1) Luciano Dal Pizzol foi preso por formação de quadrilha, fraude à licitação e corrupção passiva como parte de uma organização criminosa que fraudava licitações para a construção de poços artesianos em vários estados.
2) A defesa alega que a Justiça Estadual não tem competência para julgar o caso, mas o documento mostra que as licitações fraudulentas envolviam verbas estaduais, não federais.
3) Manter Luciano preso é importante para garantir a ordem pública e a investigação,
Parecer do MPF sobre recurso da Operação Fundo do Poço
1. PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Parecer nº 11250/2014 – ESBP.
Superior Tribunal de Justiça. Sexta Turma.
HC nº 290120/SC (2014/0050992-7)
Relator: Ministro Rogério Schietti Cruz
Impetrante: Cláudio Gastão da Rosa Filho e outros
Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina
Paciente: Luciano Dal Pizzol
Habeas corpus. Operação Fundo do Poço. Formação de
Quadrilha. Fraude à licitação. Corrupção passiva. Revogação
da prisão preventiva. Impossibilidade. Organização
criminosa, que ainda está sendo desmantelada, voltada para a
prática de crimes contra a licitação pública para a construção
de poços artesianos nos municípios dos estados de Santa
Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. Delitos praticados de
forma constante e reiterada. Indícios da existência de alguns
procedimentos licitatórios fraudados ainda em curso.
Possibilidade de que, solto, o paciente, líder e articulador do
núcleo dos empresários no esquema criminoso, venha a
ameaçar testemunhas e destruir provas. Competência da
justiça federal para apreciar o feito. Não configuração.
Tentativa do impetrante de confundir o Relator. Licitações
referentes aos contratos 69/2010 e 70/2010. Verba federal
utilizada para pagamento. Irrelevância. Fato questionado que
não tem haver com os recursos federais. Crime de corrupção
passiva imprópria. Oferecimento de vantagem apenas para
agilizar o pagamento à contratante de valor regular e devido.
Licitação relativa ao contrato 45/2012. Pagamento realizado
somente com verba estadual. Competência da justiça estadual
para analisar todos os delitos apontados na exordial do
presente writ. Parecer pela denegação da ordem.
Excelentíssimo Senhor Ministro Relator:
1.Preso temporariamente pela prática dos crimes de formação
de quadrilha, fraude à licitação e corrupção passiva, Luciano Dal Pizzol teve sua
1
2. PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
custódia cautelar prorrogada e, posteriormente, convertida em segregação preventiva
pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (fls. 391/397). Inconformada, a Defesa
impetrou o presente habeas corpus, requerendo, em síntese, a revogação da prisão
preventiva e anulação de todos os atos decisórios constantes do inquérito policial, ante
a absoluta incompetência da Justiça Estadual. No seu sentir, as fraudes relativas aos
contratos nº 69/2010 e 70/2010, originados a partir das licitações realizadas pelo
município de Ouro/SC, deveriam ser analisadas pela Justiça Federal, pois os
pagamentos dos acordos administrativos seriam realizados com verbas federais,
disponibilizadas à municipalidade através de convênio com a FUNASA (fls. 01/25).
2. A liminar foi indeferida às fls. 448/452. No entanto, o
Relator reconsiderou sua decisão, para suspender o trâmite do Inquérito Policial nº
2013.088693-6/SC e sobrestar eventual recebimento da denúncia, até o julgamento
final deste writ (fls. 926/929). É o relatório.
3. O writ não merece prosperar.
4. Nota-se que se trata de feito complexo, envolvendo 46
(quarenta e seis) denunciados e 80 (oitenta) crimes. No que tange, aos crimes atinentes
ao paciente, podemos resumir o esquema da seguinte forma:
5. Luciano Dal Pizzol, empresário, faz parte de organização
criminosa, que ainda está sendo desmantelada, voltada para a prática de crimes contra
licitações em vários municípios dos Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e
Paraná. A quadrilha é composta por deputados, prefeitos, servidores públicos
estaduais e municipais, entidades associativas, bem como por donos e funcionários de
poços artesianos, que, em conjunto, desviaram dinheiro do erário.
6. Para tanto, o deputado Romildo Luiz Titon se incumbia de
destinar, perante a Assembleia Legislativa, recursos a prefeituras e associações de
diversos municípios de Santa Catarina para a realização de obras em poços artesianos,
as quais seriam realizadas por empresários específicos, dentre eles, o paciente.
7. Para frustar a competição dos certames licitatórios, os
donos dos citados poços faziam combinações prévias, entre si e com os agentes dos
órgãos públicos envolvidos, para delimitar como seriam realizados os pagamentos de
todos os participantes do esquema, inclusive, a dos empresários que perderiam a
concorrência pública. Aliás, ao que tudo indica, Luciano é o líder e articulador de um
dos núcleos do empresariado (fl. 391/397).
8. Tais delitos causaram, segundo a Corte Estadual, “danos
de vulto ao erário e, consequente e criminosamente, a uma população inteira” (fl.
397).
9. Aliás, essa Subprocuradoria-Geral de Justiça, já, inclusive,
se pronunciou sobre a legalidade da prisão preventiva do paciente no HC 285185/SC,
conforme ementa abaixo transcrita:
2
3. PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Habeas corpus. Formação de Quadrilha. Fraude à
licitação. Corrupção passiva. Revogação da prisão preventiva.
Impossibilidade. Decisão fundamentada na garantia da ordem
pública e na conveniência da instrução criminal. Organização
criminosa, que ainda está sendo desmantelada, voltada para a
prática de crimes contra a licitação pública para a construção
de poços artesianos nos municípios dos estados de Santa
Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. Delitos praticados de
forma constante e reiterada. Indícios da existência de alguns
procedimentos licitatórios fraudados ainda em curso.
Possibilidade de que, solto, o paciente, líder e articulador do
núcleo dos empresários no esquema criminoso, venha a
ameaçar testemunhas e destruir provas. Parecer pela
denegação da ordem.
10. Neste habeas corpus, o impetrante tenta, com uma
falaciosa argumentação, atrasar o recebimento da denúncia, bem como anular todos os
atos decisórios do Inquérito Policial nº 2013.088693-6/SC, ao alegar que a
competência para analisar os citados crimes seria da Justiça Federal.
11. Para tanto, a Defesa selecionou trechos esparsos da
denúncia e os editou, maliciosamente, para fazer o Relator crer que o Parquet
Estadual teria o acusado de fraudar as licitações referentes aos contratos nº 69/2010 e
70/2010, os quais foram pagos com verbas federais.
12. No entanto, não foi isso que ocorreu. Ao contrário,
podemos verifica-se dos autos que o MP-SC, ao tratar dos delitos relacionados ao
Município de Ouro/SC (fls. 143/152), fez um breve apanhado, no item 11 da peça
exordial, para demonstrar que os empresários Luciano dal Pizzol (ora paciente) e
Miguel Atílio Roani se aproximaram do Prefeito de Ouros/SC, Neri Luiz Miqueloto, e
de outros servidores, com o fim de fraudar licitações relativa a serviços de perfuração
e manutenção de poços artesianos na referida cidade. Relatou que, entre 2009 e 2013,
os dois comerciantes foram agraciados com três contratos administrativos (69/2010,
70/2010 e 84/2012), os quais totalizaram R$ 432.957,19 (quatrocentos e trinta e dois
mil, novecentos e cinquenta e sete reais e dezenove centavos).
13. Posteriormente, passou a descrever, no item 11.1 da
denúncia, as condutas de Neri Micheloto e Miguel Roani relativas aos contratos
69/2010 e 70/2010. Relatou que em 2011, Miguel, proprietário da empresa Hidroani
Poços Artesianos LTDA, prometeu vantagem indevida de R$ 5000,00 (cinco mil
reais) ao então Prefeito de Ouros/SC, Neri, para que este praticasse atos de ofícios,
com o fim de “priorizar e agilizar” (fl. 15) os pagamentos devidos à contratante.
Demonstrou, inclusive, que a entrega do dinheiro foi realizada, consoante anotação
feita em documento apreendido pelo GAECO na sede da citada empresa, durante a
“Operação Fundo do Poço”.
3
4. PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
14. Nota-se que, em nenhum momento, o Ministério Público
disse que as licitações referentes a esses contratos teriam sido fraudadas. Apenas
descreveu a prática de corrupção passiva imprópria, ao se mencionar que foi
prometido um certo montante para antecipar pagamento do valor devido.
15. Dessa forma, irrelevante o fato de os citados contratos
terem sido pagos com verba relativa à convênio celebrado com a FUNASA, porque
não se está questionando, aqui, o desvio de recursos públicos, mas sim o ato de
solicitar e receber vantagem para o agente público agilizar a liberação de pagamento
regular e devido.
16. Já no item 11.2 da exordial, o Parquet, de fato, imputa aos
acusados a prática de fraude à licitação e corrupção ativa e passiva. No entanto, nesse
caso, não houve qualquer convênio entre órgão da União e o Município de Ouros/SC
para o pagamento do objeto do certame. Não se justifica, portanto, a competência da
Justiça Federal. Vejamos:
17. Relata-se que o Prefeito, Neri Luiz Miqueloto, e o
Secretário da Agricultura, Rodrigo José Neis, foram pressionados por pessoas ligadas
a partidos políticos a desviar 10% (dez por cento) das licitações realizadas no
Município. Neri, então, articulou com o Deputado Estadual Romildo Titon, para
conseguir obter verba, por meio de uma emenda parlamentar, para perfuração de poços
no citado Município. Conseguido o recurso, determinou a abertura da Licitação
045/2012 (Carata Convite 12/2012). No entanto, o vencedor (Água Azul Poços
Artesianos LTDA – empresa do ora paciente) já estava previamente escolhido, tendo
havido combinações e manipulação de preços pelas das empresas convidadas.
Descreveu-se, ainda, no item 11.3 da exordial, que, para conseguir o contrato, Luciano
Dal Pizzol ofereceu R$ 20.000,00 (vinte mil reais) aos, então, Deputado Estadual,
Romildo Titon, e Prefeito, Neri Miqueloto.
18. Mais uma vez, não há que se falar em verba federal. O
contrato seria pago com recursos estaduais, oriundos da citada emenda parlamentar
anteriormente aprovada.
19. Logo, não se vislumbra, nos autos, qualquer
constrangimento ilegal ao direito de locomoção do paciente.
20. Importante ressaltar, por oportuno, que o caso envolve
diversos servidores públicos, inclusive, o já afastado Presidente da Assembleia
Legislativa Catarinense. Caso se mantenha a suspensão do inquérito policial e o não
recebimento da denúncia, os diversos acusados, que hoje estão afastados dos seus
cargos ou presos, para garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal,
serão soltos, podendo, com isso, destruir provas. Tal fato já aconteceu no passado,
conforme ficou comprovado nas intercepções telefônicas realizadas.
Ante o exposto, o parecer, salvo melhor juízo, é pela
denegação da ordem, devendo ser revogada a decisão do Relator que suspendeu o
4
5. PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
trâmite do Inquérito Policial nº 2013.088693-6/SC e sobrestou o recebimento da
denúncia, até o julgamento final deste writ.
Brasília, 9 de abril de 2014.
Eitel Santiago de Brito Pereira
Subprocurador-Geral da República
FV
5