumulavam no banheiro, estava definhando.

Porém, do que mais sentia falta era o perfume que Marianna deixava ao passar. Sua
inteligência e habilidade em resolver problemas. A forma como ficava brava, com um leve
tom róseo em suas bochechas. Sua indignação com a injustiça do mundo.

                                                                                              8
Não imaginava quão arrebatador era seu amor por aquela mulher.

Tentou buscar apoio nos amigos. Na boemia. Em outras mulheres. Nada preenchia o vazio
do seu ser.

Já havia perdido vinte quilos. Já havia perdido a noção de tempo. Via Marianna em todas as
mulheres, mas também não a via em nenhuma.

Entrou em desespero. Como continuaria a levar sua vida agora? Que detalhe havia perdido?
Como não havia percebido o que estava a acontecer?

Só Marianna sabia a resposta.

Deitou-se na cama. Aquela mesma cama onde ainda havia resquícios do cheiro de sua
amada. Aquela mesma cama onde dividiram, um dia, um amor incontido, inacabável,
insaciável. Esperaria, ali mesmo, a resposta.

Mas ela não veio...

Em seu enterro, somente o padre e seu cachorro.
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 27/04/2006
Código do texto: T146489

A Desiludida
Entrou correndo e se jogou no sofá. Já não podia mais agüentar tanta inquietação em seu
coração. “O que posso fazer?”, pensou. Sua mente estava um turbilhão. Não conseguia
mais manter a calma... prolongar a decisão não adiantaria mais. Ficou ali, inerte, olhando
para o nada.

Marianna tinha sonhos. Casou-se pensando que havia encontrado o amor de sua vida. Amar
era, para ela, a entrega total e irrestrita da vida, a divisão de sonhos, alimento da alma.

Desde pequena sonhara em construir uma família, ter filhos, envelhecer ao lado do homem
da sua vida... e agora, via todos seus sonhos desmoronarem e ela nada podia fazer para
evitar que acontecesse o inevitável.

Como algo tão bonito poderia ter se desgastado tanto? Em que ponto da vida conjugal
perderam o respeito mútuo?

Esperou que ele chegasse. Deu-lhe um longo abraço. “O último”, pensou. Roberto nem
olhou para ela, queria mesmo era se alimentar e dormir. “Porco nojento”. Havia dias em
que Beto só lhe dava atenção quando queria sexo, fazia rapidamente o que queria, virava
pro lado e dormia. Marianna se irritava. Já não era a mesma. Não se reconhecia como a
pessoa doce e suave que sempre fora.

Esperou Beto dormir. Pegou suas coisas que já estavam arrumadas em dois sacos de lixo,
junto à porta, deu uma última olhada para seu passado. Virou. Respirou fundo.

Quando chegou na portaria, viu que o porteiro dormia. “Que bom”, pensou. Não haverá
testemunhas. Quando pôs o pé para fora, sentiu um alívio tão grande... parecia que renascia.
                                                                                           9
O cheiro da noite adentrou suas narinas, como se fosse o primeiro sopro de vida.

Começou a andar apressada, como quem queria recuperar cada segundo de vida perdido.
Na rua, não havia viv‟alma. Apenas uns gatos passeavam sobre os telhados das velhas casas
desbotadas pelo tempo. Assim se sentia Marianna, desbotada. Descolorida. Sem vida. “Mas
isso vai mudar”, um sorriso apareceu em seus lábios. Apertou o passo.

Chegou na rodoviária. O próximo ônibus sairia em trinta minutos. “Pra quê escolher o
destino? O destino nos escolhe”. Comprou uma passagem, “na janela, para ver a
paisagem”. Entrou no ônibus, sem nem ao menos ler o destino daquele velho ônibus, que
mais parecia uma carroça velha. Na bagagem, roupas, alguns acessórios e muitos sonhos
trancafiados por anos a fio.

Apesar do excitamento, estava tão cansada que não conseguiu esperar que o ônibus pegasse
a estrada, caiu num sono profundo. Acordou com alguém cutucando seu ombro. “Ei, moça,
já chegamos!”

Atordoada, Marianna olha ao redor, esfrega os olhos que teimavam não fixar as imagens...
Nesse momento, um arrepio percorre cada milímetro do seu corpo.

“Mãe!”, grita.

“Como você sabia que eu chegaria? Peguei um ônibus qualquer, e...”

“Filha! Eu sabia que esse dia chegaria...”

“Mas, como?!?”

“Desde que fostes embora, venho todos os dias aqui, na esperança de te reencontrar. Já
ganhei o apelido de „a Desiludida‟, mas nunca perdi a vontade de esperá-la”.

Neste momento, Marianna descobriu que tudo o que precisava, era de um colo de mãe. Que
tudo o que uma pessoa precisa, para ser completa, é ser amada por sua família e ter sempre
pra onde retornar quando tudo dá errado na vida.
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 25/04/2006
Código do texto: T144775


Crônicas (02)
Quando me apaixonei...
Um dia, olhei-me no espelho. Há tempos evitava esta afronta ao meu ego. Da mesma forma
que passava bem distante da balança. Confrontar-se com o já conhecido era, para mim, uma
desnecessidade que só me faria mal. “Para que sofrer além do que já sofro?”, pensava.

Havia passado por tempos muitos turbulentos, um casamento que havia terminado de forma
muito catastrófica, com minha filha ainda de colo, problemas decorrentes da separação,
como falta de dinheiro, desamor e baixa auto-estima, solidão... e como “desgraça pouca é
bobagem”, perdi, ao mesmo tempo, os dois empregos que tinha. Resultado: entrei em
depressão. E para completar o vazio existencial... comi o mundo. Em pouquíssimo tempo,
podia-se comprovar na balança que apesar dos cento e vinte e seis quilogramas, a existência
                                                                                         10
de um ser não pode ser completado pela comida, por doces, massas e guloseimas, pois eu
continuava deprimida.

Foram várias as tentativas para perder peso, todas inúteis. Escondia-me atrás do problema.
Na verdade, era cômodo afogar minhas mágoas numa bacia de pipoca. Ao mesmo tempo,
não conseguia me controlar, era mais forte do que todo e qualquer esforço que fizesse.
Tinha nojo de mim. Sentia vergonha de comer na frente dos outros. Não me sentia feminina
ao devorar uma caixa inteira de bombons. Não sentia prazer em comer, pelo contrário,
comia por comer, até ver o pacote esvaziado, como que para resolver logo aquilo e pronto.
Não sabia comer uma fatia de um bolo, tinha que comê-lo inteiro.

Problemas físicos já começavam a aparecer. O pior deles é que já não conseguia controlar
minha bexiga por muito tempo. E eu tinha apenas 27 anos! Minhas pernas e pés doíam. Não
conseguia dormir, acordava sempre cansada. Ficar sentada era cansativo. Ficar em pé
também o era...

Saber dizer exatamente o dia em que este processo começou, não sei. O que posso relatar, é
que um dia, tomei a decisão de emagrecer e ficar saudável e pronto! Marquei um horário no
médico, fiz todas as avaliações e ele me disse que precisava perder, no mínimo, uns trinta
quilos. “Ah, tá bom...”, pensei. “Esta será apenas minha primeira meta”.

E comecei, a partir daí, como na paixão à primeira vista, a apaixonar-me por mim...
Comecei a valorizar cada pedaço de tempo que tenho para viver. A escutar mais música e
procurar vivenciar a poesia da letra. A observar mais o céu e suas nuvens ou suas estrelas.
A sorrir para crianças e velhos nas ruas, e observar a beleza da diferença entre as pessoas.
A prestar atenção na minha filha e nas lições de vida que diariamente ela me ensina. A
saber que problemas têm soluções, e foram feitos para nos tornar mais fortes. A saber que
as verdades dos outros nem sempre servem para mim, assim como as minhas nem sempre
servem para os outros, e que não adianta ficar brava se não acatarem minha vontade.
Aprendi que nasci para ser feliz, e que momentos de tristeza são importantes para sabermos
valorizar a alegria da vida, do sorriso. E que saudade também é importante, para
valorizarmos a presença, o companheirismo. Aprendi que amigos são a família que
escolhemos para nós e que se soubermos semear, sempre colheremos frutos maravilhosos
do jardim da amizade. Aprendi que existem mais pessoas que torcem por mim do que
imaginava... e também, que existem mais pessoas que esperam minha derrota do que
imaginava... por isso, preciso ser forte sempre, e saber dosar a ingenuidade da menina com
a sabedoria da mulher.

Um amigo disse-me, certa vez, referindo-se a um grande sucesso da atualidade: “você, com
certeza, utilizou „O Segredo‟ para emagrecer...”

“Com certeza foi isso mesmo”, respondi. Pois tudo o que queremos, está ao alcance de
nossas mãos, basta querer, com muita vontade, e o mundo conspirará para que você consiga
o que quer.

Hoje, com 60 kilos a menos, sou quase metade do que era, mas, com certeza, tenho o dobro
da capacidade de ser feliz do que tinha quando me apaixonei por mim...

E você? Já se apaixonou por si mesmo? O que está esperando?...
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 24/05/2007
Código do texto: T499846


                                                                                          11
Meu primeiro amor
Amar é uma aventura. E o amor aparece, como bem escreveu Mário Quintana, quando
menos se espera e de onde menos se imagina.
Foi assim que minha aventura começou, aos 13 anos, quando pela primeira vez me
APAIXONEI...
Ele era lindo, inteligente, sagaz. Perfeito.
Sim, perfeito. Porém, tão inexperiente quanto eu. Primeiro amor tem dessas coisas...
principalmente o meu, platônico.
E amor platônico, quem já amou sabe, nunca se concretiza.
E por não se concretizar, vive perfeito para sempre, pois nunca experimenta os limites e
frustrações de uma relação completa.
Quando o inesperado aconteceu [quem ama platonicamente nunca espera ser
correspondido], realizei o meu mais simples desejo, meu primeiro beijo. Estranho, à
primeira vista. Arrebatador e envolvente, como ondas ao alcançar as rochas.
Quando percebi que maravilhosa e surpreendentemente, conseguira conquistar meus
anseios de aprendiz de mulher, entrei em pânico, me descontrolei, e nesse momento, perdi,
deixei ir embora a pessoa que mais queria ao meu lado, meu ídolo, meu herói, meu amado.
E a pena que pago [e é perpétua]
É tê-lo para sempre e a todo momento
No meu coração, no meu pensamento.
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 13/03/2006
Código do texto: T122390

Duetos (10)
Sobre fadas e poetas (Dueto: Carol & Rui)
Sobre Fadas e Poetas
Quando pequena, sonhava ser fada,
Que desnudava o mundo concedendo desejos
Com sua varinha de condão

Hoje, sou poeta
Meu condão é minha pena
Que pelas linhas fabrica
Mundo de utopia e aspiração
Ou apenas traduz minh'alma
Translúcida e peneirada
Pela latitude zero
Entre a ponta da esfera
E a celulose e o jargão

Para muitos, enigmático e inexplicável
Este viver bifurcado entre
As leis e os versos
A razão e a emoção
A necessidade e a distração

No entanto,
Eu só sobrevivo
                                                                                       12
Porque faço do meu poetar
Verdadeiro ofício
A poesia do meu ser
É o que me faz, dia após dia
Renascer

CAROLINE SCHNEIDER

******************

Sim, Poetisa
Tua pena encanta
E nas linhas escritas
A aspiração d'alma trás
Bruta, linda, límpida cantata
E do centro de ti transpõe
Para humanos corações
Alma linda de Fada
Que a poetisa nos manda
Sempre presente, transparente
Compreensiva se bifurca
Entre nós elas atentamente
A todos atende e agrada
E e Seu tempo se sente contente
Renasce
Musa Imortal
E com tua poesias encanta
Do fundo de tua Alma
Todos a quem for dado ler
Sublimes linhas traçadas
Do Âmago de tão encantador
Ser

RUI VENTURA

Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 11/02/2008
Código do texto: T854490

Ritual da Marquesa (Dueto: Carol & Rui Ventura)
Venda-me os olhos
Para desvendar
Meus paraísos
Prazeres ocultos
Acobertados a sete véus
Do inculto

Loucura, inexatidão
Palavras não ditas
Malditas...
Sensações

                                                  13
Ata-me as mãos
Para suscitar
Desejos cálidos
Fulminantes anseio
De desamarrar-me
E sentir com o tato
O que sei saber com sabor
De desejosos lábios

Tapa-me a boca
Para abafar
Gemidos latentes
Ferventes
Arrepios gerados
Pela sinergia
de nossos corpos
ardentes

Incendeia-me
Inflama meu corpo
E minh'alma
Com o fogo de nossa paixão

Sou tua
Nua marquesa
Vem rematar
Esta parte de mim
Que crua
...
te espera

CAROLINE SCHNEIDER

********************

De Olhos vendados
Ao paraíso te levo
Dos Prazeres ocultos
De Marquesa a Rainha
Pelos véus te prendo
Acontece o indulto.

De sensação em sensação
Sem palavras encontrar
Bendita
É essa Paixão

Inspirada,
Maniatada.
Desejos Aflorados
Solta-te
Sente o contato
E Em devaneios

                             14
Entrega teus lábios
Experimenta do Amor o sabor

De Tua Boca
Gemidos ferventes
Abafo em torrentes
Arrepios gelados
Ao calor do Amor
Serão transformados
Pela sinergia
De corpos molhados

Incendiei-te
E de corpo ardendo
Tua Alma adentro
E ali o fogo da paixão fomento

Sim, és.
Nua Marquesa
De ti fiz Rainha
Nua Crua ardente

Sou teu, Serpente

RUI VENTURA
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 11/02/2008
Código do texto: T854483

Prenda-me (Dueto: Carol & Rui Ventura)
Prenda-me
Se for capaz
De seduzir
Meu lado lunar
Que em fases
Troca em metades
De negro pra branco
Meu sol que pulsa em
Lençóis e hiatos
Há ecos retumbando
Em faróis de meus eclipses
E em minhas crateras
Há fases nuas
Sem luz ou figuras
Onde me escondo
Entre nuvens escuras
Não me vês
Apenas sentes
O clamor alucinante
De meus olhos ardentes
Por isso,
Não me veneres
                                                15
Pois que sou reles
Lua com sintoma bipolar

CAROLINE SCHNEIDER
******************

Sim.
Soltando-A
Envolvendo-A
Em Teu Querer
Deixando que a Lua
Seja um começo
E as estrelas uma passagem
Para uma meta selvagem
Onde lençóis em desalinho
Te conduzem para o ninho
Onde o universo imenso
Te deixe em desalinho
Senhora de teu Querer
Onde luzes e figuras
Sombras são de teu Ser
E escondida estarás
Para quem não entender
Que a chama desse Olhar
Precisa de respeito, espaço e ar
Assim sim te venero
Pois de reles nada tens
És do universo o ser
Que como átomo tens
Bipolaridade Também.

RUI VENTURA
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 11/02/2008
Código do texto: T854476

Espero-te // Achei-te (Dueto: Caroline & Rui Ventura)
ESPERO-TE

Espero-te
Como se esperam sonhos bons
Na janela
Aspiro a cada virada de esquina
Encontrar na retina
Um calor que um dia
Já acalentou corpo meu
Mas minha espera é infinda
São incontáveis olhadas
Pra uma esquina maldita
Espera vã, esquisita
Se ao menos soubesse razões
Da ausência que silencia
                                                        16
Todos os acordes
De nossas músicas
[hoje esquecidas]
Poderia passar, quem sabe
Por ti, como quem passa
Por desconhecido
Mas tenho esse vício
De me entregar
Pra amargura
Não te perdôo
Nem mesmo quando
Não restar nem mesmo
Manchas das feridas
Que hoje inda gritam
Abertas, ardidas
Vertendo sangue
sangrando vida

CAROLINE SCHNEIDER

*********************

ACHEI-TE

Abençoada Janela
Às vezes vitral
Às vezes Virtual
Por onde sem mais nem porque
Uma alma do além ( mar)
Aparece não exatamente na esquina
Mas na melhor das horas na janelinha
Assim a espera infinda
Fica por uma linha
Que nada tenha de maldita
E que da esquisita, espera vã
As razões da ausência
De notas musicais não dedilhadas
Estejam finalmente se transformando
Em maravilhosas baladas.
Sim, poderias passar por mim,
Como se um desconhecido fosse
Não fossem os Curumins,
Seus Anjos e Afins
Fazerem com que as esquinas
Em retas curtas e lindas
Deixassem que nossas vidas
Ao calor e aconchego
Um ao outro envolvessem
Em suas teias Bem ditas
E delas levassem p'ra longe
Manchas, gritos,feridas
E o sangue sagrado da vida.
Deixe para sempre de verter

                                       17
E na sua real função
Demos graças por nos
AQUECER.

RUI VENTURA
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 28/01/2008
Código do texto: T836994

Tramas do Destino (Dueto: Carol & Rui Ventura)
Em tramas que me arrefecem
Compõem minha decomposição
Sorriem, debocham da minha anarquia
Relutam, sossegam e caem, por fim

Vislumbro um fio
Que me leva a outro lado
Uma sombra, um vazio
Que nem sei definir
Entre abismo de luz
E um vôo arriscado
Encontro o caminho
Mas me é sonegado saber
o destino do pouso

Leve-me, vento da madrugada
Brinque com meus cabelos
Deliciando a árdua jornada
Sussurre em minhas orelhas
Propostas que me deixem vermelha
E diga ao maroto destino
Que estou pronta, enfim...

CAROLINE SCHNEIDER

****************************

Tuas tramas que bem teces
Arrefecem, solidificam.
Ajudam-te no sorrir, encantam.
Fortalecem-se e seguem, por fim

Trama tecida
Caminho transposto
Da sombra ao colorido
Agora já bem definido
Faz do abismo a Luz
E do arriscado vôo
Faz do percorrido caminho
Uma nova e bela jornada
Com destino, pouso e morada.

                                                 18
Teus belos cabelos ao vento
As madrugadas enfeitam
Dando graça ao caminhar
E em teu ouvido sussurro
Propostas há tanto caladas
E por Você esperadas

Pois estás Pronta, enfim.

RUI VENTURA
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 28/01/2008
Código do texto: T836872

Vou aportar aqui (Dueto: Caroline & Rui Ventura)
Vou aportar aqui
Trazer meu coração
Pra esta ilha
Amor não é só desilusão
Bem sabes que te quero
Mais que a lua
Quer o sol
Quero sorrisos
Abraçar teu olhar
E amanhecer
Em sol bemol
Acordo sem tuas mãos
A me enlaçar
Teu sustenido
Faz-me sair em busca
Do teu aconchego
Quero ter tua presença
Todos os dias junto a mim
Mas há um eco
E tua música
Não chega a meus ouvidos

CAROLINE SCHNEIDER


Sim, Aporte,
Traga seu Coração
E com ele os que lhe aprouver
Desilusões, Amor supera.
Especialmente quando o Querer
Ultrapassa grandes dimensões
Nos compara ao Astro Rei
Alegria Meiguices Deslevos
E em teu olhar me envolver
Amanhecer em Sol sustenido
Um tom acima
Em teu corpo cingido
                                                   19
Acordo por tuas mãos envolvido
Onde com candura, Te desejo
Bom dia, meu dengo.
A minha presença é tua
Pois esse foi teu querer
E no eco de teus sonhos
Música leve e sem enfadonhos
Nos envolve de mansinho
Pois com jeito, e com carinho
Ao porto chegaste
e não é sonho.

RUI VENTURA
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 27/01/2008
Código do texto: T835201

Anjo sem fronteiras (Dueto: Caroline & Rui Ventura)
És como um sôpro
que de uma lufada em meio a temporais
de meus desencantos
fostes sem o saber
designado por uma Mão
a delicadamente preencher
lacunas do meu viver

não conheço teu olhar,
teu cheiro de mar
toque a acariciar
tampouco senti calor esvoaçante
de ser alado que se faz
presença constante

mas transporta-te
aqui, no além-mar
mesmo que desterrado
raízes são postas
no coração sonhador
que não respeita fronteiras
procurando respostas
na busca de amar

CAROLINE SCHNEIDER

De um sopro cheguei
E tal como um vendaval
Teus desencantos quero encantar
E sabendo ou não por qual Mão designado
Aqui devo encontrar e parar
E com carinho satisfazer
As Lacunas de teu Bel viver

                                                      20
Hoje conheço teu olhar
Teu cheiro de leves e variadas fragrâncias
O teu acariciar, meigo e manso como Olhar
E na continuidade conhecerás,
O Calor aconchegante.
E a real presença constante.

Do Além-mar aqui me transportei
Para conhecer Aquela a quem.
Fronteiras, a Vida impôs traiçoeira
E em seu coração sonhador.
Raízes profundas lançar
De um Ser que sim.
Sabe e quer Amar.

RUI VENTURA
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 25/01/2008
Código do texto: T831918

Dialética (Dueto: Caroline & Rui Ventura)
sou pedra que chora
sou vidro que estilhaça
meu sorriso canta,
enxugando lágrimas
nos cantos, poças
covas rasas de intenso pranto
mas inda há brilho no olhar...
mesmo que por vezes se apague
nos percalços do meu caminhar

intenso o frio por falta de afago
calor que arrefeça a alma
escrevo, calando grito
como que alimentando gemido
quero colo, quero afeto
mas faço-me discreto
e, friamente,
saio pela tangente
e se precisar, bato o martelo
...
pois mesmo quando sou fraco
faço-me forte
assim eu sou
nada morno, nada pouco
ou tudo ou nada
sou Tese
sou Antítese
e por fim, Síntese

CAROLINE SCHNEIDER

                                                21
Das pedras o choro seco
Aos Vidros trarei a vida
Ao sorriso farei eco
Às lágrimas a despedida
Às poças água Límpida
Ao Pranto levo o alento
Eterno brilho lhe devolvo
A esse Olhar sempre atento
Ao seu eterno caminhar

Com ternura o frio eu findo
Com Carinho aqueço a Alma
Escrevo, ouvindo o grito
Tirado do fundo d‟alma
Com afeto e colo te brindo
Embora sempre discreto
E Ternamente
Jamais te desencanto,
E Assim ao mundo grito
Quero a Musa deste canto

Da fraqueza a força faço
Forte sou, pois
Sou a pedra, sou o afago
E assim com você lado a lado
Nada morno atento e com cuidado
O calor a cola do “vidro”
Que veio para o seu lado
Tornar a vida colorida
Completa e emoldurada

RUI VENTURA
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 23/01/2008
Código do texto: T829417

Sopro do Mundo (Dueto: Caroline & Rui Ventura)
Um sopro do mundo
Transmutou
Minha tarde vazia
Trouxe folhas de lembranças doces
Que por instantes
Congelaram ciclo
Que torna cinzento
Dantes colorido quadro
De uma vida
Ainda sendo pintado

Agonizo ao ver cores
Perdendo matizes
Vendendo-se
                                                 22
Qual meretrizes
Pra uma palheta
De cinza e negritude
Onde sequer tons pastéis
Povoam a arte
Goticamente serenam-se
Pincéis sob a alma
E tecem amargura
Em pesado linho esticado em figura

Oh, Sopro do Mundo
Conceda-me
Nova aquarela

CAROLINE SCHNEIDER

Do Mundo o Sopro
Ao que tudo indica
Leve Tal Brisa
De algures veio morno
Aos poucos,
Ganha Graça e Colorido
E em tardes domingueiras
E entrando por noites quase inteiras
Cria, de alguma forma.
Sua Nova Aquarela
Embora não seja como Aquela
Deixa cores mais vivas
Mais maduras
Mais profundas
E tem como Finalidade
Fixá-las para a
Eternidade

RUI VENTURA
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 22/01/2008
Código do texto: T827840

Sonhos de Lata
Sonhos de lata
Tropeçados
Por sôfregos pés
Procurando caminhos
Que levem a novos
Destinos

Cacos de esperança
Estilhaçados
Por calejadas mãos
Tateando o tempo
Em busca de
                                                23
Recomeços

(Caroline Schneider)

Fantasias estanhadas
Esbarrando-se
Aos sofridos calos
Que trilham caminhos
À procura de novas
Aventuras

São pedaços de incerteza
Que se quebram
Por enrugadas mãos
Que apalpam seu destino
Na tentativa de achar
Uma nova saída

(Edson dos Santos)
Carol Schneider
Publicado no Recanto das Letras em 27/08/2007
Código do texto: T626347


E – Livros ( 05) Pasta
NADA É IMPOSSÍVEL PARA QUEM ACREDITA ( PPS)

BORBOLETRAS 2 ( PPS)
BORBOLETRAS 1 (PPS)


                             ARBITRAGEM INTERNACIONAL
INTRODUÇÃO
Com o advento da Lei nº 9.307, de 23.09.1996, o Brasil passou a possuir uma nova
lei sobre arbitragem, a qual alterou consideravelmente o regime jurídico da mesma
no País. Em particular, ao que concerne à arbitragem privada internacional, esta
legislação trouxe significativo impacto.
Estima-se que cerca de 90% dos contratos internacionais de comércio contêm uma
cláusula arbitral.1 Nesse terreno, as lides decorrentes das relações jurídicas são
decididas por atribuição a tribunais arbitrais e não aos estatais. Na arbitragem
privada às partes é autorizado constituírem um tribunal arbitral e indicarem o(s)
árbitro(s) que decidirá(ão) no lugar dos tribunais estatais as suas lides de direito
privado.
Pela arbitragem privada as partes resolvem submeter suas lides, resultantes de determinadas
relações jurídicas de direito privado, a um tribunal arbitral, composto por um árbitro único ou uma
maioria deles, designados, em princípio, pelas partes ou por uma entidade por elas indicada.
Mediante a instituição de um tribunal arbitral exclui-se a competência dos Juízes estatais para julgar
a mesma lide.2
As características inerentes à arbitragem privada são: (a) a ordem jurídica a
reconhece como meio de solução de litígios; (b) a sua base é uma convenção de
                                                                                                   24
arbitragem válida, celebrada pelas partes, prestes a se sujeitar a uma procedimento
arbitral, cuja escolha lhes cumpre em primeiro lugar; e os efeitos jurídicos das
decisões arbitrais são similares aqueles dos tribunais estatais. Portanto, são passíveis
dos efeitos jurídicos da coisa julgada, sendo exeqüíveis, equivalendo-se a uma
sentença proferida por tribunal estatal.
1
 BERGER, Klaus Peter. Recht der Internationalen Wirtschaft (RIW), p. 12 citado por
RECHSTEINER, Beat Walter. Arbitragem Privada Internacional no Brasil, São Paulo, Revista dos
Tribunais, p.15.
2
    RECHSTEINER, Beat Walter. Op cit, p. 16.   2
3
    LENZA, Vítor Barboza. Cortes Arbitrais. Goiânia, AB, 1997, p. 50.
A arbitragem traz inúmeras vantagens à solução de controvérsias e litígios,
sobretudo em razão da prevalência da autonomia da vontade das partes, da rapidez,
da maior especialização do árbitro nas questões levadas à sua apreciação, do menor
custo e também da possibilidade do sigilo da questão em debate, preservando-se o
nome das pessoas físicas ou jurídicas que acorram a uma Corte de Conciliação e
Arbitragem, em face da não publicidade dos atos arbitrais. Este aspecto da
confidencialidade é de especial interesse em matéria da órbita comercial, de família
ou mesmo trabalhista.
Tendo em vista que o árbitro ou a corte arbitral deverá ser escolhido livre e responsavelmente pelas
partes, que também modelam a estrutura procedimental a ser utilizada, a arbitragem é um instituto
extremamente democrático e legítimo. A autonomia na arbitragem, por sua vez, não se dá somente
para as partes, mas para toda a sociedade, que não vê mobilizado o aparato judiciário estatal para
solução de controvérsias patrimoniais limitadas a particulares.3
Por outro lado, o árbitro pode ser autorizado pelas partes para proferir a sentença
arbitral com base na equidade, ou seja, fora das formas e regras expressas no direito,
podendo ainda proferir suas sentenças arbitrais com base no direito positivo nacional
ou estrangeiro por equidade, e nos usos e costumes, e também nas práticas
internacionais do comércio.
Os elementos básicos que levam muitos litigantes a optarem pelo juízo arbitral são a
rapidez, a economia e o segredo.

HISTÓRICO

O processo arbitral tem sua gênese na justiça privada, mais especificamente na
vingança, sendo a autodefesa a manifestação natural traduzida como forma primitiva
de resolução dos conflitos de interesses, porém indesejada, na medida em que o
Estado procurava evitá-la, em homenagem à ordem pública e a paz social. 3




                                                                                                 25
4
    FURTADO, Paulo. Juízo Arbitral. Salvador, Nova Alvorada Edições Ltda, 1995, p. 47.
5
    MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado, p. 344 citado por FURTADO, Paulo. Op.cit., p. 49.
À autodefesa segue-se a autocomposição, com a substituição da atividade instintiva
pela reflexiva, a substituição do egoísmo da autodefesa pela solidariedade social da
solução autocompositiva.
Segundo o criador do termo (Carnelutti), são tipos genuínos de autocomposição, como formas de
resolver o litígio, a desistência, o reconhecimento e a transação. A primeira, como renúncia à
pretensão resistida pela parte contrária (unilateral); a segunda, como reconhecimento, pelo atingido,
da procedência da pretensão manifestada (unilateral); a terceira, finalmente, como acordo entre as
partes (bilateral).4
À autocomposição segue-se o processo, como instrumento apropriado para a solução
dos conflitos jurídicos, manuseado pelo Estado, surgindo como o mais moderno e
eficaz remédio à prevenção ou resolução dos litígios.
Ao buscar-se situar a arbitragem ou o sistema de solução de conflitos através de
árbitros, pode-se encontrar sua origem em proposições religiosas, havendo quem
atribuísse aos deuses a inspiração.
Inicialmente, teria a arbitragem sido empregada não como instrumento de solução
das lides intersociais, mas como índice de integração de uma relação jurídica. Esta
remanesce no direito material. Porém, de forma diversa, há o juízo arbitral, a
atividade judicante do árbitro para dirimir conflitos intersubjetivos.
No Direito Grego, poder-se-ia submeter controvérsias a árbitros privados, e alguns
tribunais tinham a competência para dirimir conflitos entre cidades gregas, como
juízes arbitrais, porém distintos dos chamados árbitros públicos.
Em Roma, por sua vez, a justiça dos árbitros era empregada com a eleição feita
pelas partes de árbitros privados para que lhe solucionassem as pendências.
Pontes de Miranda noticia uma crise no direito privado romano, a braços com a recusa do arbiter
em aceitar suas funções. Criaram-se tribunais arbitrais (judicioum privatum), que reclamavam
negócio jurídico entre as partes litigantes, pelo qual prometiam submeter ao judex a solução da lide.
Uma lista de cidadãos compunha o judicium privatum, e dela se escolhia o arbiter ao qual não se
reconhecia o direito à recusa. Sua decisão, caso não a cumprisse espontaneamente o vencido, era
chancelada pelo Estado, que a impunha coativamente.5 4
6
 CRETELLA JÚNIOR, José. Da arbitragem e seu conceito categorial., p. 137 citado por LENZA, Vítor
Barboza, op. cit., p. 52.
Na Idade Média havia apelo constante de países em litígio à mediação do Papado,
razão pela qual foi fortificado o Juízo Arbitral, originando-se a arbitragem
internacional em moldes que se reiteraram na prática, na segunda metade do século
XIX. Para por termo ao dissídio entre nações por meios políticos e sem formal rigor,
havia mediação ou arbitramento exercidos pelo Papa.
Na França, foi a arbitragem estimulada e havia casos em que era obrigatória, logo
após a Revolução Francesa.
No Brasil, o Regulamento nº 737, de 1850, com base no art. 160 da Constituição do
Império, propôs-se a dar forma e desenvolvimento. O Decreto nº 3900, de 1867,
aboliu a obrigatoriedade do Juízo Arbitral. Com o advento do Código Civil e a
regulamentação do compromisso, impôs-se ao legislador processual federal de 1939
a tarefa de tratá-lo formalmente, nos arts. 1031 e 1046.

CONCEITO DE ARBITRAGEM

De forma ampla, a arbitragem é uma técnica para a solução de controvérsias através
de intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes das partes para a
solução de uma controvérsia privada, decidindo com base nesta convenção, sem
                                                                                                        26
intervenção do Estado, sendo a decisão destinada a assumir eficácia de sentença
judicial.
Para Cretella Júnior, a arbitragem é sistema especial de julgamento, com procedimento técnico e
princípios informativos próprios e com força executória reconhecida pelo direito comum, mas a este
subtraído, mediante o qual duas ou mais pessoas físicas, ou jurídicas, de direito privado ou de
direito público, em conflito de interesses escolhem de comum acordo, contratualmente, uma terceira
pessoa, o árbitro, a quem confiam o papel de resolver-lhes a pendência, anuindo os litigantes em
aceitar a decisão proferida.6 5
7
 BIAMONTI, Luigi. Arbitrato – diritto processale civile , p. 904 citado por LENZA, Vítor Barboza, op. cit., p.
53.
São duas as características básicas da arbitragem nacional: a incidência, para todo o
fenômeno, unitariamente percebido, das leis de um único sistema jurídico, e a
inexistência de conflitos de jurisdição interna ou internacional para a obtenção de
exequatur do laudo para eventual obtenção de medidas cautelares.
A arbitragem internacional, por sua vez, envolve fenômeno diferente, o
desaparecimento, segundo o qual cada elemento da arbitragem, (capacidade das
partes, competência dos árbitros, arbitrabilidade do litígio, procedimento arbitral, lei
material aplicável à solução do litígio, etc), seria regido por uma lei diferente.

NATUREZA JURÍDICA

Quanto à natureza jurídica, a arbitragem é um equivalente jurisdicional, equivalendo
e substituindo a jurisdição.

O COMPROMISSO ARBITRAL

O compromisso arbitral pode ser definido como sendo “um contrato de direito
privado estipulado como fim de produzir entre as partes efeitos processuais,
obrigando-as a subtrair à competência da autoridade judiciária ordinária o
conhecimento da controvérsia considerada no compromisso, passando tal
competência à esfera do juízo arbitral.”7
Dispõe o art. 9º da Lei 9.307/96: “O compromisso arbitral é a convenção através da
qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo
ser judicial ou extrajudicial.”
Configura-se o compromisso arbitral, por sua natureza jurídica, negócio jurídico,
enquanto se trata de externar a vontade lícita, voltada para a consecução de 6
8
    FURTADO, Paulo. Juízo Arbitral. Salvador: Nova Alvorada Edições, 1995.
um fim, desejado pelas pares e produtos da vontade da lei, a qual tutela a emissão
volitiva.
O compromisso arbitral constitui negócio jurídico plurilateral, assim como o
contrato de sociedade, concluído por não ser antagônica a vontade dos
compromitentes, ao contrário, dirigidas para o mesmo sentido, qual seja, o de
submeter suas contendas à decisão de um ou mais árbitros.
Assinala-se, no compromisso, não apenas uma relação jurídica entre as partes, ou
seja, não apenas um negócio jurídico entre as partes, mas igualmente um negócio
jurídico arbitral, isto é, uma relação jurídica entre os compromitentes e o árbitro,
relação à qual se vincula este com a aceitação.8

O ÁRBITRO
O árbitro é pessoa natural, tecnicamente preparada e qualificada que, sem estar
investida na magistratura estatal, é juiz de direito e de fato e é escolhido por duas ou
                                                                                                           27
mais pessoas, quer físicas ou jurídicas, sempre em número ímpar, para dirimir
controvérsias entre elas, proferindo sentença arbitral de mérito com força de título
executivo. São equiparados, no exercício de suas funções ou em decorrência delas,
aos funcionários públicos, para os efeitos penais, e aos magistrados, para as
exceções de impedimentos e suspeição dos artigos 134 e 135 do CPC.
São os árbitros judices compromissarii ou compromisarius, visto que pelo
compromisso recebem eles o arbítrio. Julgam como se fossem juízes togados e sua
decisão, chancelada pelo juiz togado, tem força executória.
Tem o árbitro ampla liberdade para determinar as provas que reputar necessárias ao
esclarecimento da verdade, para apreciá-las e dar especial valor às regras de
experiência comum ou técnica.
O árbitro poderá adotar em cada caso a decisão que julgar mais justa e prudente,
com o fim de atender ao fim social que a Lei quer, bem como as 7




                                                                                 28
exigências do bem comum. Além disso, poderá ele decidir por equidade, ou seja,
mesmo não havendo preceito que o autorize a decidir determinada pendência,
poderá agir como se fora legislador, desde que atenda às exigências do bem comum.

CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM
A convenção de arbitragem juridicamente válida, é o elemento indispensável para a
instituição de um tribunal arbitral e sua competência no julgamento de uma lide.
Ao se referir à lide futura, decorrente de determinada relação jurídica entre duas
partes, mormente de natureza contratual, a convenção de arbitragem é denominada
cláusula compromissória, ou cláusula arbitral. Em contrapartida, se estiver
relacionada à lide já existente, costuma-se falar em compromisso arbitral.
A convenção é juridicamente autônoma perante o acordo principal estabelecido
pelas partes. Sua validade é reconhecida pelo tribunal arbitral, bem como a
competência para julgar a lide sujeita à sua apreciação jurídica.
Deve a convenção de arbitragem preencher requisitos formais e materiais
predeterminados, para que o tribunal arbitral firme sua competência quanto as lides
suscetíveis de arbitragem.
A questão de determinar quais são as lides suscetíveis à arbitragem internacional é
de fundamental importância na prática, pois, se tal não for o caso, de acordo com a
legislação na sede do tribunal arbitral, a convenção de arbitragem será nula.
Conforme a Convenção de Nova Iorque de 1958 sobre o Reconhecimento e a
Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, nenhum pais signatário é obrigado a
reconhecer e executar um laudo arbitral estrangeiro quando a lide não for suscetível
à arbitragem, conforme a legislação do país onde o laudo deva ser executado. 8




                                                                                 29
Se porém a lide em que se fundamenta o laudo estrangeiro for de fato suscetível à
arbitragem, esta deverá ser examinada de ofício pelo juiz ou tribunal que decidirá
sobre seu reconhecimento.

COMPETÊNCIA
Atualmente, na prática da arbitragem internacional, é quase pacífico cumprir ao
próprio tribunal arbitral decidir quanto à sua competência perante a lide submetida à
sua apreciação.
No mesmo sentido o artigo 8º, §1°, da Lei 9.307/96, onde dispõe: “Caberá ao árbitro
decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência,
validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a
cláusula compromissória.” Por outro lado, a mesma lei ordena à parte que pretender
argüir questões relativas à competência, bem como a nulidade, invalidade ou
ineficácia da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que
tiver para se manifestar, após a instituição da arbitragem.
A competência do tribunal arbitral estará fixada se a lide a ser decidida for suscetível
à arbitragem, se a convenção de arbitragem for juridicamente válida, levando em
consideração todos seus aspectos formais e materiais; sendo as partes capazes para
celebrar uma convenção de arbitragem, se ambas as partes possuírem a capacidade
para ser parte em relação à lide submetida a arbitragem ou efetivamente ali são
partes e se a lide não se situar fora dos limites da convenção de arbitragem.
Na doutrina internacional parece estar assentado que a questão quanto a determinar
quando uma lide é suscetível à arbitragem, deverá ser examinada sempre de ofício
pelo tribunal arbitral.
Caso o próprio tribunal arbitral decida quanto a sua incompetência, prevê a Lei
9.307/96, que as partes sejam remetidas ao órgão do poder judiciário competente
para julgar a causa (art. 20, §1°). 9




                                                                                     30
O juiz estatal possui plena cognição quando do exame da validade da convenção de
arbitragem, independentemente de onde está localizada a sede do tribunal arbitral,
independentemente de onde está localizada a sede do tribunal arbitral já ou ainda a
ser constituída, caso o réu, preliminarmente, alegue a incompetência do juiz estatal
pela razão da existência de uma convenção de arbitragem entre as partes.

PROCEDIMENTO ARBITRAL
O principal objetivo é a solução de conflitos de direito patrimoniais ou pessoas
disponíveis. O juízo arbitral é aplicável a esses direitos.
O procedimento a ser adotado pelo árbitro ou pelo tribunal arbitral é fixado pelos
próprios compromitentes, que estabelecem as regras arbitrais, dentro da flexibilidade
procedimental facultada pela Lei de Arbitragem, ou adotam o regulamento de algum
órgão arbitral institucional.
O juízo arbitral tem início com a assinatura, pelas partes, da cláusula
compromissória ou do compromisso arbitral. É considerada instituída a arbitragem
quando é aceita a nomeação pelo árbitro, se for único, ou por todos eles, se forem
vários (tribunal arbitral).
VANTAGENS DA ARBITRAGEM
A arbitragem traz inúmeras vantagens à solução de controvérsias e litígios em
comparação com a justiça estatal, sobretudo em razão da prevalência da autonomia
de vontade das partes, da rapidez, da maior especialização do árbitro nas questões
levadas à sua apreciação, do menor custo e também da possibilidade do sigilo da
questão em debate, preservando-se o nome das pessoas físicas ou jurídicas que
acorram a uma Corte de Conciliação e Arbitragem, em face da não publicidade 10




                                                                                  31
dos atos arbitrais. Este aspecto é de especial interesse em matéria de órbita
comercial, de família e trabalhista.
Tendo em vista que o árbitro ou a corte arbitral deverá ser escolhido livre e
responsavelmente pelas partes, que também modelam a estrutura procedimental a
ser utilizada, a arbitragem é um instituto extremamente democrático e legítimo. A
autonomia na arbitragem não se dá somente pelas partes, mas para toda a sociedade,
que não vê mobilizado o aparato judiciário estatal para solução de controvérsias
patrimoniais limitadas a particulares.
CONCLUSÃO
Arbitragem é, portanto, um sistema especial de julgamento, com procedimento,
técnica e princípios informativos próprios e com força executória reconhecida pelo
direito comum, mas a este subtraído, mediante o qual duas ou mais pessoas físicas
ou jurídicas de direito privado ou de direito público, em conflito de interesses,
escolhem de comum acordo, contratualmente, uma terceira pessoa, o árbitro, a quem
confiam o papel de resolver-lhes a pendência, anuindo os litigantes em aceitar a
decisão proferida.

                          UNIÃO HOMOAFETIVA

                                     INTRODUÇÃO
A humanidade neste início de milênio vive momentos de profundas transformações
científicas, tecnológicas, sociais e de costumes; guerras, atos de terrorismo, atentados,
crimes hediondos, violência contra seres humanos: velhos, crianças e mulheres indefesos,
torturas, seqüestros e ausência total de solidariedade transformam esse mundo em
verdadeiro caos.
Nesse contexto fascinante e paradoxal, as questões sociais e o relacionamento das pessoas
tornam a sociedade mais vulnerável, exigindo dela soluções imediatas e solicitando do
legislador mais que mero expediente legislativo na elaboração jurídica, porque o direito é a
amostra de comportamento que traduz a consciência social de um povo e de uma era,
devendo andar de mãos dadas com a justiça social, em harmonia com as novas realidades
que despontam, para não se apartar de vez do ser humano e fenecer solitário.
O direito, ao longo da história, sempre esteve, e ainda está, em constante evolução,
deparando-se em diversas ocasiões com temas que causam controvérsia, mas que exigem
sempre a atenção do legislador, por dizer respeito a uma maioria da sociedade, ou por
grupos minoritários.
Necessita-se, para tanto, que haja evolução legislativa no sentido de normatizar o direito
daqueles que necessitam proteção de sua vida privada e intimidade, para que se resguarde o
direito a opções de esfera privada, no que tange à escolha da pessoa com a qual se deseja
compartilhar afetos e sentimentos, bem como se o que se deseja é estar só.
Decisões estas, porém, enfraquecidas e ameaçadas pelo modo de vida contemporâneo, onde
aquele que deseja ser autônomo, ter pensamento livre e original, sente-se isolado na
multidão e incapaz de relacionar-se com as pessoas.
O tema ora desenvolvido, qual seja, a união homossexual, possui proposta regulamentadora
através do Projeto de Lei nº 1.151, de 1995, de autoria da Deputada Marta Suplicy, o qual
vem ao encontro de uma realidade fenomenológica que não é 2




                                                                                         32
despercebida pelos operadores do direito, estabelecendo parâmetros para uma situação de
fato já existente não apenas na sociedade brasileira como no mundo inteiro.
A criação desse novo instituto legal é plenamente compatível com o nosso ordenamento
jurídico, tanto no que se refere a seus aspectos formais quanto de conteúdo.
O rol de direitos humanos inseridos em nossa Constituição revela implicações evidentes
entre a livre expressão da sexualidade por parte dos homossexuais e o princípio da
dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos e base da República Federativa do
Brasil, devendo-se inclusive mencionar o direito à intimidade e à vida privada, da liberdade
de expressão, do direito de livre associação, da liberdade de opinião, de manifestação e de
seus corolários de liberdade de informação e de imprensa; todos sob o manto cardeal do
princípio da igualdade, presentes não só nos direitos fundamentais do artigo 5º da Carta
Maior, como enunciados nos princípios fundamentais, quando elencam como objetivos
fundamentais da República, constitucionalmente garantidos “de construir uma sociedade
livre, justa e solidária e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3º, inciso IV, CF).
O Poder Judiciário tem mostrado crescente compromisso e convicção de que as leis devem
assegurar direitos e possibilitar uma vida digna para todos os cidadãos. Devido a isso, a
parceria civil tem sido acolhida pela doutrina e jurisprudência como sociedade de fato, com
repercussões jurídicas que alcançam conseqüências de natureza previdenciária e
patrimonial, estando a exigir, por isso, uma moldura jurídica precisa e consistente.
O que a comunidade homossexual reivindica não são privilégios; a equiparação de suas
relações com a dos casais heterossexuais é um direito devido àqueles que são taxados
exatamente da mesma forma. Heterossexuais e homossexuais possuem as mesmas
obrigações, mas não vêm usufruindo os mesmos benefícios. Em vista disso, fica
demonstrado que o Projeto da Parceria Civil Registrada não busca ferir a moral ou os bons
costumes, e sim, clama a direitos constitucionais, que com a evolução da 3




                                                                                         33
sociedade fazem-se necessários que se adaptem e se consolidem, para que não haja
ninguém excluído da proteção jurídica. 4




                                                                             34
I – HOMOSSEXUALIDADE
                               1 PANORAMA HISTÓRICO
Na história da humanidade, as relações homossexuais eram praticadas entre diversos povos
selvagens, bem como em antigas civilizações, conhecida e praticada por romanos, egípcios,
gregos e assírios, sendo, pois, “uma realidade que sempre existiu, e em toda parte, desde as
origens da história humana é diversamente interpretada e explicada, mas, apesar de não a
admitir, nenhuma sociedade jamais a ignorou.”1
A prática homossexual era aceita na Antigüidade Clássica, porém com certas restrições à
sua externalidade.
Na Grécia antiga, o exercício livre da sexualidade fazia parte da rotina de reis, deuses e
heróis, e era tida como "verdadeiro privilégio dos bem nascidos"2, sendo que “Os gregos
atribuíam à homossexualidade características como a intelectualidade, estética corporal e
ética comportamental, sendo que muitos a consideravam mais nobre que o relacionamento
heterossexual.”3
A dupla sexualidade estava inserta no contexto social, e a heterossexualidade considerada
de certa forma, como uma preferência inferior apenas com o objetivo de procriação.
O homossexualismo, então, não era tido como "degradação moral, acidente ou vício",4
retratado pelo fato de que “em suas olimpíadas, os atletas competiam nus, exibindo sua
beleza física, e vedada era a presença das mulheres na arena por não terem capacidade para
apreciar o belo. Também nas representações teatrais, os papéis
1 DIAS, Maria Berenice. Uniões Homossexuais – O Preconceito e a Justiça, p.27
2 SOUZA, Ivone Coelho de. Homossexualismo: discussões jurídicas e psicológicas, apud
DIAS, M.B. Op. cit., 2001, p. 28.
3 CORREIA, Jadson Dias. União Civil entre pessoas do mesmo sexo (Projeto de Lei
1151/95). Disponível em http:www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=554, acesso em 04
de janeiro de 2002
4 BLEICHMAR, Silvia. Pontualizações para uma teoria psicanalítica da
homossexualidade, apud DIAS, M.B., Op. cit, p. 28. 5




                                                                                         35
femininos eram desempenhados por homens travestidos ou mediante o uso de máscaras.
Por certo, manifestações homossexuais.”5
5 DIAS, M.B. Op. cit., p. 28.
6 SOUZA, I.C. Op. cit., apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 29.
7 MORICI, Silvia. Homossexualidade, apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 30.




                                                                               36
8 Ibid., p.30.
A prática homossexual constituía um rito sexual iniciatório aos adolescentes (efebos) e era
obrigação do preceptado "servir de mulher" ao seu preceptor, pois, para eles, heroísmo e
nobreza eram transmitidos através do esperma.
Em Roma, "o homossexualismo era visto como de procedência natural, ou seja, no mesmo
nível das relações entre casais, entre amantes ou de senhor e escravo.”6
Ocorria um tipo de preconceito, porém relacionado da "associação popular entre
passividade sexual e impotência política. A censura recaía somente no caráter passivo da
relação, na medida em que implicava debilidade de caráter."7 Clara se fazia a relação entre
“masculinidade – poder político” e “feminilidade – carência de poder”, em vista que
desempenhavam o papel passivo rapazes, mulheres e escravos, ou seja, aqueles excluídos
da estrutura de poder.8
O preconceito maior em relação ao homossexualismo provém das religiões.
Na concepção filosófica natural de São Tomás de Aquino, o sexo justificava-se como
instrumento de procriação, com o escopo de preservação do grupo étnico, ocupação dos
vazios geográficos e reposição da humanidade, cuja expectativa de vida era de 30 anos
aproximadamente.
A Igreja Católica tem o homossexualismo como transgressão à ordem natural, aberração da
natureza, uma verdadeira perversão. Em sua historia, na Santa Inquisição, asseverou-se a
penalização pela prática homossexual, pois a sodomia era tida como o maior dos crimes.
Em 1179, o III Concílio de Latrão, tornou crime a pratica homossexual.
Legislações dos séculos XII e XIII penalizavam a sodomia, tendo o primeiro código
ocidental prescrito pena de morte à sua prática.
Segundo historiadores, a homossexualidade floresceu nos mosteiros e acampamentos
militares da Idade Média, quando paralelamente, a união heterossexual foi sacramentada.
“O Papa João Paulo II recentemente, na Encíclica Fides et Ratio, 6




                                                                                        37
9 DIAS, M.B. Op. cit., p. 32.
10 Ibid., p. 33.
11 Id.
12 CZAJKOWSKI, Rainer. União Livre: à luz das Leis 8971/94 e 9278/96, 1997, p. 170
13 Idéia não tão nova, pois em Roma, no dia 25 de abril, celebrava-se o dia do mancebo
prostituto, cf. SOUZA, I.C. Op. cit., Apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 34.
14 DIAS, M.B. Op. cit., p. 34
reiterou que a Igreja só aprova as relações heterossexuais dentro do matrimônio,
classificando a contracepção, o amor livre e a homossexualidade como condutas
moralmente inaceitáveis, que distorcem o profundo significado da sexualidade.”9
Após a metade do século XX, mudanças sociais levaram ao surgimento de uma sociedade
menos homofóbica."10 Isto ocorreu, pois houve um distanciamento entre Igreja e Estado,
este obtendo mais liberdade e menos influência daquela, pois ao romper os laços que o
ligavam àquela, cessou o "condicionamento a uma estrita obediência às normas ditadas pela
religião, em que a apenação pelo descumprimento dos dogmas de fé estava sujeita à ira
divina, eterna e implacável.”11
O reflexo do declínio influencial da Igreja foi a dessacralização do casamento, com o
surgimento de novas estruturas de convívio, passando a haver maior valorização do afeto, e
a "orientação sexual começou a se caracterizar como uma opção e não como um ilícito ou
uma culpa."12
Desde fins dos anos 60, tem havido um aumento da visibilidade das opções sexuais dos
indivíduos, por ter diminuído o sentimento de culpa que pesa sobre eles.
Os chamados movimentos gays têm aumentado seus adeptos, com o objetivo de dar
transparência ao fenômeno. “Em 28 de junho de 1969, em Nova Iorque, eclodiu uma
rebelião de travestis denominada "Motim de Stonewall" em Grenwich Village. Ocorreram
protestos e brigas entre homossexuais e a polícia durante uma semana, ensejando a
institucionalização dessa data como o Dia do Orgulho Gay.”13
O movimento gay brasileiro "passou a considerar como seu insight mais importante a
constatação de que muito mais prejudicial do que a homossexualidade em si é o avassalador
estigma social de que são alvo gays, lésbicas e travestis."14
Trata-se de indivíduos que, "se experimentaram alguma forma de sofrimento, é originado
pela intolerância e injustificado preconceito social."15 7




                                                                                       38
15 MESQUITA, Rogério. Questionamentos Sobre o Projeto de Lei da Parceria Civil
Registrada. Tese de Conclusão do Curso de Pós-Graduação em Psicologia do Centro
Universitário La Salle, 1997. Apud. DIAS, M.B. Op. cit., p. 34.
16 Reflexões em torno da história da homossexualidade In: MORICI, S. Op. cit., apud
DIAS, M.B. Op. cit., p. 35.
17 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, 2001, p.400.
18 SILVA, D.P.. Op. cit., p. 400
19 GOMES, Hélio. Medicina Legal. 1997, p. 714.
Atualmente, para Philippe Ariès, “os homossexuais formam um grupo coerente, ainda
marginal, mas que tomou consciência de sua própria identidade, um grupo que reivindica
seus direitos contra uma sociedade dominante que ainda não o aceita.”16
                2 CONCEITO E ESPÉCIES DE HOMOSSEXUALISMO
O vocábulo "homossexualidade" foi criado e introduzido na literatura técnica em 1869, pela
médica húngara Karoly Benkert.
Etimologicamente, a palavra homossexual é formada pela junção de dois vocábulos,
"homo" e "sexu". Homo, provém do grego "homos", o qual significa semelhante, e o
vocábulo sexual vem do latim "sexu", que é o relativo ou pertencente ao sexo. A junção dos
dois vocábulos significa "sexualidade semelhante", ou seja, a prática sexual entre pessoas
do mesmo sexo.
Segundo a definição encontrada no Vocabulário Jurídico de De Plácido e Silva, "entende-se
homossexual toda pessoa que procura prazeres carnais com pessoas do mesmo sexo".17
Tem-se também, na mesma obra, a homossexualidade como "comércio carnal ou prática de
atos sexuais entre indivíduos do mesmo sexo. É a inversão sexual, em que o homem serve
de mulher para satisfazer a lascívia de outro homem, ou a mulher maneja como homem
para provocar o orgasmo em outra mulher e em si própria. Inversão sexual."18
A Medicina Legal define o homossexualismo como "indicativo de anormalidade do instinto
sexual do indivíduo em virtude do que somente tem inclinação sexual ou amorosa para
indivíduos de seu próprio sexo, muitas vezes com repugnância ou aversão aos seres do sexo
oposto."19
Há ainda a divisão entre homossexualismo feminino e masculino. 8
20 CORREIA, J.D. Op. cit., p. 4.
O homossexualismo masculino, isto é, a satisfação carnal de homem com homem, pode ser
chamada de pederastia, sodomia ou uranismo.
Há pederastia quando o prazer sexual se realiza pelo coito anal de um homem com uma
criança ou menino.
Sodomia é a prática sexual entre homens, já adultos.
Já o uranismo, segundo Ulrichs, é a prática sexual entre homens, por falta de mulher.
Com relação à homossexualidade feminina, o coito se realiza por meio de várias práticas
que possam provocar o orgasmo, utilizam-se os vocábulos safismo, tribadismo ou
lesbianismo:
A palavra lesbianismo deriva de Lesbos, ilha onde antigamente vivia um grupo de mulheres
homossexuais chefiadas pela poetisa Safo.
As tribadistas atritam os órgãos sexuais em práticas reciprocas.
Já as safistas ou lésbicas, praticam a sucção do clitóris, alternativamente, ou se
masturbavam reciprocamente.20
                                       3 ASPECTOS
3.1 NA MEDICINA


                                                                                        39
Na Idade Média, a homossexualidade foi considerada uma doença que acarretava
diminuição das faculdades mentais, uma enfermidade decorrente de contagioso e genético
defeito.
A Medicina pesquisou por longo tempo os hormônios, o aparelho genital, o sistema
nervoso central, não encontrando, porém, nada que diferenciasse hetero e homossexuais.
A partir de 1985, o Conselho Federal de Medicina, tornou sem efeito o código 302 da
“Classificação Internacional de Doenças” (CID), não mais considerando o
homossexualismo como um desvio ou transtorno sexual. Em decorrência do abandono da
idéia de ver a homossexualidade como doença, dispõe Maria Berenice Dias que 9




                                                                                   40
21 DIAS, M.B. Op. cit., p. 43.
22 DIAS, M.B. Op. cit., p. 43.
23 Id.
24 Ibid., p. 44.
“passou ela a ser encarada como uma forma de ser diferente da maioria, diferenciando-se
apenas no relacionamento amoroso e sexual.”21
Em 1993, a Organização Mundial de Saúde inseriu-a no capítulo “Dos Sintomas
Decorrentes de Circunstâncias Psicossociais”. Na 10ª revisão do CID-10, em 1995, foi
nominada de “Transtornos da Preferência Sexual” (F65). O sufixo ismo, que designa
doença, foi substituído pelo sufixo dade, que significa modo de ser.
3.2 NA GENÉTICA
Recentes pesquisas científicas realizadas nos Estados Unidos, buscam origem genética das
manifestações patológicas e comportamentais. Têm elas escopo de demonstrar a existência
de genéticas causas, com hereditárias características biológicas, não sendo, no entanto,
fruto do ambiente social e afetivo.
Feita uma pesquisa entre gêmeos, bem como entre irmãos adotivos – sendo um deles
homossexual – , foi constatado que, entre os gêmeos univitelinos (os que tem características
genéticas idênticas), 52% dos irmãos também eram homossexuais. Entre os gêmeos
bivitelinicos (geneticamente distintos), a identidade caiu para 22%. Já com irmãos adotivos,
o número foi para 11%, a evidenciar que a coincidência de comportamentos decorre
também da influência do ambiente familiar.22
Afirma Michael Baily, professor de psicologia da Universidade de Evanston, em
reportagem publicada na revista VEJA (25.12.91), que em 30 a 70% dos casos de
homossexualidade, esta decorre não apenas do meio no qual as pessoas são criadas, mas
principalmente de fatores genéticos23.
Simon Le-Vay, neurocientista, identificou que o hipotálamo das pessoas com tendências
homossexuais possui metade do tamanho do hipotálamo dos heterossexuais, similar em
dimensão ao das mulheres24.
Sandra Witelson, psiquiatra canadense, analisou o cérebro de 10 heterossexuais e 11
homossexuais utilizando técnicas de ressonância magnética. Concluiu a 10




                                                                                         41
25 Id.
26 Id.
27 GRAÑA, Roberto B. Além do desvio sexual. Apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 47.
28 GRAÑA, R.B. Op.cit., Apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 47.
29 Apud DIAS, M.B. Op.cit., p. 47.
30 Resolução 1/99, do Conselho Federal de Psicologia
pesquisadora que a região cerebral ligada à habilidade verbal e motora (corpo caloso) é
maior nos homossexuais25.
Um estudo da Universidade de Ontário no Canadá, revelou que homossexuais possuem
impressões digitais com características mais aproximadas do padrão microestriado
feminino, integrando, por dedução, a estrutura biológica da pessoa.26
3.3 NA PSICOLOGIA
Na área da Psicologia, elucida Roberto Graña27:
Todos os desvios sexuais são, em qualquer idade e essencialmente, desvios sexuais infantis.
A identidade sexual e as anomalias evolutivas são fruto de determinismo psíquico
primitivo, que tem origem nas relações parentais desde a concepção até os três ou quatro
anos de idade. Nessa época, constitui-se o núcleo da identidade sexual na personalidade do
indivíduo, ou seja, firma-se o entendimento interior de ser masculino ou feminino que irá
determinar sua orientação sexual.
Aduz o psicólogo que a força psicológica formativa vem de modelo que decorre da
interação da criança preferencialmente com a figura dos genitores.
O psicólogo norte-americano Money, afirma que, independentemente do sexo
cromossômico ou da aparência dos órgãos genitais, é o estabelecimento de identidade de
gênero primeiramente feito pelo ambiente.28
Já Henry Ey trata o homossexualismo como desvio do impulso sexual, obtido através de
fracasso do aparecimento edipiano, podendo advir de fatores acidentais, constitucionais ou
características das personalidades dos pais29.
Para se evitar o preconceito por meio de práticas terapêuticas para curar homossexuais, o
Conselho Federal de Psicologia, baixou a R1/99, em 23.03.1999, orientando os
profissionais desta área em como proceder.30 11
31 COLOGNESE Jr, Armando. Reflexões Psicanalíticas sobre o Homossexualismo.
Disponível                                                               em
http//www.boasaude.com/lib/ShowDoc.cfm?LibDocID=3757&ReturnCatID=1781 em 04
de janeiro de 2002.
3.4 NA PSICANÁLISE
O estudo da sexualidade, para a psicanálise, tem sentido apenas quando envolve a
compreensão do psiquismo de uma pessoa, suas identificações, a formação da pessoa como
sujeito de uma cultura, o comportamento de um modo geral.
Não existe a sexualidade dissociada da pessoa como um todo, não é algo instintivo,
herdado, rígido ou fixo dentro de uma mesma espécie.
É ela um componente de nossas vidas. A identidade sexual é desenvolvida pelo ser
humano, assim como a identidade profissional, de adulto, da maturidade, de filho, pai, e
mãe. Já a sexualidade é algo inerente ao prazer, e tudo o que é ligado ao prazer é de caráter
sexual para a psicanálise.
Quando existe especificamente uma homossexualidade, deve-se compreender como sendo
uma forma que a pessoa encontra para se expressar, relacionar-se e expor-se como tal.

                                                                                          42
Na teoria psicanalítica, uma pessoa que apresente um psiquismo homossexual, está
buscando esquivar-se das diferenças; são pessoas extremamente sensíveis a choques de
opinião e comumente tiveram que lidar com questões radicais, posições incoerentes e
contraditórias constantemente durante a infância, principalmente de seus educadores.
Buscam através da igualdade se livrar de se sentir pressionados diante das diferenças e do
diferente. Não precisam necessariamente estar ligados a parceiros do mesmo sexo. É o que
a psicanálise chama de componente narcísico da personalidade, portanto, podem procurar
parceiros para relacionamentos íntimos, tanto quanto comerciais, sociais e pessoais.
A homossexualidade, segundo o Dr. Armando Colognese Júnior, docente do Curso de
Formação em Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, é uma opção tanto quanto o é a
heterossexualidade, uma vez que “a identidade forma-se ao longo da vida e sua base mais
forte está calcada nos primeiros seis anos de vida.”31 12
32 ASSIS, Reinaldo Mendes de. União entre homossexuais: aspectos gerais e
patrimoniais. Disponível em http:www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3432, em 04 de
janeiro de 2002.
II – REFLEXÕES JURÍDICAS
             4 O CASAMENTO E SUAS CONSEQÜÊNCIAS JURÍDICAS
4.1 ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Desde os tempos mais remotos, busca o ser humano encontrar companhia para com esta se
unir, objetivando a procriação.
Originariamente, a primeira forma de união entre um homem e uma mulher ocorreu através
da força, com o macho simplesmente pegando a fêmea pela qual sentia desejo. Tratava-se
de uma união forçada, não se configurando casamento.
O casamento ingressa na história da humanidade como processo de socialização.
Falar casamento é dizer história ou cultura. Diante disso, cada sociedade esculpiu seus
modelos institucionais para ações relativas à família e à conjugalidade.
Historicamente, tem-se tentado tornar o casamento algo natural, mas é ele essencialmente
uma instituição social.
Em sua evolução história32, o casamento, dentro do sistema ocidental, encontrou quatro
etapas distintas, sendo elas:
Matrimônio consensual: praticado pelos povos antigos, não sendo condição à validade do
casamento qualquer formalidade, bastando a vontade recíproca de se unirem, o mútuo
consentimento.
Matrimônio exclusivamente religioso: a partir do século X, a Igreja passou a afirmar ser o
casamento entre os cristãos um sacramento sujeito às normas eclesiásticas. 13




                                                                                       43
É importante ressaltar que, quando da realização do Concílio Tridentino, estabeleceu este a
doutrina do sacramento matrimonial, o qual ainda se encontra em vigor, doutrina esta que
influenciou em muito o atual sistema, pois tratou dos impedimentos, da indissolubilidade.
Matrimônio legal e eclesiástico: regime que passou a vigorar desde 1836 em diversos
países, dentre eles o Brasil. Facultou-se aos interessados contrair o casamento segundo as
normas da legislação vigente no país, ou sob as prescrições da Igreja, subordinando o
casamento na Igreja ao que dispõe a lei canônica.
Matrimônio civil obrigatório: abandonando a idéia do casamento religioso, a maioria das
legislações passaram a dar validade tão somente ao matrimônio civil, podendo ser o
religioso realizado a critério dos interessados, embora não possua validade qualquer.
O instituto do casamento, em seu aspecto jurídico, desperta interesse como objeto de estudo
a partir do período de dominação do Império Romano, onde se observa a existência de
normas que regulavam a existência do instituto, o qual era dividido em três espécies
distintas: a "confarretio", a "coemptio" e o "usus".
A "confarretio" era o casamento dos patrícios (cidadãos romanos), que correspondia ao
matrimônio religioso, caracterizado pela oferenda de um pão de trigo aos deuses. Todavia,
no Império Romano, esta forma caiu em desuso.
A "coemptio" era o matrimônio dos plebeus (aqueles que não eram cidadãos romanos).
O "usus" era equivalente a um usucapião, já que a mulher era adquirida pela posse.
Posteriormente, o instituto evolui até o casamento livre, no qual era exigido apenas a
capacidade dos nubentes, o seu consentimento e a inexistência de impedimentos.
Com o passar do tempo, a Igreja se apodera dos direitos sobre a regulamentação e
celebração do matrimônio, excluindo o Estado de qualquer participação.
Devido à influência judaico-cristã, não se pode afastar a citação de Modestino, ao se
perscrutar pela trilha da decodificação do sentido de casamento para as sociedades
ocidentais. Diz ele que o casamento é a "conjugação do homem e da mulher; que se
associam para toda a vida, a comunhão do direito divino e do direito humano". O que se
vê aqui são as matrizes do casamento 14




                                                                                        44
33 DIAS, M.B., Op. cit., p. 105.
34 MONTEIRO, WB. Curso de Direito Civil – Direito de Família., 1990, p. 9.
35 Código de Direito Canônico, Codex Iuris Canonici, p. 465.
36 BEVILAQUA, Clóvis. Direito de Família, 1943, p. 34.
sexista, indissolúvel e portal entre o divino e o profano. Durante muitos séculos esse foi o
único modelo vislumbrável pelas sociedades ditas civilizadas.33
Em outro momento histórico, os Estados começaram a rever esta situação, sendo a
iniciativa tomada pelos ingleses, que passaram a regulamentar o instituto sem a
interferência da Igreja.
No Brasil, esta situação perdurou até 1861, quando o Estado regulamentou o casamento dos
não-católicos, formados em sua grande maioria por imigrantes. Mais tarde, com o advento
da Proclamação da República, houve a separação entre o poder temporal e espiritual,
conforme explica o Professor Washington de Barros Monteiro,34 sendo que, desde então,
tem-se o casamento civil, apesar de a Constituição Federal de 1988, em seu art. 226,
parágrafo segundo, equiparar o casamento religioso ao casamento civil.
4.2 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA
A Igreja teve um papel importante na definição do casamento, a qual pode-se encontrar no
Código de Direito Canônico, cânon 1055, em seu parágrafo primeiro:
"Cân. 1055 - § 1. O pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si o
consórcio de toda a vida, por sua índole natural ordenado ao bem dos cônjuges e à
geração e educação da prole, entre batizados foi por Cristo Senhor elevado à dignidade de
sacramento.”35
São inúmeras as definições que encontramos para este importante instituto na doutrina.
Porém, conceituar o casamento tem sido um grande desafio para os doutrinadores.
Clóvis Beviláqua36 define o casamento na ótica de legitimação estatal das relações carnais
e implicitamente estabelecendo suas conseqüências na órbita patrimonial: "Casamento é um
contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente,
legitimando por ele suas relações sexuais; 15
37 MONTEIRO, W B. Op. cit., p. 09.
estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar
e educar a prole que de ambos nascer".
Essa visão de Clóvis, estribada no pensamento dominante no mundo de então, presidiu a
leitura normativa nacional durante décadas. Daí advieram as compreensões acerca da
legitimidade da prole oriunda do casamento em detrimento das demais, e até mesmo do
papel do Estado como regulador e legitimador dessas relações.
Washington de Barros37 conceitua o matrimônio como "a união permanente entre o
homem e a mulher, de acordo com a lei, a fim de reproduzirem, de se ajudarem
mutuamente e de criarem os seus filhos".
Em nome da defesa do casamento e, implicitamente de um conceito limitado de
familiaridade, vigoraram no Brasil até pouco tempo o art. 175, caput, da Emenda
Constitucional no 1, em relação à Constituição de 1967, que dizia: "A família é constituída
pelo casamento e terá proteção dos Poderes do Estado", e, os arts. 242 e seguintes e 380
do Código Civil de 1916, que até 1988 impunham à mulher a necessidade de outorga
marital para realização de diversos negócios e a colocavam na condição de colaboradora do
marido na fruição e exercício do pátrio poder. Logo, a comunhão não era tão equânime
como poderia parecer em princípio.
A maioria da sociedade brasileira, já em 1967, era favorável ao divórcio, mas este somente
foi efetivado dez anos depois. Logo, a moral presidiu por mais tempo o casamento do que a
própria lógica que emanava da história e do mundo vivido na sociedade.
Quanto à natureza jurídica do casamento, a doutrina também não chegou a um ponto
pacífico, uma vez que existem duas correntes distintas no direito pátrio. A primeira corrente
afirma que o casamento é de natureza contratual, tendo entre os seus adeptos o Professor


                                                                                          45
Silvio Rodrigues, que o conceitua como sendo um contrato de direito de família, seguindo
o mesmo raciocínio do ilustre jurista baiano Orlando Gomes.
A segunda corrente afirma que o casamento é uma instituição, tendo entre os seus adeptos a
Professora Maria Helena Diniz e o ilustre jurista paulista Washington de Barros. 16




                                                                                       46
38 DINIZ, MH. Curso de Direito Civil – Direito de Família, p. 65.
39 GOMES, Orlando. Apud DIAS, M.B. Op.cit., p. 60.
A corrente contratualista tem se apoiado no direito canônico, segundo a qual o
consentimento dos nubentes é o fator preponderante na formação do vínculo matrimonial.
Por este motivo, a Igreja entende que o casamento é um contrato. Da mesma forma a escola
jusnaturalista acolheu esta concepção, a qual inspirou várias legislações, inclusive o Código
de Napoleão.
Há doutrinadores que modernamente atribuem ao matrimônio a qualidade de um ato
complexo, de natureza institucional, uma vez que depende da manifestação livre da vontade
dos nubentes, mas que se completa pela celebração, a qual é ato privativo de representante
do Estado.
Para a corrente institucionalista, existem diversos fatores que diferenciam o contrato da
instituição. Nesse passo, a Profª. Maria Helena Diniz38 cita o jurista argentino Guilhermo
Borda, que destacou tais diferenças de forma bastante elucidativa:
a) o contrato é uma especulação (o vendedor procurando o preço mais alto e o comprador o
mais baixo); a instituição é um ´consortium´, onde os interesses são coincidentes; b) o
contrato rege-se pela igualdade; a instituição pela disciplina; c) o contrato é uma relação
que só produz efeitos entre as partes; a instituição impõe deveres tanto para as partes
quanto para terceiros; d) o contrato é uma relação exterior aos contratantes, é um laço
obrigacional; a instituição, uma interiorização; e) o contrato representa uma trégua na
batalha dos direitos individuais, sendo produto da concorrência; a instituição, um corpo
cujo destino é ser compartilhado por seus membros, portanto produto da comunicação; f) o
contrato é precário, desata-se como foi formado, extinguindo-se com o pagamento; a
instituição é feita para durar; g) o contrato é uma relação subjetiva de pessoa a pessoa; as
relações institucionais são objetivas e estatutárias.
Hodiernamente, a doutrina continua tentando determinar a natureza jurídica do matrimônio.
Nesse passo, o Professor Orlando Gomes39, destacou três formas, com as quais se tentou
explicar a natureza jurídica do casamento. A primeira delas, afirma que o casamento teria a
natureza jurídica de um negócio complexo, pois o simples consentimento dos nubentes não
seria suficiente para sua formação, uma vez que também é necessário a intervenção da
autoridade para que o ato se complete.
A segunda forma entende que o casamento é um acordo, pois haveria uma soma de
vontades por parte dos nubentes. Todavia, a grande maioria da doutrina ainda não chegou a
um consenso a respeito do acordo, mas a grande maioria entende que o acordo sempre se
reduz a um contrato. 17




                                                                                          47
Finalmente, a terceira corrente entende que o casamento é um ato-condição, porque as
partes ao consentirem, necessariamente aderem ao estatuto matrimonial, ingressando na
mesma situação jurídica das pessoas casadas, o qual tem que ser aceito sem qualquer
alteração.
Dentre todas as correntes citadas, a corrente contratualista, pela origem do casamento no
direito canônico, que o considerava um contrato e por entender que o casamento forma-se
pelo acordo de vontades, é a mais aceita.
Ao nível internacional, o casamento, na ótica da ONU (art. 16, da Declaração Universal dos
Direitos Humanos), funda-se na perspectiva da distinção de sexos entre os nubentes, na
ausência de limitações raciais, religiosas ou afetas à nacionalidade – sendo garantida a sua
possibilidade de dissolução. Assevera ainda o referido postulado que a validade do
casamento está adstrita à existência de liberdade aos nubentes na sua assunção.
O casamento encontra sua estrutura na união entre homem e mulher, deixando claro, ser o
casamento um instituto incompatível com a união de pessoas do mesmo sexo.
No Brasil de hoje, a conceituação de casamento ainda congrega querelas acerca da
contratualidade ou não do instituto – consideradas relevantes do ponto de vista teórico, mas
na prática, totalmente inócuas – mas não comporta mais a indissolubilidade e não atribui
possibilidade de diferenciação entre os cônjuges e entre as formas de filiação. Sem dúvida
avanços na conceituação da instituição matrimonial.
4.3 CONSEQÜÊNCIAS ORIUNDAS DO CASAMENTO
Uma vez celebrado o casamento, várias conseqüências serão projetadas na vida social dos
nubentes, nas suas relações econômicas, nos deveres a serem cumpridos por ambos, bem
como nas suas relações com seus filhos.
Deste modo, a doutrina divide os efeitos do casamento em três categorias, quais sejam: os
efeitos sociais, os efeitos pessoais e os efeitos patrimoniais. 18




                                                                                         48
Poesias e reflexões sobre amizade, vida e perdão
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Poesias e reflexões sobre amizade, vida e perdão
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  • 1. CAROL RECANTO DAS LETRAS Acrósticos ( 03) Amigos Amigos Multiplicam os sorrisos Iluminam o caminho Grandes mestres a ensinar O valor do carinho e do amor Sem amigos, a vida é como uma casa sem janelas... Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 11/12/2006 Código do texto: T315138 Doce melodia do mundo DOce melodia do mundo REstabelece a alma partida MIlagre criativo do homem FAz a pele arrepiar, o corpo estremecer SOLta as amarras do ser LÁgrimas rolam pelas cascatas do sonho SInal divino da transformação, pela DOce melodia do mundo... Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 03/04/2006 Código do texto: T133015 Poesia Poesia, sensibilidade e emoção desenhada no papel Obra-prima do homem, Deus da palavra Expressando vida, forma mais pura da criação Suaviza os corações dos homens apaixonados Inspira paixões... Abranda a vida *** Sinônimo de poeta, para mim, é Mario Quintana. Foi este velhinho [na época em que o conheci era um velhinho lindo, de cabelos brancos] que me fez amar com tanta força esta arte. Quando era adolescente e me perguntavam quem era meu ídolo, respondia: Mário Quintana [aposto como imaginaram a cara do meu interlocutor... em que banda ele toca?! 1
  • 2. Hahahaha]. Era, sim, meu ídolo, e ainda é, pois foi ele quem me fez chorar pela primeira vez ao ler uma poesia. Foi na morte dele que chorei, pela primeira vez, por alguém que não conhecia pessoalmente, mas que, ao mesmo tempo, tanto conhecia de sua alma. Por isso hoje, no dia da poesia, desejo homenagear este e todos os poetas que sonham, amam, vivem e escrevem a vida. Continuem criando emoções e encantando o mundo com sua arte! Muita sorte! Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 14/03/2006 Código do texto: T123021 CARTAS (02) Perdão! Perdão! Por nunca ter acreditado em nada além da matéria... Por ter ignorado os diversos avisos que os que me amam tentaram, em vão, me alertar. Agora, encaro a verdade, da forma mais infeliz e triste possível, pois um sentimento de impotëncia e destruição invadem meu ser. Tive oportunidade de melhorar tendências e vícios numa encarnação cercada de afeto e amor, os quais, mesmo após meu desencarne, presentes ainda se mostram, e as vibrações plasmam força e acalentam o medo e essa frustração. Hoje, percebo quão afortunada fui e sou. E peço perdão pela cegueira da alma, agradecendo tanto amor e pedindo uma nova chance de burilamento da minha alma e coração. Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 17/12/2006 Código do texto: T321175 Carta de um pai Meu filho, Não vi te tornares homem! Não vi teus primeiros passos, tuas primeiras palavras, teus primeiros machucados... Não pude auxiliar com teus deveres na escola, tampouco pude estender meu ombro quando a vida foi dura e amarga contigo. Não pude expressar o meu amor e nem a vergonha de não ter tido coragem de assumir minhas responsabilidades. Vergonha por não ter sido homem, ser humano, quando chegada a hora de me posicionar... simplesmente parti. Vergonha de não ter sido pai para ti. E o arrependimento mostrou-se a mim todos os dias da minha existência, através de lágrimas e amargura. Hoje, só o que peço, se é que algo me é permitido pedir, é o perdão. Perdão! Por todas as vezes que faltei na tua vida, por todos os sentimentos que não pude demonstrar e também por aqueles que não tive. E quando, finalmente, puderes me perdoar, serás também melhor pessoa, e melhor pai. Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 09/04/2006 Código do texto: T136098 2
  • 3. Carta para meu eu do passado Se você pudesse receber essa carta que lhe escrevo agora, provavelmente ela não existiria... pois você teria vivido plenamente... deixo claro, porém, que não me arrependo do que fiz, somente acho que poderia ter feito mais... Aproveite melhor a sua infância, pois quando crescemos adquirimos, a cada dia, mais e mais responsabilidades, o tempo parece que passa mais ligeiro, a cada dia você terá menos lazer e prazer e muito mais trabalho e problemas. As pessoas não farão amizades tão facilmente quanto as crianças. Será muito mais difícil explicar seus sentimentos e expô- los... quase impossível... Irão taxá-la de idiota se você simplesmente quiser abraçar alguém. Se quiser pedir algo emprestado, deverá dar uma explicação completa. E quando quiser dar sua opinião, não poderá ser espontânea, deverá utilizar máscaras, pois o homem adulto não está preparado para a verdade. A verdade lhe dói mais do que cortes, machucados. E não fazer seus deveres implicará em muito mais do que castigos... Aproveite mais a adolescência, pois rebeldia depois dos 18 não é mais admissível. Namorar vai ficar mais difícil e trará conseqüências insuportáveis se você for intransigente... Aproveite agora para gritar os seus direitos, pois quando virar adulta, haverá muita burocracia, e você acabará tendo que apelar para o tribunal... Aproveite para telefonar para seus amigos, pois quando eles também estiverem grandes como você, ninguém terá mais tempo de falar e contar as novidades ao telefone, mal e mal deixarão uma mensagem enviada por computador. Saia mais, tenha mais amigos, mais namorados, não seja tão tímida – a timidez faz com que você perca preciosas oportunidades de fazer amigos e conhecer pessoas que farão diferença na sua vida. Leia mais livros, pois agora você não tem mais tanto tempo livre para eles, e muitas vezes, saber sobre algum assunto faz falta pra você. Não sonhe tanto com o futuro, viva mais o presente, pois um dia você irá lembrar quantas coisas você poderia ter feito e não fez. Viaje mais e curta mais os lugares por onde passa... Não fique com vergonha de você mesma, pois é mais inteligente do que imagina e tem mais capacidade do que desejava ter... um dia você olhará para trás e verá que sempre conseguiu tudo o que queria. Pense melhor antes de tomar decisões e utilize mais a razão do que o coração. Tenha mais voz ativa quando estiver num relacionamento, pois tem tendência a se anular... É impossível voltar atrás, espero que tenha compreendido meus conselhos, faça mais por você no presente... viva melhor e faça mais do que ter uma simples e ordinária vida. Escrevo esta carta, para lembrar, que é sempre tempo de recomeçar... Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 05/04/2006 Código do texto: T134096 Contos ( 05) 3
  • 4. O Cortejo Sofia acordou feliz... conseguira pular da cama cedo, conforme programado em seu “relógio mental”. Não era sempre que conseguia cumprir sua meta... sua vida era definitivamente “toda torta”, como ela costumava definir, pois tinha uma vida com muitas facetas, era mãe e pai, tinha um emprego em tempo integral em uma repartição pública, fazia trabalhos extras para “engordar” o orçamento apertado, e ainda possuía uma mente muito criativa, que não a deixava parada... fazia com que ela se consumisse criando... escrevendo, principalmente. Por todos esses motivos, quase não dormia, ou dormia muito pouco. Mas hoje seu dia renderia muito, pois acordando no horário, conseguiria aproveitar seus momentos mais preciosos, que eram os passados com sua filha, com seus amigos, ou mesmo fazendo pequenas tarefas do dia, como tomar um banho ou sentir o vento bater em seus cabelos. E o dia começou bem humorado, conforme o estado de espírito do primeiro raio da manhã. Após levar sua filha na escola, foi para a academia, e mal havia começado a andar na esteira, viu passar um cortejo. “Alguém muito importante deve ter falecido”, pensou. Eram carros muito bonitos, com flores e coroas muito caras e coloridas, podia ver que as pessoas dentro dos carros estavam em trajes muito elegantes também. A imaginação de Sofia iniciou uma nova exploração em seus sentidos... começando a ponderar o sentido daquele cortejo... Qual seria o sentido de todas aquelas flores, de toda aquela gente reunida... só pra dizer Adeus? Imaginou o valor de cada coroa de flores, o valor também de cada presença ali, pois pelos carros, poder-se-ia imaginar que eram pessoas muito, muito ocupadas, que provavelmente, não tinham tempo de se reunir em uma ocasião “normal”. E o que Sofia gostaria para seu próprio cortejo? Ela tinha ficado tão absorta em suas elucubrações, que tinha se esquecido de que estava andando na esteira já fazia mais de meia hora. O suor pingava em seu rosto, mas ela nem se detinha a esses meros “expectadores” de seus pensamentos. Nessa orgasmia mental em que se encontrava, perguntas e respostas vieram à sua mente: “Qual é o objetivo em ter meus amigos velando meu corpo a noite inteira, se o que mais quero é tê-los comigo durante minha vida, nas minhas horas de aflição, quando mais preciso de um ombro para chorar, nas minhas horas de vitória, quando preciso de companhia para celebrar, nos momentos de decepção, quando preciso de uma mão amiga e de uma palavra de consolação, quando estiver perdida nos labirintos da vida ou descaminhos, precisando de alguém que me puxe à realidade, quando estiver aflita, alguém que me dê uma notícia, enfim... preciso de amigos para me velarem a vida!” “Qual é o objetivo de ter meus amigos comprando coroas de flores com mensagens bonitas? Quero que meus amigos me mandem mensagens por e-mail, por carta, no Natal, na Páscoa, no meu Aniversário, ou mesmo um recado, só para dizer olá... para lembrarem- me de que tenho amigos próximos, distantes, que mesmo que não estejam presentes no meu dia-a-dia, estão pertos do meu coração. Presentes da minha alma. São relíquias. E ao invés de comprarem coroas de flores, que se esvairão no cemitério, junto aos corpos mortos de tantas idas vidas... plantem em seu jardim, ou num vaso bem à vista, uma flor bem colorida, e todos os dias, ao vê-la ou regá-la, olhe bem pra ela e diga: Essa flor foi plantada pra minha amiga Sofia... assim, ao mesmo tempo em que lembram de mim, é como se me 4
  • 5. mandassem um beijo, no pensamento de um beija-flor.” “Qual o objetivo de deixarem seus trabalhos para saírem em seus carros em um cortejo até o meu enterro? Prefiro, ao invés disso... que ainda em vida, separem um tempo para me ver, visitar-me, ou mesmo combinarmos uma saída alegre, cheia de bate-papo e bebida, para rirmos à vontade, contarmos causos de vida, piadas, falarmos de alheia vida... ou mesmo de nossos problemas, passado e planos para o futuro... o que importa, é estarmos juntos. Pois de que adianta, em meu funeral, olharem meu inerte corpo, já sem vida? Já não serei mais eu, será pedaço de carne, osso e fluidos migrantes... minha alma lá já não mais estará, portanto, meus amigos, aproveitem que cá neste mundo ainda estamos, e vamos nos reunir em cortejo à vida!” “E se um dia, eu vier a deixar este mundo, e numa cova qualquer de algum cemitério estiver meu corpo inerte enterrado, e num dia comum ou especial vocês tiverem a intenção de deixar-me um agrado... primeiro retornem aqui e leiam este recado: „Vá à livraria mais próxima e compre um livro ao seu bem amado. Faça uma dedicatória, colocando nela toda sua alma. Feche-a assim: Um dia, uma poeta escreveu que é preciso amar a vida. Não escreveu nenhuma novidade. A única novidade é que ela colocou em prática o que dizia. Poderás colocar um EU TE AMO também, caso o queiras, pois sempre é muito bom dizer isso a quem amamos...‟” Sofia sorriu, satisfeita. Estava pronto seu réquiem! Olhou para a esteira, havia andado uma hora, sem ao menos perceber... uma poça de suor e de alívio em ver que sabia do que é feita a vida ali resplandecia. Alongou-se, com o corpo em maresia. Um verdadeiro poeta é aquele que vive sua própria poesia, pensou. E a partir daquele dia, sempre que sabe da morte de alguém, conhecido ou desconhecido, compra um livro, e o oferta a alguém que ama. Sempre que sente saudades de alguém que já se foi, telefona para apaziguar a saudade de alguém que ainda está vivo. Pois, para Sofia, a vida é para ser vivida no presente, aproveitando cada momento com as pessoas que ainda fazem parte da nossa existência e dos que se foram, restam as lembranças dos momentos felizes, que os mantêm eternos na memória. Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 26/04/2007 Código do texto: T464480 ------------------------------------------------------------------------------------- Muitas vidas Marco ficou na ponta dos pés. Apesar de estar maior do que no mês anterior (sua mãe vive dizendo que cresce feito batatinha...), não conseguia enxergar através da janelinha da porta. Olhou pra trás, e, como não via ninguém, adentrou o quarto onde seu avô, já muito pálido “pela falta de sol”, como explicava. Estava recostado, lendo. Seu Savassi olhou por cima dos óculos, e foi como se o sol se abrisse num dia nublado... seu sorriso expressou sua alegria ao ver seu neto tão amado. “Já é quase um homem”, pensou. O filho de sua única filha se aproximou e, como sempre fazia desde pequeno, beijou-lhe a testa. A conversa entre eles, apesar da tamanha diferença de idade, fluía. Sempre tinham muito a 5
  • 6. dizer e contar um ao outro. Eram bons amigos. E dessa vez não foi diferente: Marco queria saber como seu avô conhecia tantos lugares e sabia tantas coisas do mundo... Foi então que seu Savassi contou-lhe que, durante muitos anos, vivera em países distantes, conhecendo lugares surpreendentes e línguas e culturas maravilhosas... Sua primeira paixão, a França. Contou-lhe sobre Paris, seu cafés, suas gente. Depois, discorreu sobre o Egito, com suas pirâmides, seus monumentos e toda a história e os mistérios contidos lá. Falou sobre a Inglaterra, a Índia, e muitos outros países com riqueza de detalhes. Mencionou as comidas, os cheiros, as artes, a música, as enebriantes sensações. Em sua imaginação, Marco fez uma rápida viagem, na qual visualizava cada ponto turístico, imaginava as pessoas, os costumes, as diferentes línguas... Estava admirado. Sabia que seu avô tinha muita cultura, mas também sabia da situação financeira da família. Como seu avô poderia ter ido a tantos lugares? Conhecer tantas línguas? Ter experimentado tantas comidas diferentes? E por que nunca lhe contara nada? Nem vovó e mamãe! Por que nunca comentaram nada com ele? Ele precisaria de muitas vidas para tudo isso, concluiu. Vendo o questionamento no olhar de seu neto, Savassi pousou um olhar pensativo no horizonte e, como se estivesse recordando bons momentos, disse-lhe: - Venha cá, meu filho. Quero dar as passagens para que você possa também conhecer tantos lugares. Está naquele canto. Vá até lá e pegue. Marco não pode conter a ansiedade e correu ao local indicado pelo avô, chegando a uma pilha de livros. Os títulos, os mais variados: “Conheça Paris”, “Viaje à Europa sem sair do lugar”, “Mistérios do Taj Mahal”,... Marco compreendeu. Virou-se para seu avô. Queria agradecer-lhe... mas este já havia partido para sua última viagem... Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 17/05/2006 Código do texto: T157981 Um raio de sol Nem sempre temos noção do significado das pequenas coisas da vida. Atos, palavras, pensamentos que transformam o universo. Posturas ante situações que, se pensadas, refletem mais do que gostaríamos de mostrar de nós mesmos... A reflexão que se faz ao caminhar pode ser considerada uma das melhores terapias, verdadeira meditação do dia-a-dia. Ana passava pelas pessoas, pelos lugares, muitas vezes sem os notar, submersa em pensamentos. Mas havia uma pessoa, que ela sempre notava. Um velho, mendigo, sentado no chão, ao lado de sua cadeira de rodas. Tinha um olhar tranqüilo e um meio-riso constante, os quais tornavam seu semblante um tanto curioso. Duas vezes por semana atravessava aquela praça e, ao passar pelo velhinho, sorria. Dava um daqueles seus sorrisos mais bonitos. E ia-se embora. 6
  • 7. Podia chover, que lá estava ele, com a mesma expressão fagueira e amistosa. E, muitas vezes, Ana sentia-se mal por não ter nada a oferecer ao tão sofrido senhor. Certa vez, estava muito apressada e, como um temporal se anunciava, decidiu correr até seu destino... porém, ao passar pela praça, notou a ausência de algo. Parou, olhou ao redor, e notou que aquele bondoso e necessitado senhor não estava ali. Deu de ombros, “deve ter ido se esconder da chuva”, continuou sua corrida. Passou-se uma semana e a ausência dele a inquietava. Após vários dias úmidos e frios, Ana avista-o de longe. Desta vez, além do costumeiro sorriso Ana pergunta-lhe a razão do desaparecimento. Este a responde com outro sorriso e depois completa: “Estava muito adoentado. Pneumonia. Quase não agüentei desta vez. Mas eu tinha uma razão muito forte para melhorar e voltar para cá”. “E qual seria uma razão muito forte para alguém desejar voltar para as ruas, para mendigar?!”, pensou Ana, atônita. E arriscou perguntar: “E que razão foi essa?” “Não poderia morrer sem nunca mais ver o teu sorriso”... Os olhos de Ana encheram-se de lágrimas, e seu coração parecia que ia pular pela boca... “Como um estranho poderia dar tanto valor ao seu sorriso? Como um homem, aparentemente rude e ignorante, poderia ter tamanha sensibilidade?” Às vezes ela se achava meio boba, pois sorria para todos, inclusive desconhecidos... adorava sorrir para as crianças, pois estas, com a inclusão de alguns velhinhos, as únicas a rebaterem com outro. Depois deste dia, Ana nunca mais o viu, mas a memória dele ainda vive em seu coração, principalmente por ter-lhe mostrado o valor de pequenos gestos, como o sorriso, que pode ser o único raio de sol na vida de um ser, que só quer ser humano... Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 28/04/2006 Código do texto: T146716 Ciranda da vida Roberto acordou, sua cabeça doía. Olhou ao redor, buscou o marcador do relógio. Deu um salto! “Meu Deus! Perdi a hora!” Levantou-se, bufando, e entrou no chuveiro de pijamas mesmo. Sabia que não podia demorar mais, tinha uma reunião importante. Cinco minutos, terminou o banho. “Cadê minha toalha?” Chamou sua mulher. Nada. Gritou pela toalha. O silêncio continuava. “Puta merda!” Foi buscar a toalha, batendo os pés e esbravejando. Passou pela cozinha antes de sair, queria tomar um café. Mas... “onde está Marianna? Cadê o cheirinho gostoso de café que emanava pela casa todos os dias? E o pão quentinho recém buscado da padaria?” “Deixa pra lá... estou com pressa”. 7
  • 8. No caminho pro trabalho, lembrou-se de sua vida quando pequeno. Morava no interior, não tinha nada, não era nada. Resolveu tentar a vida na cidade grande. Foi quando conheceu Marianna. Ela apareceu-lhe primeiramente em sonhos. Depois, em carne e osso. Parecia uma visão angelical... suave, serena, inteligente. Tudo o que sempre desejara em uma mulher. Perfeita. Perguntava-se como poderia tê-lo amado à primeira vista... Mas amou. E era sua mulher. Pensava nas artimanhas que criou para mantê-la junto dele. Lembrou-se de todas as vezes que quis dizer-lhe que a amava, que ela era a mulher da sua vida, mas não sabia por quê nunca conseguia. A palavra engasgava. Trancava-lhe a garganta. Por causa disso, plasmou uma barreira em torno de si. Foi aí que começou a perdê-la... Mas ele não sabia disso. Não queria saber. Agora se perguntava por que estaria a pensar nisso. Logo hoje, que estava atrasado. Precisava se concentrar. Afinal, tinha uma reunião importante. Marianna não havia lhe deixado bilhete. “O silêncio dirá tudo, pois no silêncio, cabe tudo. E nada”. Quando voltou pra casa, transtornado pela reunião que não fora muito bem sucedida, pensou nos braços de Marianna, naquele abraço que tirava toda sua inquietação, naquela boca que beijava a sua como se fosse a primeira vez. Mas Marianna não estava lá. Não havia cheiro de janta. Não havia seu perfume no ar. Tampouco suas palavras de amor. O chão continuava manchado da água do banho da manhã. As flores estavam meio desmaiadas pelo calor e abafamento do apartamento. Marianna não estivera ali, constatou. “Será que arrumou um amante”?, perguntou-se. A noite chegava e ele, sem notícias. Telefonou para o celular dela, mas o aparelho estava desligado. Ligou para amigos, nenhuma notícia. Encontrou o número de uma colega de trabalho e teve que sentar para conseguir digerir a notícia: “Marianna pediu demissão ontem pela manhã. Você não sabia?” Roberto nem se despediu. Desligou o telefone e deixou-se ficar inerte, perdido em seus pensamentos. Refez os últimos passos da esposa. Lembrou-se do abraço e do silêncio da noite anterior. “Marianna foi embora. Perdi seu amor, como ela havia me avisado.” Por um momento, Roberto sentiu alívio. Não precisaria mais demonstrar força, poder. Não precisaria mais procurar as fraquezas na mulher para diminuir sua auto-estima. Não precisaria mais buscar motivos para mostrar-lhe que só ele poderia amá-la na vida. Mas os dias se passaram, as roupas acumulavam no banheiro, estava definhando. Porém, do que mais sentia falta era o perfume que Marianna deixava ao passar. Sua inteligência e habilidade em resolver problemas. A forma como ficava brava, com um leve tom róseo em suas bochechas. Sua indignação com a injustiça do mundo. 8
  • 9. Não imaginava quão arrebatador era seu amor por aquela mulher. Tentou buscar apoio nos amigos. Na boemia. Em outras mulheres. Nada preenchia o vazio do seu ser. Já havia perdido vinte quilos. Já havia perdido a noção de tempo. Via Marianna em todas as mulheres, mas também não a via em nenhuma. Entrou em desespero. Como continuaria a levar sua vida agora? Que detalhe havia perdido? Como não havia percebido o que estava a acontecer? Só Marianna sabia a resposta. Deitou-se na cama. Aquela mesma cama onde ainda havia resquícios do cheiro de sua amada. Aquela mesma cama onde dividiram, um dia, um amor incontido, inacabável, insaciável. Esperaria, ali mesmo, a resposta. Mas ela não veio... Em seu enterro, somente o padre e seu cachorro. Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 27/04/2006 Código do texto: T146489 A Desiludida Entrou correndo e se jogou no sofá. Já não podia mais agüentar tanta inquietação em seu coração. “O que posso fazer?”, pensou. Sua mente estava um turbilhão. Não conseguia mais manter a calma... prolongar a decisão não adiantaria mais. Ficou ali, inerte, olhando para o nada. Marianna tinha sonhos. Casou-se pensando que havia encontrado o amor de sua vida. Amar era, para ela, a entrega total e irrestrita da vida, a divisão de sonhos, alimento da alma. Desde pequena sonhara em construir uma família, ter filhos, envelhecer ao lado do homem da sua vida... e agora, via todos seus sonhos desmoronarem e ela nada podia fazer para evitar que acontecesse o inevitável. Como algo tão bonito poderia ter se desgastado tanto? Em que ponto da vida conjugal perderam o respeito mútuo? Esperou que ele chegasse. Deu-lhe um longo abraço. “O último”, pensou. Roberto nem olhou para ela, queria mesmo era se alimentar e dormir. “Porco nojento”. Havia dias em que Beto só lhe dava atenção quando queria sexo, fazia rapidamente o que queria, virava pro lado e dormia. Marianna se irritava. Já não era a mesma. Não se reconhecia como a pessoa doce e suave que sempre fora. Esperou Beto dormir. Pegou suas coisas que já estavam arrumadas em dois sacos de lixo, junto à porta, deu uma última olhada para seu passado. Virou. Respirou fundo. Quando chegou na portaria, viu que o porteiro dormia. “Que bom”, pensou. Não haverá testemunhas. Quando pôs o pé para fora, sentiu um alívio tão grande... parecia que renascia. 9
  • 10. O cheiro da noite adentrou suas narinas, como se fosse o primeiro sopro de vida. Começou a andar apressada, como quem queria recuperar cada segundo de vida perdido. Na rua, não havia viv‟alma. Apenas uns gatos passeavam sobre os telhados das velhas casas desbotadas pelo tempo. Assim se sentia Marianna, desbotada. Descolorida. Sem vida. “Mas isso vai mudar”, um sorriso apareceu em seus lábios. Apertou o passo. Chegou na rodoviária. O próximo ônibus sairia em trinta minutos. “Pra quê escolher o destino? O destino nos escolhe”. Comprou uma passagem, “na janela, para ver a paisagem”. Entrou no ônibus, sem nem ao menos ler o destino daquele velho ônibus, que mais parecia uma carroça velha. Na bagagem, roupas, alguns acessórios e muitos sonhos trancafiados por anos a fio. Apesar do excitamento, estava tão cansada que não conseguiu esperar que o ônibus pegasse a estrada, caiu num sono profundo. Acordou com alguém cutucando seu ombro. “Ei, moça, já chegamos!” Atordoada, Marianna olha ao redor, esfrega os olhos que teimavam não fixar as imagens... Nesse momento, um arrepio percorre cada milímetro do seu corpo. “Mãe!”, grita. “Como você sabia que eu chegaria? Peguei um ônibus qualquer, e...” “Filha! Eu sabia que esse dia chegaria...” “Mas, como?!?” “Desde que fostes embora, venho todos os dias aqui, na esperança de te reencontrar. Já ganhei o apelido de „a Desiludida‟, mas nunca perdi a vontade de esperá-la”. Neste momento, Marianna descobriu que tudo o que precisava, era de um colo de mãe. Que tudo o que uma pessoa precisa, para ser completa, é ser amada por sua família e ter sempre pra onde retornar quando tudo dá errado na vida. Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 25/04/2006 Código do texto: T144775 Crônicas (02) Quando me apaixonei... Um dia, olhei-me no espelho. Há tempos evitava esta afronta ao meu ego. Da mesma forma que passava bem distante da balança. Confrontar-se com o já conhecido era, para mim, uma desnecessidade que só me faria mal. “Para que sofrer além do que já sofro?”, pensava. Havia passado por tempos muitos turbulentos, um casamento que havia terminado de forma muito catastrófica, com minha filha ainda de colo, problemas decorrentes da separação, como falta de dinheiro, desamor e baixa auto-estima, solidão... e como “desgraça pouca é bobagem”, perdi, ao mesmo tempo, os dois empregos que tinha. Resultado: entrei em depressão. E para completar o vazio existencial... comi o mundo. Em pouquíssimo tempo, podia-se comprovar na balança que apesar dos cento e vinte e seis quilogramas, a existência 10
  • 11. de um ser não pode ser completado pela comida, por doces, massas e guloseimas, pois eu continuava deprimida. Foram várias as tentativas para perder peso, todas inúteis. Escondia-me atrás do problema. Na verdade, era cômodo afogar minhas mágoas numa bacia de pipoca. Ao mesmo tempo, não conseguia me controlar, era mais forte do que todo e qualquer esforço que fizesse. Tinha nojo de mim. Sentia vergonha de comer na frente dos outros. Não me sentia feminina ao devorar uma caixa inteira de bombons. Não sentia prazer em comer, pelo contrário, comia por comer, até ver o pacote esvaziado, como que para resolver logo aquilo e pronto. Não sabia comer uma fatia de um bolo, tinha que comê-lo inteiro. Problemas físicos já começavam a aparecer. O pior deles é que já não conseguia controlar minha bexiga por muito tempo. E eu tinha apenas 27 anos! Minhas pernas e pés doíam. Não conseguia dormir, acordava sempre cansada. Ficar sentada era cansativo. Ficar em pé também o era... Saber dizer exatamente o dia em que este processo começou, não sei. O que posso relatar, é que um dia, tomei a decisão de emagrecer e ficar saudável e pronto! Marquei um horário no médico, fiz todas as avaliações e ele me disse que precisava perder, no mínimo, uns trinta quilos. “Ah, tá bom...”, pensei. “Esta será apenas minha primeira meta”. E comecei, a partir daí, como na paixão à primeira vista, a apaixonar-me por mim... Comecei a valorizar cada pedaço de tempo que tenho para viver. A escutar mais música e procurar vivenciar a poesia da letra. A observar mais o céu e suas nuvens ou suas estrelas. A sorrir para crianças e velhos nas ruas, e observar a beleza da diferença entre as pessoas. A prestar atenção na minha filha e nas lições de vida que diariamente ela me ensina. A saber que problemas têm soluções, e foram feitos para nos tornar mais fortes. A saber que as verdades dos outros nem sempre servem para mim, assim como as minhas nem sempre servem para os outros, e que não adianta ficar brava se não acatarem minha vontade. Aprendi que nasci para ser feliz, e que momentos de tristeza são importantes para sabermos valorizar a alegria da vida, do sorriso. E que saudade também é importante, para valorizarmos a presença, o companheirismo. Aprendi que amigos são a família que escolhemos para nós e que se soubermos semear, sempre colheremos frutos maravilhosos do jardim da amizade. Aprendi que existem mais pessoas que torcem por mim do que imaginava... e também, que existem mais pessoas que esperam minha derrota do que imaginava... por isso, preciso ser forte sempre, e saber dosar a ingenuidade da menina com a sabedoria da mulher. Um amigo disse-me, certa vez, referindo-se a um grande sucesso da atualidade: “você, com certeza, utilizou „O Segredo‟ para emagrecer...” “Com certeza foi isso mesmo”, respondi. Pois tudo o que queremos, está ao alcance de nossas mãos, basta querer, com muita vontade, e o mundo conspirará para que você consiga o que quer. Hoje, com 60 kilos a menos, sou quase metade do que era, mas, com certeza, tenho o dobro da capacidade de ser feliz do que tinha quando me apaixonei por mim... E você? Já se apaixonou por si mesmo? O que está esperando?... Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 24/05/2007 Código do texto: T499846 11
  • 12. Meu primeiro amor Amar é uma aventura. E o amor aparece, como bem escreveu Mário Quintana, quando menos se espera e de onde menos se imagina. Foi assim que minha aventura começou, aos 13 anos, quando pela primeira vez me APAIXONEI... Ele era lindo, inteligente, sagaz. Perfeito. Sim, perfeito. Porém, tão inexperiente quanto eu. Primeiro amor tem dessas coisas... principalmente o meu, platônico. E amor platônico, quem já amou sabe, nunca se concretiza. E por não se concretizar, vive perfeito para sempre, pois nunca experimenta os limites e frustrações de uma relação completa. Quando o inesperado aconteceu [quem ama platonicamente nunca espera ser correspondido], realizei o meu mais simples desejo, meu primeiro beijo. Estranho, à primeira vista. Arrebatador e envolvente, como ondas ao alcançar as rochas. Quando percebi que maravilhosa e surpreendentemente, conseguira conquistar meus anseios de aprendiz de mulher, entrei em pânico, me descontrolei, e nesse momento, perdi, deixei ir embora a pessoa que mais queria ao meu lado, meu ídolo, meu herói, meu amado. E a pena que pago [e é perpétua] É tê-lo para sempre e a todo momento No meu coração, no meu pensamento. Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 13/03/2006 Código do texto: T122390 Duetos (10) Sobre fadas e poetas (Dueto: Carol & Rui) Sobre Fadas e Poetas Quando pequena, sonhava ser fada, Que desnudava o mundo concedendo desejos Com sua varinha de condão Hoje, sou poeta Meu condão é minha pena Que pelas linhas fabrica Mundo de utopia e aspiração Ou apenas traduz minh'alma Translúcida e peneirada Pela latitude zero Entre a ponta da esfera E a celulose e o jargão Para muitos, enigmático e inexplicável Este viver bifurcado entre As leis e os versos A razão e a emoção A necessidade e a distração No entanto, Eu só sobrevivo 12
  • 13. Porque faço do meu poetar Verdadeiro ofício A poesia do meu ser É o que me faz, dia após dia Renascer CAROLINE SCHNEIDER ****************** Sim, Poetisa Tua pena encanta E nas linhas escritas A aspiração d'alma trás Bruta, linda, límpida cantata E do centro de ti transpõe Para humanos corações Alma linda de Fada Que a poetisa nos manda Sempre presente, transparente Compreensiva se bifurca Entre nós elas atentamente A todos atende e agrada E e Seu tempo se sente contente Renasce Musa Imortal E com tua poesias encanta Do fundo de tua Alma Todos a quem for dado ler Sublimes linhas traçadas Do Âmago de tão encantador Ser RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 11/02/2008 Código do texto: T854490 Ritual da Marquesa (Dueto: Carol & Rui Ventura) Venda-me os olhos Para desvendar Meus paraísos Prazeres ocultos Acobertados a sete véus Do inculto Loucura, inexatidão Palavras não ditas Malditas... Sensações 13
  • 14. Ata-me as mãos Para suscitar Desejos cálidos Fulminantes anseio De desamarrar-me E sentir com o tato O que sei saber com sabor De desejosos lábios Tapa-me a boca Para abafar Gemidos latentes Ferventes Arrepios gerados Pela sinergia de nossos corpos ardentes Incendeia-me Inflama meu corpo E minh'alma Com o fogo de nossa paixão Sou tua Nua marquesa Vem rematar Esta parte de mim Que crua ... te espera CAROLINE SCHNEIDER ******************** De Olhos vendados Ao paraíso te levo Dos Prazeres ocultos De Marquesa a Rainha Pelos véus te prendo Acontece o indulto. De sensação em sensação Sem palavras encontrar Bendita É essa Paixão Inspirada, Maniatada. Desejos Aflorados Solta-te Sente o contato E Em devaneios 14
  • 15. Entrega teus lábios Experimenta do Amor o sabor De Tua Boca Gemidos ferventes Abafo em torrentes Arrepios gelados Ao calor do Amor Serão transformados Pela sinergia De corpos molhados Incendiei-te E de corpo ardendo Tua Alma adentro E ali o fogo da paixão fomento Sim, és. Nua Marquesa De ti fiz Rainha Nua Crua ardente Sou teu, Serpente RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 11/02/2008 Código do texto: T854483 Prenda-me (Dueto: Carol & Rui Ventura) Prenda-me Se for capaz De seduzir Meu lado lunar Que em fases Troca em metades De negro pra branco Meu sol que pulsa em Lençóis e hiatos Há ecos retumbando Em faróis de meus eclipses E em minhas crateras Há fases nuas Sem luz ou figuras Onde me escondo Entre nuvens escuras Não me vês Apenas sentes O clamor alucinante De meus olhos ardentes Por isso, Não me veneres 15
  • 16. Pois que sou reles Lua com sintoma bipolar CAROLINE SCHNEIDER ****************** Sim. Soltando-A Envolvendo-A Em Teu Querer Deixando que a Lua Seja um começo E as estrelas uma passagem Para uma meta selvagem Onde lençóis em desalinho Te conduzem para o ninho Onde o universo imenso Te deixe em desalinho Senhora de teu Querer Onde luzes e figuras Sombras são de teu Ser E escondida estarás Para quem não entender Que a chama desse Olhar Precisa de respeito, espaço e ar Assim sim te venero Pois de reles nada tens És do universo o ser Que como átomo tens Bipolaridade Também. RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 11/02/2008 Código do texto: T854476 Espero-te // Achei-te (Dueto: Caroline & Rui Ventura) ESPERO-TE Espero-te Como se esperam sonhos bons Na janela Aspiro a cada virada de esquina Encontrar na retina Um calor que um dia Já acalentou corpo meu Mas minha espera é infinda São incontáveis olhadas Pra uma esquina maldita Espera vã, esquisita Se ao menos soubesse razões Da ausência que silencia 16
  • 17. Todos os acordes De nossas músicas [hoje esquecidas] Poderia passar, quem sabe Por ti, como quem passa Por desconhecido Mas tenho esse vício De me entregar Pra amargura Não te perdôo Nem mesmo quando Não restar nem mesmo Manchas das feridas Que hoje inda gritam Abertas, ardidas Vertendo sangue sangrando vida CAROLINE SCHNEIDER ********************* ACHEI-TE Abençoada Janela Às vezes vitral Às vezes Virtual Por onde sem mais nem porque Uma alma do além ( mar) Aparece não exatamente na esquina Mas na melhor das horas na janelinha Assim a espera infinda Fica por uma linha Que nada tenha de maldita E que da esquisita, espera vã As razões da ausência De notas musicais não dedilhadas Estejam finalmente se transformando Em maravilhosas baladas. Sim, poderias passar por mim, Como se um desconhecido fosse Não fossem os Curumins, Seus Anjos e Afins Fazerem com que as esquinas Em retas curtas e lindas Deixassem que nossas vidas Ao calor e aconchego Um ao outro envolvessem Em suas teias Bem ditas E delas levassem p'ra longe Manchas, gritos,feridas E o sangue sagrado da vida. Deixe para sempre de verter 17
  • 18. E na sua real função Demos graças por nos AQUECER. RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 28/01/2008 Código do texto: T836994 Tramas do Destino (Dueto: Carol & Rui Ventura) Em tramas que me arrefecem Compõem minha decomposição Sorriem, debocham da minha anarquia Relutam, sossegam e caem, por fim Vislumbro um fio Que me leva a outro lado Uma sombra, um vazio Que nem sei definir Entre abismo de luz E um vôo arriscado Encontro o caminho Mas me é sonegado saber o destino do pouso Leve-me, vento da madrugada Brinque com meus cabelos Deliciando a árdua jornada Sussurre em minhas orelhas Propostas que me deixem vermelha E diga ao maroto destino Que estou pronta, enfim... CAROLINE SCHNEIDER **************************** Tuas tramas que bem teces Arrefecem, solidificam. Ajudam-te no sorrir, encantam. Fortalecem-se e seguem, por fim Trama tecida Caminho transposto Da sombra ao colorido Agora já bem definido Faz do abismo a Luz E do arriscado vôo Faz do percorrido caminho Uma nova e bela jornada Com destino, pouso e morada. 18
  • 19. Teus belos cabelos ao vento As madrugadas enfeitam Dando graça ao caminhar E em teu ouvido sussurro Propostas há tanto caladas E por Você esperadas Pois estás Pronta, enfim. RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 28/01/2008 Código do texto: T836872 Vou aportar aqui (Dueto: Caroline & Rui Ventura) Vou aportar aqui Trazer meu coração Pra esta ilha Amor não é só desilusão Bem sabes que te quero Mais que a lua Quer o sol Quero sorrisos Abraçar teu olhar E amanhecer Em sol bemol Acordo sem tuas mãos A me enlaçar Teu sustenido Faz-me sair em busca Do teu aconchego Quero ter tua presença Todos os dias junto a mim Mas há um eco E tua música Não chega a meus ouvidos CAROLINE SCHNEIDER Sim, Aporte, Traga seu Coração E com ele os que lhe aprouver Desilusões, Amor supera. Especialmente quando o Querer Ultrapassa grandes dimensões Nos compara ao Astro Rei Alegria Meiguices Deslevos E em teu olhar me envolver Amanhecer em Sol sustenido Um tom acima Em teu corpo cingido 19
  • 20. Acordo por tuas mãos envolvido Onde com candura, Te desejo Bom dia, meu dengo. A minha presença é tua Pois esse foi teu querer E no eco de teus sonhos Música leve e sem enfadonhos Nos envolve de mansinho Pois com jeito, e com carinho Ao porto chegaste e não é sonho. RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 27/01/2008 Código do texto: T835201 Anjo sem fronteiras (Dueto: Caroline & Rui Ventura) És como um sôpro que de uma lufada em meio a temporais de meus desencantos fostes sem o saber designado por uma Mão a delicadamente preencher lacunas do meu viver não conheço teu olhar, teu cheiro de mar toque a acariciar tampouco senti calor esvoaçante de ser alado que se faz presença constante mas transporta-te aqui, no além-mar mesmo que desterrado raízes são postas no coração sonhador que não respeita fronteiras procurando respostas na busca de amar CAROLINE SCHNEIDER De um sopro cheguei E tal como um vendaval Teus desencantos quero encantar E sabendo ou não por qual Mão designado Aqui devo encontrar e parar E com carinho satisfazer As Lacunas de teu Bel viver 20
  • 21. Hoje conheço teu olhar Teu cheiro de leves e variadas fragrâncias O teu acariciar, meigo e manso como Olhar E na continuidade conhecerás, O Calor aconchegante. E a real presença constante. Do Além-mar aqui me transportei Para conhecer Aquela a quem. Fronteiras, a Vida impôs traiçoeira E em seu coração sonhador. Raízes profundas lançar De um Ser que sim. Sabe e quer Amar. RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 25/01/2008 Código do texto: T831918 Dialética (Dueto: Caroline & Rui Ventura) sou pedra que chora sou vidro que estilhaça meu sorriso canta, enxugando lágrimas nos cantos, poças covas rasas de intenso pranto mas inda há brilho no olhar... mesmo que por vezes se apague nos percalços do meu caminhar intenso o frio por falta de afago calor que arrefeça a alma escrevo, calando grito como que alimentando gemido quero colo, quero afeto mas faço-me discreto e, friamente, saio pela tangente e se precisar, bato o martelo ... pois mesmo quando sou fraco faço-me forte assim eu sou nada morno, nada pouco ou tudo ou nada sou Tese sou Antítese e por fim, Síntese CAROLINE SCHNEIDER 21
  • 22. Das pedras o choro seco Aos Vidros trarei a vida Ao sorriso farei eco Às lágrimas a despedida Às poças água Límpida Ao Pranto levo o alento Eterno brilho lhe devolvo A esse Olhar sempre atento Ao seu eterno caminhar Com ternura o frio eu findo Com Carinho aqueço a Alma Escrevo, ouvindo o grito Tirado do fundo d‟alma Com afeto e colo te brindo Embora sempre discreto E Ternamente Jamais te desencanto, E Assim ao mundo grito Quero a Musa deste canto Da fraqueza a força faço Forte sou, pois Sou a pedra, sou o afago E assim com você lado a lado Nada morno atento e com cuidado O calor a cola do “vidro” Que veio para o seu lado Tornar a vida colorida Completa e emoldurada RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 23/01/2008 Código do texto: T829417 Sopro do Mundo (Dueto: Caroline & Rui Ventura) Um sopro do mundo Transmutou Minha tarde vazia Trouxe folhas de lembranças doces Que por instantes Congelaram ciclo Que torna cinzento Dantes colorido quadro De uma vida Ainda sendo pintado Agonizo ao ver cores Perdendo matizes Vendendo-se 22
  • 23. Qual meretrizes Pra uma palheta De cinza e negritude Onde sequer tons pastéis Povoam a arte Goticamente serenam-se Pincéis sob a alma E tecem amargura Em pesado linho esticado em figura Oh, Sopro do Mundo Conceda-me Nova aquarela CAROLINE SCHNEIDER Do Mundo o Sopro Ao que tudo indica Leve Tal Brisa De algures veio morno Aos poucos, Ganha Graça e Colorido E em tardes domingueiras E entrando por noites quase inteiras Cria, de alguma forma. Sua Nova Aquarela Embora não seja como Aquela Deixa cores mais vivas Mais maduras Mais profundas E tem como Finalidade Fixá-las para a Eternidade RUI VENTURA Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 22/01/2008 Código do texto: T827840 Sonhos de Lata Sonhos de lata Tropeçados Por sôfregos pés Procurando caminhos Que levem a novos Destinos Cacos de esperança Estilhaçados Por calejadas mãos Tateando o tempo Em busca de 23
  • 24. Recomeços (Caroline Schneider) Fantasias estanhadas Esbarrando-se Aos sofridos calos Que trilham caminhos À procura de novas Aventuras São pedaços de incerteza Que se quebram Por enrugadas mãos Que apalpam seu destino Na tentativa de achar Uma nova saída (Edson dos Santos) Carol Schneider Publicado no Recanto das Letras em 27/08/2007 Código do texto: T626347 E – Livros ( 05) Pasta NADA É IMPOSSÍVEL PARA QUEM ACREDITA ( PPS) BORBOLETRAS 2 ( PPS) BORBOLETRAS 1 (PPS) ARBITRAGEM INTERNACIONAL INTRODUÇÃO Com o advento da Lei nº 9.307, de 23.09.1996, o Brasil passou a possuir uma nova lei sobre arbitragem, a qual alterou consideravelmente o regime jurídico da mesma no País. Em particular, ao que concerne à arbitragem privada internacional, esta legislação trouxe significativo impacto. Estima-se que cerca de 90% dos contratos internacionais de comércio contêm uma cláusula arbitral.1 Nesse terreno, as lides decorrentes das relações jurídicas são decididas por atribuição a tribunais arbitrais e não aos estatais. Na arbitragem privada às partes é autorizado constituírem um tribunal arbitral e indicarem o(s) árbitro(s) que decidirá(ão) no lugar dos tribunais estatais as suas lides de direito privado. Pela arbitragem privada as partes resolvem submeter suas lides, resultantes de determinadas relações jurídicas de direito privado, a um tribunal arbitral, composto por um árbitro único ou uma maioria deles, designados, em princípio, pelas partes ou por uma entidade por elas indicada. Mediante a instituição de um tribunal arbitral exclui-se a competência dos Juízes estatais para julgar a mesma lide.2 As características inerentes à arbitragem privada são: (a) a ordem jurídica a reconhece como meio de solução de litígios; (b) a sua base é uma convenção de 24
  • 25. arbitragem válida, celebrada pelas partes, prestes a se sujeitar a uma procedimento arbitral, cuja escolha lhes cumpre em primeiro lugar; e os efeitos jurídicos das decisões arbitrais são similares aqueles dos tribunais estatais. Portanto, são passíveis dos efeitos jurídicos da coisa julgada, sendo exeqüíveis, equivalendo-se a uma sentença proferida por tribunal estatal. 1 BERGER, Klaus Peter. Recht der Internationalen Wirtschaft (RIW), p. 12 citado por RECHSTEINER, Beat Walter. Arbitragem Privada Internacional no Brasil, São Paulo, Revista dos Tribunais, p.15. 2 RECHSTEINER, Beat Walter. Op cit, p. 16. 2 3 LENZA, Vítor Barboza. Cortes Arbitrais. Goiânia, AB, 1997, p. 50. A arbitragem traz inúmeras vantagens à solução de controvérsias e litígios, sobretudo em razão da prevalência da autonomia da vontade das partes, da rapidez, da maior especialização do árbitro nas questões levadas à sua apreciação, do menor custo e também da possibilidade do sigilo da questão em debate, preservando-se o nome das pessoas físicas ou jurídicas que acorram a uma Corte de Conciliação e Arbitragem, em face da não publicidade dos atos arbitrais. Este aspecto da confidencialidade é de especial interesse em matéria da órbita comercial, de família ou mesmo trabalhista. Tendo em vista que o árbitro ou a corte arbitral deverá ser escolhido livre e responsavelmente pelas partes, que também modelam a estrutura procedimental a ser utilizada, a arbitragem é um instituto extremamente democrático e legítimo. A autonomia na arbitragem, por sua vez, não se dá somente para as partes, mas para toda a sociedade, que não vê mobilizado o aparato judiciário estatal para solução de controvérsias patrimoniais limitadas a particulares.3 Por outro lado, o árbitro pode ser autorizado pelas partes para proferir a sentença arbitral com base na equidade, ou seja, fora das formas e regras expressas no direito, podendo ainda proferir suas sentenças arbitrais com base no direito positivo nacional ou estrangeiro por equidade, e nos usos e costumes, e também nas práticas internacionais do comércio. Os elementos básicos que levam muitos litigantes a optarem pelo juízo arbitral são a rapidez, a economia e o segredo. HISTÓRICO O processo arbitral tem sua gênese na justiça privada, mais especificamente na vingança, sendo a autodefesa a manifestação natural traduzida como forma primitiva de resolução dos conflitos de interesses, porém indesejada, na medida em que o Estado procurava evitá-la, em homenagem à ordem pública e a paz social. 3 25
  • 26. 4 FURTADO, Paulo. Juízo Arbitral. Salvador, Nova Alvorada Edições Ltda, 1995, p. 47. 5 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado, p. 344 citado por FURTADO, Paulo. Op.cit., p. 49. À autodefesa segue-se a autocomposição, com a substituição da atividade instintiva pela reflexiva, a substituição do egoísmo da autodefesa pela solidariedade social da solução autocompositiva. Segundo o criador do termo (Carnelutti), são tipos genuínos de autocomposição, como formas de resolver o litígio, a desistência, o reconhecimento e a transação. A primeira, como renúncia à pretensão resistida pela parte contrária (unilateral); a segunda, como reconhecimento, pelo atingido, da procedência da pretensão manifestada (unilateral); a terceira, finalmente, como acordo entre as partes (bilateral).4 À autocomposição segue-se o processo, como instrumento apropriado para a solução dos conflitos jurídicos, manuseado pelo Estado, surgindo como o mais moderno e eficaz remédio à prevenção ou resolução dos litígios. Ao buscar-se situar a arbitragem ou o sistema de solução de conflitos através de árbitros, pode-se encontrar sua origem em proposições religiosas, havendo quem atribuísse aos deuses a inspiração. Inicialmente, teria a arbitragem sido empregada não como instrumento de solução das lides intersociais, mas como índice de integração de uma relação jurídica. Esta remanesce no direito material. Porém, de forma diversa, há o juízo arbitral, a atividade judicante do árbitro para dirimir conflitos intersubjetivos. No Direito Grego, poder-se-ia submeter controvérsias a árbitros privados, e alguns tribunais tinham a competência para dirimir conflitos entre cidades gregas, como juízes arbitrais, porém distintos dos chamados árbitros públicos. Em Roma, por sua vez, a justiça dos árbitros era empregada com a eleição feita pelas partes de árbitros privados para que lhe solucionassem as pendências. Pontes de Miranda noticia uma crise no direito privado romano, a braços com a recusa do arbiter em aceitar suas funções. Criaram-se tribunais arbitrais (judicioum privatum), que reclamavam negócio jurídico entre as partes litigantes, pelo qual prometiam submeter ao judex a solução da lide. Uma lista de cidadãos compunha o judicium privatum, e dela se escolhia o arbiter ao qual não se reconhecia o direito à recusa. Sua decisão, caso não a cumprisse espontaneamente o vencido, era chancelada pelo Estado, que a impunha coativamente.5 4 6 CRETELLA JÚNIOR, José. Da arbitragem e seu conceito categorial., p. 137 citado por LENZA, Vítor Barboza, op. cit., p. 52. Na Idade Média havia apelo constante de países em litígio à mediação do Papado, razão pela qual foi fortificado o Juízo Arbitral, originando-se a arbitragem internacional em moldes que se reiteraram na prática, na segunda metade do século XIX. Para por termo ao dissídio entre nações por meios políticos e sem formal rigor, havia mediação ou arbitramento exercidos pelo Papa. Na França, foi a arbitragem estimulada e havia casos em que era obrigatória, logo após a Revolução Francesa. No Brasil, o Regulamento nº 737, de 1850, com base no art. 160 da Constituição do Império, propôs-se a dar forma e desenvolvimento. O Decreto nº 3900, de 1867, aboliu a obrigatoriedade do Juízo Arbitral. Com o advento do Código Civil e a regulamentação do compromisso, impôs-se ao legislador processual federal de 1939 a tarefa de tratá-lo formalmente, nos arts. 1031 e 1046. CONCEITO DE ARBITRAGEM De forma ampla, a arbitragem é uma técnica para a solução de controvérsias através de intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes das partes para a solução de uma controvérsia privada, decidindo com base nesta convenção, sem 26
  • 27. intervenção do Estado, sendo a decisão destinada a assumir eficácia de sentença judicial. Para Cretella Júnior, a arbitragem é sistema especial de julgamento, com procedimento técnico e princípios informativos próprios e com força executória reconhecida pelo direito comum, mas a este subtraído, mediante o qual duas ou mais pessoas físicas, ou jurídicas, de direito privado ou de direito público, em conflito de interesses escolhem de comum acordo, contratualmente, uma terceira pessoa, o árbitro, a quem confiam o papel de resolver-lhes a pendência, anuindo os litigantes em aceitar a decisão proferida.6 5 7 BIAMONTI, Luigi. Arbitrato – diritto processale civile , p. 904 citado por LENZA, Vítor Barboza, op. cit., p. 53. São duas as características básicas da arbitragem nacional: a incidência, para todo o fenômeno, unitariamente percebido, das leis de um único sistema jurídico, e a inexistência de conflitos de jurisdição interna ou internacional para a obtenção de exequatur do laudo para eventual obtenção de medidas cautelares. A arbitragem internacional, por sua vez, envolve fenômeno diferente, o desaparecimento, segundo o qual cada elemento da arbitragem, (capacidade das partes, competência dos árbitros, arbitrabilidade do litígio, procedimento arbitral, lei material aplicável à solução do litígio, etc), seria regido por uma lei diferente. NATUREZA JURÍDICA Quanto à natureza jurídica, a arbitragem é um equivalente jurisdicional, equivalendo e substituindo a jurisdição. O COMPROMISSO ARBITRAL O compromisso arbitral pode ser definido como sendo “um contrato de direito privado estipulado como fim de produzir entre as partes efeitos processuais, obrigando-as a subtrair à competência da autoridade judiciária ordinária o conhecimento da controvérsia considerada no compromisso, passando tal competência à esfera do juízo arbitral.”7 Dispõe o art. 9º da Lei 9.307/96: “O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial.” Configura-se o compromisso arbitral, por sua natureza jurídica, negócio jurídico, enquanto se trata de externar a vontade lícita, voltada para a consecução de 6 8 FURTADO, Paulo. Juízo Arbitral. Salvador: Nova Alvorada Edições, 1995. um fim, desejado pelas pares e produtos da vontade da lei, a qual tutela a emissão volitiva. O compromisso arbitral constitui negócio jurídico plurilateral, assim como o contrato de sociedade, concluído por não ser antagônica a vontade dos compromitentes, ao contrário, dirigidas para o mesmo sentido, qual seja, o de submeter suas contendas à decisão de um ou mais árbitros. Assinala-se, no compromisso, não apenas uma relação jurídica entre as partes, ou seja, não apenas um negócio jurídico entre as partes, mas igualmente um negócio jurídico arbitral, isto é, uma relação jurídica entre os compromitentes e o árbitro, relação à qual se vincula este com a aceitação.8 O ÁRBITRO O árbitro é pessoa natural, tecnicamente preparada e qualificada que, sem estar investida na magistratura estatal, é juiz de direito e de fato e é escolhido por duas ou 27
  • 28. mais pessoas, quer físicas ou jurídicas, sempre em número ímpar, para dirimir controvérsias entre elas, proferindo sentença arbitral de mérito com força de título executivo. São equiparados, no exercício de suas funções ou em decorrência delas, aos funcionários públicos, para os efeitos penais, e aos magistrados, para as exceções de impedimentos e suspeição dos artigos 134 e 135 do CPC. São os árbitros judices compromissarii ou compromisarius, visto que pelo compromisso recebem eles o arbítrio. Julgam como se fossem juízes togados e sua decisão, chancelada pelo juiz togado, tem força executória. Tem o árbitro ampla liberdade para determinar as provas que reputar necessárias ao esclarecimento da verdade, para apreciá-las e dar especial valor às regras de experiência comum ou técnica. O árbitro poderá adotar em cada caso a decisão que julgar mais justa e prudente, com o fim de atender ao fim social que a Lei quer, bem como as 7 28
  • 29. exigências do bem comum. Além disso, poderá ele decidir por equidade, ou seja, mesmo não havendo preceito que o autorize a decidir determinada pendência, poderá agir como se fora legislador, desde que atenda às exigências do bem comum. CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM A convenção de arbitragem juridicamente válida, é o elemento indispensável para a instituição de um tribunal arbitral e sua competência no julgamento de uma lide. Ao se referir à lide futura, decorrente de determinada relação jurídica entre duas partes, mormente de natureza contratual, a convenção de arbitragem é denominada cláusula compromissória, ou cláusula arbitral. Em contrapartida, se estiver relacionada à lide já existente, costuma-se falar em compromisso arbitral. A convenção é juridicamente autônoma perante o acordo principal estabelecido pelas partes. Sua validade é reconhecida pelo tribunal arbitral, bem como a competência para julgar a lide sujeita à sua apreciação jurídica. Deve a convenção de arbitragem preencher requisitos formais e materiais predeterminados, para que o tribunal arbitral firme sua competência quanto as lides suscetíveis de arbitragem. A questão de determinar quais são as lides suscetíveis à arbitragem internacional é de fundamental importância na prática, pois, se tal não for o caso, de acordo com a legislação na sede do tribunal arbitral, a convenção de arbitragem será nula. Conforme a Convenção de Nova Iorque de 1958 sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, nenhum pais signatário é obrigado a reconhecer e executar um laudo arbitral estrangeiro quando a lide não for suscetível à arbitragem, conforme a legislação do país onde o laudo deva ser executado. 8 29
  • 30. Se porém a lide em que se fundamenta o laudo estrangeiro for de fato suscetível à arbitragem, esta deverá ser examinada de ofício pelo juiz ou tribunal que decidirá sobre seu reconhecimento. COMPETÊNCIA Atualmente, na prática da arbitragem internacional, é quase pacífico cumprir ao próprio tribunal arbitral decidir quanto à sua competência perante a lide submetida à sua apreciação. No mesmo sentido o artigo 8º, §1°, da Lei 9.307/96, onde dispõe: “Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.” Por outro lado, a mesma lei ordena à parte que pretender argüir questões relativas à competência, bem como a nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver para se manifestar, após a instituição da arbitragem. A competência do tribunal arbitral estará fixada se a lide a ser decidida for suscetível à arbitragem, se a convenção de arbitragem for juridicamente válida, levando em consideração todos seus aspectos formais e materiais; sendo as partes capazes para celebrar uma convenção de arbitragem, se ambas as partes possuírem a capacidade para ser parte em relação à lide submetida a arbitragem ou efetivamente ali são partes e se a lide não se situar fora dos limites da convenção de arbitragem. Na doutrina internacional parece estar assentado que a questão quanto a determinar quando uma lide é suscetível à arbitragem, deverá ser examinada sempre de ofício pelo tribunal arbitral. Caso o próprio tribunal arbitral decida quanto a sua incompetência, prevê a Lei 9.307/96, que as partes sejam remetidas ao órgão do poder judiciário competente para julgar a causa (art. 20, §1°). 9 30
  • 31. O juiz estatal possui plena cognição quando do exame da validade da convenção de arbitragem, independentemente de onde está localizada a sede do tribunal arbitral, independentemente de onde está localizada a sede do tribunal arbitral já ou ainda a ser constituída, caso o réu, preliminarmente, alegue a incompetência do juiz estatal pela razão da existência de uma convenção de arbitragem entre as partes. PROCEDIMENTO ARBITRAL O principal objetivo é a solução de conflitos de direito patrimoniais ou pessoas disponíveis. O juízo arbitral é aplicável a esses direitos. O procedimento a ser adotado pelo árbitro ou pelo tribunal arbitral é fixado pelos próprios compromitentes, que estabelecem as regras arbitrais, dentro da flexibilidade procedimental facultada pela Lei de Arbitragem, ou adotam o regulamento de algum órgão arbitral institucional. O juízo arbitral tem início com a assinatura, pelas partes, da cláusula compromissória ou do compromisso arbitral. É considerada instituída a arbitragem quando é aceita a nomeação pelo árbitro, se for único, ou por todos eles, se forem vários (tribunal arbitral). VANTAGENS DA ARBITRAGEM A arbitragem traz inúmeras vantagens à solução de controvérsias e litígios em comparação com a justiça estatal, sobretudo em razão da prevalência da autonomia de vontade das partes, da rapidez, da maior especialização do árbitro nas questões levadas à sua apreciação, do menor custo e também da possibilidade do sigilo da questão em debate, preservando-se o nome das pessoas físicas ou jurídicas que acorram a uma Corte de Conciliação e Arbitragem, em face da não publicidade 10 31
  • 32. dos atos arbitrais. Este aspecto é de especial interesse em matéria de órbita comercial, de família e trabalhista. Tendo em vista que o árbitro ou a corte arbitral deverá ser escolhido livre e responsavelmente pelas partes, que também modelam a estrutura procedimental a ser utilizada, a arbitragem é um instituto extremamente democrático e legítimo. A autonomia na arbitragem não se dá somente pelas partes, mas para toda a sociedade, que não vê mobilizado o aparato judiciário estatal para solução de controvérsias patrimoniais limitadas a particulares. CONCLUSÃO Arbitragem é, portanto, um sistema especial de julgamento, com procedimento, técnica e princípios informativos próprios e com força executória reconhecida pelo direito comum, mas a este subtraído, mediante o qual duas ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado ou de direito público, em conflito de interesses, escolhem de comum acordo, contratualmente, uma terceira pessoa, o árbitro, a quem confiam o papel de resolver-lhes a pendência, anuindo os litigantes em aceitar a decisão proferida. UNIÃO HOMOAFETIVA INTRODUÇÃO A humanidade neste início de milênio vive momentos de profundas transformações científicas, tecnológicas, sociais e de costumes; guerras, atos de terrorismo, atentados, crimes hediondos, violência contra seres humanos: velhos, crianças e mulheres indefesos, torturas, seqüestros e ausência total de solidariedade transformam esse mundo em verdadeiro caos. Nesse contexto fascinante e paradoxal, as questões sociais e o relacionamento das pessoas tornam a sociedade mais vulnerável, exigindo dela soluções imediatas e solicitando do legislador mais que mero expediente legislativo na elaboração jurídica, porque o direito é a amostra de comportamento que traduz a consciência social de um povo e de uma era, devendo andar de mãos dadas com a justiça social, em harmonia com as novas realidades que despontam, para não se apartar de vez do ser humano e fenecer solitário. O direito, ao longo da história, sempre esteve, e ainda está, em constante evolução, deparando-se em diversas ocasiões com temas que causam controvérsia, mas que exigem sempre a atenção do legislador, por dizer respeito a uma maioria da sociedade, ou por grupos minoritários. Necessita-se, para tanto, que haja evolução legislativa no sentido de normatizar o direito daqueles que necessitam proteção de sua vida privada e intimidade, para que se resguarde o direito a opções de esfera privada, no que tange à escolha da pessoa com a qual se deseja compartilhar afetos e sentimentos, bem como se o que se deseja é estar só. Decisões estas, porém, enfraquecidas e ameaçadas pelo modo de vida contemporâneo, onde aquele que deseja ser autônomo, ter pensamento livre e original, sente-se isolado na multidão e incapaz de relacionar-se com as pessoas. O tema ora desenvolvido, qual seja, a união homossexual, possui proposta regulamentadora através do Projeto de Lei nº 1.151, de 1995, de autoria da Deputada Marta Suplicy, o qual vem ao encontro de uma realidade fenomenológica que não é 2 32
  • 33. despercebida pelos operadores do direito, estabelecendo parâmetros para uma situação de fato já existente não apenas na sociedade brasileira como no mundo inteiro. A criação desse novo instituto legal é plenamente compatível com o nosso ordenamento jurídico, tanto no que se refere a seus aspectos formais quanto de conteúdo. O rol de direitos humanos inseridos em nossa Constituição revela implicações evidentes entre a livre expressão da sexualidade por parte dos homossexuais e o princípio da dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos e base da República Federativa do Brasil, devendo-se inclusive mencionar o direito à intimidade e à vida privada, da liberdade de expressão, do direito de livre associação, da liberdade de opinião, de manifestação e de seus corolários de liberdade de informação e de imprensa; todos sob o manto cardeal do princípio da igualdade, presentes não só nos direitos fundamentais do artigo 5º da Carta Maior, como enunciados nos princípios fundamentais, quando elencam como objetivos fundamentais da República, constitucionalmente garantidos “de construir uma sociedade livre, justa e solidária e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3º, inciso IV, CF). O Poder Judiciário tem mostrado crescente compromisso e convicção de que as leis devem assegurar direitos e possibilitar uma vida digna para todos os cidadãos. Devido a isso, a parceria civil tem sido acolhida pela doutrina e jurisprudência como sociedade de fato, com repercussões jurídicas que alcançam conseqüências de natureza previdenciária e patrimonial, estando a exigir, por isso, uma moldura jurídica precisa e consistente. O que a comunidade homossexual reivindica não são privilégios; a equiparação de suas relações com a dos casais heterossexuais é um direito devido àqueles que são taxados exatamente da mesma forma. Heterossexuais e homossexuais possuem as mesmas obrigações, mas não vêm usufruindo os mesmos benefícios. Em vista disso, fica demonstrado que o Projeto da Parceria Civil Registrada não busca ferir a moral ou os bons costumes, e sim, clama a direitos constitucionais, que com a evolução da 3 33
  • 34. sociedade fazem-se necessários que se adaptem e se consolidem, para que não haja ninguém excluído da proteção jurídica. 4 34
  • 35. I – HOMOSSEXUALIDADE 1 PANORAMA HISTÓRICO Na história da humanidade, as relações homossexuais eram praticadas entre diversos povos selvagens, bem como em antigas civilizações, conhecida e praticada por romanos, egípcios, gregos e assírios, sendo, pois, “uma realidade que sempre existiu, e em toda parte, desde as origens da história humana é diversamente interpretada e explicada, mas, apesar de não a admitir, nenhuma sociedade jamais a ignorou.”1 A prática homossexual era aceita na Antigüidade Clássica, porém com certas restrições à sua externalidade. Na Grécia antiga, o exercício livre da sexualidade fazia parte da rotina de reis, deuses e heróis, e era tida como "verdadeiro privilégio dos bem nascidos"2, sendo que “Os gregos atribuíam à homossexualidade características como a intelectualidade, estética corporal e ética comportamental, sendo que muitos a consideravam mais nobre que o relacionamento heterossexual.”3 A dupla sexualidade estava inserta no contexto social, e a heterossexualidade considerada de certa forma, como uma preferência inferior apenas com o objetivo de procriação. O homossexualismo, então, não era tido como "degradação moral, acidente ou vício",4 retratado pelo fato de que “em suas olimpíadas, os atletas competiam nus, exibindo sua beleza física, e vedada era a presença das mulheres na arena por não terem capacidade para apreciar o belo. Também nas representações teatrais, os papéis 1 DIAS, Maria Berenice. Uniões Homossexuais – O Preconceito e a Justiça, p.27 2 SOUZA, Ivone Coelho de. Homossexualismo: discussões jurídicas e psicológicas, apud DIAS, M.B. Op. cit., 2001, p. 28. 3 CORREIA, Jadson Dias. União Civil entre pessoas do mesmo sexo (Projeto de Lei 1151/95). Disponível em http:www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=554, acesso em 04 de janeiro de 2002 4 BLEICHMAR, Silvia. Pontualizações para uma teoria psicanalítica da homossexualidade, apud DIAS, M.B., Op. cit, p. 28. 5 35
  • 36. femininos eram desempenhados por homens travestidos ou mediante o uso de máscaras. Por certo, manifestações homossexuais.”5 5 DIAS, M.B. Op. cit., p. 28. 6 SOUZA, I.C. Op. cit., apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 29. 7 MORICI, Silvia. Homossexualidade, apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 30. 36
  • 37. 8 Ibid., p.30. A prática homossexual constituía um rito sexual iniciatório aos adolescentes (efebos) e era obrigação do preceptado "servir de mulher" ao seu preceptor, pois, para eles, heroísmo e nobreza eram transmitidos através do esperma. Em Roma, "o homossexualismo era visto como de procedência natural, ou seja, no mesmo nível das relações entre casais, entre amantes ou de senhor e escravo.”6 Ocorria um tipo de preconceito, porém relacionado da "associação popular entre passividade sexual e impotência política. A censura recaía somente no caráter passivo da relação, na medida em que implicava debilidade de caráter."7 Clara se fazia a relação entre “masculinidade – poder político” e “feminilidade – carência de poder”, em vista que desempenhavam o papel passivo rapazes, mulheres e escravos, ou seja, aqueles excluídos da estrutura de poder.8 O preconceito maior em relação ao homossexualismo provém das religiões. Na concepção filosófica natural de São Tomás de Aquino, o sexo justificava-se como instrumento de procriação, com o escopo de preservação do grupo étnico, ocupação dos vazios geográficos e reposição da humanidade, cuja expectativa de vida era de 30 anos aproximadamente. A Igreja Católica tem o homossexualismo como transgressão à ordem natural, aberração da natureza, uma verdadeira perversão. Em sua historia, na Santa Inquisição, asseverou-se a penalização pela prática homossexual, pois a sodomia era tida como o maior dos crimes. Em 1179, o III Concílio de Latrão, tornou crime a pratica homossexual. Legislações dos séculos XII e XIII penalizavam a sodomia, tendo o primeiro código ocidental prescrito pena de morte à sua prática. Segundo historiadores, a homossexualidade floresceu nos mosteiros e acampamentos militares da Idade Média, quando paralelamente, a união heterossexual foi sacramentada. “O Papa João Paulo II recentemente, na Encíclica Fides et Ratio, 6 37
  • 38. 9 DIAS, M.B. Op. cit., p. 32. 10 Ibid., p. 33. 11 Id. 12 CZAJKOWSKI, Rainer. União Livre: à luz das Leis 8971/94 e 9278/96, 1997, p. 170 13 Idéia não tão nova, pois em Roma, no dia 25 de abril, celebrava-se o dia do mancebo prostituto, cf. SOUZA, I.C. Op. cit., Apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 34. 14 DIAS, M.B. Op. cit., p. 34 reiterou que a Igreja só aprova as relações heterossexuais dentro do matrimônio, classificando a contracepção, o amor livre e a homossexualidade como condutas moralmente inaceitáveis, que distorcem o profundo significado da sexualidade.”9 Após a metade do século XX, mudanças sociais levaram ao surgimento de uma sociedade menos homofóbica."10 Isto ocorreu, pois houve um distanciamento entre Igreja e Estado, este obtendo mais liberdade e menos influência daquela, pois ao romper os laços que o ligavam àquela, cessou o "condicionamento a uma estrita obediência às normas ditadas pela religião, em que a apenação pelo descumprimento dos dogmas de fé estava sujeita à ira divina, eterna e implacável.”11 O reflexo do declínio influencial da Igreja foi a dessacralização do casamento, com o surgimento de novas estruturas de convívio, passando a haver maior valorização do afeto, e a "orientação sexual começou a se caracterizar como uma opção e não como um ilícito ou uma culpa."12 Desde fins dos anos 60, tem havido um aumento da visibilidade das opções sexuais dos indivíduos, por ter diminuído o sentimento de culpa que pesa sobre eles. Os chamados movimentos gays têm aumentado seus adeptos, com o objetivo de dar transparência ao fenômeno. “Em 28 de junho de 1969, em Nova Iorque, eclodiu uma rebelião de travestis denominada "Motim de Stonewall" em Grenwich Village. Ocorreram protestos e brigas entre homossexuais e a polícia durante uma semana, ensejando a institucionalização dessa data como o Dia do Orgulho Gay.”13 O movimento gay brasileiro "passou a considerar como seu insight mais importante a constatação de que muito mais prejudicial do que a homossexualidade em si é o avassalador estigma social de que são alvo gays, lésbicas e travestis."14 Trata-se de indivíduos que, "se experimentaram alguma forma de sofrimento, é originado pela intolerância e injustificado preconceito social."15 7 38
  • 39. 15 MESQUITA, Rogério. Questionamentos Sobre o Projeto de Lei da Parceria Civil Registrada. Tese de Conclusão do Curso de Pós-Graduação em Psicologia do Centro Universitário La Salle, 1997. Apud. DIAS, M.B. Op. cit., p. 34. 16 Reflexões em torno da história da homossexualidade In: MORICI, S. Op. cit., apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 35. 17 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, 2001, p.400. 18 SILVA, D.P.. Op. cit., p. 400 19 GOMES, Hélio. Medicina Legal. 1997, p. 714. Atualmente, para Philippe Ariès, “os homossexuais formam um grupo coerente, ainda marginal, mas que tomou consciência de sua própria identidade, um grupo que reivindica seus direitos contra uma sociedade dominante que ainda não o aceita.”16 2 CONCEITO E ESPÉCIES DE HOMOSSEXUALISMO O vocábulo "homossexualidade" foi criado e introduzido na literatura técnica em 1869, pela médica húngara Karoly Benkert. Etimologicamente, a palavra homossexual é formada pela junção de dois vocábulos, "homo" e "sexu". Homo, provém do grego "homos", o qual significa semelhante, e o vocábulo sexual vem do latim "sexu", que é o relativo ou pertencente ao sexo. A junção dos dois vocábulos significa "sexualidade semelhante", ou seja, a prática sexual entre pessoas do mesmo sexo. Segundo a definição encontrada no Vocabulário Jurídico de De Plácido e Silva, "entende-se homossexual toda pessoa que procura prazeres carnais com pessoas do mesmo sexo".17 Tem-se também, na mesma obra, a homossexualidade como "comércio carnal ou prática de atos sexuais entre indivíduos do mesmo sexo. É a inversão sexual, em que o homem serve de mulher para satisfazer a lascívia de outro homem, ou a mulher maneja como homem para provocar o orgasmo em outra mulher e em si própria. Inversão sexual."18 A Medicina Legal define o homossexualismo como "indicativo de anormalidade do instinto sexual do indivíduo em virtude do que somente tem inclinação sexual ou amorosa para indivíduos de seu próprio sexo, muitas vezes com repugnância ou aversão aos seres do sexo oposto."19 Há ainda a divisão entre homossexualismo feminino e masculino. 8 20 CORREIA, J.D. Op. cit., p. 4. O homossexualismo masculino, isto é, a satisfação carnal de homem com homem, pode ser chamada de pederastia, sodomia ou uranismo. Há pederastia quando o prazer sexual se realiza pelo coito anal de um homem com uma criança ou menino. Sodomia é a prática sexual entre homens, já adultos. Já o uranismo, segundo Ulrichs, é a prática sexual entre homens, por falta de mulher. Com relação à homossexualidade feminina, o coito se realiza por meio de várias práticas que possam provocar o orgasmo, utilizam-se os vocábulos safismo, tribadismo ou lesbianismo: A palavra lesbianismo deriva de Lesbos, ilha onde antigamente vivia um grupo de mulheres homossexuais chefiadas pela poetisa Safo. As tribadistas atritam os órgãos sexuais em práticas reciprocas. Já as safistas ou lésbicas, praticam a sucção do clitóris, alternativamente, ou se masturbavam reciprocamente.20 3 ASPECTOS 3.1 NA MEDICINA 39
  • 40. Na Idade Média, a homossexualidade foi considerada uma doença que acarretava diminuição das faculdades mentais, uma enfermidade decorrente de contagioso e genético defeito. A Medicina pesquisou por longo tempo os hormônios, o aparelho genital, o sistema nervoso central, não encontrando, porém, nada que diferenciasse hetero e homossexuais. A partir de 1985, o Conselho Federal de Medicina, tornou sem efeito o código 302 da “Classificação Internacional de Doenças” (CID), não mais considerando o homossexualismo como um desvio ou transtorno sexual. Em decorrência do abandono da idéia de ver a homossexualidade como doença, dispõe Maria Berenice Dias que 9 40
  • 41. 21 DIAS, M.B. Op. cit., p. 43. 22 DIAS, M.B. Op. cit., p. 43. 23 Id. 24 Ibid., p. 44. “passou ela a ser encarada como uma forma de ser diferente da maioria, diferenciando-se apenas no relacionamento amoroso e sexual.”21 Em 1993, a Organização Mundial de Saúde inseriu-a no capítulo “Dos Sintomas Decorrentes de Circunstâncias Psicossociais”. Na 10ª revisão do CID-10, em 1995, foi nominada de “Transtornos da Preferência Sexual” (F65). O sufixo ismo, que designa doença, foi substituído pelo sufixo dade, que significa modo de ser. 3.2 NA GENÉTICA Recentes pesquisas científicas realizadas nos Estados Unidos, buscam origem genética das manifestações patológicas e comportamentais. Têm elas escopo de demonstrar a existência de genéticas causas, com hereditárias características biológicas, não sendo, no entanto, fruto do ambiente social e afetivo. Feita uma pesquisa entre gêmeos, bem como entre irmãos adotivos – sendo um deles homossexual – , foi constatado que, entre os gêmeos univitelinos (os que tem características genéticas idênticas), 52% dos irmãos também eram homossexuais. Entre os gêmeos bivitelinicos (geneticamente distintos), a identidade caiu para 22%. Já com irmãos adotivos, o número foi para 11%, a evidenciar que a coincidência de comportamentos decorre também da influência do ambiente familiar.22 Afirma Michael Baily, professor de psicologia da Universidade de Evanston, em reportagem publicada na revista VEJA (25.12.91), que em 30 a 70% dos casos de homossexualidade, esta decorre não apenas do meio no qual as pessoas são criadas, mas principalmente de fatores genéticos23. Simon Le-Vay, neurocientista, identificou que o hipotálamo das pessoas com tendências homossexuais possui metade do tamanho do hipotálamo dos heterossexuais, similar em dimensão ao das mulheres24. Sandra Witelson, psiquiatra canadense, analisou o cérebro de 10 heterossexuais e 11 homossexuais utilizando técnicas de ressonância magnética. Concluiu a 10 41
  • 42. 25 Id. 26 Id. 27 GRAÑA, Roberto B. Além do desvio sexual. Apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 47. 28 GRAÑA, R.B. Op.cit., Apud DIAS, M.B. Op. cit., p. 47. 29 Apud DIAS, M.B. Op.cit., p. 47. 30 Resolução 1/99, do Conselho Federal de Psicologia pesquisadora que a região cerebral ligada à habilidade verbal e motora (corpo caloso) é maior nos homossexuais25. Um estudo da Universidade de Ontário no Canadá, revelou que homossexuais possuem impressões digitais com características mais aproximadas do padrão microestriado feminino, integrando, por dedução, a estrutura biológica da pessoa.26 3.3 NA PSICOLOGIA Na área da Psicologia, elucida Roberto Graña27: Todos os desvios sexuais são, em qualquer idade e essencialmente, desvios sexuais infantis. A identidade sexual e as anomalias evolutivas são fruto de determinismo psíquico primitivo, que tem origem nas relações parentais desde a concepção até os três ou quatro anos de idade. Nessa época, constitui-se o núcleo da identidade sexual na personalidade do indivíduo, ou seja, firma-se o entendimento interior de ser masculino ou feminino que irá determinar sua orientação sexual. Aduz o psicólogo que a força psicológica formativa vem de modelo que decorre da interação da criança preferencialmente com a figura dos genitores. O psicólogo norte-americano Money, afirma que, independentemente do sexo cromossômico ou da aparência dos órgãos genitais, é o estabelecimento de identidade de gênero primeiramente feito pelo ambiente.28 Já Henry Ey trata o homossexualismo como desvio do impulso sexual, obtido através de fracasso do aparecimento edipiano, podendo advir de fatores acidentais, constitucionais ou características das personalidades dos pais29. Para se evitar o preconceito por meio de práticas terapêuticas para curar homossexuais, o Conselho Federal de Psicologia, baixou a R1/99, em 23.03.1999, orientando os profissionais desta área em como proceder.30 11 31 COLOGNESE Jr, Armando. Reflexões Psicanalíticas sobre o Homossexualismo. Disponível em http//www.boasaude.com/lib/ShowDoc.cfm?LibDocID=3757&ReturnCatID=1781 em 04 de janeiro de 2002. 3.4 NA PSICANÁLISE O estudo da sexualidade, para a psicanálise, tem sentido apenas quando envolve a compreensão do psiquismo de uma pessoa, suas identificações, a formação da pessoa como sujeito de uma cultura, o comportamento de um modo geral. Não existe a sexualidade dissociada da pessoa como um todo, não é algo instintivo, herdado, rígido ou fixo dentro de uma mesma espécie. É ela um componente de nossas vidas. A identidade sexual é desenvolvida pelo ser humano, assim como a identidade profissional, de adulto, da maturidade, de filho, pai, e mãe. Já a sexualidade é algo inerente ao prazer, e tudo o que é ligado ao prazer é de caráter sexual para a psicanálise. Quando existe especificamente uma homossexualidade, deve-se compreender como sendo uma forma que a pessoa encontra para se expressar, relacionar-se e expor-se como tal. 42
  • 43. Na teoria psicanalítica, uma pessoa que apresente um psiquismo homossexual, está buscando esquivar-se das diferenças; são pessoas extremamente sensíveis a choques de opinião e comumente tiveram que lidar com questões radicais, posições incoerentes e contraditórias constantemente durante a infância, principalmente de seus educadores. Buscam através da igualdade se livrar de se sentir pressionados diante das diferenças e do diferente. Não precisam necessariamente estar ligados a parceiros do mesmo sexo. É o que a psicanálise chama de componente narcísico da personalidade, portanto, podem procurar parceiros para relacionamentos íntimos, tanto quanto comerciais, sociais e pessoais. A homossexualidade, segundo o Dr. Armando Colognese Júnior, docente do Curso de Formação em Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, é uma opção tanto quanto o é a heterossexualidade, uma vez que “a identidade forma-se ao longo da vida e sua base mais forte está calcada nos primeiros seis anos de vida.”31 12 32 ASSIS, Reinaldo Mendes de. União entre homossexuais: aspectos gerais e patrimoniais. Disponível em http:www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3432, em 04 de janeiro de 2002. II – REFLEXÕES JURÍDICAS 4 O CASAMENTO E SUAS CONSEQÜÊNCIAS JURÍDICAS 4.1 ORIGENS E EVOLUÇÃO HISTÓRICA Desde os tempos mais remotos, busca o ser humano encontrar companhia para com esta se unir, objetivando a procriação. Originariamente, a primeira forma de união entre um homem e uma mulher ocorreu através da força, com o macho simplesmente pegando a fêmea pela qual sentia desejo. Tratava-se de uma união forçada, não se configurando casamento. O casamento ingressa na história da humanidade como processo de socialização. Falar casamento é dizer história ou cultura. Diante disso, cada sociedade esculpiu seus modelos institucionais para ações relativas à família e à conjugalidade. Historicamente, tem-se tentado tornar o casamento algo natural, mas é ele essencialmente uma instituição social. Em sua evolução história32, o casamento, dentro do sistema ocidental, encontrou quatro etapas distintas, sendo elas: Matrimônio consensual: praticado pelos povos antigos, não sendo condição à validade do casamento qualquer formalidade, bastando a vontade recíproca de se unirem, o mútuo consentimento. Matrimônio exclusivamente religioso: a partir do século X, a Igreja passou a afirmar ser o casamento entre os cristãos um sacramento sujeito às normas eclesiásticas. 13 43
  • 44. É importante ressaltar que, quando da realização do Concílio Tridentino, estabeleceu este a doutrina do sacramento matrimonial, o qual ainda se encontra em vigor, doutrina esta que influenciou em muito o atual sistema, pois tratou dos impedimentos, da indissolubilidade. Matrimônio legal e eclesiástico: regime que passou a vigorar desde 1836 em diversos países, dentre eles o Brasil. Facultou-se aos interessados contrair o casamento segundo as normas da legislação vigente no país, ou sob as prescrições da Igreja, subordinando o casamento na Igreja ao que dispõe a lei canônica. Matrimônio civil obrigatório: abandonando a idéia do casamento religioso, a maioria das legislações passaram a dar validade tão somente ao matrimônio civil, podendo ser o religioso realizado a critério dos interessados, embora não possua validade qualquer. O instituto do casamento, em seu aspecto jurídico, desperta interesse como objeto de estudo a partir do período de dominação do Império Romano, onde se observa a existência de normas que regulavam a existência do instituto, o qual era dividido em três espécies distintas: a "confarretio", a "coemptio" e o "usus". A "confarretio" era o casamento dos patrícios (cidadãos romanos), que correspondia ao matrimônio religioso, caracterizado pela oferenda de um pão de trigo aos deuses. Todavia, no Império Romano, esta forma caiu em desuso. A "coemptio" era o matrimônio dos plebeus (aqueles que não eram cidadãos romanos). O "usus" era equivalente a um usucapião, já que a mulher era adquirida pela posse. Posteriormente, o instituto evolui até o casamento livre, no qual era exigido apenas a capacidade dos nubentes, o seu consentimento e a inexistência de impedimentos. Com o passar do tempo, a Igreja se apodera dos direitos sobre a regulamentação e celebração do matrimônio, excluindo o Estado de qualquer participação. Devido à influência judaico-cristã, não se pode afastar a citação de Modestino, ao se perscrutar pela trilha da decodificação do sentido de casamento para as sociedades ocidentais. Diz ele que o casamento é a "conjugação do homem e da mulher; que se associam para toda a vida, a comunhão do direito divino e do direito humano". O que se vê aqui são as matrizes do casamento 14 44
  • 45. 33 DIAS, M.B., Op. cit., p. 105. 34 MONTEIRO, WB. Curso de Direito Civil – Direito de Família., 1990, p. 9. 35 Código de Direito Canônico, Codex Iuris Canonici, p. 465. 36 BEVILAQUA, Clóvis. Direito de Família, 1943, p. 34. sexista, indissolúvel e portal entre o divino e o profano. Durante muitos séculos esse foi o único modelo vislumbrável pelas sociedades ditas civilizadas.33 Em outro momento histórico, os Estados começaram a rever esta situação, sendo a iniciativa tomada pelos ingleses, que passaram a regulamentar o instituto sem a interferência da Igreja. No Brasil, esta situação perdurou até 1861, quando o Estado regulamentou o casamento dos não-católicos, formados em sua grande maioria por imigrantes. Mais tarde, com o advento da Proclamação da República, houve a separação entre o poder temporal e espiritual, conforme explica o Professor Washington de Barros Monteiro,34 sendo que, desde então, tem-se o casamento civil, apesar de a Constituição Federal de 1988, em seu art. 226, parágrafo segundo, equiparar o casamento religioso ao casamento civil. 4.2 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA A Igreja teve um papel importante na definição do casamento, a qual pode-se encontrar no Código de Direito Canônico, cânon 1055, em seu parágrafo primeiro: "Cân. 1055 - § 1. O pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si o consórcio de toda a vida, por sua índole natural ordenado ao bem dos cônjuges e à geração e educação da prole, entre batizados foi por Cristo Senhor elevado à dignidade de sacramento.”35 São inúmeras as definições que encontramos para este importante instituto na doutrina. Porém, conceituar o casamento tem sido um grande desafio para os doutrinadores. Clóvis Beviláqua36 define o casamento na ótica de legitimação estatal das relações carnais e implicitamente estabelecendo suas conseqüências na órbita patrimonial: "Casamento é um contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legitimando por ele suas relações sexuais; 15 37 MONTEIRO, W B. Op. cit., p. 09. estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar e educar a prole que de ambos nascer". Essa visão de Clóvis, estribada no pensamento dominante no mundo de então, presidiu a leitura normativa nacional durante décadas. Daí advieram as compreensões acerca da legitimidade da prole oriunda do casamento em detrimento das demais, e até mesmo do papel do Estado como regulador e legitimador dessas relações. Washington de Barros37 conceitua o matrimônio como "a união permanente entre o homem e a mulher, de acordo com a lei, a fim de reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e de criarem os seus filhos". Em nome da defesa do casamento e, implicitamente de um conceito limitado de familiaridade, vigoraram no Brasil até pouco tempo o art. 175, caput, da Emenda Constitucional no 1, em relação à Constituição de 1967, que dizia: "A família é constituída pelo casamento e terá proteção dos Poderes do Estado", e, os arts. 242 e seguintes e 380 do Código Civil de 1916, que até 1988 impunham à mulher a necessidade de outorga marital para realização de diversos negócios e a colocavam na condição de colaboradora do marido na fruição e exercício do pátrio poder. Logo, a comunhão não era tão equânime como poderia parecer em princípio. A maioria da sociedade brasileira, já em 1967, era favorável ao divórcio, mas este somente foi efetivado dez anos depois. Logo, a moral presidiu por mais tempo o casamento do que a própria lógica que emanava da história e do mundo vivido na sociedade. Quanto à natureza jurídica do casamento, a doutrina também não chegou a um ponto pacífico, uma vez que existem duas correntes distintas no direito pátrio. A primeira corrente afirma que o casamento é de natureza contratual, tendo entre os seus adeptos o Professor 45
  • 46. Silvio Rodrigues, que o conceitua como sendo um contrato de direito de família, seguindo o mesmo raciocínio do ilustre jurista baiano Orlando Gomes. A segunda corrente afirma que o casamento é uma instituição, tendo entre os seus adeptos a Professora Maria Helena Diniz e o ilustre jurista paulista Washington de Barros. 16 46
  • 47. 38 DINIZ, MH. Curso de Direito Civil – Direito de Família, p. 65. 39 GOMES, Orlando. Apud DIAS, M.B. Op.cit., p. 60. A corrente contratualista tem se apoiado no direito canônico, segundo a qual o consentimento dos nubentes é o fator preponderante na formação do vínculo matrimonial. Por este motivo, a Igreja entende que o casamento é um contrato. Da mesma forma a escola jusnaturalista acolheu esta concepção, a qual inspirou várias legislações, inclusive o Código de Napoleão. Há doutrinadores que modernamente atribuem ao matrimônio a qualidade de um ato complexo, de natureza institucional, uma vez que depende da manifestação livre da vontade dos nubentes, mas que se completa pela celebração, a qual é ato privativo de representante do Estado. Para a corrente institucionalista, existem diversos fatores que diferenciam o contrato da instituição. Nesse passo, a Profª. Maria Helena Diniz38 cita o jurista argentino Guilhermo Borda, que destacou tais diferenças de forma bastante elucidativa: a) o contrato é uma especulação (o vendedor procurando o preço mais alto e o comprador o mais baixo); a instituição é um ´consortium´, onde os interesses são coincidentes; b) o contrato rege-se pela igualdade; a instituição pela disciplina; c) o contrato é uma relação que só produz efeitos entre as partes; a instituição impõe deveres tanto para as partes quanto para terceiros; d) o contrato é uma relação exterior aos contratantes, é um laço obrigacional; a instituição, uma interiorização; e) o contrato representa uma trégua na batalha dos direitos individuais, sendo produto da concorrência; a instituição, um corpo cujo destino é ser compartilhado por seus membros, portanto produto da comunicação; f) o contrato é precário, desata-se como foi formado, extinguindo-se com o pagamento; a instituição é feita para durar; g) o contrato é uma relação subjetiva de pessoa a pessoa; as relações institucionais são objetivas e estatutárias. Hodiernamente, a doutrina continua tentando determinar a natureza jurídica do matrimônio. Nesse passo, o Professor Orlando Gomes39, destacou três formas, com as quais se tentou explicar a natureza jurídica do casamento. A primeira delas, afirma que o casamento teria a natureza jurídica de um negócio complexo, pois o simples consentimento dos nubentes não seria suficiente para sua formação, uma vez que também é necessário a intervenção da autoridade para que o ato se complete. A segunda forma entende que o casamento é um acordo, pois haveria uma soma de vontades por parte dos nubentes. Todavia, a grande maioria da doutrina ainda não chegou a um consenso a respeito do acordo, mas a grande maioria entende que o acordo sempre se reduz a um contrato. 17 47
  • 48. Finalmente, a terceira corrente entende que o casamento é um ato-condição, porque as partes ao consentirem, necessariamente aderem ao estatuto matrimonial, ingressando na mesma situação jurídica das pessoas casadas, o qual tem que ser aceito sem qualquer alteração. Dentre todas as correntes citadas, a corrente contratualista, pela origem do casamento no direito canônico, que o considerava um contrato e por entender que o casamento forma-se pelo acordo de vontades, é a mais aceita. Ao nível internacional, o casamento, na ótica da ONU (art. 16, da Declaração Universal dos Direitos Humanos), funda-se na perspectiva da distinção de sexos entre os nubentes, na ausência de limitações raciais, religiosas ou afetas à nacionalidade – sendo garantida a sua possibilidade de dissolução. Assevera ainda o referido postulado que a validade do casamento está adstrita à existência de liberdade aos nubentes na sua assunção. O casamento encontra sua estrutura na união entre homem e mulher, deixando claro, ser o casamento um instituto incompatível com a união de pessoas do mesmo sexo. No Brasil de hoje, a conceituação de casamento ainda congrega querelas acerca da contratualidade ou não do instituto – consideradas relevantes do ponto de vista teórico, mas na prática, totalmente inócuas – mas não comporta mais a indissolubilidade e não atribui possibilidade de diferenciação entre os cônjuges e entre as formas de filiação. Sem dúvida avanços na conceituação da instituição matrimonial. 4.3 CONSEQÜÊNCIAS ORIUNDAS DO CASAMENTO Uma vez celebrado o casamento, várias conseqüências serão projetadas na vida social dos nubentes, nas suas relações econômicas, nos deveres a serem cumpridos por ambos, bem como nas suas relações com seus filhos. Deste modo, a doutrina divide os efeitos do casamento em três categorias, quais sejam: os efeitos sociais, os efeitos pessoais e os efeitos patrimoniais. 18 48