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Construir uma revista requer muitas coisas, muitas mesmo,
tanto emocionais – cuidados para não surtar com ninguém
ou sozinho - quanto coisas físicas, e técnicas, sem contar
conhecimento e leitura, e referências, enfim, com certeza é um dos
projetos mais díficeis que eu já fiz, e acredito que se perguntarem
a meu grupo eles dirão o mesmo. Nossa primeira edição traz como
matéria de capa a construção desse projeto, desde o preguiçoso
início ao desesperador fim. Os passos para projetuar uma revista
se tornaram uma espécie de borrão conforme o tempo – lembrem-
se que o desespero traz a tona muitas emoções fortes e lágrimas
amargas - brincadeiras a parte, essa revista desde o começo tinha
o intuito de falar com um público ao qual nos identificássemos,
jovens, designers, querendo muito conhecimento (ou que nem
queiram tanto assim, mas faríamos eles quererem) esse público
é você, e esperamos com todo o coração que agrade, como disse
antes, projeto de revista não é fácil, e sim temos certas falhas,
mas convenhamos, quem não tem falhas, nosso projeto final se
tornou sobre design social. Quando comentamos isso com um de
nossos professores ele nos perguntou: “mas que tipo de design
social?”. Mal sabíamos que por mais que tivéssemos fechado em
um assunto dentro do design ele ainda era muito abrangente. O
design na sociedade toma diversas formas, nós escolhemos ir para
caminho da prática, o design feito por designers para a sociedade,
trazer reflexões para vocês, e instigar mais sobre esse assunto.
O design tem um poder muito grande dentro da sociedade, ele
tem uma relação direta com todos nós, porém na maioria das
vezes nem percebemos. Com essa revista queremos apontar
para o design que envolve vocês todos como sociedade, e
apontar obviamente que há falhas, falhas essas dentro de
projetos, ou até mesmo falhas onde nem houve um projeto, com
isso queremos despertar em vocês, assim como nos despertaram
essa inquietação, o por que certas coisas não funcionam como
deveriam ou por que deveriam funcionar de maneira diferente.
O design não é a última solução, nós sabemos disso, e sabemos
que na verdade a única coisa que pode melhorar algo, somos nós
mesmos, tudo começa de um impulsozinho de nada no seu cérebro,
mas isso pode virar algo grandioso, algo que mude vidas, ou até
mesmo somente uma. Design está na sociedade para ajudar, e não
somente deixar as coisas bonitas, isso é óbvio para um estudante
de design, mas nunca é demais repetir. Temos um dever social e
ele nos impulsiona, esperamos que com essa revista consigamos
mostrar todo essa dimensão do Design que está ali presente,
mesmo que escondido no mínimo detalhe, mesmo que pareça
simples, porém é sempre relevante.
ao leitorcarta
6 Design de Informação?
Joaquim Redig
22 Construindo In Locus
Editores
off
on
aqui
carta
lá
Sumário
44 Na próxima
edição
28 O Design e o espírito
humano
Victor Margolin
Joaquim Redig aponta o que a falta de um bom projeto de design pode causar
à sociedade. Todos temos que arcar com as consequências de um design de
informação falho, enquanto somos muitas vezes culpados por esses problemas.
“Um dos objetivos do design de informação é equacionar os aspectos sintáticos, semânti-
cos e pragmáticos que envolvem os sistemas de informação através da contextualização,
planejamento, produção e interface gráfica da informação junto ao seu público alvo.”
aqui
paul pride
aquidesign de informação? 5
Há seis anos foi fundada em Recife a Sociedade Brasileira de
Design da Informação (Sbdi), primeira entidade no Brasil
dedicada a essa área do Design, cuja responsabilidade social tem
crescido junto com a importância dainformação como instrumen-
to de comunicação, cultura e tecnologia. A entidade já realizou
três encontros nacionais (sempre com convidados internacionais)
e sua atuação tem ajudado a disseminar no país o conceito do
Design de Informação.
Internacionalmente, este tem sido um tema de discussão impor-
tante para o Design desde meados dos anos 1970, com eventos
como a criação do Iiid (International Institute for Information De-
sign, sediado na Áustria), a edição do Design Information Journal,
e do boletim da Glyphs Inc., entidade internacional liderada pela
antropóloga Margaret Mead e pelo designer Rudolf Modley, que
visava a disseminação da pictografia como linguagem universal.
Nacionalmente, a criação dessa entidade representa um grande
passo no sentido da conscientização sobre a questão no país,
após meio século de história do Design brasileiro. Embora neste
período tenha florescido o Design Gráfico nacional, setor a que
está vinculado o Design de Informação, esta especialidade per-
maneceu aparentemente esquecida, tanto pela teoria, nas esco-
las, quanto pela prática, nos escritórios, empresas e repartições
- a não ser por algumas experiências isoladas, mas fundamentais
neste processo, como o sistema de Comunicação Visual do
serviço de ônibus urbano do Recife, de Edna Cunha Lima, ou
o de São Paulo, de Cauduro/Martino, ou a sinalização urbana
do Rio de Janeiro, da PVDI, de Aloisio Magalhães, só para citar
grandes projetos pioneiros, todos dessa mesma época, anos 1970.
No entanto, sua importância e necessidade nunca foi pequena. O
passar do tempo e a permanência (portanto, o agravamento) dos
problemas - como o caso (crítico) da (ausência de) comunicação
visual nos transportes urbanos de ônibus, principal meio de loco-
moção das cidades brasileiras - apenas acentuam a necessidade
de atenção dos designers a esta área.
Soma-se a isso o crescimento do valor da informação com a
disseminação mundial da informática, e a recente expansão da
área de Web Design, para a qual o Design de Informação é impre-
scindível, embora muitas vezes relegado ao segundo plano, sub-
stituído por estéticas de marketing para quem quer só se divertir,
mas irrelevantes para aqueles que buscam informação na web
com determinado objetivo. Estes são alguns dos antecedentes
profissionais da fundação da Sbdi. Academicamente, passos de-
cisivos nesse sentido foram a criação do Curso de Especialização
em Design de Informação -único no país- no Departamento de
Design da Ufpe (Universidade Federal de Pernambuco) em 2000,
pelos professores Solange Coutinho e André Neves, e, em 2001,
do Grupo de Pesquisa em Design de Informação (vinculado ao
CNPq), liderado pelas professoras Solange e Carla Spinillo.
Indo um pouco mais atrás, Solange declara que foram os profes-
sores Edna e Guilherme Cunha Lima, formadores de sucessivas
gerações de designers na Ufpe, e profissionais atuantes de forma
pioneira no mercado do Design Gráfico local, que estimularam
na atual geração de professores dessa escola o interesse pelo
Design de Informação. Além disso, Solange lembra também a
intervenção sempre precisa e oportuna de mestre Gui Bonsiepe,
que, em 1993, introduziu o tema do Design de Informação no
Recife, em sua palestra no 1º. Seminário Nacional de Educação
em Design Gráfico.lamuria
aquidesign de informação?
Não foi à toa que o início da tomada de consciência coletiva
sobre essa questão no Brasil veio daquela cidade. Muitas outras
centelhas que alimentaram o desenvolvimento do
Design Gráfico brasileiro têm vindo de lá. Historicamente
- e por aí podemos chegar até às iniciativas pioneiras de Nassau
no sentido de implantar a imprensa no Brasil, só para dar um
exemplo clássico - Recife tem sido berço e palco de fatos e
atores determinantes para o desenvolvimento da disciplina e da
profissão do Design no Brasil. Não sendo especialista em história
pernambucana, acho que devo apenas lembrar aqui alguns
exemplos importantes: O Jornal do Commercio, Vicente do
Rego Monteiro, O Gráfico Amador, Aloisio Magalhães, Gastão de
Holanda, João Roberto Peixe, a APD-PE (Associação Profissional
do Designers de Pernambuco).
O grupo que se estruturou neste século na Ufpe em torno do
tema da Informação no Design pode ser uma continuidade
dessa linha - melhor dizendo, dessa linhagem. O conhecimento
específico, esse grupo foi buscar na Inglaterra, mais
especificamente na Universidade de Reading, onde se pós-
graduaram muitos dos professores de Design Gráfico da UFPE.
É bom lembrar que os ingleses são grandes mestres no assunto
informação e cidadania: o mapa do metrô de Londres, ícone
internacional do Design de Informação, desenhado nos anos 1930
e ainda hoje mundialmente copiado, ou re-reproduzido, é um
exemplo maravilhoso e contundente.
Já nos anos 1980 a revista inglesa Design, uma das mais
importantes na área, predizia que, com a Informática,
a função do designer industrial tenderia a perder com-
plexidade e importância para a do comunicador visual
(ou do designer gráfico) na medida em que os produtos
eletrônicos tendem a ser materialmente iguais - uma placa
de circuito impresso, uma botoeira, e um display - embora
possam cumprir funções totalmente diferentes, graças à
informação que contém. Resumindo, o hardware (material)
é o mesmo, o que muda é o software (informação
processada pelo hardware). Exemplo: Uma calculadora
é igual a um controle remoto que é igual a um telefone
sem fio. A diferença é a função que cumprem, dada pelo
software (um faz contas, o segundo controla aparelhos à
distância, e o terceiro transmite voz).
A tendência é termos um só aparelho que, dependendo
das teclas que se aperte, cumprirá TODAS as funções
que hoje dezenas ou centenas de tipos de aparelhos
diferentes cumprem, na nossa vida cotidiana. Um
só Design de Produto, para centenas de Designs de
Informação. Nesse ponto não posso deixar de lembrar da
semente plantada por Décio Pignatari nos anos 1960 na
Esdi (Escola Superior de Desenho Industrial), no Rio de
Janeiro, onde, como professor de Teoria da Informação,
Design industrial x design gráfico
7
aqui design de informação?
ele já antevia muitas destas questões. Ainda que
não tivesse dado, até agora, frutos institucionais,
essa semente certamente germinou na cabeça
de muitos designers brasileiros que, como eu, se
formaram nessa Escola nesse período, e foram
alunos dele. Apaixonado pelo tema, por sua
função (social) e por sua forma (racional), sem-
pre o enfoquei com meus alunos - desde a pri-
meira aula, em 1975, na PUC-Rio, com o tema da
Pictografia. Profissionalmente, tenho desenvolvi-
do, desde o escritório de Aloisio Magalhães/
PVDI, nos anos 1960/70, dezenas de projetos de
sinalização que me têm dado a oportunidade
de tocar na questão dainformação.Ao contrário,
por exemplo, do Design Editorial ou Corpora-
tivo, o Design de Informação não é, em geral,
uma área lucrativa do mercado. Lidando com
questões de âmbito público, está, portanto, mais
submetido à crônica “falta” de verba do serviço
público brasileiro. Somente agora, ainda timid-
amente, algumas empresas, orientadas por um
marketing mais inovador, e ajudadas por déca-
das da ação perseverante do Design, começam
a se voltar às reais necessidades do consumidor
- ou pelo menos a dizer que querem isso - das
quais uma das mais importantes é a informação
clara, precisa e verdadeira.Assim, paralelamente
ao crescimento do país, têm crescido no Brasil as ne-
cessidades de projetos e intervenções nessa área.
A importância desta iniciativa dos professores da Ufpe
está não só em ajudar a nos preparar para atender a
essas demandas, mas principalmente em trazer esse
conceito da informação no Design para a consciência
coletiva brasileira - governantes, empresários, profis-
sionais e pesquisadores. Embora nesse movimento
pernambucano tenham prevalecido os últimos
- e é importantíssimo, particularmente para o Design
brasileiro, uma questão como essa ocupar a cabeça, o
tempo e a verba de cientistas e pesquisadores
- sinto necessidade de convocar para a discussão os
designers profissionais, e, sobretudo, os órgãos gove-
namentais responsáveis por legislar e definir a info-
mação pública no Brasil.
casteel
8
aquidesign de informação?
Esta pergunta, que me foi feita pela editora de uma revista
especializada, quando sugeri esse tema para um artigo, me fez
pensar: É. Todo Design é de Informação. Mas uns são mais,
outros menos. E é essa diferença que me interessa.
Um exemplo: capas de discos. Um mesmo objeto mostra
a diferença entre oDesign Gráfico (na capa) e o Design de
Informação (na contracapa). Na frente, pode-se passar qualquer
mensagem, pode-se até contrariar a imagem do artista, se ele,
e/ou seu produtor, assim o quiser, ou concordar, naquele
momento, naquele lançamento. Às vezes não é necessário nem
escrever o nome do artista, na frente. Mas, do outro lado, eu,
como usuário, quero saber rapidamente, sem esforço
(se possível lendo em pé, na loja, antes de comprar), além do
nome do artista, quais são as músicas, os autores, os músicos e,
se possível, quando e em que contexto cada uma foi composta
(para não falar das letras das canções, para ler depois, em casa).
Tudo em tipo de letra não menor que Corpo 8, não muito fina
nem muito grossa (nem light nem bold), sem linhas de contorno
(outline) e com bom contraste cromático (letra bem escura
sobre fundo bem claro ou vice versa). E ainda, com a numeração
grande. A redução de espaço gráfico trazida pela passagem
do LP ao CD veio aguçar os problemas de Comunicação
Visual das capas de discos, acentuando o papel dodesigner de
informação, nessa área rica e produtiva do Design Gráfico - tanto
internacionalmente quanto nacionalmente, dada a riqueza e
variedade de nossa produção musical.
“Todo design não é de informação?”
Dois instrumentos, um mesmo fim: funcionalidade
o depoimento de um dos mais impor-
tantes pesquisadores em Design de
Informação, Jorge Frascara, argentino
radicado no Canadá, veio reiterar essa
conexão (Design Industrial e Design
de Informação), ao citar o exemplo de
um designer que, convocado por um
fabricante de aviões para melhorar
as instruções visuais de operação da
saída de emergência da aeronave, após
estudar o problema recomendou à
empresa redesenhar primeiro o meca-
nismo de operação da saída, que não se
mostrava funcional, antes de redesenhar
as respectivas instruções de uso.
Isso me lembra um terrível acidente
ocorrido há alguns anos no Rio de
Janeiro, quando um ônibus urbano se
incendiou e cerca de 10 pessoas mor-
reram, sem conseguir sair do veículo a
tempo. E por que não conseguiram, se
o ônibus tinha saídas de emergência?
Ou porque não conseguiram entender
as instruções de funcionamento das
saídas (um problema de Design de In-
formação), ou porque não conseguiram
operá-las, por serem mal desenhadas
(um problema deDesign Industrial), ou
porque eram subdimensionadas (outro
problema deDesign Industrial), ou
então o mecanismo de abertura estava
emperrado - único caso em que não
se trataria de um problema de Design,
mas do serviço de manutenção.
Sempre tive duas paixões profissionais,
o Design Industrial e o Design de
Informação, e sempre estranhei o
fato de duas disciplinas ou atividades
aparentemente tão díspares (uma
com ênfase tecnológica, a outra
cognitiva) me atraírem da mesma
maneira. Daí fiquei contente quando
ouvi mestre Gui Bonsiepe - hoje em
dia provavelmente o maior teórico
do Design no mundo - dizer numa
palestra que o designer industrial teria
facilidade em trabalhar com o Design
de Informação por estar habituado
a resolver problemas complexos de
funcionalidade. No próprio congresso
inaugural da Sbdi em Recife (2004),
9
Diante daquela pergunta “todo Design não é de
Informação?”, resolvi me deter sobre aqueles
componentes que caracterizam essa área. Não
pretendo aqui ser extensivo sobre o assunto,
mas colocar inicialmente seus pontos principais:
O primeiro se refere a questões do destinatário
da mensagem. Os seguintes, a questões da
forma da mensagem. E os últimos referem-
se a questões do tempo, na transmissão da
mensagem. Quando o objeto informativo não
atende a essas características, relacionadas
a seguir, o processo de comunicação será
Outro exemplo, mais recente,
da falta de funcionalidade
da informação gerando con-
seqüências desastrosas
(mundialmente desastrosas,
neste caso). O jornalFolha de
São Paulo de 13.11.2001 (pág.
A17) cita notícia veicula-da
pelo site do diário norte-
americano New York
Times dizendo o seguinte:
“O novo estudo(sobre
as eleições de 2001 nos
EUA, que deram vitória ao
presidente republicano
George Bush) deu respaldo
estatístico às reclamações
de muitos eleitores, sobre-
tudo democratas de idade
avançada, segundo os
quais cédulas confusas os
atrapalharam no momento
da votação, fazendo com que
votassem em mais de um
candidato, segundo o jornal
(NYT). Mais de 113 mil eleitores
votaram em dois candidatos
ou mais. Entre eles, 75 mil
escolheram Gore (o candidato
democrata derrotado) e
algum outro candidato de
menor expressão enquanto
apenas 29 mil votaram em
Bush e em outro candidato
menos expressivo. Esses
votos não foram considerados
no resultado final porque a
intenção dos eleitores não
estava clara, de acordo com
o diário. A vitória de Bush na
Flórida deu ao republicano os
25 votos do Estado no Colégio
Eleitoral. Assim, Bush chegou a
271 votos no colégio, um a mais
do que o mínimo necessário
para vencer o pleito.” (grifos
meus) E se as cédulas não
fossem “confusas”?
E se tantos milhares eleitores
não tivessem “se atrapalhado”
com elas? (mesmo sendo idosos
- e nesse ponto eu lembro que
o que é ruim para idoso é ruim
para todo o mundo). E se Bush
não tivesse sido eleito, como
seria o mundo hoje?
O Design de Informação está
no eixo do sistema democrático.
Não existe democracia sem
informação clara, e verdadeira.
A seguir procuro delinear o que
é informação clara e verdadeira,
sob o ponto de vista do Design:
aqui design de informação?10
deficiente e, portanto, o usuário ou o cidadão
poderá não ser atendido. Nesse caso, de nada
servirá o Design - harmonia entre formas, cores,
materiais, significados. A relação da forma
(externa) com a estrutura (interna) dos objetos é
um dos fundamentos do Design (de Produto, ou
de Comunicação Visual), ao contrário do que se
pensa, e diz a mídia, que confunde “design” com
aparência, superficialidade e frivolidade.
São condições indispensáveis para o Design de Informação existir:
anirudhkoul
1
aquidesign de informação? 11
aqui design de informação?
Se, como diz a Semiótica, toda
comunicação tem um ponto de
partida, o emissor da men-
sagem, e um ponto de chega-
da, o receptor, para o Design
de Informação é este quem
determina o conteúdo da men-
sagem, e não quem a emite. O
próprio emissor (nosso cliente),
se quiser cumprir sua função,
deve se colocar também nessa
po-sição diante do receptor
(seu cliente - isto é, cliente do
nosso cliente). Por exemplo, no
caso da sinalização do metrô, o
emissor das informações que
desenhamos é a companhia,
nosso cliente (por quem somos
contratados), sendo receptor o
passageiro (para quem somos
contratados). A propaganda
oficial do go-verno tem sido um
campo típico - e vergonhoso -
onde a informação se dirige
mais aos interesses do emissor
(governantes) que do receptor
(população), ao contrário do
que deveria ser. Vergonhoso
porque é o cidadão (recep-
tor) quem paga, em forma de
impostos, os milhões que essa
propaganda custa - enquan-
to alguns serviços públicos
Depois do foco no receptor,
a segunda qualidade
fundamental do Design de
Infor-mação está na forma
gráfica da mensagem, que
deve ser, o mais possível,
analógica. É essencial que
a informação tratada pelo
designer estabeleça uma
analogia com seu conteúdo,
visando, antes de tudo,
clareza e rapidez de leitura.
Os relógios digitais, ainda
bem, não substituíram os de
ponteiros, que hoje são digitais
na tecnologia (com painéis
de cristal líquido), mas muitas
vezes analógicos na sua forma
de leitura (com “ponteiros”
que são na verdade imagens
na tela, e não mais peças
que giram mecanicamente).
Chamam-se”analógicos” na
medida em que estabelecem
uma analogia (no caso, visual)
com a noção da passagem do
tempo, refletida no movimento
circular dos ponteiros (que
remete ao próprio movimento
dos planetas, nosso sistema de
referência para a contagem do
tempo, originalmente expresso
no relógio de sol), em oposição
aos “digitais”, que veiculam a
essenciais não são prestados
por “falta de verba”. Sou
totalmente contra propagan-
da governamental (não cam-
panhas de interesse público,
que é coisa oposta). Afinal, não
lhe parece um absurdo pagar
para que seus empregados
falem bem deles mesmos, para
você mesmo? - e o que são os
governantes senão nossos em-
pregados, ou seja, alguém que
pagamos para trabalhar para
nós, embora a maioria trabalhe
para si próprio? Por outro lado,
campanhas de interesse coleti-
vo (de saúde, de se-gurança no
trânsito etc.) são puro Design
de Infor-mação, essenciais para
a cidadania e o desenvolvimen-
to social. Nada têm a ver com
gastar dinheiro público para
dizer que este governo foi o
melhor que já tivemos, ou para
um pagodeiro nos repetir, em
cadeia nacional, aquele refrão
inspirado que não nos per-
mitirá esquecer que o partido
do governo é o mais honesto e
trabalhador do Brasil.
12
aquidesign de informação?
informação através de “dígitos”, signos
abstratos e convencionados - no caso,
algarismos.Esse conceito de leitura digital x
analógica (homogênea, por meio do apenas
do alfabeto, x heterogênea, isto é, por meio
de formas, cores, símbolos, e também do
alfabeto) pode ser estendido a qualquer área da
Comunicação Visual.
Muitas informações de inte-resse público
perdem eficácia porque são “digitais” e não
“analógicas” (nesse sentido da leitura, não da
tecnologia, repito). A bula de remédio é um
exemplo clássico. São produzidas em função
dos interesses do emissor da informação
(laboratório fa-bricante do remédio) e
não do receptor (paciente - só podia ter esse
nome!), sendo visualmente “planas” (chatas),
nada analógicas, e muito pouco comunicativas.
Um bom exemplo oposto, de informação
analógica útil e disseminada, é a Sinalização
de Trânsito, uma das primeiras manifestações
do Design de Informação no mundo, cujos
parâmetros foram es-tabelecidos também
nos anos 1930 (na mesma época do mapa do
metrô de Londres), e que, desde então, tem
servido de modelo para muitas outras áreas da
linguagem visual. O conceito de analogia é, no
meu entender, determinante para a existência
do Design de Informação. Mas existem
outras características impor-tantes a serem
consideradas, na forma da mensagem:
Atributo intrínseco a qualquer
comunicação, trata-se de uma
característica absolutamente
imprescindível para o Design
de Informação. Embora sua
necessidade seja óbvia, sua
ausência é comum.
Nessa área da Sinalização de
Trânsito, a eletrônica trouxe a
possibilidade de uso de painéis
luminosos (feitos de micro-
lâmpadas) com informações
móveis, transitórias, úteis
principalmente em situações
de emergência (embora aqui
eles não sejam usados para
isso), coisa impossível de
fazer com a sinalização fixa
tradicional. Cidades grandes,
médias e até pequenas
possuem hoje em dia esses
painéis luminosos, em pórtico
sobre as avenidas principais.
Aqui no Rio eles são (sub)
usados na hora do rush, por
exemplo, para orientar os
motoristas quanto ao melhor
trajeto para ir de Botafogo à
Barra, dois polos importantes
da cidade separados por
montanhas e lagunas.
Pode-se fazer esse trajeto
pelo lado direito (Av. Borges
de Medeiros) ou esquerdo
(Av. Epitácio Pessoa) da Lagoa
Rodrigo de Freitas. Assim,
logo antes da Lagoa há um
painel desses que diz (todos
os dias, no fim da tarde): “B.
Medeiros: LENTO - E. Pessoa:
INTENSO”. Ou vice-versa.
Qual a diferença? Qual dos
dois caminhos devo escolher?
Qual será o melhor - ou o
menos pior, o lento ou o
intenso? Para que me serve
essa informação
yuribittar
13
1
aqui design de informação?
Considerando as necessidades e condições de leitura, é
imprescindível que a mensagem do Design de Informação
seja absolutamente concisa, sem signos ou palavras
supérfluas ou dispensáveis. Há uma placa nas ciclovias do
Rio que diz, para o ciclista: “Atenção! Cuidado! Respeite
a travessia - a prioridade é do pedestre. Bastava dizer:
“A prioridade é do pedestre”. Aí já está subentendido o
“respeite a travessia”. Nesse contexto (sinalização urbana),
por questões de tempo, e de segurança, não se pode ser
prolixo nem redundante. Tem-se que ir direto ao ponto. A
economia de palavras inclusive valoriza a mensagem.
O excesso dilui. Uma ordem NUMA só palavra é muito
mais forte do que NUMA FRASE DE DEZ PALAVRAS.
Voltando ao painel eletrônico de trânsito: alternando com
a mensagem sobre o andamento do tráfego, acende uma
tela nesse painel que anuncia, solenemente: “CET-RIO
INFORMA: CONDIÇÕES DE TRÁFEGO “ (e depois apaga
- aliás, não apaga, as palavras saem da tela “andando”
para os lados, uma linha sai para a direita e outra para a
esquerda: uma gracinha!). Eu não quero saber se aquele
painel SERVE PARA ME DIZER quais são as condições de
tráfego (se ele está no local das informações de tráfego,
ou seja, acima e no meio da pista... era só o que faltava, se
fosse um painel de propaganda!). O que eu preciso saber
é QUAIS SÃO as condições do tráfego. Sem introduções.
Em movimento, não há tempo para isso - além de ser
perigoso (distrair-se com informações supérfluas). Seria
o mesmo que colocar no cabeçalho das placas fixas
de sinalização urbana o título: “CET-RIO INFORMA:
DIREÇÕES DE TRÁFEGO”, e abaixo, então, a informação
que realmente interessa: “Copacabana à direita”, por
exemplo. E para que alternar as telas luminosas? para
nos divertir, enquanto dirigimos no tráfego? (ou enquanto
NÃO dirigimos, no engarrafamento?) Por que não deixar
acesa só a informação que (pretensamente) nos interessa,
sem movimentos graciosos?
Outro exemplo de propaganda confundida com
sinalização: é muito comum no Brasil uma placa rodoviária
(portanto, dirigida aos motoristas) que diz “Proteja a
Sinalização”. O que se quer dizer com isso? Como é
que uma pessoa, dentro de um carro, em movimento,
dirigindo, pode “proteger” uma placa fincada do lado
de fora, na beira da estrada? O que se espera que o
motorista faça? (pare o carro na estrada, salte, chegue
junto à placa, veja se ela está suja ou quebrada, faça
uma limpeza ou um carinho na placa, e depois procure
na lista telefônica o número do Dner ou do DER para
avisar sobre eventuais avarias na placa?) Ou será que
essa mensagem seria dirigida àqueles delinqüentes que
dão tiros na sinalização? Neste caso, será que, lendo-a,
eles deixarão de atirar? (ironia é ver placas com esse
texto furadas de bala!). Dinheiro (nosso, não canso de
lembrar) jogado fora - ou no bolso dos fornecedores e
compradores oficiais corruptos).
14
aquidesign de informação?
Outro componente essencial
do Design de Informação,
relacionado à propriedade
analógica. Na informação
analógica, há ênfase nas
partes mais importantes ou
mais graves da mensagem, por
meio da acentuação gráfica
dos elementos de informação,
como o uso de letra pesada
(bold) ou caixa alta, o aumento
do tamanho, o destaque em
cores mais fortes, ou o uso de
recursos de separação visual,
como margens, fios, barras,
vinhetas, molduras ou quadros.
As ênfases tornam a superfície
informativa heterogênea, ou
“ondulada”, e não homogênea,
ou “plana” (como é a bula de
remédio). Além da legibilidade,
elas conferem também
ao objeto informativo um
contorno, um perfil, uma “cara”
- uma identidade, portanto.
Sistemas de informação necessitam de códigos consistentes,
onde cada signo, dentro de seu contexto, corresponde sempre
a um mesmo significado, e vice-versa. No metrô do Rio, durante
cerca de 30 anos os assentos reservados a gestantes, idosos
e deficientes físicos eram, em alguns vagões, na cor verde, com
os demais assentos do mesmo vagão na cor laranja, e nos outros
vagões era o contrário, ou seja, os assentos reservados em
laranja, e os comuns em verde. Aoposição de cores, sobretudo,
mais do que sua variação, anulava qualquer possibilidade
de fixação - e portanto de utilização - do código. Para que
fazer dois acabamentos dife-rentes no interior dos trens?
Certamente para ficar mais “de-corativo”. Aí está outro vírus que
freqüentemente contamina ou até destrói a Informação, além
da Propaganda: a Decoração. Não que a sinalização deva se
desvincular da função decorativa, ao contrário, esta é uma
das funções compulsórias a serem cumpridas por ela, na medida
em que é parte do ambiente ar-quitetônico. O problema é quan-
do o aspecto decorativo ofusca ou até substitui a informação, o
que é um contra-senso, embora freqüente. Contra-senso porque
a sinalização é feita (destinada / pensada / comprada / fabri-
Empregar palavras de uso
comum é essencial para a
comunicação neste nível.
No Rio de Janeiro, os pontos
de parada de vans e kombis
(sistema que veio a preencher
um vácuo no transporte de
média capacidade das grandes
cidades brasileiras neste início
de século) são identificados
por uma placa onde está
escrito “Transporte Especial
Complementar” - “tucanaram
a kombi”, diria o José Simão,
humorista do jornal Folha
de S.Paulo. Se você estiver
procurando esse serviço
em algum lugar na cidade, e
perguntar a alguém “onde fica
o ponto do transporte especial
complementar”, ninguém
vai entender. Mas, se você
perguntar “onde fica o ponto
de kombi”, ou de van vão te
responder. Para mim, usuário,
esse sistema de transporte
não tem nada de “especial”,
nem de “complementar”. Poderá ser para os planejadores
do transporte da cidade, emissores dessa informação,
para quem este sistema auxiliar complementa o principal,
servido pelos ônibus. Mas, para muitos, ele é o meio
transporte que o levará, por exemplo diretamente de
casa ao trabalho. Para o usuário ele é apenas um sistema
de transporte menor, mais rápido, mais freqüente - e, ao
menos aqui no Rio, chama-se “van” ou “kombi”.
cada / instalada) para informar, não
para decorar. O desafio do designer
no caso é justamente o oposto, ou
seja, não substituir a informação pela
decoração, mas unir os dois: usar a
infor-mação como decoração, e o ele-
mento decorativo como informação.
lops jr.
15
1
aqui design de informação?
Outra característica necessária ao Design
de Informação, no mínimo por uma questão
de respeito ao próximo. Podemos continuar
no mesmo exemplo: na placa que identifica
esses assentos reservados para gestantes
e deficientes nos vagões do metrô do Rio,
colocada acima dos respectivos assentos, há
uma frase, obrigatória por lei, que começa
assim: “Colabore: Você não está proibido de
sentar nesses lugares mas lembre-se que eles
são reservados a idosos, gestantes, deficientes
físicos, etc. etc....”. No metrô de Londres tem
escrito assim: “Por favor, ofereça esse assento
a uma pessoa idosa ou deficiente”. Veja bem a
diferença: “Por favor ofereça este assento...” em
lugar de “Você não está proibido de sentar-se
mas lembre-se...”.Síntese, precisão, e respeito.
Aqui no Brasil parte-se do princípio de que
todos os usuários dos serviços públicos são de-
linqüentes, e assim somos todos tratados. Mas
eu não sou delinqüente e exijo o direito de ser
tratado como cidadão. E mesmo que fôssemos
todos delinqüentes, caberia ao serviço público
tratar-nos com respeito. Como se espera que
nós TODOS, inclusive os delinqüentes, tratemos
os serviços públicos com respeito.
Por outro lado, cordialidade não é esse ônibus
urbano que dá “BOM DIA” pelo painel frontal
(noutro dia, ainda de manhã, havia um dizendo
“BOA TARDE”), onde também, alternadamente,
se informa o número e nome da linha. Como
esse painel agora é eletrônico (como o pórtico
de trânsito, feito de micro-lâmpadas),
pronto, haja criatividade nas mensagens! Na
época do Natal o ônibus diz também “FELIZ
NATAL”! Já que se pode escrever qualquer
coisa nesses painéis, as pessoas não conseguem
deixar de escrever bobagens - é só digitar
e enviar a mensagem (ao contrário de uma
sinalização fixa, que você tem que pensar,
desenhar, olhar, aprovar, fabricar, e instalar).
Se querem mudar de mensagem, alternando
com o nome da linha, no caso do ônibus, então
pelo menos que se esclareça seu trajeto, ou
sua tarifa. O “bom dia” a gente deixa para o
motorista, ao entrarmos no veículo. Ao vivo.
Com direito a som, e ex-pressão. Como em
Londres. E no interior do Brasil.
Se esse é um exemplo de demagogia (fantasiada
de “cordialidade”), este próximo chega a ser
hipocrisia: quem agüenta ligar para um serviço e
ficar esperando na linha enquanto uma gravação
repete no seu ouvido que “a sua ligação é
muito importante para nós”? Se fosse, não nos
deixariam esperando, nos massacrando com
essa frase “cordial”, mas estaríamos sendo
atendidos. Esses tele-marqueteiros pensam que
todos são bobos, como eles? Se sabemos que
pelo menos ALGUMAS ligações NÃO serão
importantes para a empresa, e sendo a frase
dita em TODAS as ligações, então, às vezes -
senão sempre - aquela voz está mentindo, e isso
pode estar acontecendo na nossa vez.
pampolin
16
aquidesign de informação?
Em primeiro lugar, é essencial
que a informação apareça
(em primeiro plano), quando
precisamos dela, e não apa-
reça (fique em segundo plano),
quando não precisamos.
Vou exemplificar novamente
com o painel eletrônico da
sinalização de trânsito - é bom
repetir o exemplo para ver a
variedade de problemas que
um mesmo objeto pode trazer.
Além da falta de clareza,
o que torna aquele painel inútil
é a inoportunidade da infor-
mação: Ou seja: todo mundo
sabe - até os turistas - que,
todo dia, na hora do rush, o
trânsito nas avenidas principais
é mesmo “lento” E “intenso”.
Por isso, essa informação não
quer dizer nada. Então, não
perco mais tempo desviando
minha atenção da rua para ler
esses painéis (quanto pagamos
por eles, aliás?). E, no dia que
precisarem me mandar uma in-
formação útil (aos motoristas),
não vou receber (como, por
exemplo, a de que o trânsito
está lento por causa de um
acidente em tal lugar, indican-
do um caminho alternativo
- uso que nunca vi ser feito
desse painel, embora ela seja
feito para isso).
Agora, o exemplo inverso,
elucidativo: Há poucos anos
atrás passei algumas semanas
hospedado num bairro resi-
dencial na periferia da cidade
de São Francisco (EUA), e
todos os dias, seguindo o
movimento do trânsito, ia para
o centro da cidade de manhã
e voltava à tarde, dirigindo
por auto-estradas largas mas
sinuosas, numa região mon-
tanhosa. Depois de percorrer
esse trajeto várias vezes, e já
sabendo o caminho de cor,
um dia deparei, logo antes de
uma curva da estrada, com um
desses painéis eletrônicos, que
dizia: “Tráfego parado adiante”.
E, logo depois da curva, tudo
parado. Numa via expressa
veloz, cheia de curvas, e de
carros, aquela informação
era muito importante para
os motoristas diminuírem a
velocidade a tempo, evitan-
do um engavetamento. Mas,
repare, eu nunca antes tinha
visto aquele painel. Nos outros
dias ele provavelmente estava
APAGADO! Só o vi quando
precisei dele. Para mim, como
motorista, ele nunca foi usado
para dizer algo previsível (e,
portanto, inútil). Ele nunca
foi usado para dizer que o
tráfego adiante estava NOR-
MAL! (como aqui no Rio,
onde às vezes se coloca esta
informação preciosa no painel
eletrônico: “Avenida Tal: BOM”!
Se o trânsito está bom, e isso é
o normal - ou será o anormal? -
para que informar? Apaguem o
painel, e pelo menos, economi-
zamos energia - a elétrica, cole-
tiva, e a do olhar, individual.
yurireese
17
1
aqui design de informação?
Informação é linguagem, e linguagem
demanda continuidade. Não se usa uma
palavra num sentido hoje, e amanhã noutro. O
que, porém, não significa estagnação. Com o
tempo, o sentido muda. Mas é uma mudança
lenta, onde predomina a estabilidade sobre
a instabilidade. Códigos, para serem usados,
têm de ser duradouros, mudando quando não
correspondem mais à realidade. Na nossa
sociedade de consumo subdesenvolvido, porém,
onde vicejam, além do regime da obsolescência
planejada (de origem internacional), o regime da
corrupção institucionalizada (paixão nacional),
ambos campos de interesses privados (isto é,
dos interesses do emissor, não do receptor),
exemplos de descontinuidade, em prejuízo
do público, são freqüentes: A mudança
constante dos nomes de ruas no Brasil, além
desconsiderar o caráter poético e histórico que
cada rua tem, serve apenas para fazer média
entre políticos e famílias de mortos poderosos
(emissores da informação). A mudança
freqüente dos números de telefone no Brasil
serve apenas para atender à desorganização das
empresas concessionárias de telefonia, e à sua
falta de consideração com o público, destino
final do serviço.
A mudança constante das siglas de órgãos
públicos serve ou para encobrir erros passados,
ou para atender aos interesses de políticos que
entram em cena, e usam esses órgãos em seu
benefício. Nenhuma dessas mudanças leva
em consideração as necessidades dos
usuários. Ao contrário, só lhes dá dor de
cabeça e despesas, desperdiçando seu tempo,
prejudicando sua comunicação e sua vida,
exigindo-lhes refazer papéis e documentos,
despesas e prejuízos NUNCA ressarcidos pelos
agentes provocadores das mudança.
No campo do consumo privado o problema
também é freqüente. Se um produto que você
tem saiu de linha (e se ele ficou mais de um ano
na “linha” foi muito), pode jogá-lo fora.
As dificuldades de consertar aparelhos fora
de linha, ainda que bem conservados, ou de
conseguir re-completar os azulejos de um
pedaço de parede que teve de reformar, ou
de comprar mais um sapato igual a esse que
você usa e gosta, são maneiras que as empresas
encontram de fazer você comprar mais (de
novo, no interesse do emissor, não do receptor).
Você é obrigado a jogar fora o que você sabe
que gosta, e a comprar um produto novo que
você não sabe se vai gostar. Isto é, te fazem
gastar mais para trocar o certo pelo duvidoso.
Isso prejudica não só a economia individual,
mas, somando-se, reflete-se também, é claro, na
economia nacional. Na área da informática, em
seu processo de mudança vertiginosa,
essa questão vem atingindo níveis dramáticos.
A alteração - sem sentido - dos comandos
a cada nova versão dos programas de
computador pode divertir (a cabeça), ocupar (o
tempo) e sustentar os (salários dos) analistas de
sistemas e projetistas de softwares, mas
traz grandes prejuízos aos usuários, que perdem
não só tempo, mas principalmente desempenho
operacional tendo de “reaprender”
os comandos que já conheciam, para continuar
a trabalhar. Isso sem falar nos custos
de aquisição dos upgrades. Quanto custa
ao país essa derrapagem periódica da
produtividade nacional, decorrente da falta
de consideração dos produtores com as
necessidades dos consumidores?
18
aquidesign de informação?
Não há cidadania sem informação, nem informação sem
Design. Esses pequenos exemplos, somados a tantos
outros, trazem a noção de cidadania para o âmbito da
responsabilidade do designer, e particularmente do
designer de informação. Cabe-nos assumir junto ao
poder público esta responsabilidade, por intermédio das
entidades acadêmicas e profissionais.
Conclusão
Joaquim Redig
é designer formado na
Esdi-Uerj (Escola Superior
de Desenho Industrial da
Universidade do Estado do
Rio de Janeiro), Mestre em
Design pela mesma instituição,
professor de Design da
PUC-Rio (Pontifícia
Universidade Católica do
Rio de Janeiro) e titular do
escritório Design Redig,
voltado às áreas do Design
Industrial e Informacional.
zenite
19
1
nstruindo
c
off
Aqui, lá, em
todos os cantos do mundo há soluções a
serem
compartilhadas, problemas a serem
tratados,
projetos a serem
divulgados. Hoje em
dia há tanta
informação que é muito fácil assuntos importantes e
interessantes passarem
despercebidos pela maioria
das pessoas. Não seria muito mais fácil se houvesse um
canal de informações que filtrasse esse conteúdo, lhe
apresentando só o que há de melhor e mais interessante?
offconstruindo in locus 21
Assim funciona In Locus, interligando diver-
sos assuntos nacionais e internacionais, com
foco no design social, mostrando exemplos na
prática e discussões teóricas sobre assuntos
contemporâneos. In Locus significa “no local”,
transmitindo o conceito de cada um estar pre-
sente na sociedade fazendo algo; independente
de estar perto ou longe, cada um faz um pouco
para contribuir para o bem social e mostrando
a grande movimentação de informações, que
contribuem para novos projetos.
Acreditamos no potencial de mudança dos
jovens de todo o mundo e gostaríamos de
lhes oferecer as ferramentas e informações
necessárias para que com seus projetos pes-
soais possam fazer a diferença - In Locus age
como a conexão entre todos eles, unindo o
pou-co que cada um pode fazer e concentrando
isso em uma força transformadora, com o intuito
de fazer o mundo um lugar melhor para todos
nós. O público-leitor são jovens estudantes de
design e interessados no assunto, que buscam
informações para enriquecerem seu conheci-
mento na área social e ativa do design.
off construindo in locus22
Nexa Bold
ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ
abcdefghijklmnopqrstuxywz
1234567890
Nexa Light
ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ
abcdefghijklmnopqrstuxywz
1234567890
Neutra Text Book
ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ
abcdefghijklmnopqrstuxywz
1234567890
Neutra Text Bold
ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ
abcdefghijklmnopqrstuxywz
1234567890
Neutra Text Book Italic
ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ
abcdefghijklmnopqrstuxywz
1234567890
SciFly
ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ
abcdefghijklmnopqrstuxywz
1234567890
1rial
ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ
1234567890
A tipografia para texto escolhida busca alcançar
o mesmo objetivo: a família tipográfica Neutra,
com seu desenho geométrico diferenciado co-
munica o tom sério da revista ao mesmo tempo
que se aproxima com nosso público jovem
– é uma tipografia moderna e dinâmica, sempre
adicionando ritmo e brincadeira com o desenho
diferenciado de suas caixas altas. A nexa,
utilizada como base para a criação do logotipo
também é utilizada para retrancas, olhos
(quando a tipografia da abertura da ma-téria
não é apropriada) e nos ícones do sumário. A
tipografia no título de cada matéria muda, para
criar uma identidade apropriada para o tema.
offconstruindo in locus 23
carta
A primeira capa tem o logotipo redesenhado
a partir da fonte Nexa Bold, escolhida para
trazer contemporaniedade para a marca em
sua primeira edição, as linhas que se expandem
das letras são a ideia de interligação que o
projeto leva como conceito. O círculo amarelo,
elemento que será sempre modificado a cada
edição, se encontra posicionado na letra “L”,
significando a saída do leitor da “bolha” de
conforto que se encontra, indo para novos
caminhos, representados pelas próprias
linhas de construção. A segunda capa traz a
construção e grid da primeira capa, revelando o
processo de construção da nossa primeira capa.
Na contra capa de cada edição trazemos uma
ficha com as principais matérias de cada seção
e seus respectivos autores, para que o usuário
possa identificar a edição que procura de forma
prática, sem precisar abrir a revista. Na primeira
edição o logo é o que mais importa, ja que
faz parte da matéria principal da revista, nas
seguintes edições ocuparia um espaço menor
dando lugar para imagens sobre outras matérias.
A linguagem visual que rege a revista, presente
em seu sumário e retranca, é a de “conexão”
– como a comunicação entre todos nós - cada
um em “seu lugar” – pode fazer a diferença na
sociedade e trazer novas ideias a tona. Isso é
representado pela linha que conecta todos
nós, representados como pontos. A escolha do
nome das seções também é relacionado a isso –
Aqui, para matérias nacionais ou sobre assuntos
daqui do Brasil; Lá, para matérias internacionais
e globais; On, sendo a parte conectada com os
leitores e nossa revista digital; e Off, a seção
Making-off dos bastidores, apresentando um
novo projeto e o processo de criação dele.
off
on
aqui
láoff construindo in locus24
A In Locus não é somente uma revista informa-
tiva, seu objetivo também é trazer assuntos con-
temporâneos porém sempre relevantes, inde-
pendentes de seu tempo. É uma revista para se
saborear – para se colecionar e guardar, para se
consultar e inspirar. Aliada à grande quantidade
de informação de qualidade que a revista traz,
está o planejamento gráfico e ilustrativo. Para
dar ainda mais valor a seu aspecto colecionável,
a revista faz uso de muitas fotos e ilustrações,
utilizando sempre imagens de alta qualidade
que agreguem significado à suas matérias. O
formato grande da revista aprimora isso, dando
alta visibilidade para as imagens.
Apesar da grande quantidade de informações
que são articuladas, a diagramação prioriza o
ritmo das matérias. Há muito espaço de respiro
e para articulação de imagens, sempre com a
preocupação de fazer com que o conteúdo seja
apresentado de forma dinâmica e interessante.
Utiliza-se de um grid de oito colunas com um
respiro entre elas, dando uma vasta possibili-
dade de articulação de texto e imagens.
O grid rege a organização da revista mas não a
restringe - dando a possibilidade de trabalhar
com uma diagramação experimental mas não
completamente desconstruída a ponto de per-
der a legibilidade e a leiturabilidade.
Os Editores
é um grupo formado por
estudantes de design em
habilitação em Programação
Visual da Universidade Pres-
biteriana Mackenzie formado
por: Felipe Kobayashi, Juliene
Ivy, Susanna Fukuma e
Zenite Sentoma. Descobriram
a verdadeira amizade depois
do projeto In Locus.
offconstruindo in locus 25
davidschermann
lá
Designers, assim como todos no planeta, têm uma boa razão para se
preocupar com o futuro. O mundo é volátil, e a habilidade da raça
humana de fazer um habitat saudável para si mesmo está em risco.
Ameaças que vão desde aquecimento global, falta de nutrição,
doenças, terrorismo e armas nucleares desafiam o potencial de
todos de praticar ações produtivas para o bem comum.
artigo por Victor Margolin
tradução por Thiago Burian
o design e o
espírito
humano
láo design e o espírito humano 27
Designers certamente estão entre aqueles
dos quais as contribuições positivas são
essenciais para a construção de um mundo mais
humano. Experientes em diversas áreas - seja
design de produtos, arquitetura, engenharia,
comunicação visual ou desenvolvimento de
softwares - pontes, edifícios, a internet, meios
de transporte, publicidade e vestimentas são
só alguns exemplos. Empresas não teriam nada
para comercializar sem designers, e também
não teriam serviços a oferecer.Paradoxalmente,
designers unidos como uma classe profissional
poderiam ser absurdamente poderosos, e ape-
sar disso suas vozes nos diversos congressos
onde políticas sociais e planos são discutidos e
debatidos raramente estão presentes.
Enquanto que o mundo já tenha ouvido muitos
clamores por mudanças sociais, pou-cas vieram
dos próprios designers, em parte porque a
comunidade de design não gerou argumentos
sobre quais tipos de mudança gostaria dever.
Apesar do potencial discursivo e prático que
possui para argumentar sobre o tema, a comu-
nidade de design do mundo inteiro ainda não
gerou uma visão profissional única sobre como
sua energia pode ser canalizada para fins
sociais. Como criadores de modelos, protóti-
pos e propostas, designers ocupam um espaço
dialético entre o mundo que é e o mundo que
poderia ser. Informados pelo passado e pelo
presente, sua atividade é orientada ao futuro.
Eles operam em situações que chamam por
intervenções, e têm a habilidade única de trans-
formar estas intervenções em formas materiais
e imateriais. Ainda que outros normalmente
definam as condições de seus trabalhos,
designers ainda criam os artefatos que são
postos em uso no mundo social. Um desincen-
tivo para que os designers se mobilizem é a
questão de sua autonomia ou habilidade de
programarem suas próprias agendas. O suporte
inicial para esta habilidade veio de Tomás Mal-
donado e outros teóricos de design na Itália no
começo dos anos 70. Eles caracterizaram o de-
signer como alguém que projeta ou faz projetos,
stekkes
lá o design e o espírito humano28
uso no mundo social.”
artefatos que são postos em
“designers ainda criam os 	
para fazer seu papel em um processo de mu-
dança social. Maldonado enfatizou a autonomia,
reconhecendo-a como um estado difícil de
conquistar. Entretanto, ele fez o argumento Sar-
treano de que “independentemente da situação,
o designer deve agir, ele deve definitivamente
abandonar a ‘sala de espera’ em que foi forçado
a permanecer até agora.
E ele deve agir mesmo que ele não saiba se
no fim a autonomia não se provará ser uma
ilusão”. Na verdade, muitas recentes inovações
tecnológicas permitiram que designers adqui-
rissem mais autonomia como produtores e
distribuidores de produtos. Casando a teoria de
que modestas ações individuais são pontos de
partida viáveis para mudanças sociais, escrevi
um curto artigo muitos anos atrás chamado “The
Designer as a Producer”, no qual argumentei
que o indivíduo designer agora tem o poder
para lançar uma empresa ou projeto usando os
abundantes recursos da internet para manufatu-
ra, armazenamento, promoção e distribuição.
e falaram sobre a cultura del progetto, ou “cultu-
ra de projeto”. Maldonado veementemente
articulou sua posição no influente livro de 1970
La Speranza Progettuale que fora traduzido
para o inglês dois anos depois como
Design, Nature and Revolution: Toward a
Critical Ecology. Como tema foco, Maldonado
focou no “ambiente humano”, que caracterizou
como “um dos muitos subsistemas que com-
põem o vasto sistema ecológico da natureza”.
Seguindo um modelo da teoria de sistemas,
ele clamou que dentre subsistemas, “apenas o
nosso possui hoje a capacidade virtual e real de
provocar perturbações substanciais - ou seja
irreversíveis - no equilíbrio de outros subsiste-
mas”.Designers são cúmplices neste processo,
mas Maldonado levanta a questão de como seus
papéis podem mudar. O ímpeto para seu livro
foi a urgência que sentiu a combater a rápida
degradação do ambiente e, ainda que tenha
reconhecido que a ação de design autônoma
seja difícil em qualquer sistema social, urgiu por
um esforço substancial da parte do designer
láo design e o espírito humano 29
Como um designer formula
o seu papel como agente de
mudança e determina um
caminho de ação?
Fazê-lo significa considerar
ambos o passado e o presente,
os quais foram ou são
incorporados em atividades
e artefatos concretos. Da
dialética do passado e
presente saem situações que
determinam as possibilidades
para o futuro. Para se planejar
efetivamente no presente se
requer uma visão de o que
o futuro poderia e deveria
ser. Eu uso tanto a palavra
de condição “podia” quanto
a prescritiva “deveria” para
sugerir, no primeiro caso,
que o futuro é sempre
baseado na contigência
de escolhas humanas e, no
“Da dialética do
segundo, para afirmar que
essas escolhas precisam ser
dirigidas por uma consideração
de o que deve ser feito.
Eu também faria uma distinção
entre cenários futuros
previsíveis e prescritivos. Um
cenário previsível é baseado
no que poderia acontecer.
Suas metodologias envolvem
a obtenção de dados e a
organização dos mesmos
em padrões que façam que
as reflexões sobre possíveis
futuros sejam mais plausíveis.
Criadores de cenários
previsíveis reconhecem que
os eventos ou atividades
que eles estudam são
complexos demais para serem
controlados por decreto.
Um dos poucos designer
Mais de um futuro
passado e presente
saem situações que
determinam as
possibilidades para
o futuro.”
liamhart
que pensava sobre o futuro
era William Morris, uma
figura prótea do século
dezenove, que publicou o
romance utópico, “News from
Nowhere”, em 1891. Mas a
visão de Morris do futuro foi
uma recriação do passado.
Ele mantinha uma polêmica
forte contra os valores de
preservação da sua época;
deste modo o passado rural
oferecia uma paisagem
mais hospitaleira para uma
sociedade utópica do que o
presente problemático. Eu
concordo com a preocupação
de Morris por valores
humanos, mas sua escolha
de uma configuração antiga
para uma comunidade futura
absolveu ele de negociar com
a dura realidade da Revolução
Industrial. Ainda assim seu
interesse no futuro era quase
único entre os designers de
seu tempo. Hoje, o processo
de mudança acelerado pede
que os designers interajam
com o futuro de um jeito mais
direto se eles vão ter um lugar
em seu esculpimento. Esse
é um processo complicado
para o qual os designers
profissionais não foram bem
preparados. Assim, pode
ajudar rever alguns métodos
que outros usaram para pensar
sobre o futuro e ver se eles
tem alguma relevância para
os designers. Ao passo que as
tentativas de saber o futuro
eram baseadas em adivinhação
ou previsão especulativa,
o campo de estudos do
futuro emergiu depois da II
Guerra Mundial como uma
tentativa de aplicar técnicas
de modelagem sofisticadas a
crianção de cenário futuros.
lá o design e o espírito humano30
“Talvez o campo mais volátil
Hoje, praticantes de tal técnica
competem com visionários es-
peculativos para gerar cenários
para ação futura. Esses cenári-
os abrangem bastante em
topico como também em estilo
retórico. Alguns são especu-
lativos, outros prescritivos.
Alguns focam em geopolítica,
enquanto outros enfatizam
a tecnologia. Como então
alguém entende tais cenários
para criar um plano de ação
individual ou coletivo? Para
tal seria necessário levar em
conta as várias esferas de ativi-
dade que constituem o mundo
social. Isso significa cuidadosa-
mente analisar as metodologias
que previsores adotam para
prever eventos futuros dentro
de suas próprias esferas de
conhecimento e interesse.
Talvez o campo mais volátil da
atividade humana, e o que
é mais difícil fazer previsões, é
relações internacionais.
Para criar políticas para ação
futura, teóricos nesse campo
desenvolvem modelos geo-
políticos de como se com-
portar uns com os outros.
Henry Kissinger, por exemplo,
introduziu a teoria Européia
de realpolitik para a política
da atividade humana, e o que é
mais difícil fazer previsões, é
relações internacionais.”
estrangeira Americana durante
a Guerra Fria, com resultados
que abrangem desde détente
com a União Soviética até
a cospiração com os ditadores
da América Latina. Hoje, geo-
política permanece dividida
entre teóricos com pontos de
vistas mundiais competitivos.
Em 1992, Francis Fukuyama
escreveu “O fim da história e
o último homem”, no qual ele
previu a adoção universal da
democracia liberal. Re-con-
hecendo que muitas nações
ainda tinham que instituir esse
sistema político, Fukuyama
considerou eles serem tem-
porariamente fora da história,
esperando para perceber que
a democracia liberal era o
objetivo do envolvimento
político. O otimismo base-
ado no esclarecimento de
Fukuyama foi oposto em 1996
por Saumel P. Huntington, que
previu um “conflito de civili-
zações” em seu livro “O confli-
to de civilizações e a recriação
da ordem mundial”.
Para Huntington, cujo subtex-
to foi uma convocação para
reafirmar os valores do Oci-
dente na frente ao seu declí-
nio econômico, as diferenças
entre nações não foram uma
consequência política, como
Kissinger assume, mas sim uma
questão de cultura.
O sistema de mundo de
Huntington compõe grandes
agregações de nações cul-
turalmente compatíveis que
frequentemente vnegociam
e apoiam umas às outras,
mas que opõem agregações
diferentes com a mesma
frequência. Para Huntington,
estes agrupamentos culturais
normalmente têm dificuldades
em reconciliar suas diferenças,
assim permitindo a ele con-
siderar tanto a polarização
crescente entre o Ocidente e
o Islamismo quanto a tensão
advinda do crescimento
econômico e político da China.
Os modelos geopolíticos de
Fukuyama, Huntington e out-
ros teóricos recentes carregam
um peso considerável entre
políticos que precisam mapear
as estratégias de nações e
organizações internaciona-
is. Os modelos também são
de interesse de crescentes
movimentos sociais que estão
inventando seus próprios pa-
péis na arena global emergen-
te, ainda que nem Fukuyama
e Huntington respondam pela
influência crescente destes
movimentos. Teorias geopolíti-
cas e suas implicações para o
futuro são também relevantes
láo design e o espírito humano 31
“Teorias geopolíticas e suas
implicações para o futuro são
também relevantes ao design.”
ao design. Um dos poucos designers a referenciar a geopolítica
foi Gui Bonsiepe, que escreveu de forma convincente sobre
o modelo centroperiferia e seus efeitos no design na América
Latina. Bonsiepe, por exemplo, recusou-se a caracterizar a
América Latina como uma região periférica que precise assimilar
ideias e modelos da prática do design de um cen-tro. Ao invés
Porque relações internacionais
envolvem muitos atores com
agendas diferentes, modelos
geopolíticos futuros podem
apenas ser de cunho premedi-
tivo ao invés de prescritivo.
Em contraste, o movimento
ambientalista emergente dos
anos 60 enfatiza modelos
de cunho prescritivo para o
futuro do planeta. Ativistas
ambientais da época procla-
maram que o ambiente era
uma responsabilidade coletiva
humana, e que todos devem
ser envolvidos no combate ao
seu abuso ou negligência. I
sto gerou a introdução de um
novo elemento nas relações
políticas - preocupações co-
muns - ainda que os teóricos
geopolíticos de vanguarda mal
tenham percebido.
Em 1972, o Clube de Roma
publicou “Limites ao Cresci-
mento”, um estudo baseado
em modelos computacionais
do MIT que simula as relações
entre os recursos da Terra e a
população humana.
Como uma ferramenta de
previsão, o estudo argumenta
que o consumo continuado
de recursos na proporção
atual seria insustentável. Seu
chamado por novas políticas
sociais e ambientais suste-
ntáveis foi continuado em
estudos subsequentes - as
“Our Common Future” e
“Agenda 21: The Earth Summit
Strategy to Save Our Planet”
da Comissão de Bruntland.
Ambos se originaram dentro
do sistema das Nações Unidas,
o último em conjunto com a
disso, ele buscou dar poder à designers lati-
no-americanos apelando a eles para localizar
suas práticas dentro de um modelo geopolí-tico
revisionista que não relegue seu trabalho para
as margens da produção e fluxo transnacional
de bens e serviços.
Às vezes o design é também incluso em planos
estratégicos para o desenvolvimento industrial.
Na Ásia, o design permitiu que o Japão trocasse
o paradigma centro/periferia no início dos anos
60 movendo-o de uma posição política e eco-
nomicamente marginal na ordem mundial para
uma de considerável poder. O modelo japonês
foi também utilizado pela Coréia, e agora outros
países asiáticos como China, Taiwan e Cingapu-
ra estão se posicionando como importantes
centros de design. A iniciativa “Design Cingapu-
ra”, que articula uma política de design para
Cingapura, diz claramente que a promoção do
design é central ao interesse nacional.
lá o design e o espírito humano32
hannan
Eco-92 do Rio de Janeiro. Desde então, diver-
sos autores têm produzido cenários futuros
baseados em sua crença em que políticas
ambientais sólidas são cruciais à sobrevivência
da humanidade. Dentre estes estão Natural
Capitalism: Creating the Next Industrial
Revolution (1999) por Paul Hawken, Amory
Lovins, e. Hunter Lovins e Eco-Economy: Build-
ing an Economy for the Earth (2001) de Lester R.
Brown. Opondo a posição ambiental contra as
predominantes suposições da economia, Brown
estabeleceu que: “economistas veem o ambi-
ente como um subgrupo da economia.
Ecologistas, por outro lado, veem a economia
como um subgrupo do ambiente”.
Os ambientalistas fornecem argumentos con-
vincentes a favor de mudanças, e consequen-
temente criaram impressionantes incursões
nas políticas e práticas de nações individuais e
organizações sociais cíveis.
Sustentabilidade, que denota bem-estar tan-
to social quanto ambiental, está também na
agenda social como um componente integrar
da política das Nações Unidas. Lester Brown,
na minha opinião, está correto em caracterizar
a economia como um subgrupo do meio ambi-
ente, assim como Tomás Maldonado definiu o
meio ambiente humano como um subsistema
interno a uma estrutura ambiental maior.
A comunidade de design,
como um todo, não adotou a
sustentabilidade como núcleo
de seu etos, mas muitos
designers sim. O desenvolvi-
mento adicional de uma pro-
gramação de sustentabilidade
se beneficiaria da atenção
para com o futuro em duas
formas: na antecipação de
novos m-teriais e processos
que permitirão um design mais
sustentável, e na avaliação das
consequências de práticas
não-sustentáveis. Os métodos
de previsão receberam um
forte empurrão da análise de
sistemas nos anos 60, um mod-
elo de abordagem matemática
para a anticipação de compor-
tamento de grandes sistemas.
Uma das aplicações mais
efetivas desta abordagem, que
combina análise de sistemas
com pesquisa histórica, foi o
estudo de 1997 de Herman
Kahn e Anthony Wiener, “The
Year 2000: A Framework for
Speculation on the Next Thir-
ty-Three Years”. Kahn já tivera
ganho notoriedade mundial
pelo seu livro de 1961 sobre
situações nucleares, “On Ther-
monuclear War”.
láo design e o espírito humano 33
“o mundo do construído em
breve será como o mundo do
nascido: autônomo, adaptável e
criativo mas, consequentemente,
fora do nosso controle.”
O estudo de Kahn e Wiener sondou dados de
muitos campos de pesquisa incluindo ciência,
tecnologia, economia e política internacional.
Mais integrados que os estudos geopolíticos
de Kissinger e outros especialistas em relações
internacionais, “The Year 2000” fez conexões
entre ciência, tecnologia e política.
Este apresentou algumas visões prescientes
com relação ao futuro, particularmente no domí-
nio da tecnologia. Muito antes de que qualquer
um pudesse imaginar as consequências políticas
de atos de terrorismo, Kahn e Wiener escre-
veram que “a necessidade de controlar e vigiar
vai se desenvolver a ponto de utilizar (ou como
Parkinson diria, ‘expandir-se para encher’) as ca-
pacidades tecnológicas que estão presentes no
sistema. O desenvolvimento tecnológico então,
além de atender a requisições do ambiente, ger-
ará necessidades a satisfazer capacidades tec-
nológicas ”. Poucos exercícios de previsão foram
tão extensivos quanto o de Kahn e Wiener.
Uma versão mais especializada, previsão tec-
nológica, também ganhou destaque nos anos
60, coincidindo com um pico nas pesquisas
sobre viagem espacial. Assim como o estudo de
Kahn e Wiener, a previsão tecnológica é primari-
amente preditiva e não prescritiva. Sendo assim
é melhor em caracterizar o que deve acontecer,
e é usada principalmente por organizações
comerciais e governamentais que buscam se
posicionar dentro de um mercado emergente ou
ambiente de pesquisa.
A bibliografia sobre previsão tecnológica pode
também ser extremamente valiosa para
designers por ajudá-los a localizar práticas atu-
ais em relação a tecnologias futuras, cujas
aplicações eles então podem antecipar com
planos, modelos e propostas. Uma variante mais
ampla e generalista da previsão tecnológica é o
reconhecimento de tendências, como exem-
plificado por livros amplamente lidos como
Megatrends de John Naisbitt, e Future Shock e
The Third Wave, de Alvin Toffler, os quais foram
previsões populares do futuro em oposição à
literatura mais séria sobre geopolítica, o ambi-
ente, ou tecnologia.
Por fim, eu gostaria de mencionar a literatura
altamente especulativa desenvolvida pelos
utópicos e distópicos que imaginam os efeitos
futuros de novas tecnologias, frequentemente
com base no seu próprio compromisso com
elas. Por isso, Hans Moravec, pesquisador
de vanguarda na área de robótica, prevê o
dia em que robôs substituirão seres vivos
devido à sua inteligencia superior. De forma
similar, Kevin Kelly, ex-editor da revista de
tecnologia Wired, publicou um extenso livro
em 1994, “Out of Control: The New Biology of
lá o design e o espírito humano34
Machines”, em que visualiza um momento no
futuro similar ao de Moravec, no qual máquinas
gerenciariam consideráveis segmentos da
sociedade humana. Kelly cunhou o termo
“vivisystems” para caracterizar a relação entre
grupos de entidades naturais e artificiais.
Como exemplo destas, ele cita “incubadoras
de vírus de computador, protótipos de robôs,
mundos de realidade virtual, personagens
animados sintéticos, ecologias artificiais
diversas, e modelos computadorizados da
própria Terra.” Abraçando a incursão do
artificial no biológico, Kelly prognostica que :
“o mundo do construído em breve será como
o mundo do nascido: autônomo, adaptável e
criativo mas, consequentemente, fora do nosso
controle.” Mais recentemente, o cientista de
computadores Bill Joy, um co-fundador da
Sun Microsystems, publicou um artigo de
cautela na revista Wired, “Porque o Futuro
não Precisa de Nós”, no qual ele busca entrar
em acordo com as tecnologias emergentes no
campo da robótica, engenharia genética e
nano-tecnologia. Como um especialista de
tecnologia, Joy expressa sua preocupação que
a tecnologia pode estar se movendo rápido
demais para que humanos façam as escolhas
corretas com relação ao seu uso.
Segundo Joy, “as experiências dos cientistas
do ramo atômico claramente mostram a
necessidade dos cientistas de responsabilizar-se
pelo seu estudo, pelo perigo das coisas andarem
rápido demais, e da forma como um processo
pode criar vida própria. Nós podemos, como
eles o fizeram, criar problemas insuperáveis
em um piscar de olhos. Nó precisamos pensar
mais agora para não sermos surpreendidos
e chocados pelas consequências de nossas
próprias invenções no futuro.” O maior valor
de narrativas especulativas como as de
Moravec ou Kelly é a sua apresentação de
dados em formas que a imaginação consegue
compreender. Eles têm a tendência, porém, a
ignorar a complexidade do mundo, substituindo
por predições simplificadas que carecem de
credibilidade social, psicológica ou política.
bandit
láo design e o espírito humano 35
Pela breve pesquisa acima, podemos ver que cenários
futuros são muito diversos e retoricamente incompatíveis. 	
Kevin Kelly ao escrever sobre o potencial de vivisistemas
parece viver em um planeta diferente de Lester Brown,
que privilegia o ambiente natural como determinante da
ação humana. E nenhum dos dois leva em consideração
a realidade do mundo goepolítico endereçada por
Fukuyama ou Huntington. Enquanto a visão de Kahn e
Wiener do ano 2000 é mais abrangente que muitos outros
estudos, sua janela de predição é limitada pela agenda
de pesquisa de seu patrocinador, o Instituto Hudson, um
centro de pesquisas Americano que trabalha para grandes
corporações e governos.
Visualizar o futuro é uma empreitada problemática, tendo
em vista as cacofonias de visões opostas que descrevem
Poder Discursivo
e Prático
“(...) designers são obrigados a
produzir um mundo
contrário aos valores que a
exibição demonstra (...)”
yigitak
como o mundo poderia ou deveria ser. Isto põe designers
e as profissões de design em uma situação difícil. Como
previamente mencionado, eles têm a habilidade única
de dar forma a planos e propostas, porém carecem de
cenários sociais amplos e coerentes que guiem seus
trabalhos. Ainda que o design esteja implicado em toda
a atividade humana, há pouco no curriculum típico do
designer que prepare estudantes a imaginar tais cenários.
Uma exceção notável é Massive Change, uma exibição
sobre o design e o futuro que foi inaugurada na Galeria de
Arte de Vancouver em 2004, e está desde então viajando
para diversas outras regiões.Organizado pelo Instituto
Sem Fronteiras, um grupo de pesquisa situado dentro
do estúdio de design do designer de Toronto Bruce Mau,
um de seus criadores, a exibição é prescritiva ao invés
de preditiva. Assim como os escritos de Victor Papanek,
Buckminster Fuller, Gui Bonsiepe e Tomás Maldonado
o fizeram no passado, Massive Change é um projeto
discursivo ainda que tenha forma de exibições, catálogos
e Websites, e não um livro.
Como o texto introdutório do catálogo afirma, Massive
Change “transformou o objetivo de bem-estar da raça
humana de uma ambição utópica - que seria, por definição,
fora de alcance, existindo apenas no domínio da arte -
para um projeto de design, um objetivo prático.”
Divididos em categorias denominadas “economias”, a
exposição e catálogo oferece uma gama de novas idéias
em domínios que vão desde urbanismo e energia até
novos materiais, manufatura, e desenvolvimento militar.
A organização e conteúdo da exposição foi grandemente
inspirada por um conjunto de experts convocados
como consultores durante seu planejamento. Através
das páginas do catálogo encontram-se entrevistas com
lá o design e o espírito humano36
profissionais como William McDonough,
Hernando de Soto, Dean Kamen, Lawrence
Lessig, Stewart Brand, Hazel Henderson,
Arthur Kroker, Catherine Gray e Jeffrey Sachs.
Politicamente, Massive Change apresenta
uma agenda global liberal. Enfatiza o lado mais
positivo do capitalismo - sua habilidade de
inovar em uma forma socialmente-responsável
- enquanto identifica os multiplos atores na
sociedade civil - “Grupos civis, empreendedo-
res sociais, organizações não governamentais
(ONGs),
e associações não-lucrativas” - como seus
agentes de mudança preferidos. O projeto
não endereça geopolítica ou sua influência no
design, nem trata de tecnologias potencialmente
distópicas. Não sem críticos prontos a levantar
preocupações legítimas sobre suas limitações, a
intenção do projeto é de abrir novos caminhos
para o compromisso do design e não analisar ou
criticar as práticas atuais do design. Confiando
grandemente em experts em assuntos diversos,
Massive Change é sobre ação e não política,
e tem sucesso ao fornecer uma rota de
esperança para designers preocupados com
o estado do mundo.
Para citar exemplos práticos de como designers
podem ganhar mais autonomia, podemos
mencionar Curitiba, Brasil, em que Jaime
Lerner, eleito prefeito três vezes a partir de
1971, transformou a cidade em um laboratório
de baixa tecnologia em prol do urbanismo
sustentável. Treinado como arquiteto e
planejador, Lerner foi assistido por um grande
grupo de arquitetos e designers empregados
por um instituto urbano público. Juntos,
identificaram e executaram centenas de
projetos variando desde um sistema de trânsito
rápido que tornou o transporte público mais
efetivo até uma fábrica que produz brinquedos
a de plástico reciclável, além de praças de
pedestres e sinais de rua em Braille que foram
adicionados à postes em intersecções de ruas.
Tanto Massive Change e as conquistas de Jaime
Lerner em Curitiba são exemplos de como os
designers podem ter poder prático e discursivo,
mas cada exemplo têm suas limitações. Massive
Change não confronta as muitas maneiras em
que designers são obrigados a produzir um
mundo contrário aos valores que a exibição
demonstra, nem sugere os tipos de mudanças
políticas que devem acontecer para que
designers possam realizar o trabalho que a
exibição reinvindica.
A liderança de Lerner em Curitiba demonstra
que um designer - seja ele arquiteto, planejador
ou designer de produto - pode conquistar muito
em uma posição de poder. Mas continua a ser
um exemplo idiosincrático que seria muito
difícil de ser recriado em países com políticas
diferentes. Assim voltamos ao argumento de
Maldonado de que designers precisam buscar
a autonomia e usá-la, se possível, para fins
socialmente e ambientalmente produtivos.
Eles precisam combater um mundo que está
se tornando cada vez mais polarizado: riqueza
contra pobreza; religião fundamentalista
contra humanitarismo secular; sustentabilidade
ambiental contra destruição ecológica; e
utopismo contra resistência tecnológica. Para
se posicionar nestas e outras forças opositoras
é requerida uma intensa reflexão dos valores,
objetivos e preocupações sociais do indivíduo.
Também se faz necessária uma estratégia
de alinhar-se com outros autores sociais e
instituições cujos ideais sejam compatíveis com
os do indivíduo.
Como então podem os cenários futuros
ajudar? Herman Kahn e Anthony Wiener
acreditam que antecipar estes eventos futuros
é uma tentativa de “aumentar as chances do
desejável e reduzir as chances do indesejável”.
Eles notam que “tendências ou eventos que
possuam dependência de grandes fenômenos
costumam ser mais vulneráveis a planejamento
a longo-prazo que aqueles que dependam de
circunstâncias únicas ou sequencias especiais
de eventos”. Kahn e Wiener direcionaram suas
observações ao seu clientes governamentais,
corporativos e militares, e é precisamente
por causa das previsões destes e de outros
pesquisadores relacionados que estes clientes
normalmente estão entre as com maior po-
tencial para compreender as tendências
do futuro e usar estas informações para a
tomada de decisões.
láo design e o espírito humano 37
Sociedades não se desenvolvem em trajetórias lineares.
Atividade intensa em um ou outro campo como ciência,
tecnologia, guerra ou arte pode produzir mares de mudança que
resultam em situações radicalmente diferentes que são difíceis de
antecipar. O mundo está agora no intermédio de um destes mares
de mudança, e nós precisamos aprender a pensar no futuro de
uma nova maneira. O Professor de direito Jeffrey Rosen, Ameri-
cano, fez este argumento alguns meses atrás enquanto refletia
sobre os julgamentos da Suprema Corte dos Estados Unidos.
Partindo do pressuposto que os questionamentos em qualquer
audiência de justiça focaria nos registros anteriores de justiça
e opiniões sobre assuntos controversos atuais como aborto,
Rosen defendeu a importância de tornar o processo tão focado
no futuro quanto é com relação ao passado e presente. Rosen
indica que na próxima década, “a Suprema Corte vai, com toda
certeza, ser questionada a decidir sobre uma fascinante gama de
questões divisivas que hoje estão em um horizonte longínguo.”
Como exemplos, ele cita tópicos controversos como monitoração
eletrônica, impressões digitais cerebrais, sondagem genética,
clonagem reprodutiva, mineiração de dados, e direitos sobre
propriedades digitais. Seu argumento era o de que seria tão im-
portante saber como os candidatos poderiam votar nestes temas
quanto examinar como eles teriam votado em casos passados.
Cenários Futuros,
Éticas e Valores
Como os julgamentos da Suprema Corte
referenciados por Rosen, designers também
encontrarão situações que levantarão questão
questões sem precedentes sobre valores e
ética. Novas tecnologias estão transformando
nossa relação com o mundo material e com
nós mesmos. Engenheiros, programadores,
designers de produto e cientistas estão
no centro destas transformações. Eu não
estou convencido de que essas pessoas são
capazes de prever todos os possíveis usos dos
dispositivos que estão criando, o que significa
que o “lado negro” de algumas tecnologias
podem vir a ser realidades sociais. Diversas
tecnologias existentes hoje estão apenas
aguardando uma implementação comercial.
Chips RFID, por exemplo, eventualmente serão
implantados na maioria dos produtos para
que lojas possam rastrear seus inventórios.
Mas assim que os produtos forem comprados,
os chips continuarão a transmitir sinais. As
consequências atuais parecem benignas. Autor
de ficção científica, Bruce Sterling elogia os
chips nos produtos, os quais ele categoriza
como parte de uma “internet de coisas.” “A
maior vantagem de uma Internet de coisas,”
escreve Sterling, “é que eu não preciso mais
fazer inventários de meus bens na minha
cabeça. Eles estão em um inventório voodoo
automágico, um trabalho muito distante da
minha percepção feito por um grupo de
máquinas. Não mais me preocuparei em lembrar
onde eu ponho meus objetos, ou como os
encontro, ou quanto eles custam, etc. Eu apenas
pergunto. Então eu recebo
a resposta com precisão em
tempo real.”
E ainda assim a quantidade de
dados que objetos vão emitir e
o seu potencial acesso público
levanta diversas questões
de privacidade que Sterling
desconsidera em sua visão
otimista de chips RFID como
servos eletrônicos, tomando
conta de todos nossos bens.
Além de inseridos em
produtos, chips RFID estão
sendo planejados para implan-
tação em seres humanos e já
estão, de fato, sendo usado
por jovens na Europa no
lugar de cartões de crédito,
especialmente em bares e
clubes noturnos.
A Corporação VeriChip,
detentora da patente do chip
implantável, promove seu
uso para múltiplos propósitos
desde pesquisas médicas a
“Historicamente, a tarefa
do designer era mais
simples do que é hoje (...)”
lá o design e o espírito humano38
segurança domiciliar. Muitos no mundo comer-
cial, assim como artistas de vanguarda que por
anos brincam com o conceito do ‘cyborg’, são
entusiastas da tecnologia RFID. Mas os chips
RFID também abrem as portas para questões
sérias de privacidade pessoal e controle do
corpo do indivíduo.
Designers estão envolvidos em todo aspecto
do design, promoção e uso da tecnologia
RFID. Engenheiros inventaram os chips,
Web Designers criaram o site da VeriChip, e
designers de produto desenharam o modelo do
leitor dos chips e outros aparelhos relacionados.
Movendo do microcósmico para o macrocós-
mico, uma pequena porém ativa comunidade
de empreendedores mostra interesse na
colonização do espaço e comercialização
de seus recursos, tanto como materia prima
ou como bens imóveis. Space Adventures
Ltd. é a precursora do turismo Espacial e um
número de empresários incluindo Richard
Branson, fundador da Virgin Galactic, fundaram
companhias para manufatura de veículos para
viagem turística. Além do próprio turismo
Espacial, alguns dos empreendedores neste
novo campo estão de olho no potencial para
comércio do Espaço Sideral.
A ambição deles ignora as propostas de
diversos tratados das Nações Unidas - o
Tratado do Espaço Sideral de 1967 e o Tratado
Lunar de 1979 - que determinam explícitamente
que todos os recursos do Espaço Sideral
são herança de toda a humanidade. Ainda
que estes tratados proíbam a propriedade de
recursos encontrados na lua ou outros
corpos celestiais, estes têm poucos signatários
e sua aplicação é difícil de imaginar.
Nós ainda não vimos se empreendedores
interessados no Espaço vão honrar os ideais
destes tratados, ou se irão ignorá-los e passarão
a comercializar os bens encontrados.
Se eles prosseguirem com empreendimentos
comerciais, precisarão de uma grande
quantidade de designers para criar naves
espaciais, equipamento de coleta, habitações
e publicidade. Isto levanta questões sobre
a ética de se trabalhar para um cliente cujo
trabalho vá contra o concelho de um tratado
cuja aplicação não pode ser forçada a eles.
sararbyrne
láo design e o espírito humano 39
As duas situações que
descrevo são apenas amostras
do que estes designers podem
encontrar nos anos a vir. Como
eles estarão preparados para
avaliar estas situações?
Em sociedades cujas eco-
nomias são interligadas
com tecnologias avançadas,
novas invenções e sistemas
como chips RFID e Smart Dust, pequenos
micro-sensores capazes de transmitir dados
de um para o outro enquanto permanecem
virtualmente invisíveis, têm o potencial
de alterar o núcleo da vida social. Como
os profissionais que estão criando estes
dispositivos, designers devem ser responsáveis
por manter fortes diálogos sobre suas
implicações sociais como Bill Joy o fez em seu
artigo da revista Wired ditado anteriormente.
Historicamente, a tarefa do designer era
mais simples do que é hoje, assim como
a responsabilidade do designer mais fácil
de se definir. Prover decoração para ou
dar forma a produtos era a tarefa primária.
Consequentemente, o design era sobre forma
visual e, consequentemente, sobre função
mecânica. John Ruskin e William Morris
demonstraram preocupações relacionadas a
trabalho e qualidade, mas eles não estavam
preocupados com os usos dos produtos os
quais, no fim do século 19, ainda não carregavam
as consequências sociais que hoje carregam.
Agora de frente com a crescente complexidade
do meio social do produto, designers precisam
pensar mais profundamente sobre o futuro e
sobre seu papel em trazê-lo ao presente. Eles
precisam de sistemas de aviso prévio para
alertá-los sobre tendências sociais que possam
ter impacto no que desenham, e requerem as
ferramentas intelectuais para refletir no sentido
destas tendências e suas implicações éticas.
Mas a ética, como a tecnologia, também entrou
em uma área cinzenta em que as implicações
morais de certas ações não são claras. Pesquisas
feitas em campos seletos como na bioética
têm produzido literatura considerável sobre
clonagem, células-tronco e tópicos relacionados.
Mas as éticas de implantes de chips, observação
tecnológica ou a comercialização do Espaço
ainda não foram debatidas com seriedade.
“designers precisam pensar mais
profundamente sobre
o futuro e sobre seu papel em
trazê-lo ao presente”
lá o design e o espírito humano40
Victor Margolin
é professor emérito de História
do Design na Universidade de
Illinois, Chicago. Ele é um co-
editor do periódico acadêmico
de design, Design Issues, e é o
autor, editor, ou co-editor de
vários livros incluindo Design
Discourse, Discovering Design,
The Idea of Design, The
Designed World, e The Politics
of the Artificial. Atualmente
está trabalhando em História
Mundial do Design (World
History of Design) dividido em
três volumes, que será publica-
do por Berg em Londres.
Nós precisamos rever as discussões éticas,
ainda que modestas, que históricamente
tenham sido parte do discurso do design. No
núcleo de uma nova ética de design está a
questão de o que significa ser humano. Clive
Dilnot argumenta que nós estamos submersos
em um mundo de artifício, devoto de qualquer
relação com um reino da natureza.
Eu discordo de Dilnot e prefiro situar o meio
ambiente humano, como Tomás Maldonado o
faz, dentro de um sistema maior que transcende
os limites da produção humana. Maldonado
nota que a ação humana é capaz de danificar
ou destruir o sistema maior, mas que o meio
ambiente humano não é nada além de um
subsistema do sistema ecológico. A implicação
deste esquema é que a conduta da vida humana
é de certa forma responsável pela ordem
complexa do sistema ecológico maior. Enquanto
a modelagem da organização do meio ambiente
humano é problemática, como numerosos
estudiosos têm mostrado, ainda assim há
muito que humanos precisam aprender sobre
coexistência com a natureza.
Natureza é apenas uma fonte de valores. Religião
é outra, assim como filosofia. Aqueles que abraçam
o credo ético da religião o fazem por acreditar que
valores religiosos representam a vontade de um
poder superior. Valores filosóficos são sustentados
em sistemas culturais específicos por outra razão
- eles parecem razoáveis. Sistemas de valores
coletivos, como os contidos em uma agregação
de declarações das Nações Unidas, derivam
destas outras fontes de pensamento religioso ou
filosófico. Todos estes códigos e compêndios são
fontes para se consumir ao desenvolver um novo
conjunto de éticas para o futuro.. O futuro que
temos pela frente afeta profundamente designers
de muitos campos profissionais diferentes. Eles
são, efetivamente, os agentes cujas habilidades
produzem o meio social de produtos e serviços
em que vivemos. Visto que este meio social pode
afetar e afirmar o potencial e bem-estar humano,
nós precisamos responsabilizar, pelo menos
parcialmente, os designer. Nós precisamos priorizar
a questão de como criar um conjunto de éticas de
design que possa sugerir direções humanamente
satisfatórias para o trabalho futuro. Esta é uma
tarefa coletiva para a comunidade de design cuja
compreensão do futuro via continuar a determinar
como vivemos no presente.
yaseralmajed
láo design e o espírito humano 41
Na nossa próxima edição traremos como matéria de capa um
grande questionamento em cima do grafite e o picho, o design
tem um grande papel nisso tudo afinal?
Nos mande sugestões, dúvidas, críticas o elogios.
Esse é o nosso espaço de contato direto com você leitor,
através do site (www.inlocus.com.br) ou do nosso aplicativo
(InLocus) disponível na appstore ou na playstore. Você pode
enviar fotos e elas podem aparecer aqui, nos aponte problemas
e soluções, seja com design de informação (pg. 5) ou qualquer
outro tipo que afete a nossa sociedade.
Também no nosso app vocês podem conferir uma agenda
com eventos, de design, sociais, ou culturais em geral.
Veja quando e onde acontecem os eventos mais próximos,
convide amigos ou começe seu próprio evento.
A Arte Urbana e seu
papel na sociedade.
Como o Design se
encaixa nisso?
Na próxima edição:
on próxima edição42
on
onpróxima edição 43
O poder do design social na sociedade

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O poder do design social na sociedade

  • 1.
  • 2. Construir uma revista requer muitas coisas, muitas mesmo, tanto emocionais – cuidados para não surtar com ninguém ou sozinho - quanto coisas físicas, e técnicas, sem contar conhecimento e leitura, e referências, enfim, com certeza é um dos projetos mais díficeis que eu já fiz, e acredito que se perguntarem a meu grupo eles dirão o mesmo. Nossa primeira edição traz como matéria de capa a construção desse projeto, desde o preguiçoso início ao desesperador fim. Os passos para projetuar uma revista se tornaram uma espécie de borrão conforme o tempo – lembrem- se que o desespero traz a tona muitas emoções fortes e lágrimas amargas - brincadeiras a parte, essa revista desde o começo tinha o intuito de falar com um público ao qual nos identificássemos, jovens, designers, querendo muito conhecimento (ou que nem queiram tanto assim, mas faríamos eles quererem) esse público é você, e esperamos com todo o coração que agrade, como disse antes, projeto de revista não é fácil, e sim temos certas falhas, mas convenhamos, quem não tem falhas, nosso projeto final se tornou sobre design social. Quando comentamos isso com um de nossos professores ele nos perguntou: “mas que tipo de design social?”. Mal sabíamos que por mais que tivéssemos fechado em um assunto dentro do design ele ainda era muito abrangente. O design na sociedade toma diversas formas, nós escolhemos ir para caminho da prática, o design feito por designers para a sociedade, trazer reflexões para vocês, e instigar mais sobre esse assunto. O design tem um poder muito grande dentro da sociedade, ele tem uma relação direta com todos nós, porém na maioria das vezes nem percebemos. Com essa revista queremos apontar para o design que envolve vocês todos como sociedade, e apontar obviamente que há falhas, falhas essas dentro de projetos, ou até mesmo falhas onde nem houve um projeto, com isso queremos despertar em vocês, assim como nos despertaram essa inquietação, o por que certas coisas não funcionam como deveriam ou por que deveriam funcionar de maneira diferente. O design não é a última solução, nós sabemos disso, e sabemos que na verdade a única coisa que pode melhorar algo, somos nós mesmos, tudo começa de um impulsozinho de nada no seu cérebro, mas isso pode virar algo grandioso, algo que mude vidas, ou até mesmo somente uma. Design está na sociedade para ajudar, e não somente deixar as coisas bonitas, isso é óbvio para um estudante de design, mas nunca é demais repetir. Temos um dever social e ele nos impulsiona, esperamos que com essa revista consigamos mostrar todo essa dimensão do Design que está ali presente, mesmo que escondido no mínimo detalhe, mesmo que pareça simples, porém é sempre relevante. ao leitorcarta
  • 3. 6 Design de Informação? Joaquim Redig 22 Construindo In Locus Editores off on aqui carta lá Sumário 44 Na próxima edição 28 O Design e o espírito humano Victor Margolin
  • 4. Joaquim Redig aponta o que a falta de um bom projeto de design pode causar à sociedade. Todos temos que arcar com as consequências de um design de informação falho, enquanto somos muitas vezes culpados por esses problemas. “Um dos objetivos do design de informação é equacionar os aspectos sintáticos, semânti- cos e pragmáticos que envolvem os sistemas de informação através da contextualização, planejamento, produção e interface gráfica da informação junto ao seu público alvo.” aqui
  • 5. paul pride aquidesign de informação? 5
  • 6. Há seis anos foi fundada em Recife a Sociedade Brasileira de Design da Informação (Sbdi), primeira entidade no Brasil dedicada a essa área do Design, cuja responsabilidade social tem crescido junto com a importância dainformação como instrumen- to de comunicação, cultura e tecnologia. A entidade já realizou três encontros nacionais (sempre com convidados internacionais) e sua atuação tem ajudado a disseminar no país o conceito do Design de Informação. Internacionalmente, este tem sido um tema de discussão impor- tante para o Design desde meados dos anos 1970, com eventos como a criação do Iiid (International Institute for Information De- sign, sediado na Áustria), a edição do Design Information Journal, e do boletim da Glyphs Inc., entidade internacional liderada pela antropóloga Margaret Mead e pelo designer Rudolf Modley, que visava a disseminação da pictografia como linguagem universal. Nacionalmente, a criação dessa entidade representa um grande passo no sentido da conscientização sobre a questão no país, após meio século de história do Design brasileiro. Embora neste período tenha florescido o Design Gráfico nacional, setor a que está vinculado o Design de Informação, esta especialidade per- maneceu aparentemente esquecida, tanto pela teoria, nas esco- las, quanto pela prática, nos escritórios, empresas e repartições - a não ser por algumas experiências isoladas, mas fundamentais neste processo, como o sistema de Comunicação Visual do serviço de ônibus urbano do Recife, de Edna Cunha Lima, ou o de São Paulo, de Cauduro/Martino, ou a sinalização urbana do Rio de Janeiro, da PVDI, de Aloisio Magalhães, só para citar grandes projetos pioneiros, todos dessa mesma época, anos 1970. No entanto, sua importância e necessidade nunca foi pequena. O passar do tempo e a permanência (portanto, o agravamento) dos problemas - como o caso (crítico) da (ausência de) comunicação visual nos transportes urbanos de ônibus, principal meio de loco- moção das cidades brasileiras - apenas acentuam a necessidade de atenção dos designers a esta área. Soma-se a isso o crescimento do valor da informação com a disseminação mundial da informática, e a recente expansão da área de Web Design, para a qual o Design de Informação é impre- scindível, embora muitas vezes relegado ao segundo plano, sub- stituído por estéticas de marketing para quem quer só se divertir, mas irrelevantes para aqueles que buscam informação na web com determinado objetivo. Estes são alguns dos antecedentes profissionais da fundação da Sbdi. Academicamente, passos de- cisivos nesse sentido foram a criação do Curso de Especialização em Design de Informação -único no país- no Departamento de Design da Ufpe (Universidade Federal de Pernambuco) em 2000, pelos professores Solange Coutinho e André Neves, e, em 2001, do Grupo de Pesquisa em Design de Informação (vinculado ao CNPq), liderado pelas professoras Solange e Carla Spinillo. Indo um pouco mais atrás, Solange declara que foram os profes- sores Edna e Guilherme Cunha Lima, formadores de sucessivas gerações de designers na Ufpe, e profissionais atuantes de forma pioneira no mercado do Design Gráfico local, que estimularam na atual geração de professores dessa escola o interesse pelo Design de Informação. Além disso, Solange lembra também a intervenção sempre precisa e oportuna de mestre Gui Bonsiepe, que, em 1993, introduziu o tema do Design de Informação no Recife, em sua palestra no 1º. Seminário Nacional de Educação em Design Gráfico.lamuria
  • 7. aquidesign de informação? Não foi à toa que o início da tomada de consciência coletiva sobre essa questão no Brasil veio daquela cidade. Muitas outras centelhas que alimentaram o desenvolvimento do Design Gráfico brasileiro têm vindo de lá. Historicamente - e por aí podemos chegar até às iniciativas pioneiras de Nassau no sentido de implantar a imprensa no Brasil, só para dar um exemplo clássico - Recife tem sido berço e palco de fatos e atores determinantes para o desenvolvimento da disciplina e da profissão do Design no Brasil. Não sendo especialista em história pernambucana, acho que devo apenas lembrar aqui alguns exemplos importantes: O Jornal do Commercio, Vicente do Rego Monteiro, O Gráfico Amador, Aloisio Magalhães, Gastão de Holanda, João Roberto Peixe, a APD-PE (Associação Profissional do Designers de Pernambuco). O grupo que se estruturou neste século na Ufpe em torno do tema da Informação no Design pode ser uma continuidade dessa linha - melhor dizendo, dessa linhagem. O conhecimento específico, esse grupo foi buscar na Inglaterra, mais especificamente na Universidade de Reading, onde se pós- graduaram muitos dos professores de Design Gráfico da UFPE. É bom lembrar que os ingleses são grandes mestres no assunto informação e cidadania: o mapa do metrô de Londres, ícone internacional do Design de Informação, desenhado nos anos 1930 e ainda hoje mundialmente copiado, ou re-reproduzido, é um exemplo maravilhoso e contundente. Já nos anos 1980 a revista inglesa Design, uma das mais importantes na área, predizia que, com a Informática, a função do designer industrial tenderia a perder com- plexidade e importância para a do comunicador visual (ou do designer gráfico) na medida em que os produtos eletrônicos tendem a ser materialmente iguais - uma placa de circuito impresso, uma botoeira, e um display - embora possam cumprir funções totalmente diferentes, graças à informação que contém. Resumindo, o hardware (material) é o mesmo, o que muda é o software (informação processada pelo hardware). Exemplo: Uma calculadora é igual a um controle remoto que é igual a um telefone sem fio. A diferença é a função que cumprem, dada pelo software (um faz contas, o segundo controla aparelhos à distância, e o terceiro transmite voz). A tendência é termos um só aparelho que, dependendo das teclas que se aperte, cumprirá TODAS as funções que hoje dezenas ou centenas de tipos de aparelhos diferentes cumprem, na nossa vida cotidiana. Um só Design de Produto, para centenas de Designs de Informação. Nesse ponto não posso deixar de lembrar da semente plantada por Décio Pignatari nos anos 1960 na Esdi (Escola Superior de Desenho Industrial), no Rio de Janeiro, onde, como professor de Teoria da Informação, Design industrial x design gráfico 7
  • 8. aqui design de informação? ele já antevia muitas destas questões. Ainda que não tivesse dado, até agora, frutos institucionais, essa semente certamente germinou na cabeça de muitos designers brasileiros que, como eu, se formaram nessa Escola nesse período, e foram alunos dele. Apaixonado pelo tema, por sua função (social) e por sua forma (racional), sem- pre o enfoquei com meus alunos - desde a pri- meira aula, em 1975, na PUC-Rio, com o tema da Pictografia. Profissionalmente, tenho desenvolvi- do, desde o escritório de Aloisio Magalhães/ PVDI, nos anos 1960/70, dezenas de projetos de sinalização que me têm dado a oportunidade de tocar na questão dainformação.Ao contrário, por exemplo, do Design Editorial ou Corpora- tivo, o Design de Informação não é, em geral, uma área lucrativa do mercado. Lidando com questões de âmbito público, está, portanto, mais submetido à crônica “falta” de verba do serviço público brasileiro. Somente agora, ainda timid- amente, algumas empresas, orientadas por um marketing mais inovador, e ajudadas por déca- das da ação perseverante do Design, começam a se voltar às reais necessidades do consumidor - ou pelo menos a dizer que querem isso - das quais uma das mais importantes é a informação clara, precisa e verdadeira.Assim, paralelamente ao crescimento do país, têm crescido no Brasil as ne- cessidades de projetos e intervenções nessa área. A importância desta iniciativa dos professores da Ufpe está não só em ajudar a nos preparar para atender a essas demandas, mas principalmente em trazer esse conceito da informação no Design para a consciência coletiva brasileira - governantes, empresários, profis- sionais e pesquisadores. Embora nesse movimento pernambucano tenham prevalecido os últimos - e é importantíssimo, particularmente para o Design brasileiro, uma questão como essa ocupar a cabeça, o tempo e a verba de cientistas e pesquisadores - sinto necessidade de convocar para a discussão os designers profissionais, e, sobretudo, os órgãos gove- namentais responsáveis por legislar e definir a info- mação pública no Brasil. casteel 8
  • 9. aquidesign de informação? Esta pergunta, que me foi feita pela editora de uma revista especializada, quando sugeri esse tema para um artigo, me fez pensar: É. Todo Design é de Informação. Mas uns são mais, outros menos. E é essa diferença que me interessa. Um exemplo: capas de discos. Um mesmo objeto mostra a diferença entre oDesign Gráfico (na capa) e o Design de Informação (na contracapa). Na frente, pode-se passar qualquer mensagem, pode-se até contrariar a imagem do artista, se ele, e/ou seu produtor, assim o quiser, ou concordar, naquele momento, naquele lançamento. Às vezes não é necessário nem escrever o nome do artista, na frente. Mas, do outro lado, eu, como usuário, quero saber rapidamente, sem esforço (se possível lendo em pé, na loja, antes de comprar), além do nome do artista, quais são as músicas, os autores, os músicos e, se possível, quando e em que contexto cada uma foi composta (para não falar das letras das canções, para ler depois, em casa). Tudo em tipo de letra não menor que Corpo 8, não muito fina nem muito grossa (nem light nem bold), sem linhas de contorno (outline) e com bom contraste cromático (letra bem escura sobre fundo bem claro ou vice versa). E ainda, com a numeração grande. A redução de espaço gráfico trazida pela passagem do LP ao CD veio aguçar os problemas de Comunicação Visual das capas de discos, acentuando o papel dodesigner de informação, nessa área rica e produtiva do Design Gráfico - tanto internacionalmente quanto nacionalmente, dada a riqueza e variedade de nossa produção musical. “Todo design não é de informação?” Dois instrumentos, um mesmo fim: funcionalidade o depoimento de um dos mais impor- tantes pesquisadores em Design de Informação, Jorge Frascara, argentino radicado no Canadá, veio reiterar essa conexão (Design Industrial e Design de Informação), ao citar o exemplo de um designer que, convocado por um fabricante de aviões para melhorar as instruções visuais de operação da saída de emergência da aeronave, após estudar o problema recomendou à empresa redesenhar primeiro o meca- nismo de operação da saída, que não se mostrava funcional, antes de redesenhar as respectivas instruções de uso. Isso me lembra um terrível acidente ocorrido há alguns anos no Rio de Janeiro, quando um ônibus urbano se incendiou e cerca de 10 pessoas mor- reram, sem conseguir sair do veículo a tempo. E por que não conseguiram, se o ônibus tinha saídas de emergência? Ou porque não conseguiram entender as instruções de funcionamento das saídas (um problema de Design de In- formação), ou porque não conseguiram operá-las, por serem mal desenhadas (um problema deDesign Industrial), ou porque eram subdimensionadas (outro problema deDesign Industrial), ou então o mecanismo de abertura estava emperrado - único caso em que não se trataria de um problema de Design, mas do serviço de manutenção. Sempre tive duas paixões profissionais, o Design Industrial e o Design de Informação, e sempre estranhei o fato de duas disciplinas ou atividades aparentemente tão díspares (uma com ênfase tecnológica, a outra cognitiva) me atraírem da mesma maneira. Daí fiquei contente quando ouvi mestre Gui Bonsiepe - hoje em dia provavelmente o maior teórico do Design no mundo - dizer numa palestra que o designer industrial teria facilidade em trabalhar com o Design de Informação por estar habituado a resolver problemas complexos de funcionalidade. No próprio congresso inaugural da Sbdi em Recife (2004), 9
  • 10. Diante daquela pergunta “todo Design não é de Informação?”, resolvi me deter sobre aqueles componentes que caracterizam essa área. Não pretendo aqui ser extensivo sobre o assunto, mas colocar inicialmente seus pontos principais: O primeiro se refere a questões do destinatário da mensagem. Os seguintes, a questões da forma da mensagem. E os últimos referem- se a questões do tempo, na transmissão da mensagem. Quando o objeto informativo não atende a essas características, relacionadas a seguir, o processo de comunicação será Outro exemplo, mais recente, da falta de funcionalidade da informação gerando con- seqüências desastrosas (mundialmente desastrosas, neste caso). O jornalFolha de São Paulo de 13.11.2001 (pág. A17) cita notícia veicula-da pelo site do diário norte- americano New York Times dizendo o seguinte: “O novo estudo(sobre as eleições de 2001 nos EUA, que deram vitória ao presidente republicano George Bush) deu respaldo estatístico às reclamações de muitos eleitores, sobre- tudo democratas de idade avançada, segundo os quais cédulas confusas os atrapalharam no momento da votação, fazendo com que votassem em mais de um candidato, segundo o jornal (NYT). Mais de 113 mil eleitores votaram em dois candidatos ou mais. Entre eles, 75 mil escolheram Gore (o candidato democrata derrotado) e algum outro candidato de menor expressão enquanto apenas 29 mil votaram em Bush e em outro candidato menos expressivo. Esses votos não foram considerados no resultado final porque a intenção dos eleitores não estava clara, de acordo com o diário. A vitória de Bush na Flórida deu ao republicano os 25 votos do Estado no Colégio Eleitoral. Assim, Bush chegou a 271 votos no colégio, um a mais do que o mínimo necessário para vencer o pleito.” (grifos meus) E se as cédulas não fossem “confusas”? E se tantos milhares eleitores não tivessem “se atrapalhado” com elas? (mesmo sendo idosos - e nesse ponto eu lembro que o que é ruim para idoso é ruim para todo o mundo). E se Bush não tivesse sido eleito, como seria o mundo hoje? O Design de Informação está no eixo do sistema democrático. Não existe democracia sem informação clara, e verdadeira. A seguir procuro delinear o que é informação clara e verdadeira, sob o ponto de vista do Design: aqui design de informação?10
  • 11. deficiente e, portanto, o usuário ou o cidadão poderá não ser atendido. Nesse caso, de nada servirá o Design - harmonia entre formas, cores, materiais, significados. A relação da forma (externa) com a estrutura (interna) dos objetos é um dos fundamentos do Design (de Produto, ou de Comunicação Visual), ao contrário do que se pensa, e diz a mídia, que confunde “design” com aparência, superficialidade e frivolidade. São condições indispensáveis para o Design de Informação existir: anirudhkoul 1 aquidesign de informação? 11
  • 12. aqui design de informação? Se, como diz a Semiótica, toda comunicação tem um ponto de partida, o emissor da men- sagem, e um ponto de chega- da, o receptor, para o Design de Informação é este quem determina o conteúdo da men- sagem, e não quem a emite. O próprio emissor (nosso cliente), se quiser cumprir sua função, deve se colocar também nessa po-sição diante do receptor (seu cliente - isto é, cliente do nosso cliente). Por exemplo, no caso da sinalização do metrô, o emissor das informações que desenhamos é a companhia, nosso cliente (por quem somos contratados), sendo receptor o passageiro (para quem somos contratados). A propaganda oficial do go-verno tem sido um campo típico - e vergonhoso - onde a informação se dirige mais aos interesses do emissor (governantes) que do receptor (população), ao contrário do que deveria ser. Vergonhoso porque é o cidadão (recep- tor) quem paga, em forma de impostos, os milhões que essa propaganda custa - enquan- to alguns serviços públicos Depois do foco no receptor, a segunda qualidade fundamental do Design de Infor-mação está na forma gráfica da mensagem, que deve ser, o mais possível, analógica. É essencial que a informação tratada pelo designer estabeleça uma analogia com seu conteúdo, visando, antes de tudo, clareza e rapidez de leitura. Os relógios digitais, ainda bem, não substituíram os de ponteiros, que hoje são digitais na tecnologia (com painéis de cristal líquido), mas muitas vezes analógicos na sua forma de leitura (com “ponteiros” que são na verdade imagens na tela, e não mais peças que giram mecanicamente). Chamam-se”analógicos” na medida em que estabelecem uma analogia (no caso, visual) com a noção da passagem do tempo, refletida no movimento circular dos ponteiros (que remete ao próprio movimento dos planetas, nosso sistema de referência para a contagem do tempo, originalmente expresso no relógio de sol), em oposição aos “digitais”, que veiculam a essenciais não são prestados por “falta de verba”. Sou totalmente contra propagan- da governamental (não cam- panhas de interesse público, que é coisa oposta). Afinal, não lhe parece um absurdo pagar para que seus empregados falem bem deles mesmos, para você mesmo? - e o que são os governantes senão nossos em- pregados, ou seja, alguém que pagamos para trabalhar para nós, embora a maioria trabalhe para si próprio? Por outro lado, campanhas de interesse coleti- vo (de saúde, de se-gurança no trânsito etc.) são puro Design de Infor-mação, essenciais para a cidadania e o desenvolvimen- to social. Nada têm a ver com gastar dinheiro público para dizer que este governo foi o melhor que já tivemos, ou para um pagodeiro nos repetir, em cadeia nacional, aquele refrão inspirado que não nos per- mitirá esquecer que o partido do governo é o mais honesto e trabalhador do Brasil. 12
  • 13. aquidesign de informação? informação através de “dígitos”, signos abstratos e convencionados - no caso, algarismos.Esse conceito de leitura digital x analógica (homogênea, por meio do apenas do alfabeto, x heterogênea, isto é, por meio de formas, cores, símbolos, e também do alfabeto) pode ser estendido a qualquer área da Comunicação Visual. Muitas informações de inte-resse público perdem eficácia porque são “digitais” e não “analógicas” (nesse sentido da leitura, não da tecnologia, repito). A bula de remédio é um exemplo clássico. São produzidas em função dos interesses do emissor da informação (laboratório fa-bricante do remédio) e não do receptor (paciente - só podia ter esse nome!), sendo visualmente “planas” (chatas), nada analógicas, e muito pouco comunicativas. Um bom exemplo oposto, de informação analógica útil e disseminada, é a Sinalização de Trânsito, uma das primeiras manifestações do Design de Informação no mundo, cujos parâmetros foram es-tabelecidos também nos anos 1930 (na mesma época do mapa do metrô de Londres), e que, desde então, tem servido de modelo para muitas outras áreas da linguagem visual. O conceito de analogia é, no meu entender, determinante para a existência do Design de Informação. Mas existem outras características impor-tantes a serem consideradas, na forma da mensagem: Atributo intrínseco a qualquer comunicação, trata-se de uma característica absolutamente imprescindível para o Design de Informação. Embora sua necessidade seja óbvia, sua ausência é comum. Nessa área da Sinalização de Trânsito, a eletrônica trouxe a possibilidade de uso de painéis luminosos (feitos de micro- lâmpadas) com informações móveis, transitórias, úteis principalmente em situações de emergência (embora aqui eles não sejam usados para isso), coisa impossível de fazer com a sinalização fixa tradicional. Cidades grandes, médias e até pequenas possuem hoje em dia esses painéis luminosos, em pórtico sobre as avenidas principais. Aqui no Rio eles são (sub) usados na hora do rush, por exemplo, para orientar os motoristas quanto ao melhor trajeto para ir de Botafogo à Barra, dois polos importantes da cidade separados por montanhas e lagunas. Pode-se fazer esse trajeto pelo lado direito (Av. Borges de Medeiros) ou esquerdo (Av. Epitácio Pessoa) da Lagoa Rodrigo de Freitas. Assim, logo antes da Lagoa há um painel desses que diz (todos os dias, no fim da tarde): “B. Medeiros: LENTO - E. Pessoa: INTENSO”. Ou vice-versa. Qual a diferença? Qual dos dois caminhos devo escolher? Qual será o melhor - ou o menos pior, o lento ou o intenso? Para que me serve essa informação yuribittar 13 1
  • 14. aqui design de informação? Considerando as necessidades e condições de leitura, é imprescindível que a mensagem do Design de Informação seja absolutamente concisa, sem signos ou palavras supérfluas ou dispensáveis. Há uma placa nas ciclovias do Rio que diz, para o ciclista: “Atenção! Cuidado! Respeite a travessia - a prioridade é do pedestre. Bastava dizer: “A prioridade é do pedestre”. Aí já está subentendido o “respeite a travessia”. Nesse contexto (sinalização urbana), por questões de tempo, e de segurança, não se pode ser prolixo nem redundante. Tem-se que ir direto ao ponto. A economia de palavras inclusive valoriza a mensagem. O excesso dilui. Uma ordem NUMA só palavra é muito mais forte do que NUMA FRASE DE DEZ PALAVRAS. Voltando ao painel eletrônico de trânsito: alternando com a mensagem sobre o andamento do tráfego, acende uma tela nesse painel que anuncia, solenemente: “CET-RIO INFORMA: CONDIÇÕES DE TRÁFEGO “ (e depois apaga - aliás, não apaga, as palavras saem da tela “andando” para os lados, uma linha sai para a direita e outra para a esquerda: uma gracinha!). Eu não quero saber se aquele painel SERVE PARA ME DIZER quais são as condições de tráfego (se ele está no local das informações de tráfego, ou seja, acima e no meio da pista... era só o que faltava, se fosse um painel de propaganda!). O que eu preciso saber é QUAIS SÃO as condições do tráfego. Sem introduções. Em movimento, não há tempo para isso - além de ser perigoso (distrair-se com informações supérfluas). Seria o mesmo que colocar no cabeçalho das placas fixas de sinalização urbana o título: “CET-RIO INFORMA: DIREÇÕES DE TRÁFEGO”, e abaixo, então, a informação que realmente interessa: “Copacabana à direita”, por exemplo. E para que alternar as telas luminosas? para nos divertir, enquanto dirigimos no tráfego? (ou enquanto NÃO dirigimos, no engarrafamento?) Por que não deixar acesa só a informação que (pretensamente) nos interessa, sem movimentos graciosos? Outro exemplo de propaganda confundida com sinalização: é muito comum no Brasil uma placa rodoviária (portanto, dirigida aos motoristas) que diz “Proteja a Sinalização”. O que se quer dizer com isso? Como é que uma pessoa, dentro de um carro, em movimento, dirigindo, pode “proteger” uma placa fincada do lado de fora, na beira da estrada? O que se espera que o motorista faça? (pare o carro na estrada, salte, chegue junto à placa, veja se ela está suja ou quebrada, faça uma limpeza ou um carinho na placa, e depois procure na lista telefônica o número do Dner ou do DER para avisar sobre eventuais avarias na placa?) Ou será que essa mensagem seria dirigida àqueles delinqüentes que dão tiros na sinalização? Neste caso, será que, lendo-a, eles deixarão de atirar? (ironia é ver placas com esse texto furadas de bala!). Dinheiro (nosso, não canso de lembrar) jogado fora - ou no bolso dos fornecedores e compradores oficiais corruptos). 14
  • 15. aquidesign de informação? Outro componente essencial do Design de Informação, relacionado à propriedade analógica. Na informação analógica, há ênfase nas partes mais importantes ou mais graves da mensagem, por meio da acentuação gráfica dos elementos de informação, como o uso de letra pesada (bold) ou caixa alta, o aumento do tamanho, o destaque em cores mais fortes, ou o uso de recursos de separação visual, como margens, fios, barras, vinhetas, molduras ou quadros. As ênfases tornam a superfície informativa heterogênea, ou “ondulada”, e não homogênea, ou “plana” (como é a bula de remédio). Além da legibilidade, elas conferem também ao objeto informativo um contorno, um perfil, uma “cara” - uma identidade, portanto. Sistemas de informação necessitam de códigos consistentes, onde cada signo, dentro de seu contexto, corresponde sempre a um mesmo significado, e vice-versa. No metrô do Rio, durante cerca de 30 anos os assentos reservados a gestantes, idosos e deficientes físicos eram, em alguns vagões, na cor verde, com os demais assentos do mesmo vagão na cor laranja, e nos outros vagões era o contrário, ou seja, os assentos reservados em laranja, e os comuns em verde. Aoposição de cores, sobretudo, mais do que sua variação, anulava qualquer possibilidade de fixação - e portanto de utilização - do código. Para que fazer dois acabamentos dife-rentes no interior dos trens? Certamente para ficar mais “de-corativo”. Aí está outro vírus que freqüentemente contamina ou até destrói a Informação, além da Propaganda: a Decoração. Não que a sinalização deva se desvincular da função decorativa, ao contrário, esta é uma das funções compulsórias a serem cumpridas por ela, na medida em que é parte do ambiente ar-quitetônico. O problema é quan- do o aspecto decorativo ofusca ou até substitui a informação, o que é um contra-senso, embora freqüente. Contra-senso porque a sinalização é feita (destinada / pensada / comprada / fabri- Empregar palavras de uso comum é essencial para a comunicação neste nível. No Rio de Janeiro, os pontos de parada de vans e kombis (sistema que veio a preencher um vácuo no transporte de média capacidade das grandes cidades brasileiras neste início de século) são identificados por uma placa onde está escrito “Transporte Especial Complementar” - “tucanaram a kombi”, diria o José Simão, humorista do jornal Folha de S.Paulo. Se você estiver procurando esse serviço em algum lugar na cidade, e perguntar a alguém “onde fica o ponto do transporte especial complementar”, ninguém vai entender. Mas, se você perguntar “onde fica o ponto de kombi”, ou de van vão te responder. Para mim, usuário, esse sistema de transporte não tem nada de “especial”, nem de “complementar”. Poderá ser para os planejadores do transporte da cidade, emissores dessa informação, para quem este sistema auxiliar complementa o principal, servido pelos ônibus. Mas, para muitos, ele é o meio transporte que o levará, por exemplo diretamente de casa ao trabalho. Para o usuário ele é apenas um sistema de transporte menor, mais rápido, mais freqüente - e, ao menos aqui no Rio, chama-se “van” ou “kombi”. cada / instalada) para informar, não para decorar. O desafio do designer no caso é justamente o oposto, ou seja, não substituir a informação pela decoração, mas unir os dois: usar a infor-mação como decoração, e o ele- mento decorativo como informação. lops jr. 15 1
  • 16. aqui design de informação? Outra característica necessária ao Design de Informação, no mínimo por uma questão de respeito ao próximo. Podemos continuar no mesmo exemplo: na placa que identifica esses assentos reservados para gestantes e deficientes nos vagões do metrô do Rio, colocada acima dos respectivos assentos, há uma frase, obrigatória por lei, que começa assim: “Colabore: Você não está proibido de sentar nesses lugares mas lembre-se que eles são reservados a idosos, gestantes, deficientes físicos, etc. etc....”. No metrô de Londres tem escrito assim: “Por favor, ofereça esse assento a uma pessoa idosa ou deficiente”. Veja bem a diferença: “Por favor ofereça este assento...” em lugar de “Você não está proibido de sentar-se mas lembre-se...”.Síntese, precisão, e respeito. Aqui no Brasil parte-se do princípio de que todos os usuários dos serviços públicos são de- linqüentes, e assim somos todos tratados. Mas eu não sou delinqüente e exijo o direito de ser tratado como cidadão. E mesmo que fôssemos todos delinqüentes, caberia ao serviço público tratar-nos com respeito. Como se espera que nós TODOS, inclusive os delinqüentes, tratemos os serviços públicos com respeito. Por outro lado, cordialidade não é esse ônibus urbano que dá “BOM DIA” pelo painel frontal (noutro dia, ainda de manhã, havia um dizendo “BOA TARDE”), onde também, alternadamente, se informa o número e nome da linha. Como esse painel agora é eletrônico (como o pórtico de trânsito, feito de micro-lâmpadas), pronto, haja criatividade nas mensagens! Na época do Natal o ônibus diz também “FELIZ NATAL”! Já que se pode escrever qualquer coisa nesses painéis, as pessoas não conseguem deixar de escrever bobagens - é só digitar e enviar a mensagem (ao contrário de uma sinalização fixa, que você tem que pensar, desenhar, olhar, aprovar, fabricar, e instalar). Se querem mudar de mensagem, alternando com o nome da linha, no caso do ônibus, então pelo menos que se esclareça seu trajeto, ou sua tarifa. O “bom dia” a gente deixa para o motorista, ao entrarmos no veículo. Ao vivo. Com direito a som, e ex-pressão. Como em Londres. E no interior do Brasil. Se esse é um exemplo de demagogia (fantasiada de “cordialidade”), este próximo chega a ser hipocrisia: quem agüenta ligar para um serviço e ficar esperando na linha enquanto uma gravação repete no seu ouvido que “a sua ligação é muito importante para nós”? Se fosse, não nos deixariam esperando, nos massacrando com essa frase “cordial”, mas estaríamos sendo atendidos. Esses tele-marqueteiros pensam que todos são bobos, como eles? Se sabemos que pelo menos ALGUMAS ligações NÃO serão importantes para a empresa, e sendo a frase dita em TODAS as ligações, então, às vezes - senão sempre - aquela voz está mentindo, e isso pode estar acontecendo na nossa vez. pampolin 16
  • 17. aquidesign de informação? Em primeiro lugar, é essencial que a informação apareça (em primeiro plano), quando precisamos dela, e não apa- reça (fique em segundo plano), quando não precisamos. Vou exemplificar novamente com o painel eletrônico da sinalização de trânsito - é bom repetir o exemplo para ver a variedade de problemas que um mesmo objeto pode trazer. Além da falta de clareza, o que torna aquele painel inútil é a inoportunidade da infor- mação: Ou seja: todo mundo sabe - até os turistas - que, todo dia, na hora do rush, o trânsito nas avenidas principais é mesmo “lento” E “intenso”. Por isso, essa informação não quer dizer nada. Então, não perco mais tempo desviando minha atenção da rua para ler esses painéis (quanto pagamos por eles, aliás?). E, no dia que precisarem me mandar uma in- formação útil (aos motoristas), não vou receber (como, por exemplo, a de que o trânsito está lento por causa de um acidente em tal lugar, indican- do um caminho alternativo - uso que nunca vi ser feito desse painel, embora ela seja feito para isso). Agora, o exemplo inverso, elucidativo: Há poucos anos atrás passei algumas semanas hospedado num bairro resi- dencial na periferia da cidade de São Francisco (EUA), e todos os dias, seguindo o movimento do trânsito, ia para o centro da cidade de manhã e voltava à tarde, dirigindo por auto-estradas largas mas sinuosas, numa região mon- tanhosa. Depois de percorrer esse trajeto várias vezes, e já sabendo o caminho de cor, um dia deparei, logo antes de uma curva da estrada, com um desses painéis eletrônicos, que dizia: “Tráfego parado adiante”. E, logo depois da curva, tudo parado. Numa via expressa veloz, cheia de curvas, e de carros, aquela informação era muito importante para os motoristas diminuírem a velocidade a tempo, evitan- do um engavetamento. Mas, repare, eu nunca antes tinha visto aquele painel. Nos outros dias ele provavelmente estava APAGADO! Só o vi quando precisei dele. Para mim, como motorista, ele nunca foi usado para dizer algo previsível (e, portanto, inútil). Ele nunca foi usado para dizer que o tráfego adiante estava NOR- MAL! (como aqui no Rio, onde às vezes se coloca esta informação preciosa no painel eletrônico: “Avenida Tal: BOM”! Se o trânsito está bom, e isso é o normal - ou será o anormal? - para que informar? Apaguem o painel, e pelo menos, economi- zamos energia - a elétrica, cole- tiva, e a do olhar, individual. yurireese 17 1
  • 18. aqui design de informação? Informação é linguagem, e linguagem demanda continuidade. Não se usa uma palavra num sentido hoje, e amanhã noutro. O que, porém, não significa estagnação. Com o tempo, o sentido muda. Mas é uma mudança lenta, onde predomina a estabilidade sobre a instabilidade. Códigos, para serem usados, têm de ser duradouros, mudando quando não correspondem mais à realidade. Na nossa sociedade de consumo subdesenvolvido, porém, onde vicejam, além do regime da obsolescência planejada (de origem internacional), o regime da corrupção institucionalizada (paixão nacional), ambos campos de interesses privados (isto é, dos interesses do emissor, não do receptor), exemplos de descontinuidade, em prejuízo do público, são freqüentes: A mudança constante dos nomes de ruas no Brasil, além desconsiderar o caráter poético e histórico que cada rua tem, serve apenas para fazer média entre políticos e famílias de mortos poderosos (emissores da informação). A mudança freqüente dos números de telefone no Brasil serve apenas para atender à desorganização das empresas concessionárias de telefonia, e à sua falta de consideração com o público, destino final do serviço. A mudança constante das siglas de órgãos públicos serve ou para encobrir erros passados, ou para atender aos interesses de políticos que entram em cena, e usam esses órgãos em seu benefício. Nenhuma dessas mudanças leva em consideração as necessidades dos usuários. Ao contrário, só lhes dá dor de cabeça e despesas, desperdiçando seu tempo, prejudicando sua comunicação e sua vida, exigindo-lhes refazer papéis e documentos, despesas e prejuízos NUNCA ressarcidos pelos agentes provocadores das mudança. No campo do consumo privado o problema também é freqüente. Se um produto que você tem saiu de linha (e se ele ficou mais de um ano na “linha” foi muito), pode jogá-lo fora. As dificuldades de consertar aparelhos fora de linha, ainda que bem conservados, ou de conseguir re-completar os azulejos de um pedaço de parede que teve de reformar, ou de comprar mais um sapato igual a esse que você usa e gosta, são maneiras que as empresas encontram de fazer você comprar mais (de novo, no interesse do emissor, não do receptor). Você é obrigado a jogar fora o que você sabe que gosta, e a comprar um produto novo que você não sabe se vai gostar. Isto é, te fazem gastar mais para trocar o certo pelo duvidoso. Isso prejudica não só a economia individual, mas, somando-se, reflete-se também, é claro, na economia nacional. Na área da informática, em seu processo de mudança vertiginosa, essa questão vem atingindo níveis dramáticos. A alteração - sem sentido - dos comandos a cada nova versão dos programas de computador pode divertir (a cabeça), ocupar (o tempo) e sustentar os (salários dos) analistas de sistemas e projetistas de softwares, mas traz grandes prejuízos aos usuários, que perdem não só tempo, mas principalmente desempenho operacional tendo de “reaprender” os comandos que já conheciam, para continuar a trabalhar. Isso sem falar nos custos de aquisição dos upgrades. Quanto custa ao país essa derrapagem periódica da produtividade nacional, decorrente da falta de consideração dos produtores com as necessidades dos consumidores? 18
  • 19. aquidesign de informação? Não há cidadania sem informação, nem informação sem Design. Esses pequenos exemplos, somados a tantos outros, trazem a noção de cidadania para o âmbito da responsabilidade do designer, e particularmente do designer de informação. Cabe-nos assumir junto ao poder público esta responsabilidade, por intermédio das entidades acadêmicas e profissionais. Conclusão Joaquim Redig é designer formado na Esdi-Uerj (Escola Superior de Desenho Industrial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro), Mestre em Design pela mesma instituição, professor de Design da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) e titular do escritório Design Redig, voltado às áreas do Design Industrial e Informacional. zenite 19 1
  • 21. Aqui, lá, em todos os cantos do mundo há soluções a serem compartilhadas, problemas a serem tratados, projetos a serem divulgados. Hoje em dia há tanta informação que é muito fácil assuntos importantes e interessantes passarem despercebidos pela maioria das pessoas. Não seria muito mais fácil se houvesse um canal de informações que filtrasse esse conteúdo, lhe apresentando só o que há de melhor e mais interessante? offconstruindo in locus 21
  • 22. Assim funciona In Locus, interligando diver- sos assuntos nacionais e internacionais, com foco no design social, mostrando exemplos na prática e discussões teóricas sobre assuntos contemporâneos. In Locus significa “no local”, transmitindo o conceito de cada um estar pre- sente na sociedade fazendo algo; independente de estar perto ou longe, cada um faz um pouco para contribuir para o bem social e mostrando a grande movimentação de informações, que contribuem para novos projetos. Acreditamos no potencial de mudança dos jovens de todo o mundo e gostaríamos de lhes oferecer as ferramentas e informações necessárias para que com seus projetos pes- soais possam fazer a diferença - In Locus age como a conexão entre todos eles, unindo o pou-co que cada um pode fazer e concentrando isso em uma força transformadora, com o intuito de fazer o mundo um lugar melhor para todos nós. O público-leitor são jovens estudantes de design e interessados no assunto, que buscam informações para enriquecerem seu conheci- mento na área social e ativa do design. off construindo in locus22
  • 23. Nexa Bold ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ abcdefghijklmnopqrstuxywz 1234567890 Nexa Light ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ abcdefghijklmnopqrstuxywz 1234567890 Neutra Text Book ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ abcdefghijklmnopqrstuxywz 1234567890 Neutra Text Bold ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ abcdefghijklmnopqrstuxywz 1234567890 Neutra Text Book Italic ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ abcdefghijklmnopqrstuxywz 1234567890 SciFly ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ abcdefghijklmnopqrstuxywz 1234567890 1rial ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUXYWZ 1234567890 A tipografia para texto escolhida busca alcançar o mesmo objetivo: a família tipográfica Neutra, com seu desenho geométrico diferenciado co- munica o tom sério da revista ao mesmo tempo que se aproxima com nosso público jovem – é uma tipografia moderna e dinâmica, sempre adicionando ritmo e brincadeira com o desenho diferenciado de suas caixas altas. A nexa, utilizada como base para a criação do logotipo também é utilizada para retrancas, olhos (quando a tipografia da abertura da ma-téria não é apropriada) e nos ícones do sumário. A tipografia no título de cada matéria muda, para criar uma identidade apropriada para o tema. offconstruindo in locus 23
  • 24. carta A primeira capa tem o logotipo redesenhado a partir da fonte Nexa Bold, escolhida para trazer contemporaniedade para a marca em sua primeira edição, as linhas que se expandem das letras são a ideia de interligação que o projeto leva como conceito. O círculo amarelo, elemento que será sempre modificado a cada edição, se encontra posicionado na letra “L”, significando a saída do leitor da “bolha” de conforto que se encontra, indo para novos caminhos, representados pelas próprias linhas de construção. A segunda capa traz a construção e grid da primeira capa, revelando o processo de construção da nossa primeira capa. Na contra capa de cada edição trazemos uma ficha com as principais matérias de cada seção e seus respectivos autores, para que o usuário possa identificar a edição que procura de forma prática, sem precisar abrir a revista. Na primeira edição o logo é o que mais importa, ja que faz parte da matéria principal da revista, nas seguintes edições ocuparia um espaço menor dando lugar para imagens sobre outras matérias. A linguagem visual que rege a revista, presente em seu sumário e retranca, é a de “conexão” – como a comunicação entre todos nós - cada um em “seu lugar” – pode fazer a diferença na sociedade e trazer novas ideias a tona. Isso é representado pela linha que conecta todos nós, representados como pontos. A escolha do nome das seções também é relacionado a isso – Aqui, para matérias nacionais ou sobre assuntos daqui do Brasil; Lá, para matérias internacionais e globais; On, sendo a parte conectada com os leitores e nossa revista digital; e Off, a seção Making-off dos bastidores, apresentando um novo projeto e o processo de criação dele. off on aqui láoff construindo in locus24
  • 25. A In Locus não é somente uma revista informa- tiva, seu objetivo também é trazer assuntos con- temporâneos porém sempre relevantes, inde- pendentes de seu tempo. É uma revista para se saborear – para se colecionar e guardar, para se consultar e inspirar. Aliada à grande quantidade de informação de qualidade que a revista traz, está o planejamento gráfico e ilustrativo. Para dar ainda mais valor a seu aspecto colecionável, a revista faz uso de muitas fotos e ilustrações, utilizando sempre imagens de alta qualidade que agreguem significado à suas matérias. O formato grande da revista aprimora isso, dando alta visibilidade para as imagens. Apesar da grande quantidade de informações que são articuladas, a diagramação prioriza o ritmo das matérias. Há muito espaço de respiro e para articulação de imagens, sempre com a preocupação de fazer com que o conteúdo seja apresentado de forma dinâmica e interessante. Utiliza-se de um grid de oito colunas com um respiro entre elas, dando uma vasta possibili- dade de articulação de texto e imagens. O grid rege a organização da revista mas não a restringe - dando a possibilidade de trabalhar com uma diagramação experimental mas não completamente desconstruída a ponto de per- der a legibilidade e a leiturabilidade. Os Editores é um grupo formado por estudantes de design em habilitação em Programação Visual da Universidade Pres- biteriana Mackenzie formado por: Felipe Kobayashi, Juliene Ivy, Susanna Fukuma e Zenite Sentoma. Descobriram a verdadeira amizade depois do projeto In Locus. offconstruindo in locus 25
  • 27. Designers, assim como todos no planeta, têm uma boa razão para se preocupar com o futuro. O mundo é volátil, e a habilidade da raça humana de fazer um habitat saudável para si mesmo está em risco. Ameaças que vão desde aquecimento global, falta de nutrição, doenças, terrorismo e armas nucleares desafiam o potencial de todos de praticar ações produtivas para o bem comum. artigo por Victor Margolin tradução por Thiago Burian o design e o espírito humano láo design e o espírito humano 27
  • 28. Designers certamente estão entre aqueles dos quais as contribuições positivas são essenciais para a construção de um mundo mais humano. Experientes em diversas áreas - seja design de produtos, arquitetura, engenharia, comunicação visual ou desenvolvimento de softwares - pontes, edifícios, a internet, meios de transporte, publicidade e vestimentas são só alguns exemplos. Empresas não teriam nada para comercializar sem designers, e também não teriam serviços a oferecer.Paradoxalmente, designers unidos como uma classe profissional poderiam ser absurdamente poderosos, e ape- sar disso suas vozes nos diversos congressos onde políticas sociais e planos são discutidos e debatidos raramente estão presentes. Enquanto que o mundo já tenha ouvido muitos clamores por mudanças sociais, pou-cas vieram dos próprios designers, em parte porque a comunidade de design não gerou argumentos sobre quais tipos de mudança gostaria dever. Apesar do potencial discursivo e prático que possui para argumentar sobre o tema, a comu- nidade de design do mundo inteiro ainda não gerou uma visão profissional única sobre como sua energia pode ser canalizada para fins sociais. Como criadores de modelos, protóti- pos e propostas, designers ocupam um espaço dialético entre o mundo que é e o mundo que poderia ser. Informados pelo passado e pelo presente, sua atividade é orientada ao futuro. Eles operam em situações que chamam por intervenções, e têm a habilidade única de trans- formar estas intervenções em formas materiais e imateriais. Ainda que outros normalmente definam as condições de seus trabalhos, designers ainda criam os artefatos que são postos em uso no mundo social. Um desincen- tivo para que os designers se mobilizem é a questão de sua autonomia ou habilidade de programarem suas próprias agendas. O suporte inicial para esta habilidade veio de Tomás Mal- donado e outros teóricos de design na Itália no começo dos anos 70. Eles caracterizaram o de- signer como alguém que projeta ou faz projetos, stekkes lá o design e o espírito humano28
  • 29. uso no mundo social.” artefatos que são postos em “designers ainda criam os para fazer seu papel em um processo de mu- dança social. Maldonado enfatizou a autonomia, reconhecendo-a como um estado difícil de conquistar. Entretanto, ele fez o argumento Sar- treano de que “independentemente da situação, o designer deve agir, ele deve definitivamente abandonar a ‘sala de espera’ em que foi forçado a permanecer até agora. E ele deve agir mesmo que ele não saiba se no fim a autonomia não se provará ser uma ilusão”. Na verdade, muitas recentes inovações tecnológicas permitiram que designers adqui- rissem mais autonomia como produtores e distribuidores de produtos. Casando a teoria de que modestas ações individuais são pontos de partida viáveis para mudanças sociais, escrevi um curto artigo muitos anos atrás chamado “The Designer as a Producer”, no qual argumentei que o indivíduo designer agora tem o poder para lançar uma empresa ou projeto usando os abundantes recursos da internet para manufatu- ra, armazenamento, promoção e distribuição. e falaram sobre a cultura del progetto, ou “cultu- ra de projeto”. Maldonado veementemente articulou sua posição no influente livro de 1970 La Speranza Progettuale que fora traduzido para o inglês dois anos depois como Design, Nature and Revolution: Toward a Critical Ecology. Como tema foco, Maldonado focou no “ambiente humano”, que caracterizou como “um dos muitos subsistemas que com- põem o vasto sistema ecológico da natureza”. Seguindo um modelo da teoria de sistemas, ele clamou que dentre subsistemas, “apenas o nosso possui hoje a capacidade virtual e real de provocar perturbações substanciais - ou seja irreversíveis - no equilíbrio de outros subsiste- mas”.Designers são cúmplices neste processo, mas Maldonado levanta a questão de como seus papéis podem mudar. O ímpeto para seu livro foi a urgência que sentiu a combater a rápida degradação do ambiente e, ainda que tenha reconhecido que a ação de design autônoma seja difícil em qualquer sistema social, urgiu por um esforço substancial da parte do designer láo design e o espírito humano 29
  • 30. Como um designer formula o seu papel como agente de mudança e determina um caminho de ação? Fazê-lo significa considerar ambos o passado e o presente, os quais foram ou são incorporados em atividades e artefatos concretos. Da dialética do passado e presente saem situações que determinam as possibilidades para o futuro. Para se planejar efetivamente no presente se requer uma visão de o que o futuro poderia e deveria ser. Eu uso tanto a palavra de condição “podia” quanto a prescritiva “deveria” para sugerir, no primeiro caso, que o futuro é sempre baseado na contigência de escolhas humanas e, no “Da dialética do segundo, para afirmar que essas escolhas precisam ser dirigidas por uma consideração de o que deve ser feito. Eu também faria uma distinção entre cenários futuros previsíveis e prescritivos. Um cenário previsível é baseado no que poderia acontecer. Suas metodologias envolvem a obtenção de dados e a organização dos mesmos em padrões que façam que as reflexões sobre possíveis futuros sejam mais plausíveis. Criadores de cenários previsíveis reconhecem que os eventos ou atividades que eles estudam são complexos demais para serem controlados por decreto. Um dos poucos designer Mais de um futuro passado e presente saem situações que determinam as possibilidades para o futuro.” liamhart que pensava sobre o futuro era William Morris, uma figura prótea do século dezenove, que publicou o romance utópico, “News from Nowhere”, em 1891. Mas a visão de Morris do futuro foi uma recriação do passado. Ele mantinha uma polêmica forte contra os valores de preservação da sua época; deste modo o passado rural oferecia uma paisagem mais hospitaleira para uma sociedade utópica do que o presente problemático. Eu concordo com a preocupação de Morris por valores humanos, mas sua escolha de uma configuração antiga para uma comunidade futura absolveu ele de negociar com a dura realidade da Revolução Industrial. Ainda assim seu interesse no futuro era quase único entre os designers de seu tempo. Hoje, o processo de mudança acelerado pede que os designers interajam com o futuro de um jeito mais direto se eles vão ter um lugar em seu esculpimento. Esse é um processo complicado para o qual os designers profissionais não foram bem preparados. Assim, pode ajudar rever alguns métodos que outros usaram para pensar sobre o futuro e ver se eles tem alguma relevância para os designers. Ao passo que as tentativas de saber o futuro eram baseadas em adivinhação ou previsão especulativa, o campo de estudos do futuro emergiu depois da II Guerra Mundial como uma tentativa de aplicar técnicas de modelagem sofisticadas a crianção de cenário futuros. lá o design e o espírito humano30
  • 31. “Talvez o campo mais volátil Hoje, praticantes de tal técnica competem com visionários es- peculativos para gerar cenários para ação futura. Esses cenári- os abrangem bastante em topico como também em estilo retórico. Alguns são especu- lativos, outros prescritivos. Alguns focam em geopolítica, enquanto outros enfatizam a tecnologia. Como então alguém entende tais cenários para criar um plano de ação individual ou coletivo? Para tal seria necessário levar em conta as várias esferas de ativi- dade que constituem o mundo social. Isso significa cuidadosa- mente analisar as metodologias que previsores adotam para prever eventos futuros dentro de suas próprias esferas de conhecimento e interesse. Talvez o campo mais volátil da atividade humana, e o que é mais difícil fazer previsões, é relações internacionais. Para criar políticas para ação futura, teóricos nesse campo desenvolvem modelos geo- políticos de como se com- portar uns com os outros. Henry Kissinger, por exemplo, introduziu a teoria Européia de realpolitik para a política da atividade humana, e o que é mais difícil fazer previsões, é relações internacionais.” estrangeira Americana durante a Guerra Fria, com resultados que abrangem desde détente com a União Soviética até a cospiração com os ditadores da América Latina. Hoje, geo- política permanece dividida entre teóricos com pontos de vistas mundiais competitivos. Em 1992, Francis Fukuyama escreveu “O fim da história e o último homem”, no qual ele previu a adoção universal da democracia liberal. Re-con- hecendo que muitas nações ainda tinham que instituir esse sistema político, Fukuyama considerou eles serem tem- porariamente fora da história, esperando para perceber que a democracia liberal era o objetivo do envolvimento político. O otimismo base- ado no esclarecimento de Fukuyama foi oposto em 1996 por Saumel P. Huntington, que previu um “conflito de civili- zações” em seu livro “O confli- to de civilizações e a recriação da ordem mundial”. Para Huntington, cujo subtex- to foi uma convocação para reafirmar os valores do Oci- dente na frente ao seu declí- nio econômico, as diferenças entre nações não foram uma consequência política, como Kissinger assume, mas sim uma questão de cultura. O sistema de mundo de Huntington compõe grandes agregações de nações cul- turalmente compatíveis que frequentemente vnegociam e apoiam umas às outras, mas que opõem agregações diferentes com a mesma frequência. Para Huntington, estes agrupamentos culturais normalmente têm dificuldades em reconciliar suas diferenças, assim permitindo a ele con- siderar tanto a polarização crescente entre o Ocidente e o Islamismo quanto a tensão advinda do crescimento econômico e político da China. Os modelos geopolíticos de Fukuyama, Huntington e out- ros teóricos recentes carregam um peso considerável entre políticos que precisam mapear as estratégias de nações e organizações internaciona- is. Os modelos também são de interesse de crescentes movimentos sociais que estão inventando seus próprios pa- péis na arena global emergen- te, ainda que nem Fukuyama e Huntington respondam pela influência crescente destes movimentos. Teorias geopolíti- cas e suas implicações para o futuro são também relevantes láo design e o espírito humano 31
  • 32. “Teorias geopolíticas e suas implicações para o futuro são também relevantes ao design.” ao design. Um dos poucos designers a referenciar a geopolítica foi Gui Bonsiepe, que escreveu de forma convincente sobre o modelo centroperiferia e seus efeitos no design na América Latina. Bonsiepe, por exemplo, recusou-se a caracterizar a América Latina como uma região periférica que precise assimilar ideias e modelos da prática do design de um cen-tro. Ao invés Porque relações internacionais envolvem muitos atores com agendas diferentes, modelos geopolíticos futuros podem apenas ser de cunho premedi- tivo ao invés de prescritivo. Em contraste, o movimento ambientalista emergente dos anos 60 enfatiza modelos de cunho prescritivo para o futuro do planeta. Ativistas ambientais da época procla- maram que o ambiente era uma responsabilidade coletiva humana, e que todos devem ser envolvidos no combate ao seu abuso ou negligência. I sto gerou a introdução de um novo elemento nas relações políticas - preocupações co- muns - ainda que os teóricos geopolíticos de vanguarda mal tenham percebido. Em 1972, o Clube de Roma publicou “Limites ao Cresci- mento”, um estudo baseado em modelos computacionais do MIT que simula as relações entre os recursos da Terra e a população humana. Como uma ferramenta de previsão, o estudo argumenta que o consumo continuado de recursos na proporção atual seria insustentável. Seu chamado por novas políticas sociais e ambientais suste- ntáveis foi continuado em estudos subsequentes - as “Our Common Future” e “Agenda 21: The Earth Summit Strategy to Save Our Planet” da Comissão de Bruntland. Ambos se originaram dentro do sistema das Nações Unidas, o último em conjunto com a disso, ele buscou dar poder à designers lati- no-americanos apelando a eles para localizar suas práticas dentro de um modelo geopolí-tico revisionista que não relegue seu trabalho para as margens da produção e fluxo transnacional de bens e serviços. Às vezes o design é também incluso em planos estratégicos para o desenvolvimento industrial. Na Ásia, o design permitiu que o Japão trocasse o paradigma centro/periferia no início dos anos 60 movendo-o de uma posição política e eco- nomicamente marginal na ordem mundial para uma de considerável poder. O modelo japonês foi também utilizado pela Coréia, e agora outros países asiáticos como China, Taiwan e Cingapu- ra estão se posicionando como importantes centros de design. A iniciativa “Design Cingapu- ra”, que articula uma política de design para Cingapura, diz claramente que a promoção do design é central ao interesse nacional. lá o design e o espírito humano32
  • 33. hannan Eco-92 do Rio de Janeiro. Desde então, diver- sos autores têm produzido cenários futuros baseados em sua crença em que políticas ambientais sólidas são cruciais à sobrevivência da humanidade. Dentre estes estão Natural Capitalism: Creating the Next Industrial Revolution (1999) por Paul Hawken, Amory Lovins, e. Hunter Lovins e Eco-Economy: Build- ing an Economy for the Earth (2001) de Lester R. Brown. Opondo a posição ambiental contra as predominantes suposições da economia, Brown estabeleceu que: “economistas veem o ambi- ente como um subgrupo da economia. Ecologistas, por outro lado, veem a economia como um subgrupo do ambiente”. Os ambientalistas fornecem argumentos con- vincentes a favor de mudanças, e consequen- temente criaram impressionantes incursões nas políticas e práticas de nações individuais e organizações sociais cíveis. Sustentabilidade, que denota bem-estar tan- to social quanto ambiental, está também na agenda social como um componente integrar da política das Nações Unidas. Lester Brown, na minha opinião, está correto em caracterizar a economia como um subgrupo do meio ambi- ente, assim como Tomás Maldonado definiu o meio ambiente humano como um subsistema interno a uma estrutura ambiental maior. A comunidade de design, como um todo, não adotou a sustentabilidade como núcleo de seu etos, mas muitos designers sim. O desenvolvi- mento adicional de uma pro- gramação de sustentabilidade se beneficiaria da atenção para com o futuro em duas formas: na antecipação de novos m-teriais e processos que permitirão um design mais sustentável, e na avaliação das consequências de práticas não-sustentáveis. Os métodos de previsão receberam um forte empurrão da análise de sistemas nos anos 60, um mod- elo de abordagem matemática para a anticipação de compor- tamento de grandes sistemas. Uma das aplicações mais efetivas desta abordagem, que combina análise de sistemas com pesquisa histórica, foi o estudo de 1997 de Herman Kahn e Anthony Wiener, “The Year 2000: A Framework for Speculation on the Next Thir- ty-Three Years”. Kahn já tivera ganho notoriedade mundial pelo seu livro de 1961 sobre situações nucleares, “On Ther- monuclear War”. láo design e o espírito humano 33
  • 34. “o mundo do construído em breve será como o mundo do nascido: autônomo, adaptável e criativo mas, consequentemente, fora do nosso controle.” O estudo de Kahn e Wiener sondou dados de muitos campos de pesquisa incluindo ciência, tecnologia, economia e política internacional. Mais integrados que os estudos geopolíticos de Kissinger e outros especialistas em relações internacionais, “The Year 2000” fez conexões entre ciência, tecnologia e política. Este apresentou algumas visões prescientes com relação ao futuro, particularmente no domí- nio da tecnologia. Muito antes de que qualquer um pudesse imaginar as consequências políticas de atos de terrorismo, Kahn e Wiener escre- veram que “a necessidade de controlar e vigiar vai se desenvolver a ponto de utilizar (ou como Parkinson diria, ‘expandir-se para encher’) as ca- pacidades tecnológicas que estão presentes no sistema. O desenvolvimento tecnológico então, além de atender a requisições do ambiente, ger- ará necessidades a satisfazer capacidades tec- nológicas ”. Poucos exercícios de previsão foram tão extensivos quanto o de Kahn e Wiener. Uma versão mais especializada, previsão tec- nológica, também ganhou destaque nos anos 60, coincidindo com um pico nas pesquisas sobre viagem espacial. Assim como o estudo de Kahn e Wiener, a previsão tecnológica é primari- amente preditiva e não prescritiva. Sendo assim é melhor em caracterizar o que deve acontecer, e é usada principalmente por organizações comerciais e governamentais que buscam se posicionar dentro de um mercado emergente ou ambiente de pesquisa. A bibliografia sobre previsão tecnológica pode também ser extremamente valiosa para designers por ajudá-los a localizar práticas atu- ais em relação a tecnologias futuras, cujas aplicações eles então podem antecipar com planos, modelos e propostas. Uma variante mais ampla e generalista da previsão tecnológica é o reconhecimento de tendências, como exem- plificado por livros amplamente lidos como Megatrends de John Naisbitt, e Future Shock e The Third Wave, de Alvin Toffler, os quais foram previsões populares do futuro em oposição à literatura mais séria sobre geopolítica, o ambi- ente, ou tecnologia. Por fim, eu gostaria de mencionar a literatura altamente especulativa desenvolvida pelos utópicos e distópicos que imaginam os efeitos futuros de novas tecnologias, frequentemente com base no seu próprio compromisso com elas. Por isso, Hans Moravec, pesquisador de vanguarda na área de robótica, prevê o dia em que robôs substituirão seres vivos devido à sua inteligencia superior. De forma similar, Kevin Kelly, ex-editor da revista de tecnologia Wired, publicou um extenso livro em 1994, “Out of Control: The New Biology of lá o design e o espírito humano34
  • 35. Machines”, em que visualiza um momento no futuro similar ao de Moravec, no qual máquinas gerenciariam consideráveis segmentos da sociedade humana. Kelly cunhou o termo “vivisystems” para caracterizar a relação entre grupos de entidades naturais e artificiais. Como exemplo destas, ele cita “incubadoras de vírus de computador, protótipos de robôs, mundos de realidade virtual, personagens animados sintéticos, ecologias artificiais diversas, e modelos computadorizados da própria Terra.” Abraçando a incursão do artificial no biológico, Kelly prognostica que : “o mundo do construído em breve será como o mundo do nascido: autônomo, adaptável e criativo mas, consequentemente, fora do nosso controle.” Mais recentemente, o cientista de computadores Bill Joy, um co-fundador da Sun Microsystems, publicou um artigo de cautela na revista Wired, “Porque o Futuro não Precisa de Nós”, no qual ele busca entrar em acordo com as tecnologias emergentes no campo da robótica, engenharia genética e nano-tecnologia. Como um especialista de tecnologia, Joy expressa sua preocupação que a tecnologia pode estar se movendo rápido demais para que humanos façam as escolhas corretas com relação ao seu uso. Segundo Joy, “as experiências dos cientistas do ramo atômico claramente mostram a necessidade dos cientistas de responsabilizar-se pelo seu estudo, pelo perigo das coisas andarem rápido demais, e da forma como um processo pode criar vida própria. Nós podemos, como eles o fizeram, criar problemas insuperáveis em um piscar de olhos. Nó precisamos pensar mais agora para não sermos surpreendidos e chocados pelas consequências de nossas próprias invenções no futuro.” O maior valor de narrativas especulativas como as de Moravec ou Kelly é a sua apresentação de dados em formas que a imaginação consegue compreender. Eles têm a tendência, porém, a ignorar a complexidade do mundo, substituindo por predições simplificadas que carecem de credibilidade social, psicológica ou política. bandit láo design e o espírito humano 35
  • 36. Pela breve pesquisa acima, podemos ver que cenários futuros são muito diversos e retoricamente incompatíveis. Kevin Kelly ao escrever sobre o potencial de vivisistemas parece viver em um planeta diferente de Lester Brown, que privilegia o ambiente natural como determinante da ação humana. E nenhum dos dois leva em consideração a realidade do mundo goepolítico endereçada por Fukuyama ou Huntington. Enquanto a visão de Kahn e Wiener do ano 2000 é mais abrangente que muitos outros estudos, sua janela de predição é limitada pela agenda de pesquisa de seu patrocinador, o Instituto Hudson, um centro de pesquisas Americano que trabalha para grandes corporações e governos. Visualizar o futuro é uma empreitada problemática, tendo em vista as cacofonias de visões opostas que descrevem Poder Discursivo e Prático “(...) designers são obrigados a produzir um mundo contrário aos valores que a exibição demonstra (...)” yigitak como o mundo poderia ou deveria ser. Isto põe designers e as profissões de design em uma situação difícil. Como previamente mencionado, eles têm a habilidade única de dar forma a planos e propostas, porém carecem de cenários sociais amplos e coerentes que guiem seus trabalhos. Ainda que o design esteja implicado em toda a atividade humana, há pouco no curriculum típico do designer que prepare estudantes a imaginar tais cenários. Uma exceção notável é Massive Change, uma exibição sobre o design e o futuro que foi inaugurada na Galeria de Arte de Vancouver em 2004, e está desde então viajando para diversas outras regiões.Organizado pelo Instituto Sem Fronteiras, um grupo de pesquisa situado dentro do estúdio de design do designer de Toronto Bruce Mau, um de seus criadores, a exibição é prescritiva ao invés de preditiva. Assim como os escritos de Victor Papanek, Buckminster Fuller, Gui Bonsiepe e Tomás Maldonado o fizeram no passado, Massive Change é um projeto discursivo ainda que tenha forma de exibições, catálogos e Websites, e não um livro. Como o texto introdutório do catálogo afirma, Massive Change “transformou o objetivo de bem-estar da raça humana de uma ambição utópica - que seria, por definição, fora de alcance, existindo apenas no domínio da arte - para um projeto de design, um objetivo prático.” Divididos em categorias denominadas “economias”, a exposição e catálogo oferece uma gama de novas idéias em domínios que vão desde urbanismo e energia até novos materiais, manufatura, e desenvolvimento militar. A organização e conteúdo da exposição foi grandemente inspirada por um conjunto de experts convocados como consultores durante seu planejamento. Através das páginas do catálogo encontram-se entrevistas com lá o design e o espírito humano36
  • 37. profissionais como William McDonough, Hernando de Soto, Dean Kamen, Lawrence Lessig, Stewart Brand, Hazel Henderson, Arthur Kroker, Catherine Gray e Jeffrey Sachs. Politicamente, Massive Change apresenta uma agenda global liberal. Enfatiza o lado mais positivo do capitalismo - sua habilidade de inovar em uma forma socialmente-responsável - enquanto identifica os multiplos atores na sociedade civil - “Grupos civis, empreendedo- res sociais, organizações não governamentais (ONGs), e associações não-lucrativas” - como seus agentes de mudança preferidos. O projeto não endereça geopolítica ou sua influência no design, nem trata de tecnologias potencialmente distópicas. Não sem críticos prontos a levantar preocupações legítimas sobre suas limitações, a intenção do projeto é de abrir novos caminhos para o compromisso do design e não analisar ou criticar as práticas atuais do design. Confiando grandemente em experts em assuntos diversos, Massive Change é sobre ação e não política, e tem sucesso ao fornecer uma rota de esperança para designers preocupados com o estado do mundo. Para citar exemplos práticos de como designers podem ganhar mais autonomia, podemos mencionar Curitiba, Brasil, em que Jaime Lerner, eleito prefeito três vezes a partir de 1971, transformou a cidade em um laboratório de baixa tecnologia em prol do urbanismo sustentável. Treinado como arquiteto e planejador, Lerner foi assistido por um grande grupo de arquitetos e designers empregados por um instituto urbano público. Juntos, identificaram e executaram centenas de projetos variando desde um sistema de trânsito rápido que tornou o transporte público mais efetivo até uma fábrica que produz brinquedos a de plástico reciclável, além de praças de pedestres e sinais de rua em Braille que foram adicionados à postes em intersecções de ruas. Tanto Massive Change e as conquistas de Jaime Lerner em Curitiba são exemplos de como os designers podem ter poder prático e discursivo, mas cada exemplo têm suas limitações. Massive Change não confronta as muitas maneiras em que designers são obrigados a produzir um mundo contrário aos valores que a exibição demonstra, nem sugere os tipos de mudanças políticas que devem acontecer para que designers possam realizar o trabalho que a exibição reinvindica. A liderança de Lerner em Curitiba demonstra que um designer - seja ele arquiteto, planejador ou designer de produto - pode conquistar muito em uma posição de poder. Mas continua a ser um exemplo idiosincrático que seria muito difícil de ser recriado em países com políticas diferentes. Assim voltamos ao argumento de Maldonado de que designers precisam buscar a autonomia e usá-la, se possível, para fins socialmente e ambientalmente produtivos. Eles precisam combater um mundo que está se tornando cada vez mais polarizado: riqueza contra pobreza; religião fundamentalista contra humanitarismo secular; sustentabilidade ambiental contra destruição ecológica; e utopismo contra resistência tecnológica. Para se posicionar nestas e outras forças opositoras é requerida uma intensa reflexão dos valores, objetivos e preocupações sociais do indivíduo. Também se faz necessária uma estratégia de alinhar-se com outros autores sociais e instituições cujos ideais sejam compatíveis com os do indivíduo. Como então podem os cenários futuros ajudar? Herman Kahn e Anthony Wiener acreditam que antecipar estes eventos futuros é uma tentativa de “aumentar as chances do desejável e reduzir as chances do indesejável”. Eles notam que “tendências ou eventos que possuam dependência de grandes fenômenos costumam ser mais vulneráveis a planejamento a longo-prazo que aqueles que dependam de circunstâncias únicas ou sequencias especiais de eventos”. Kahn e Wiener direcionaram suas observações ao seu clientes governamentais, corporativos e militares, e é precisamente por causa das previsões destes e de outros pesquisadores relacionados que estes clientes normalmente estão entre as com maior po- tencial para compreender as tendências do futuro e usar estas informações para a tomada de decisões. láo design e o espírito humano 37
  • 38. Sociedades não se desenvolvem em trajetórias lineares. Atividade intensa em um ou outro campo como ciência, tecnologia, guerra ou arte pode produzir mares de mudança que resultam em situações radicalmente diferentes que são difíceis de antecipar. O mundo está agora no intermédio de um destes mares de mudança, e nós precisamos aprender a pensar no futuro de uma nova maneira. O Professor de direito Jeffrey Rosen, Ameri- cano, fez este argumento alguns meses atrás enquanto refletia sobre os julgamentos da Suprema Corte dos Estados Unidos. Partindo do pressuposto que os questionamentos em qualquer audiência de justiça focaria nos registros anteriores de justiça e opiniões sobre assuntos controversos atuais como aborto, Rosen defendeu a importância de tornar o processo tão focado no futuro quanto é com relação ao passado e presente. Rosen indica que na próxima década, “a Suprema Corte vai, com toda certeza, ser questionada a decidir sobre uma fascinante gama de questões divisivas que hoje estão em um horizonte longínguo.” Como exemplos, ele cita tópicos controversos como monitoração eletrônica, impressões digitais cerebrais, sondagem genética, clonagem reprodutiva, mineiração de dados, e direitos sobre propriedades digitais. Seu argumento era o de que seria tão im- portante saber como os candidatos poderiam votar nestes temas quanto examinar como eles teriam votado em casos passados. Cenários Futuros, Éticas e Valores Como os julgamentos da Suprema Corte referenciados por Rosen, designers também encontrarão situações que levantarão questão questões sem precedentes sobre valores e ética. Novas tecnologias estão transformando nossa relação com o mundo material e com nós mesmos. Engenheiros, programadores, designers de produto e cientistas estão no centro destas transformações. Eu não estou convencido de que essas pessoas são capazes de prever todos os possíveis usos dos dispositivos que estão criando, o que significa que o “lado negro” de algumas tecnologias podem vir a ser realidades sociais. Diversas tecnologias existentes hoje estão apenas aguardando uma implementação comercial. Chips RFID, por exemplo, eventualmente serão implantados na maioria dos produtos para que lojas possam rastrear seus inventórios. Mas assim que os produtos forem comprados, os chips continuarão a transmitir sinais. As consequências atuais parecem benignas. Autor de ficção científica, Bruce Sterling elogia os chips nos produtos, os quais ele categoriza como parte de uma “internet de coisas.” “A maior vantagem de uma Internet de coisas,” escreve Sterling, “é que eu não preciso mais fazer inventários de meus bens na minha cabeça. Eles estão em um inventório voodoo automágico, um trabalho muito distante da minha percepção feito por um grupo de máquinas. Não mais me preocuparei em lembrar onde eu ponho meus objetos, ou como os encontro, ou quanto eles custam, etc. Eu apenas pergunto. Então eu recebo a resposta com precisão em tempo real.” E ainda assim a quantidade de dados que objetos vão emitir e o seu potencial acesso público levanta diversas questões de privacidade que Sterling desconsidera em sua visão otimista de chips RFID como servos eletrônicos, tomando conta de todos nossos bens. Além de inseridos em produtos, chips RFID estão sendo planejados para implan- tação em seres humanos e já estão, de fato, sendo usado por jovens na Europa no lugar de cartões de crédito, especialmente em bares e clubes noturnos. A Corporação VeriChip, detentora da patente do chip implantável, promove seu uso para múltiplos propósitos desde pesquisas médicas a “Historicamente, a tarefa do designer era mais simples do que é hoje (...)” lá o design e o espírito humano38
  • 39. segurança domiciliar. Muitos no mundo comer- cial, assim como artistas de vanguarda que por anos brincam com o conceito do ‘cyborg’, são entusiastas da tecnologia RFID. Mas os chips RFID também abrem as portas para questões sérias de privacidade pessoal e controle do corpo do indivíduo. Designers estão envolvidos em todo aspecto do design, promoção e uso da tecnologia RFID. Engenheiros inventaram os chips, Web Designers criaram o site da VeriChip, e designers de produto desenharam o modelo do leitor dos chips e outros aparelhos relacionados. Movendo do microcósmico para o macrocós- mico, uma pequena porém ativa comunidade de empreendedores mostra interesse na colonização do espaço e comercialização de seus recursos, tanto como materia prima ou como bens imóveis. Space Adventures Ltd. é a precursora do turismo Espacial e um número de empresários incluindo Richard Branson, fundador da Virgin Galactic, fundaram companhias para manufatura de veículos para viagem turística. Além do próprio turismo Espacial, alguns dos empreendedores neste novo campo estão de olho no potencial para comércio do Espaço Sideral. A ambição deles ignora as propostas de diversos tratados das Nações Unidas - o Tratado do Espaço Sideral de 1967 e o Tratado Lunar de 1979 - que determinam explícitamente que todos os recursos do Espaço Sideral são herança de toda a humanidade. Ainda que estes tratados proíbam a propriedade de recursos encontrados na lua ou outros corpos celestiais, estes têm poucos signatários e sua aplicação é difícil de imaginar. Nós ainda não vimos se empreendedores interessados no Espaço vão honrar os ideais destes tratados, ou se irão ignorá-los e passarão a comercializar os bens encontrados. Se eles prosseguirem com empreendimentos comerciais, precisarão de uma grande quantidade de designers para criar naves espaciais, equipamento de coleta, habitações e publicidade. Isto levanta questões sobre a ética de se trabalhar para um cliente cujo trabalho vá contra o concelho de um tratado cuja aplicação não pode ser forçada a eles. sararbyrne láo design e o espírito humano 39
  • 40. As duas situações que descrevo são apenas amostras do que estes designers podem encontrar nos anos a vir. Como eles estarão preparados para avaliar estas situações? Em sociedades cujas eco- nomias são interligadas com tecnologias avançadas, novas invenções e sistemas como chips RFID e Smart Dust, pequenos micro-sensores capazes de transmitir dados de um para o outro enquanto permanecem virtualmente invisíveis, têm o potencial de alterar o núcleo da vida social. Como os profissionais que estão criando estes dispositivos, designers devem ser responsáveis por manter fortes diálogos sobre suas implicações sociais como Bill Joy o fez em seu artigo da revista Wired ditado anteriormente. Historicamente, a tarefa do designer era mais simples do que é hoje, assim como a responsabilidade do designer mais fácil de se definir. Prover decoração para ou dar forma a produtos era a tarefa primária. Consequentemente, o design era sobre forma visual e, consequentemente, sobre função mecânica. John Ruskin e William Morris demonstraram preocupações relacionadas a trabalho e qualidade, mas eles não estavam preocupados com os usos dos produtos os quais, no fim do século 19, ainda não carregavam as consequências sociais que hoje carregam. Agora de frente com a crescente complexidade do meio social do produto, designers precisam pensar mais profundamente sobre o futuro e sobre seu papel em trazê-lo ao presente. Eles precisam de sistemas de aviso prévio para alertá-los sobre tendências sociais que possam ter impacto no que desenham, e requerem as ferramentas intelectuais para refletir no sentido destas tendências e suas implicações éticas. Mas a ética, como a tecnologia, também entrou em uma área cinzenta em que as implicações morais de certas ações não são claras. Pesquisas feitas em campos seletos como na bioética têm produzido literatura considerável sobre clonagem, células-tronco e tópicos relacionados. Mas as éticas de implantes de chips, observação tecnológica ou a comercialização do Espaço ainda não foram debatidas com seriedade. “designers precisam pensar mais profundamente sobre o futuro e sobre seu papel em trazê-lo ao presente” lá o design e o espírito humano40
  • 41. Victor Margolin é professor emérito de História do Design na Universidade de Illinois, Chicago. Ele é um co- editor do periódico acadêmico de design, Design Issues, e é o autor, editor, ou co-editor de vários livros incluindo Design Discourse, Discovering Design, The Idea of Design, The Designed World, e The Politics of the Artificial. Atualmente está trabalhando em História Mundial do Design (World History of Design) dividido em três volumes, que será publica- do por Berg em Londres. Nós precisamos rever as discussões éticas, ainda que modestas, que históricamente tenham sido parte do discurso do design. No núcleo de uma nova ética de design está a questão de o que significa ser humano. Clive Dilnot argumenta que nós estamos submersos em um mundo de artifício, devoto de qualquer relação com um reino da natureza. Eu discordo de Dilnot e prefiro situar o meio ambiente humano, como Tomás Maldonado o faz, dentro de um sistema maior que transcende os limites da produção humana. Maldonado nota que a ação humana é capaz de danificar ou destruir o sistema maior, mas que o meio ambiente humano não é nada além de um subsistema do sistema ecológico. A implicação deste esquema é que a conduta da vida humana é de certa forma responsável pela ordem complexa do sistema ecológico maior. Enquanto a modelagem da organização do meio ambiente humano é problemática, como numerosos estudiosos têm mostrado, ainda assim há muito que humanos precisam aprender sobre coexistência com a natureza. Natureza é apenas uma fonte de valores. Religião é outra, assim como filosofia. Aqueles que abraçam o credo ético da religião o fazem por acreditar que valores religiosos representam a vontade de um poder superior. Valores filosóficos são sustentados em sistemas culturais específicos por outra razão - eles parecem razoáveis. Sistemas de valores coletivos, como os contidos em uma agregação de declarações das Nações Unidas, derivam destas outras fontes de pensamento religioso ou filosófico. Todos estes códigos e compêndios são fontes para se consumir ao desenvolver um novo conjunto de éticas para o futuro.. O futuro que temos pela frente afeta profundamente designers de muitos campos profissionais diferentes. Eles são, efetivamente, os agentes cujas habilidades produzem o meio social de produtos e serviços em que vivemos. Visto que este meio social pode afetar e afirmar o potencial e bem-estar humano, nós precisamos responsabilizar, pelo menos parcialmente, os designer. Nós precisamos priorizar a questão de como criar um conjunto de éticas de design que possa sugerir direções humanamente satisfatórias para o trabalho futuro. Esta é uma tarefa coletiva para a comunidade de design cuja compreensão do futuro via continuar a determinar como vivemos no presente. yaseralmajed láo design e o espírito humano 41
  • 42. Na nossa próxima edição traremos como matéria de capa um grande questionamento em cima do grafite e o picho, o design tem um grande papel nisso tudo afinal? Nos mande sugestões, dúvidas, críticas o elogios. Esse é o nosso espaço de contato direto com você leitor, através do site (www.inlocus.com.br) ou do nosso aplicativo (InLocus) disponível na appstore ou na playstore. Você pode enviar fotos e elas podem aparecer aqui, nos aponte problemas e soluções, seja com design de informação (pg. 5) ou qualquer outro tipo que afete a nossa sociedade. Também no nosso app vocês podem conferir uma agenda com eventos, de design, sociais, ou culturais em geral. Veja quando e onde acontecem os eventos mais próximos, convide amigos ou começe seu próprio evento. A Arte Urbana e seu papel na sociedade. Como o Design se encaixa nisso? Na próxima edição: on próxima edição42 on