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Redalyc
                                   Sistema de Información Científica
Red de Revistas Científicas de América Latina, el Caribe, España y Portugal




                                      Arán, Márcia;Murta, Daniela;Lionço, Tatiana
                                Transexualidade e saúde pública no Brasil
                Ciência e Saúde Coletiva, Vol. 14, Núm. 4, julio-agosto, 2009, pp. 1141-1149
                        Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva
                                                    Brasil

                    Disponible en: http://redalyc.uaemex.mx/src/inicio/ArtPdfRed.jsp?iCve=63011692015




                                                                  Ciência e Saúde Coletiva
                                                                  ISSN (Versión impresa): 1413-8123
                                                                  cecilia@claves.fiocruz.br
                                                                  Associação Brasileira de Pós-Graduação em
                                                                  Saúde Coletiva
                                                                  Brasil




                  ¿Cómo citar?        Número completo          Más información del artículo   Página de la revista


                                                    www.redalyc.org
                  Proyecto académico sin fines de lucro, desarrollado bajo la iniciativa de acceso abierto
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                              Transexualidade e saúde pública no Brasil




                                                                                                                                                 ARTIGO ARTICLE
                              Transsexuality and public health in Brazil




Márcia Arán 1
Daniela Murta 1
Tatiana Lionço 2




                              Abstract The article aims to discuss transsexuality        Resumo O artigo tem como objetivo discutir a tran-
                              in the context of the Brazilian public health poli-        sexualidade no contexto das políticas de saúde públi-
                              cies. Firstly, it questions the necessity of the diagno-   ca no Brasil. Para isto, num primeiro momento, pro-
                              sis of Gender Identity Disorder as a condition of          blematiza-se a necessidade do diagnóstico de trans-
                              access to treatment in the public health service,          torno de identidade de gênero como condição de aces-
                              searching to understand the historical construction        so ao tratamento na rede pública, buscando compre-
                              of transsexuality as a pathological phenomenon. Af-        ender de que forma se deu historicamente a patologi-
                              ter that, it analyzes the debate on public health pol-     zação da transexualidade. Em seguida, analisa-se o
                              icies for transsexuals, considering the process of le-     debate sobre as políticas de saúde para transexuais,
                              galization of the reassignment surgery in the coun-        considerando o processo de legalização da cirurgia de
                              try, the resolutions of the Federal Council of Medi-       transgenitalização no país, as resoluções do Conse-
                              cine and the constitution of representative forums         lho Federal de Medicina e os fóruns que se constitu-
                              of the Health Ministry, as well as professionals of the    íram com representantes do Ministério da Saúde,
                              area and representatives of the social movement.           profissionais da área e representantes do movimento
                              Finally, considering the references available that         social. Finalmente, tendo como referência trabalhos
                              emphasizes the critics on the analysis of transsexu-       que se destacaram pela crítica à patologização da
                              ality as a pathological phenomenon in the areas of         transexualidade nas áreas da saúde coletiva e das
                              the Public Health and Social Sciences, it intends to       ciências sociais, pretende-se destacar a importância
                              emphasize the importance of understanding the di-          de compreendermos a diversidade de formas de sub-
                              versity of subjectivity’s forms and gender’s construc-     jetivação e de construção de gênero na transexuali-
                              tion considering transsexuality. In this context, it       dade. Discute-se a questão da autonomia dos transe-
1
  Departamento de Políticas   discusses the question of transsexuals’ autonomy and       xuais e sugerem-se políticas públicas que, embora
e Instituições de Saúde,
                              suggests public policies that, even following an assis-    sigam um protocolo de assistência, não tenham como
Instituto de Medicina
Social, UERJ. Rua São         tance protocol, do not have as its only therapeutical      única referência terapêutica a realização do diag-
Francisco Xavier 524,         reference the accomplishment of the diagnosis and          nóstico e a cirurgia de transgenitalização.
Pavilhão João Lyra Filho,
7º andar, blocos D e E,
                              the reassignment surgery.                                  Palavras-chave Transexualidade, Saúde pública,
Maracanã. 20550-900           Key words Transsexuality, Public health, Sexuali-          Gênero, Subjetividade
Rio de Janeiro RJ.            ty, Gender, Subjectivity
marciaaran@terra.com.br
2
  Anis - Instituto de
Bioética, Direitos
Humanos e Gênero.
1142
Arán M et al.




                Introdução                                              tada pela psiquiatrização da transexualidade. Ten-
                                                                        do como a referência a norma do Conselho Federal
                Em 1997, o Conselho Federal de Medicina (CFM),          de Medicina, parte-se do pressuposto de que a tran-
                através da Resolução nº 1.4821, autorizou a reali-      sexualidade é uma doença, sendo o transtorno de
                zação de cirurgias de transgenitalização em pacien-     identidade de gênero (TIG) condição de acesso à
                tes transexuais no país, alegando seu caráter tera-     assistência médica e jurídica para transexuais4. Desta
                pêutico. Esta resolução parte do princípio de que       forma, seguindo uma tendência internacional, a
                “o paciente transexual é portador de desvio psico-      institucionalização da prática assistencial dirigida a
                lógico permanente de identidade sexual, com rejei-      transexuais no Brasil está condicionada a um diag-
                ção do fenótipo e tendência à automutilação ou          nóstico psiquiátrico, o que permitiu o acesso ao
                auto-extermínio”. A intervenção cirúrgica passou        tratamento e, muitas vezes, significa o próprio exer-
                a ser legítima no Brasil, desde que o paciente apre-    cício de cidadania. No entanto, esse mesmo diag-
                sente os critérios necessários para a realização da     nóstico pode ser considerado um vetor de patolo-
                mesma e o tratamento siga um programa rígido,           gização e de estigma, pois atribui uma patologia ao
                que inclui a avaliação de equipe multidisciplinar e     paciente sem questionar as questões históricas, po-
                acompanhamento psiquiátrico por no mínimo               líticas e subjetivas dessa psiquiatrização2.
                dois anos, para a confirmação do diagnóstico de              Diante disso, o artigo pretende problematizar
                transexualismo.                                         o diagnóstico de TIG como condição de acesso ao
                    Diante disso, houve aumento da demanda de           tratamento e cuidado na rede pública no Brasil,
                auxílio médico por parte de transexuais que, rela-      buscando compreender de que forma se deu his-
                tando intenso sofrimento e demandando tratamen-         toricamente a patologização da transexualidade.
                to médico-cirúrgico, impulsionaram a organiza-          Em seguida, analisaremos o debate sobre as políti-
                ção de programas assistenciais2. Conforme obser-        cas de saúde pública para transexuais no Brasil,
                vado na I Jornada Nacional sobre Transexualida-         desde o processo de legalização da cirurgia de trans-
                de e Saúde: a Assistência Pública no Brasil3, pro-      genitalização no país, as resoluções do CFM e os
                movida pela Coordenação de Saúde Mental do              fóruns que se constituíram representantes do Mi-
                Ministério da Saúde e pelo Instituto de Medicina        nistério da Saúde, profissionais da área e represen-
                Social da UERJ, estes serviços apresentam formato       tantes do movimento social para discutir o pro-
                diferenciado de atendimento, com práticas cirúr-        cesso transexualizador no SUS. Finalmente, tendo
                gicas e terapêuticas distintas, destacando que al-      como referência trabalhos que se destacaram pela
                guns já se constituíram como programas consoli-         crítica à patologização da transexualidade na área
                dados, atendendo a um grande número de pacien-          da saúde coletiva e das ciências sociais, pretende-
                tes, com vasta experiência na área de assistência e     mos destacar a importância de compreendermos
                pesquisa, como o Hospital das Clínicas da Univer-       a diversidade de formas de subjetivação na transe-
                sidade Federal do Rio Grande do Sul e o Hospital        xualidade. Para isto, pretendemos discutir a ques-
                das Clínicas da Faculdade de Medicina da Univer-        tão da autonomia dos transexuais e sugerir políti-
                sidade de São Paulo.                                    cas públicas que, embora sigam um protocolo de
                    Em geral, o processo assistencial compreende        assistência, não tenham como única referência te-
                as seguintes etapas: avaliação e acompanhamento         rapêutica a realização do diagnóstico e a cirurgia
                psiquiátrico periódico para confirmação do diag-        de transgenitalização.
                nóstico; psicoterapia individual e de grupo; hor-
                monioterapia, com o objetivo de induzir o apare-
                cimento de caracteres sexuais secundários compa-        Algumas considerações críticas
                tíveis com a identificação psicossexual do paciente;    sobre a psiquiatrização da transexualidade
                avaliação genética; tratamento cirúrgico. Além dis-
                so, vários desses serviços já estabelecem contato       O discurso atual sobre o transexualismo na sexo-
                com uma assessoria jurídica, para indicação de          logia, na psiquiatria e em parte na psicanálise faz
                pacientes operados no processo de mudança de            dessa experiência uma patologia – um “transtor-
                nome. Vale destacar que, na transexualidade, a          no de identidade” – dada a não-conformidade en-
                importância do acesso aos serviços de saúde con-        tre sexo biológico e gênero. Nota-se que o que de-
                siste não apenas no cuidado do processo de saúde-       fine o diagnóstico de transexualismo é uma con-
                doença, mas fundamentalmente numa estratégia            cepção normativa dos sistemas de sexo-gênero,
                de construção de si.                                    fundamentados numa matriz binária heterosse-
                    A partir deste primeiro contato, percebemos         xual que se converte em sistema regulador da se-
                que, na maioria das vezes, a prática clínica é orien-   xualidade e da subjetividade5. Assim, por contrari-
1143




                                                                                                                   Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009
ar a coerência essencial entre sexo biológico e gêne-       Porém, o surgimento do que Bento10 denomi-
ro, não se encaixando em nenhum dos modelos             na de dispositivo da transexualidade não se deu a
propostos de identidade sexual em conformidade          partir do debate sobre o diagnóstico, mas sim a
com as práticas discursivas do século XIX, obser-       partir da primeira intervenção terapêutica tornada
vamos que restou exclusivamente à transexualida-        pública: a cirurgia do ex-soldado do exército ame-
de ocupar o espaço que foi aberto pela psiquiatri-      ricano George Jorgensen realizada por Christian
zação da homossexualidade: o de uma patologia           Hamburger, em 1952, na Dinamarca11. Neste con-
da identidade sexual4.                                  texto, as novas teorias médicas e sociológicas con-
    Esta premissa foi bastante problematizada por       duziram muitos pesquisadores para uma nova
autores como Michel Foucault e Judith Butler. Se-       definição do conceito de transexualismo e para a
gundo Foucault, o dispositivo da sexualidade, o         defesa do tratamento dos transexuais através de
qual surgiu na aurora da modernidade, só pode           intervenções corporais. Seus personagens centrais
ser compreendido através dos mecanismos de po-          são: Harry Benjamin, endocrinologista alemão,
der e saber que lhes são intrínsecos. Falar de sexu-    radicado nos Estados Unidos da América; John
alidade é também se referir à produção dos sabe-        Money, psicólogo, professor do Hospital Univer-
res que a constituem, aos sistemas de poder que         sitário John Hopkins e Roberto Stoller, psicanalis-
regulam suas práticas e às formas pelas quais os        ta e psiquiatra americano.
indivíduos podem e devem se reconhecer como                 Harry Benjamin, considerado até hoje uma das
sujeitos sexuados6. Em outras palavras, sexo –          principais referências na teorização sobre o tran-
homem, mulher – não é um simples fato ou uma            sexualismo, afirma que há uma relação entre o
condição estática, e sim “uma construção ideal for-     transexualismo e a endocrinologia. Apoiado nos
çosamente materializada através do tempo”7.             avanços dos estudos biológicos do século XX, em
    Antigamente, convivíamos mais livremente com        especial os estudos genéticos, propõe que não ha-
a possibilidade da mistura dos sexos. Somente a         veria uma divisão absoluta entre “masculino” e “fe-
partir do século XVII é que as teorias biológicas da    minino”, sendo inadequada a determinação do sexo
sexualidade e as condições jurídicas impostas aos       do indivíduo baseada puramente nas diferenças
indivíduos conduziram pouco a pouco à refuta-           anatômicas. Para ele, o sexo é composto por diver-
ção da idéia da mistura de dois sexos em um só          sos componentes, de modo que a etiologia do tran-
corpo e restringiram “a livre escolha dos indivídu-     sexualismo e a origem do desejo de mudar o sexo
os incertos”6. Assim, o dispositivo da sexualidade      ultrapassariam os aspectos psicológicos, podendo
instaurou a necessidade de saber, através da medi-      estar associadas a uma causa biológica – genética
cina, qual o sexo determinado pela natureza e, por      ou endócrina4.
consequência, aquele que a justiça exige e reconhe-         Além da definição proposta por Benjamin, os
ce. Ser “sexuado” é estar submetido a um conjunto       estudos sobre a transexualidade tomaram força
de regulações sociais, as quais constituem uma          nos Estados Unidos, através de investigações só-
norma que, ao mesmo tempo em que norteia uma            cio-antropológicas sobre os fatores que influenci-
inteligibilidade e uma coerência entre sexo, gênero,    avam na definição da identidade sexual. Tais estu-
prazeres e desejos, funciona como um princípio          dos, retomando as discussões entre natureza e cul-
hermenêutico de auto-interpretação7. Neste senti-       tura, entre inato e adquirido, promoveram a sepa-
do, “o verdadeiro sexo” é o efeito da naturalização     ração conceitual entre sexo (biológico) e gênero
de uma norma materializada5.                            (social), apresentando uma nova possibilidade de
    Retomando historicamente a constituição do          se compreender fenômenos onde se expressa uma
discurso científico sobre o sexo, podemos perce-        discordância entre eles, favorecendo a consolida-
ber como a norma heterossexual e reprodutiva            ção de um campo assistencial e teórico voltado
culminou na constituição do saber psiquiátrico do       para esses casos.
século XIX e, consequentemente, na psiquiatriza-            Um dos autores que se destacaram nesta pro-
ção do prazer perverso e na problematização da          posição foi o psiquiatra John Money, que desen-
homossexualidade8. A partir disso, foi construída       volveu pesquisas com crianças intersexuais, com o
uma semiologia dos comportamentos definidos             objetivo de esclarecer quais as relações entre a iden-
como anormais. Com efeito, na obra de Von Kra-          tidade nuclear de um indivíduo, sua anatomia, sua
fft-Ebing9 podem ser observadas as primeiras re-        fórmula cromossômica e seus hormônios, bus-
ferências sobre transexualismo e a descrição de         cando demonstrar a independência radical entre o
outras alterações das características psicossexuais     social e o biológico. Para Money12, o comporta-
da personalidade, como a metamorfose psicosse-          mento masculino ou feminino é construído social-
xual e o hermafroditismo4.                              mente, sendo a educação o principal aspecto mo-
1144
Arán M et al.




                delador do gênero. A partir disso, a noção de gêne-        Nota-se que, embora a transexualidade já fos-
                ro para diferenciar o sexo biológico da identidade     se um fenômeno reconhecido desde o final do sé-
                sexual foi consolidada, sendo que, segundo o au-       culo XIX, as discussões em torno da temática tive-
                tor, esta última seria construída ao longo dos pri-    ram início apenas a partir da possibilidade de in-
                meiros anos de vida, teria caráter irreversível e só   tervenção médica sobre esses casos, viabilizando a
                alcançaria sua completa expressão com a maturi-        constituição de um campo assistencial, em especial
                dade sexual12.                                         nos serviços públicos de saúde, voltado para seu
                    Outra referência importante para a definição       tratamento em diversos países. Porém, como afir-
                de transexualismo são as teses de Robert Stoller.      mamos, o diagnóstico de transtorno de identida-
                Para esse autor, a definição de transexualismo se      de de gênero, produto de uma exigência médico-
                baseia principalmente em três aspectos: (1) um         legal, reproduz um sistema normativo de sexo e
                sentimento de identidade permanente, uma crença        gênero que não condiz com os modos de subjeti-
                (no caso do transexualismo masculino) numa es-         vação ou a diversidade das formas de construção
                sência feminina sem ambiguidades (diferentemente       de gênero na transexualidade.
                do transvestismo); (2) uma relação com o pênis
                vivida “como horror”; (3) uma especificidade na
                relação com a mãe que o autor chama de simbio-         A assistência a transexuais na rede pública
                se. Porém, o autor ressalta que essa relação não       de saúde no Brasil: a questão do acesso
                pode ser considerada psicotizante, principalmente      e o cuidado integral
                porque a capacidade de integração social dessas
                pessoas permanece intacta, contrariando teoriza-       A legalização da cirurgia de transgenitalização e de
                ções como as da psicanálise lacaniana, nas quais se    procedimentos afins foi um processo longo e cer-
                destaca a relação entre a transexualidade e a com-     cado de diversas discussões que tiveram início em
                preensão lógica e estrutural da psicose5.              1979, quando o CFM foi consultado pela primeira
                    Frente a isso, a apropriação desse fenômeno        vez sobre a inclusão de próteses mamárias em pa-
                pela medicina, através da proposição de tratamen-      cientes do sexo masculino (Protocolo nº 1.529/79
                tos, deu origem a um problema médico-legal, já         CFM15). Tais discussões, sempre amparadas no
                que esse tipo de intervenção médica não era permi-     Código de Ética Médica e no Código Penal, coloca-
                tido em todos os países e estava gerando pedidos       vam em pauta a licitude ética e penal da “cirurgia
                de redefinição do sexo civil13. Nesse contexto, foi    de conversão sexual”, já que se considerava inicial-
                necessário que as redesignações sexuais estivessem     mente a mesma “mutilação grave” e “ofensa à inte-
                inseridas em processos terapêuticos formais que        gridade corporal”. Além disso, foram problemati-
                culminaram na criação de centros de transgenitali-     zadas as possíveis implicações jurídicas que tal in-
                zação e na elaboração de protocolos de atendimen-      tervenção geraria, podendo a alteração da genitá-
                to, com base na Escala de Orientação Sexual criada     lia servir como argumento para a modificação da
                por Harry Benjamin. Assim, em 1973, Norman Fisk        identidade sexual, o que poderia estar relacionado
                fundamentou uma nosografia psiquiátrica para o         ao crime de atribuição de falsa identidade, confor-
                transexualismo, ancorada fundamentalmente num          me Artigo 307 do Código Penal.
                autodiagnóstico e, em 1977, essa condição foi in-           Entre os diversos debates ocorridos nesse perío-
                corporada à categoria psiquiátrica de disforia de      do, destacamos o I Encontro Nacional dos Conse-
                gênero, um “híbrido psiquiátrico-sociológico” que      lhos de Medicina, nos quais pela primeira vez hou-
                tinha como único objetivo responder a necessida-       ve uma manifestação favorável à realização da ci-
                des funcionais, apenas reproduzindo o autodiag-        rurgia. Nesse contexto, a cirurgia de transgenitali-
                nóstico numa definição médica da síndrome13.           zação foi considerada a etapa mais importante no
                    Em 1980, a condição transexual finalmente teve     tratamento de transexualismo, pela possibilidade
                seu lugar formalizado na psiquiatria e na medici-      de adaptar a morfologia genital ao sexo com o qual
                na, sendo agregada ao manual diagnóstico psiqui-       o indivíduo se identifica. Esse procedimento foi jus-
                átrico DSM III (Manual Diagnóstico e Estatístico       tificado, inicialmente, através do princípio de bene-
                das Desordens Mentais). Posteriormente, em 1994,       ficência, já que possibilita a integração entre o cor-
                com a publicação do DSM IV14, o termo transexu-        po e a identidade sexual psíquica do interessado,
                alismo, utilizado até então, foi substituído por       unido aos princípios de autonomia – direito da
                transtorno de identidade de gênero (TIG), delimi-      autodeterminação e de dispor do próprio corpo – e
                tando mais claramente o fato de ser considerado        de justiça – o direito de a pessoa não ser discrimi-
                um estado psicológico no qual a identidade de gê-      nada no pleito à cirurgia. Tal premissa deu origem
                nero está em desacordo com o sexo biológico.           à proposta da Resolução PC/CFM 39/9716, que su-
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                                                                                                                     Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009
gere a adoção deste procedimento cirúrgico, a títu-      do registro civil da realização da cirurgia de trans-
lo experimental, nos casos de transexualismo e,          genitalização, já que a permissão para troca de
posteriormente, à Resolução nº 1.4821. Esta define       nome e sexo no registro civil resolveria o problema
que a cirurgia de transgenitalização e procedimen-       mais agudo da vida cotidiana dos transexuais19,20.
tos afins poderiam ser realizados no Brasil em hos-          Essas premissas tiveram eco no I Encontro Na-
pitais universitários ou públicos a título experimen-    cional de Transexuais, realizado em novembro de
tal, desde que algumas definições fossem seguidas,       2005, em Brasília, do qual se originou o Coletivo
destacando-se o acompanhamento psiquiátrico por          Nacional de Transexuais. Embora o movimento
no mínimo dois anos. Em 2002, a primeira resolu-         social de transexuais só tenha se constituído efeti-
ção foi revogada pela Resolução nº 1.65217 que, con-     vamente em 2005, podemos observar que desde 2003
siderando o estágio atual de tratamento dos casos e      existem discussões sobre a formulação de políticas
o bom resultado estético e funcional das neocolpo-       inclusivas para toda a população LGBT (lésbicas,
vulvoplastias e/ou procedimentos complementares,         gays, bissexuais, travestis e transexuais), no Brasil,
resolve que as cirurgias para adequação do fenóti-       que culminaram nos debates atuais sobre atenção
po masculino para o feminino podem ser pratica-          integral a transexuais no Ministério da Saúde. A
das em hospitais públicos ou privados, indepen-          partir da definição desse grupo como vulnerável à
dentemente da atividade de pesquisa, mas seguin-         exclusão social, pelo Conselho Nacional de Com-
do os critérios de acompanhamento já estabeleci-         bate à Discriminação (CNCD), o mesmo passou a
dos. No caso da neofaloplastia, faloplastia, metoi-      fazer parte da pauta dos gestores de políticas públi-
dioplastia, antes de e/ou procedimentos comple-          cas e foi incluído em programas que tivessem como
mentares, a realização se manteve condicionada à         objetivo garantir os direitos de lésbicas, gays, trans-
prática em hospitais universitários ou hospitais         gêneros e bissexuais21.
públicos adequados para a pesquisa.                          Nesse contexto, a Secretaria Especial de Direitos
     A partir dessas resoluções, alguns hospitais uni-   Humanos, atualmente vinculada à Presidência da
versitários do país constituíram programas inter-        República, iniciou reuniões ambulantes, com o in-
disciplinares para atender à crescente demanda de        tuito de apresentar essa demanda a diversos ór-
usuários transexuais. Mesmo considerando o ine-          gãos governamentais, assim como sensibilizar e es-
gável benefício que alguns serviços têm prestado a       clarecer representantes do governo quanto à neces-
usuários transexuais, vale destacar que a exigência      sidade de formulação de políticas inclusivas aos
do diagnóstico como condição de acesso ao trata-         grupos definidos pelo CNCD.
mento vem sendo continuamente problematizada,                Além disso, ainda em 2003, o Ministério da Saúde
através das contribuições realizadas no campo da         foi solicitado a tomar uma posição em relação à
saúde coletiva, das ciências sociais e da bioética.      população LGBT, contemplando dois aspectos: que
     A partir do relato de experiências assistenciais,   a inclusão da população LGBTno SUS se efetivasse
alguns autores destacam que a certeza quanto ao          segundo seus princípios fundamentais, a saber,
pertencimento ao gênero oposto, a qual às vezes se       universalidade, integralidade e equidade; e que o
expressa pela crença numa identidade fixa, se repe-      Ministério da Saúde consolidasse uma Política Na-
te no cotidiano do atendimento a pacientes transe-       cional de Saúde para a População LGBT (lésbicas,
xuais. Porém, afirmam que a transexualidade não          gays, bissexuais, travestis e transexuais).
necessariamente fixa uma posição subjetiva e des-            Nesse sentido, em 2004, o Governo Federal, atra-
tacam a importância de deslocar a manifestação           vés dos encaminhamentos do CNCD, lança o Brasil
social da transexualidade da necessidade de tradu-       sem homofobia - programa de combate à violência e à
zi-la imediatamente numa patologia, numa estru-          discriminação contra GLTB e de promoção da cida-
tura ou num modo de funcionamento específico,            dania homossexual, explicitando o compromisso es-
o que nos permitiria escapar da sua psiquiatriza-        tatal com a promoção de políticas públicas que ga-
ção. A experiência transexual, neste sentido, com-       rantissem a efetividade dos direitos a essa popula-
portaria várias formas singulares de subjetiva-          ção. O programa, elaborado a partir das contribui-
ção2,4,7,18. Além disso, discute-se também que não       ções de lideranças do movimento LGBT, represen-
existe um processo específico de construção das          tou uma conquista da sociedade brasileira decor-
identidades de gênero nos transexuais e desta for-       rente de mais de duas décadas de mobilização social,
ma não se deve esperar de transexuais um com-            apresentando propostas de ações nos setores Saúde,
portamento fixo, rígido, adequado às normas de           Educação, Cultura, Trabalho e Segurança Pública,
feminilidade ou de masculinidade12,20. Outra pro-        sendo coordenado pela Secretaria Especial de Direi-
posição que tem se destacado no debate é a impor-        tos Humanos. De qualquer modo, este programa
tância de desvincular a possibilidade da mudança         governamental se estrutura em torno do eixo da
1146
Arán M et al.




                violência, enfatizando o combate à discriminação e à         Partindo do fato de que não há nenhuma regu-
                homofobia como estratégias fundamentais para a           lamentação do processo de redesignação sexual no
                promoção da cidadania, permanecendo a necessi-           SUS (visto que o fornecimento de medicamentos
                dade de implementação de políticas de saúde22.           específicos é irregular), que a cirurgia de transgeni-
                    Diante disto, ainda em 2004, o Ministério da         talização não estava, na ocasião, incluída na tabela
                Saúde, através da Portaria nº 2.227/GM23, criou o        de procedimentos financiados pelo mesmo e que
                comitê técnico para a formulação da proposta de          existem programas de atendimento a transexuais
                Política Nacional de Saúde da População LGBT.            em funcionamento em diversos estados brasilei-
                Este comitê técnico teve seu processo de efetiva ins-    ros, foram colocados em pauta pontos relevantes
                titucionalização prejudicado por mudanças na ges-        para a elaboração de protocolos de acompanha-
                tão do Ministério da Saúde, já que desde a data de       mento e avaliação de transexuais orientados pelo
                sua formalização (novembro de 2004) até o pre-           Ministério da Saúde.
                sente, mudanças contínuas no corpo técnico da                Além disso, foram discutidos os critérios para
                instituição, aliadas a entraves na gestão, compro-       realização de outras intervenções somáticas – como
                meteram o seu efetivo exercício.                         implante de silicone nos seios, eletrólise, redução
                    Cabe ressaltar, no entanto, que avanços signifi-     do pomo de Adão, mastectomia e histerectomia –,
                cativos nas discussões sobre saúde de transexuais        a inclusão de previsões de distribuição de medica-
                vêm se consolidando, através de sólida pactuação         ções específicas, a inclusão da cirurgia de transgeni-
                de interesses entre o movimento social de transexu-      talização na tabela do SUS, a promoção da inclusão
                ais e o Ministério da Saúde. Como efeito da articu-      desses indivíduos como cidadãos de direitos e a in-
                lação política entre o governo e o movimento de          clusão de transexuais no SUS de forma mais ampla
                transexuais no Brasil, decidiu-se, durante o XII         que a questão da cirurgia de redesignação sexual18.
                EBGLT, através de fórum de discussões ampliado               Sendo assim, evidenciou-se a necessidade de
                entre representantes do Ministério da Saúde e lide-      considerar a transexualidade para além da questão
                ranças do movimento LGBT, estender um assento            pré e pós-operatória, sendo a questão mais com-
                no Comitê Técnico Saúde da População GLTB para           plexa e danosa a própria representação social sobre
                transexuais, passando a diferenciar e reconhecer a       a transexualidade, que patologiza e estigmatiza este
                especificidade de suas demandas, anteriormente           segmento populacional. A cirurgia de transgenitali-
                associadas e confundidas com as de travestis.            zação, comumente apresentada como central na
                    Segundo já explicitaram Costa e Lionço24, a          demanda de transexuais, foi problematizada como
                busca pela efetivação dos princípios de universali-      solução não-consensual entre as diferentes pessoas
                dade e integralidade, preconizados constitucional-       transexuais. Existindo realidades distintas, há tam-
                mente desde 1988 e afirmados pela Lei nº 8.080, de       bém necessidades distintas quanto à característica
                1990, encontram na idéia de equidade sua condição        das intervenções somáticas que seriam satisfatóri-
                de possibilidade, sendo as políticas de promoção         as para cada indivíduo. É interessante notar que a
                da equidade efeito ou consequência da participação       discriminação e a conotação patologizante que re-
                social na gestão das políticas públicas. A gestão par-   cai sobre transexuais foram apresentadas como
                ticipativa e o protagonismo do movimento social          central para o segmento, demandando iniciativas
                são fundamentais para que ações em saúde venham          que primem pela humanização do atendimento e
                a responder e espelhar as reais necessidades e os        pela viabilização e qualificação do acesso dessas
                valores específicos de diferentes grupos sociais, con-   pessoas ao sistema de saúde.
                sumando a proposição de modelos de atenção jus-               Paralelamente à institucionalização do Comi-
                tos rumo à equidade. Portanto, é necessário reco-        tê Técnico Saúde da População GLTB, ainda em
                nhecer a unidade dos diferentes segmentos LGBT           2004, como efeito de uma ação do Ministério Pú-
                numa luta comum por visibilidade, ao mesmo tem-          blico do Rio Grande do Sul, foi instituído, sob a
                po em que se considera sua pluralidade interna.          responsabilidade da Coordenação Geral de Alta
                    Nesse sentido, o Ministério da Saúde, através        Complexidade da Secretaria de Atenção à Saúde
                do Comitê Técnico Saúde da População GLTB, de-           do Ministério da Saúde, grupo de trabalho para
                sencadeou, em fevereiro de 2006, reunião sobre o         discutir a inclusão da cirurgia de transgenitaliza-
                Processo Transexualizador no SUS, articulando, em        ção e procedimentos complementares sobre gôna-
                um mesmo espaço de formulação, representantes            das e caracteres sexuais secundários na tabela de
                do Ministério da Saúde, do Coletivo Nacional de          procedimentos do SUS.
                Transexuais, profissionais da rede pública de saúde          As recomendações decorrentes da reunião so-
                que atuam com transexuais e pesquisadores que se         bre o Processo Transexualizador no SUS refletem
                dedicam ao tema.                                         os anseios do movimento social. Como efeito des-
1147




                                                                                                                  Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009
se processo, o grupo de trabalho da Coordenação         implementação e qualificação dos serviços de aten-
Geral de Alta Complexidade foi rearticulado, aco-       ção a transexuais no SUS, prevendo credenciar, junto
lhendo representantes de sociedades médicas, do         ao Ministério da Saúde, Centros de Referência para
Conselho Federal de Medicina, do Ministério Pú-         a Atenção Integral ao Processo Transexualizador
blico do Rio Grande do Sul, da Defensoria Pública       do SUS, um por macrorregião. A definição dos ser-
do DF, representante transexual da sociedade civil      viços a serem credenciados deveria levar em consi-
e representantes de áreas técnicas do Ministério da     deração a existência de programas já existentes na
Saúde. Nessa circunstância, foram analisadas a si-      rede pública de saúde e a operacionalização dos ser-
tuação atual da saúde dos transexuais e a assistên-     viços seria organizada em rede integrada.
cia dos mesmos nos serviços de saúde pública, a             As discussões empreendidas no Seminário Na-
fim de se definirem as diretrizes da assistência a      cional Saúde da População GLBTT na Construção
esse público sob a perspectiva da integralidade, da     do SUS, em agosto de 2007, denunciam a atualida-
equidade e da humanização da atenção, além de se        de deste posicionamento por parte do Coletivo
discutir a inclusão da cirurgia de transgenitaliza-     Nacional de Transexuais, de pesquisadores e de
ção nas tabelas de procedimentos do SUS.                representantes do Comitê Técnico Saúde da Popu-
    As discussões técnicas subsequentes se orien-       lação GLTB do Ministério da Saúde. Ainda que
tam para a proposição de diretrizes comprometi-         comemorando a decisão do Tribunal Regional Fe-
das com a superação do estigma associado à con-         deral da 4ª Região, o temor de transexuais frente à
dição transexual, tendo como objetivo delimitar         compulsória liberação das cirurgias no SUS con-
os critérios para o acompanhamento a transexu-          siste na falta de normatização do processo transe-
ais no SUS, assim como definir as estratégias de        xualizador em sua perspectiva integral, bem como
avaliação, implementação e credenciamento de            pela patologização de sua condição ser a porta de
Centros de Referência de Assistência à População        acesso ao sistema de saúde.
Transexual no Brasil. Além disso, o combate à dis-          Neste sentido, espera-se que o processo de in-
criminação, que foi considerado fator determinante      clusão do procedimento na tabela do SUS possa
da condição de sofrimento de transexuais, foi con-      levar adiante as recomendações coletivamente cons-
templado como estratégia de promoção da saúde,          truídas por profissionais de saúde, pesquisadores,
não sendo mais a saúde de transexuais uma ques-         do Coletivo Nacional de Transexuais e dos técnicos
tão exclusivamente médico-cirúrgica21. Nesse con-       do Ministério da Saúde envolvidos diretamente com
texto, outros aspectos, como o uso do nome social       a promoção da equidade na saúde deste segmento.
nas unidades de saúde, tornaram-se uma estraté-
gia de promoção de acesso aos serviços, benefici-
ando diretamente transexuais e travestis, já que        O debate atual sobre a trans-autonomia
um dos principais fatores da exclusão do sistema é
a própria precariedade no acolhimento.                  Embora a associação do diagnóstico de transexu-
    De qualquer modo, como efeito das recomen-          alismo à redesignação sexual tenha viabilizado a
dações oriundas da reunião sobre o Processo Tran-       institucionalização do debate sobre a assistência
sexualizador no SUS, as subsequentes discussões         dessa clientela na rede pública de saúde, devemos
internas do referido grupo de trabalho considera-       considerar a complexidade que envolve compre-
ram a pertinência de reformular e atualizar a mi-       ender a condição transexual como uma anormali-
nuta de portaria proposta em 2004, atendendo às         dade, colocando em pauta o paradoxo de que, se
demandas do segmento de transexuais pela inte-          por um lado o diagnóstico torna legítima a de-
gralidade da atenção no processo transexualiza-         manda por redesignação sexual e possibilita o aces-
dor, bem como à premente exigência de humani-           so aos serviços de saúde, por outro é raiz de restri-
zação e qualificação da atenção, para além da ques-     ções sociais e estigma que afetam diversos níveis
tão cirúrgica, embora sem dela prescindir.              da vida desses indivíduos, reforçando sua condi-
    Neste sentido, e visando a garantir a universali-   ção de exclusão social.
dade e a integralidade na atenção à saúde desse seg-        Como mencionado antes, o debate em torno
mento populacional, optou-se pelo esboço de Di-         da compreensão patologizante do fenômeno tran-
retrizes do Ministério da Saúde para o Processo         sexual tem sido largamente realizado nos dias de
Transexualizador no SUS, processo este em discus-       hoje, em especial por aqueles que se opõem a sua
são quando da recente ação do Ministério Público        definição como uma categoria psiquiátrica. Segun-
Federal para a pronta inclusão da cirurgia de rede-     do Butler25, podemos observar que há um campo
signação sexual na tabela do SUS. Essas diretrizes      de tensão entre aqueles que estão tentando obter
esboçadas acompanham a proposta estratégica de          autorização e assistência financeira para realizar a
1148
Arán M et al.




                cirurgia de transgenitalização e aqueles que consi-     siderando que a mesma não é um conceito, mas
                deram que o diagnóstico deve ser eliminado com-         uma prática socialmente condicionada; e de outro,
                pletamente, considerando que usuários transexu-         há a argumentação que sugere que nesta situação a
                ais têm total condição de dispor sobre seu corpo.       prática da trans-autonomia seria enfraquecida, ou
                    Nesta discussão, para os defensores do transe-      até mesmo comprometida, ao estar sujeita a deter-
                xualismo como categoria nosológica, entre os quais      minado tipo de avaliação e enquadramento psi-
                estão alguns membros da comunidade LGBT, psi-           quiátrico e psicológico.
                quiatras, psicólogos e pesquisadores, essa defini-          No entanto, ao fazer uma revisão sobre os as-
                ção tem função de extrema importância, pois ga-         pectos que constituem o transtorno de identidade
                rante o reconhecimento do direito do paciente tran-     de gênero, podemos perceber que a definição do
                sexual de utilizar o serviço de saúde para realizar a   diagnóstico reitera as interpretações normativas
                conversão sexual. Segundo esta posição, através do      sobre o gênero masculino e o feminino de nossa
                diagnóstico psiquiátrico, o desejo de realizar a ci-    sociedade, medicalizando as condutas desviantes a
                rurgia de transgenitalização e procedimentos afins      partir das supostas “verdades” de cada sexo. Além
                pode ser concretizado a partir de uma necessidade       disso, parte-se do pressuposto de que existe uma
                médica, possibilitando, assim, uma modalidade de        identidade transexual universal, a qual é revestida
                exercício de autonomia25. A argumentação crítica        de uma série de preconceitos, os quais invariavel-
                ao diagnóstico se baseia na tese de que a qualifica-    mente afetam a vida desses indivíduos e interferem
                ção deste fenômeno não está relacionada a qual-         na determinação de si. Assim, mesmo diante da
                quer alteração de função, mas à percepção de uma        proposta de uma utilização puramente estratégica
                inadequação às normas de gênero. Para eles, a tran-     do diagnóstico, podemos notar que o dilema refe-
                sexualidade deve ser compreendida como uma en-          rente às consequências da definição da transexua-
                tre muitas possibilidades humanas de determina-         lidade como uma desordem não se esgota – seja
                ção do próprio gênero, considerando que, quando         pelos sacrifícios envolvidos em assumir a condição
                é associada a uma compreensão patológica, enfra-        de doente, seja pelo risco de internalização de al-
                quece o que Butler25 denomina de trans-autono-          guns desses aspectos patológicos.
                mia. Desse modo, questionam a avaliação médico-             Portanto, consideramos de fundamental im-
                psicológica como condição de acesso ao tratamen-        portância manter um campo de reflexão sobre o
                to, além de problematizarem as consequências ine-       tema, a fim de promover um deslocamento que
                rentes à definição dessa condição como doença.          permita aos serviços de assistência a pacientes tran-
                    Observamos que existem duas formas diferen-         sexuais acolher integralmente esses indivíduos, va-
                tes de abordar a questão da autonomia, que se           lorizando sua diversidade e sem estar fixados ape-
                expressam na forma como cada uma compreende             nas na exigência institucional de confirmação do
                a autodeterminação e a medicalização. De um lado,       diagnóstico.
                há uma visão que admite a necessidade de condi-             É importante levar sempre em conta que certos
                ções específicas para o exercício da autonomia ple-     tipos de “identidade de gênero” parecem ser meras
                na, ou seja, que não é possível pressupor o exercí-     falhas do desenvolvimento, ou impossibilidades
                cio da autonomia numa população que se encon-           lógicas, porque não se conformam às normas da
                tra numa situação de extrema vulnerabilidade, con-      inteligibilidade cultural vigente”7.




                Colaboradores

                M Arán, D Murta e T Lionço trabalharam em to-
                das as etapas do estudo e fizeram a revisão final do
                artigo. M Arán foi responsável pela concepção do
                artigo e escreveu as primeira e terceira partes em
                conjunto com D Murta. T Lionço escreveu a se-
                gunda parte.
1149




                                                                                                                                   Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009
Referências

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      Autoriza, a título experimental, a realização de cirur-         sobre a cirurgia de transgenitalização e revoga a Reso-
      gia de transgenitalização do tipo neocolpovulvoplas-            lução CFM 1482/97. Diário Oficial da União 2002; 2
      tia, neofaloplastia e ou procedimentos complemen-               dez.
      tares sobre gônadas e caracteres sexuais secundários        18. Lionço T. Um olhar sobre a transexualidade a partir da
      como tratamento dos casos de transexualismo. Diá-               perspectiva da tensionalidade somato-psíquica [tese].
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      uma leitura da teoria psicanalítica da perversão. Rio de        RM, organizadoras. Movimentos sociais, educação e
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      3_1980.htm
16.   Conselho Federal de Medicina. Parecer e Proposta
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      pareceres/cfm/1997/39_1997.htm                              Aprovado em 27/06/2008

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Transexualidade e saúde pública: desafios para uma assistência não-patologizante

  • 1. Redalyc Sistema de Información Científica Red de Revistas Científicas de América Latina, el Caribe, España y Portugal Arán, Márcia;Murta, Daniela;Lionço, Tatiana Transexualidade e saúde pública no Brasil Ciência e Saúde Coletiva, Vol. 14, Núm. 4, julio-agosto, 2009, pp. 1141-1149 Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva Brasil Disponible en: http://redalyc.uaemex.mx/src/inicio/ArtPdfRed.jsp?iCve=63011692015 Ciência e Saúde Coletiva ISSN (Versión impresa): 1413-8123 cecilia@claves.fiocruz.br Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva Brasil ¿Cómo citar? Número completo Más información del artículo Página de la revista www.redalyc.org Proyecto académico sin fines de lucro, desarrollado bajo la iniciativa de acceso abierto
  • 2. 1141 Transexualidade e saúde pública no Brasil ARTIGO ARTICLE Transsexuality and public health in Brazil Márcia Arán 1 Daniela Murta 1 Tatiana Lionço 2 Abstract The article aims to discuss transsexuality Resumo O artigo tem como objetivo discutir a tran- in the context of the Brazilian public health poli- sexualidade no contexto das políticas de saúde públi- cies. Firstly, it questions the necessity of the diagno- ca no Brasil. Para isto, num primeiro momento, pro- sis of Gender Identity Disorder as a condition of blematiza-se a necessidade do diagnóstico de trans- access to treatment in the public health service, torno de identidade de gênero como condição de aces- searching to understand the historical construction so ao tratamento na rede pública, buscando compre- of transsexuality as a pathological phenomenon. Af- ender de que forma se deu historicamente a patologi- ter that, it analyzes the debate on public health pol- zação da transexualidade. Em seguida, analisa-se o icies for transsexuals, considering the process of le- debate sobre as políticas de saúde para transexuais, galization of the reassignment surgery in the coun- considerando o processo de legalização da cirurgia de try, the resolutions of the Federal Council of Medi- transgenitalização no país, as resoluções do Conse- cine and the constitution of representative forums lho Federal de Medicina e os fóruns que se constitu- of the Health Ministry, as well as professionals of the íram com representantes do Ministério da Saúde, area and representatives of the social movement. profissionais da área e representantes do movimento Finally, considering the references available that social. Finalmente, tendo como referência trabalhos emphasizes the critics on the analysis of transsexu- que se destacaram pela crítica à patologização da ality as a pathological phenomenon in the areas of transexualidade nas áreas da saúde coletiva e das the Public Health and Social Sciences, it intends to ciências sociais, pretende-se destacar a importância emphasize the importance of understanding the di- de compreendermos a diversidade de formas de sub- versity of subjectivity’s forms and gender’s construc- jetivação e de construção de gênero na transexuali- tion considering transsexuality. In this context, it dade. Discute-se a questão da autonomia dos transe- 1 Departamento de Políticas discusses the question of transsexuals’ autonomy and xuais e sugerem-se políticas públicas que, embora e Instituições de Saúde, suggests public policies that, even following an assis- sigam um protocolo de assistência, não tenham como Instituto de Medicina Social, UERJ. Rua São tance protocol, do not have as its only therapeutical única referência terapêutica a realização do diag- Francisco Xavier 524, reference the accomplishment of the diagnosis and nóstico e a cirurgia de transgenitalização. Pavilhão João Lyra Filho, 7º andar, blocos D e E, the reassignment surgery. Palavras-chave Transexualidade, Saúde pública, Maracanã. 20550-900 Key words Transsexuality, Public health, Sexuali- Gênero, Subjetividade Rio de Janeiro RJ. ty, Gender, Subjectivity marciaaran@terra.com.br 2 Anis - Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero.
  • 3. 1142 Arán M et al. Introdução tada pela psiquiatrização da transexualidade. Ten- do como a referência a norma do Conselho Federal Em 1997, o Conselho Federal de Medicina (CFM), de Medicina, parte-se do pressuposto de que a tran- através da Resolução nº 1.4821, autorizou a reali- sexualidade é uma doença, sendo o transtorno de zação de cirurgias de transgenitalização em pacien- identidade de gênero (TIG) condição de acesso à tes transexuais no país, alegando seu caráter tera- assistência médica e jurídica para transexuais4. Desta pêutico. Esta resolução parte do princípio de que forma, seguindo uma tendência internacional, a “o paciente transexual é portador de desvio psico- institucionalização da prática assistencial dirigida a lógico permanente de identidade sexual, com rejei- transexuais no Brasil está condicionada a um diag- ção do fenótipo e tendência à automutilação ou nóstico psiquiátrico, o que permitiu o acesso ao auto-extermínio”. A intervenção cirúrgica passou tratamento e, muitas vezes, significa o próprio exer- a ser legítima no Brasil, desde que o paciente apre- cício de cidadania. No entanto, esse mesmo diag- sente os critérios necessários para a realização da nóstico pode ser considerado um vetor de patolo- mesma e o tratamento siga um programa rígido, gização e de estigma, pois atribui uma patologia ao que inclui a avaliação de equipe multidisciplinar e paciente sem questionar as questões históricas, po- acompanhamento psiquiátrico por no mínimo líticas e subjetivas dessa psiquiatrização2. dois anos, para a confirmação do diagnóstico de Diante disso, o artigo pretende problematizar transexualismo. o diagnóstico de TIG como condição de acesso ao Diante disso, houve aumento da demanda de tratamento e cuidado na rede pública no Brasil, auxílio médico por parte de transexuais que, rela- buscando compreender de que forma se deu his- tando intenso sofrimento e demandando tratamen- toricamente a patologização da transexualidade. to médico-cirúrgico, impulsionaram a organiza- Em seguida, analisaremos o debate sobre as políti- ção de programas assistenciais2. Conforme obser- cas de saúde pública para transexuais no Brasil, vado na I Jornada Nacional sobre Transexualida- desde o processo de legalização da cirurgia de trans- de e Saúde: a Assistência Pública no Brasil3, pro- genitalização no país, as resoluções do CFM e os movida pela Coordenação de Saúde Mental do fóruns que se constituíram representantes do Mi- Ministério da Saúde e pelo Instituto de Medicina nistério da Saúde, profissionais da área e represen- Social da UERJ, estes serviços apresentam formato tantes do movimento social para discutir o pro- diferenciado de atendimento, com práticas cirúr- cesso transexualizador no SUS. Finalmente, tendo gicas e terapêuticas distintas, destacando que al- como referência trabalhos que se destacaram pela guns já se constituíram como programas consoli- crítica à patologização da transexualidade na área dados, atendendo a um grande número de pacien- da saúde coletiva e das ciências sociais, pretende- tes, com vasta experiência na área de assistência e mos destacar a importância de compreendermos pesquisa, como o Hospital das Clínicas da Univer- a diversidade de formas de subjetivação na transe- sidade Federal do Rio Grande do Sul e o Hospital xualidade. Para isto, pretendemos discutir a ques- das Clínicas da Faculdade de Medicina da Univer- tão da autonomia dos transexuais e sugerir políti- sidade de São Paulo. cas públicas que, embora sigam um protocolo de Em geral, o processo assistencial compreende assistência, não tenham como única referência te- as seguintes etapas: avaliação e acompanhamento rapêutica a realização do diagnóstico e a cirurgia psiquiátrico periódico para confirmação do diag- de transgenitalização. nóstico; psicoterapia individual e de grupo; hor- monioterapia, com o objetivo de induzir o apare- cimento de caracteres sexuais secundários compa- Algumas considerações críticas tíveis com a identificação psicossexual do paciente; sobre a psiquiatrização da transexualidade avaliação genética; tratamento cirúrgico. Além dis- so, vários desses serviços já estabelecem contato O discurso atual sobre o transexualismo na sexo- com uma assessoria jurídica, para indicação de logia, na psiquiatria e em parte na psicanálise faz pacientes operados no processo de mudança de dessa experiência uma patologia – um “transtor- nome. Vale destacar que, na transexualidade, a no de identidade” – dada a não-conformidade en- importância do acesso aos serviços de saúde con- tre sexo biológico e gênero. Nota-se que o que de- siste não apenas no cuidado do processo de saúde- fine o diagnóstico de transexualismo é uma con- doença, mas fundamentalmente numa estratégia cepção normativa dos sistemas de sexo-gênero, de construção de si. fundamentados numa matriz binária heterosse- A partir deste primeiro contato, percebemos xual que se converte em sistema regulador da se- que, na maioria das vezes, a prática clínica é orien- xualidade e da subjetividade5. Assim, por contrari-
  • 4. 1143 Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009 ar a coerência essencial entre sexo biológico e gêne- Porém, o surgimento do que Bento10 denomi- ro, não se encaixando em nenhum dos modelos na de dispositivo da transexualidade não se deu a propostos de identidade sexual em conformidade partir do debate sobre o diagnóstico, mas sim a com as práticas discursivas do século XIX, obser- partir da primeira intervenção terapêutica tornada vamos que restou exclusivamente à transexualida- pública: a cirurgia do ex-soldado do exército ame- de ocupar o espaço que foi aberto pela psiquiatri- ricano George Jorgensen realizada por Christian zação da homossexualidade: o de uma patologia Hamburger, em 1952, na Dinamarca11. Neste con- da identidade sexual4. texto, as novas teorias médicas e sociológicas con- Esta premissa foi bastante problematizada por duziram muitos pesquisadores para uma nova autores como Michel Foucault e Judith Butler. Se- definição do conceito de transexualismo e para a gundo Foucault, o dispositivo da sexualidade, o defesa do tratamento dos transexuais através de qual surgiu na aurora da modernidade, só pode intervenções corporais. Seus personagens centrais ser compreendido através dos mecanismos de po- são: Harry Benjamin, endocrinologista alemão, der e saber que lhes são intrínsecos. Falar de sexu- radicado nos Estados Unidos da América; John alidade é também se referir à produção dos sabe- Money, psicólogo, professor do Hospital Univer- res que a constituem, aos sistemas de poder que sitário John Hopkins e Roberto Stoller, psicanalis- regulam suas práticas e às formas pelas quais os ta e psiquiatra americano. indivíduos podem e devem se reconhecer como Harry Benjamin, considerado até hoje uma das sujeitos sexuados6. Em outras palavras, sexo – principais referências na teorização sobre o tran- homem, mulher – não é um simples fato ou uma sexualismo, afirma que há uma relação entre o condição estática, e sim “uma construção ideal for- transexualismo e a endocrinologia. Apoiado nos çosamente materializada através do tempo”7. avanços dos estudos biológicos do século XX, em Antigamente, convivíamos mais livremente com especial os estudos genéticos, propõe que não ha- a possibilidade da mistura dos sexos. Somente a veria uma divisão absoluta entre “masculino” e “fe- partir do século XVII é que as teorias biológicas da minino”, sendo inadequada a determinação do sexo sexualidade e as condições jurídicas impostas aos do indivíduo baseada puramente nas diferenças indivíduos conduziram pouco a pouco à refuta- anatômicas. Para ele, o sexo é composto por diver- ção da idéia da mistura de dois sexos em um só sos componentes, de modo que a etiologia do tran- corpo e restringiram “a livre escolha dos indivídu- sexualismo e a origem do desejo de mudar o sexo os incertos”6. Assim, o dispositivo da sexualidade ultrapassariam os aspectos psicológicos, podendo instaurou a necessidade de saber, através da medi- estar associadas a uma causa biológica – genética cina, qual o sexo determinado pela natureza e, por ou endócrina4. consequência, aquele que a justiça exige e reconhe- Além da definição proposta por Benjamin, os ce. Ser “sexuado” é estar submetido a um conjunto estudos sobre a transexualidade tomaram força de regulações sociais, as quais constituem uma nos Estados Unidos, através de investigações só- norma que, ao mesmo tempo em que norteia uma cio-antropológicas sobre os fatores que influenci- inteligibilidade e uma coerência entre sexo, gênero, avam na definição da identidade sexual. Tais estu- prazeres e desejos, funciona como um princípio dos, retomando as discussões entre natureza e cul- hermenêutico de auto-interpretação7. Neste senti- tura, entre inato e adquirido, promoveram a sepa- do, “o verdadeiro sexo” é o efeito da naturalização ração conceitual entre sexo (biológico) e gênero de uma norma materializada5. (social), apresentando uma nova possibilidade de Retomando historicamente a constituição do se compreender fenômenos onde se expressa uma discurso científico sobre o sexo, podemos perce- discordância entre eles, favorecendo a consolida- ber como a norma heterossexual e reprodutiva ção de um campo assistencial e teórico voltado culminou na constituição do saber psiquiátrico do para esses casos. século XIX e, consequentemente, na psiquiatriza- Um dos autores que se destacaram nesta pro- ção do prazer perverso e na problematização da posição foi o psiquiatra John Money, que desen- homossexualidade8. A partir disso, foi construída volveu pesquisas com crianças intersexuais, com o uma semiologia dos comportamentos definidos objetivo de esclarecer quais as relações entre a iden- como anormais. Com efeito, na obra de Von Kra- tidade nuclear de um indivíduo, sua anatomia, sua fft-Ebing9 podem ser observadas as primeiras re- fórmula cromossômica e seus hormônios, bus- ferências sobre transexualismo e a descrição de cando demonstrar a independência radical entre o outras alterações das características psicossexuais social e o biológico. Para Money12, o comporta- da personalidade, como a metamorfose psicosse- mento masculino ou feminino é construído social- xual e o hermafroditismo4. mente, sendo a educação o principal aspecto mo-
  • 5. 1144 Arán M et al. delador do gênero. A partir disso, a noção de gêne- Nota-se que, embora a transexualidade já fos- ro para diferenciar o sexo biológico da identidade se um fenômeno reconhecido desde o final do sé- sexual foi consolidada, sendo que, segundo o au- culo XIX, as discussões em torno da temática tive- tor, esta última seria construída ao longo dos pri- ram início apenas a partir da possibilidade de in- meiros anos de vida, teria caráter irreversível e só tervenção médica sobre esses casos, viabilizando a alcançaria sua completa expressão com a maturi- constituição de um campo assistencial, em especial dade sexual12. nos serviços públicos de saúde, voltado para seu Outra referência importante para a definição tratamento em diversos países. Porém, como afir- de transexualismo são as teses de Robert Stoller. mamos, o diagnóstico de transtorno de identida- Para esse autor, a definição de transexualismo se de de gênero, produto de uma exigência médico- baseia principalmente em três aspectos: (1) um legal, reproduz um sistema normativo de sexo e sentimento de identidade permanente, uma crença gênero que não condiz com os modos de subjeti- (no caso do transexualismo masculino) numa es- vação ou a diversidade das formas de construção sência feminina sem ambiguidades (diferentemente de gênero na transexualidade. do transvestismo); (2) uma relação com o pênis vivida “como horror”; (3) uma especificidade na relação com a mãe que o autor chama de simbio- A assistência a transexuais na rede pública se. Porém, o autor ressalta que essa relação não de saúde no Brasil: a questão do acesso pode ser considerada psicotizante, principalmente e o cuidado integral porque a capacidade de integração social dessas pessoas permanece intacta, contrariando teoriza- A legalização da cirurgia de transgenitalização e de ções como as da psicanálise lacaniana, nas quais se procedimentos afins foi um processo longo e cer- destaca a relação entre a transexualidade e a com- cado de diversas discussões que tiveram início em preensão lógica e estrutural da psicose5. 1979, quando o CFM foi consultado pela primeira Frente a isso, a apropriação desse fenômeno vez sobre a inclusão de próteses mamárias em pa- pela medicina, através da proposição de tratamen- cientes do sexo masculino (Protocolo nº 1.529/79 tos, deu origem a um problema médico-legal, já CFM15). Tais discussões, sempre amparadas no que esse tipo de intervenção médica não era permi- Código de Ética Médica e no Código Penal, coloca- tido em todos os países e estava gerando pedidos vam em pauta a licitude ética e penal da “cirurgia de redefinição do sexo civil13. Nesse contexto, foi de conversão sexual”, já que se considerava inicial- necessário que as redesignações sexuais estivessem mente a mesma “mutilação grave” e “ofensa à inte- inseridas em processos terapêuticos formais que gridade corporal”. Além disso, foram problemati- culminaram na criação de centros de transgenitali- zadas as possíveis implicações jurídicas que tal in- zação e na elaboração de protocolos de atendimen- tervenção geraria, podendo a alteração da genitá- to, com base na Escala de Orientação Sexual criada lia servir como argumento para a modificação da por Harry Benjamin. Assim, em 1973, Norman Fisk identidade sexual, o que poderia estar relacionado fundamentou uma nosografia psiquiátrica para o ao crime de atribuição de falsa identidade, confor- transexualismo, ancorada fundamentalmente num me Artigo 307 do Código Penal. autodiagnóstico e, em 1977, essa condição foi in- Entre os diversos debates ocorridos nesse perío- corporada à categoria psiquiátrica de disforia de do, destacamos o I Encontro Nacional dos Conse- gênero, um “híbrido psiquiátrico-sociológico” que lhos de Medicina, nos quais pela primeira vez hou- tinha como único objetivo responder a necessida- ve uma manifestação favorável à realização da ci- des funcionais, apenas reproduzindo o autodiag- rurgia. Nesse contexto, a cirurgia de transgenitali- nóstico numa definição médica da síndrome13. zação foi considerada a etapa mais importante no Em 1980, a condição transexual finalmente teve tratamento de transexualismo, pela possibilidade seu lugar formalizado na psiquiatria e na medici- de adaptar a morfologia genital ao sexo com o qual na, sendo agregada ao manual diagnóstico psiqui- o indivíduo se identifica. Esse procedimento foi jus- átrico DSM III (Manual Diagnóstico e Estatístico tificado, inicialmente, através do princípio de bene- das Desordens Mentais). Posteriormente, em 1994, ficência, já que possibilita a integração entre o cor- com a publicação do DSM IV14, o termo transexu- po e a identidade sexual psíquica do interessado, alismo, utilizado até então, foi substituído por unido aos princípios de autonomia – direito da transtorno de identidade de gênero (TIG), delimi- autodeterminação e de dispor do próprio corpo – e tando mais claramente o fato de ser considerado de justiça – o direito de a pessoa não ser discrimi- um estado psicológico no qual a identidade de gê- nada no pleito à cirurgia. Tal premissa deu origem nero está em desacordo com o sexo biológico. à proposta da Resolução PC/CFM 39/9716, que su-
  • 6. 1145 Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009 gere a adoção deste procedimento cirúrgico, a títu- do registro civil da realização da cirurgia de trans- lo experimental, nos casos de transexualismo e, genitalização, já que a permissão para troca de posteriormente, à Resolução nº 1.4821. Esta define nome e sexo no registro civil resolveria o problema que a cirurgia de transgenitalização e procedimen- mais agudo da vida cotidiana dos transexuais19,20. tos afins poderiam ser realizados no Brasil em hos- Essas premissas tiveram eco no I Encontro Na- pitais universitários ou públicos a título experimen- cional de Transexuais, realizado em novembro de tal, desde que algumas definições fossem seguidas, 2005, em Brasília, do qual se originou o Coletivo destacando-se o acompanhamento psiquiátrico por Nacional de Transexuais. Embora o movimento no mínimo dois anos. Em 2002, a primeira resolu- social de transexuais só tenha se constituído efeti- ção foi revogada pela Resolução nº 1.65217 que, con- vamente em 2005, podemos observar que desde 2003 siderando o estágio atual de tratamento dos casos e existem discussões sobre a formulação de políticas o bom resultado estético e funcional das neocolpo- inclusivas para toda a população LGBT (lésbicas, vulvoplastias e/ou procedimentos complementares, gays, bissexuais, travestis e transexuais), no Brasil, resolve que as cirurgias para adequação do fenóti- que culminaram nos debates atuais sobre atenção po masculino para o feminino podem ser pratica- integral a transexuais no Ministério da Saúde. A das em hospitais públicos ou privados, indepen- partir da definição desse grupo como vulnerável à dentemente da atividade de pesquisa, mas seguin- exclusão social, pelo Conselho Nacional de Com- do os critérios de acompanhamento já estabeleci- bate à Discriminação (CNCD), o mesmo passou a dos. No caso da neofaloplastia, faloplastia, metoi- fazer parte da pauta dos gestores de políticas públi- dioplastia, antes de e/ou procedimentos comple- cas e foi incluído em programas que tivessem como mentares, a realização se manteve condicionada à objetivo garantir os direitos de lésbicas, gays, trans- prática em hospitais universitários ou hospitais gêneros e bissexuais21. públicos adequados para a pesquisa. Nesse contexto, a Secretaria Especial de Direitos A partir dessas resoluções, alguns hospitais uni- Humanos, atualmente vinculada à Presidência da versitários do país constituíram programas inter- República, iniciou reuniões ambulantes, com o in- disciplinares para atender à crescente demanda de tuito de apresentar essa demanda a diversos ór- usuários transexuais. Mesmo considerando o ine- gãos governamentais, assim como sensibilizar e es- gável benefício que alguns serviços têm prestado a clarecer representantes do governo quanto à neces- usuários transexuais, vale destacar que a exigência sidade de formulação de políticas inclusivas aos do diagnóstico como condição de acesso ao trata- grupos definidos pelo CNCD. mento vem sendo continuamente problematizada, Além disso, ainda em 2003, o Ministério da Saúde através das contribuições realizadas no campo da foi solicitado a tomar uma posição em relação à saúde coletiva, das ciências sociais e da bioética. população LGBT, contemplando dois aspectos: que A partir do relato de experiências assistenciais, a inclusão da população LGBTno SUS se efetivasse alguns autores destacam que a certeza quanto ao segundo seus princípios fundamentais, a saber, pertencimento ao gênero oposto, a qual às vezes se universalidade, integralidade e equidade; e que o expressa pela crença numa identidade fixa, se repe- Ministério da Saúde consolidasse uma Política Na- te no cotidiano do atendimento a pacientes transe- cional de Saúde para a População LGBT (lésbicas, xuais. Porém, afirmam que a transexualidade não gays, bissexuais, travestis e transexuais). necessariamente fixa uma posição subjetiva e des- Nesse sentido, em 2004, o Governo Federal, atra- tacam a importância de deslocar a manifestação vés dos encaminhamentos do CNCD, lança o Brasil social da transexualidade da necessidade de tradu- sem homofobia - programa de combate à violência e à zi-la imediatamente numa patologia, numa estru- discriminação contra GLTB e de promoção da cida- tura ou num modo de funcionamento específico, dania homossexual, explicitando o compromisso es- o que nos permitiria escapar da sua psiquiatriza- tatal com a promoção de políticas públicas que ga- ção. A experiência transexual, neste sentido, com- rantissem a efetividade dos direitos a essa popula- portaria várias formas singulares de subjetiva- ção. O programa, elaborado a partir das contribui- ção2,4,7,18. Além disso, discute-se também que não ções de lideranças do movimento LGBT, represen- existe um processo específico de construção das tou uma conquista da sociedade brasileira decor- identidades de gênero nos transexuais e desta for- rente de mais de duas décadas de mobilização social, ma não se deve esperar de transexuais um com- apresentando propostas de ações nos setores Saúde, portamento fixo, rígido, adequado às normas de Educação, Cultura, Trabalho e Segurança Pública, feminilidade ou de masculinidade12,20. Outra pro- sendo coordenado pela Secretaria Especial de Direi- posição que tem se destacado no debate é a impor- tos Humanos. De qualquer modo, este programa tância de desvincular a possibilidade da mudança governamental se estrutura em torno do eixo da
  • 7. 1146 Arán M et al. violência, enfatizando o combate à discriminação e à Partindo do fato de que não há nenhuma regu- homofobia como estratégias fundamentais para a lamentação do processo de redesignação sexual no promoção da cidadania, permanecendo a necessi- SUS (visto que o fornecimento de medicamentos dade de implementação de políticas de saúde22. específicos é irregular), que a cirurgia de transgeni- Diante disto, ainda em 2004, o Ministério da talização não estava, na ocasião, incluída na tabela Saúde, através da Portaria nº 2.227/GM23, criou o de procedimentos financiados pelo mesmo e que comitê técnico para a formulação da proposta de existem programas de atendimento a transexuais Política Nacional de Saúde da População LGBT. em funcionamento em diversos estados brasilei- Este comitê técnico teve seu processo de efetiva ins- ros, foram colocados em pauta pontos relevantes titucionalização prejudicado por mudanças na ges- para a elaboração de protocolos de acompanha- tão do Ministério da Saúde, já que desde a data de mento e avaliação de transexuais orientados pelo sua formalização (novembro de 2004) até o pre- Ministério da Saúde. sente, mudanças contínuas no corpo técnico da Além disso, foram discutidos os critérios para instituição, aliadas a entraves na gestão, compro- realização de outras intervenções somáticas – como meteram o seu efetivo exercício. implante de silicone nos seios, eletrólise, redução Cabe ressaltar, no entanto, que avanços signifi- do pomo de Adão, mastectomia e histerectomia –, cativos nas discussões sobre saúde de transexuais a inclusão de previsões de distribuição de medica- vêm se consolidando, através de sólida pactuação ções específicas, a inclusão da cirurgia de transgeni- de interesses entre o movimento social de transexu- talização na tabela do SUS, a promoção da inclusão ais e o Ministério da Saúde. Como efeito da articu- desses indivíduos como cidadãos de direitos e a in- lação política entre o governo e o movimento de clusão de transexuais no SUS de forma mais ampla transexuais no Brasil, decidiu-se, durante o XII que a questão da cirurgia de redesignação sexual18. EBGLT, através de fórum de discussões ampliado Sendo assim, evidenciou-se a necessidade de entre representantes do Ministério da Saúde e lide- considerar a transexualidade para além da questão ranças do movimento LGBT, estender um assento pré e pós-operatória, sendo a questão mais com- no Comitê Técnico Saúde da População GLTB para plexa e danosa a própria representação social sobre transexuais, passando a diferenciar e reconhecer a a transexualidade, que patologiza e estigmatiza este especificidade de suas demandas, anteriormente segmento populacional. A cirurgia de transgenitali- associadas e confundidas com as de travestis. zação, comumente apresentada como central na Segundo já explicitaram Costa e Lionço24, a demanda de transexuais, foi problematizada como busca pela efetivação dos princípios de universali- solução não-consensual entre as diferentes pessoas dade e integralidade, preconizados constitucional- transexuais. Existindo realidades distintas, há tam- mente desde 1988 e afirmados pela Lei nº 8.080, de bém necessidades distintas quanto à característica 1990, encontram na idéia de equidade sua condição das intervenções somáticas que seriam satisfatóri- de possibilidade, sendo as políticas de promoção as para cada indivíduo. É interessante notar que a da equidade efeito ou consequência da participação discriminação e a conotação patologizante que re- social na gestão das políticas públicas. A gestão par- cai sobre transexuais foram apresentadas como ticipativa e o protagonismo do movimento social central para o segmento, demandando iniciativas são fundamentais para que ações em saúde venham que primem pela humanização do atendimento e a responder e espelhar as reais necessidades e os pela viabilização e qualificação do acesso dessas valores específicos de diferentes grupos sociais, con- pessoas ao sistema de saúde. sumando a proposição de modelos de atenção jus- Paralelamente à institucionalização do Comi- tos rumo à equidade. Portanto, é necessário reco- tê Técnico Saúde da População GLTB, ainda em nhecer a unidade dos diferentes segmentos LGBT 2004, como efeito de uma ação do Ministério Pú- numa luta comum por visibilidade, ao mesmo tem- blico do Rio Grande do Sul, foi instituído, sob a po em que se considera sua pluralidade interna. responsabilidade da Coordenação Geral de Alta Nesse sentido, o Ministério da Saúde, através Complexidade da Secretaria de Atenção à Saúde do Comitê Técnico Saúde da População GLTB, de- do Ministério da Saúde, grupo de trabalho para sencadeou, em fevereiro de 2006, reunião sobre o discutir a inclusão da cirurgia de transgenitaliza- Processo Transexualizador no SUS, articulando, em ção e procedimentos complementares sobre gôna- um mesmo espaço de formulação, representantes das e caracteres sexuais secundários na tabela de do Ministério da Saúde, do Coletivo Nacional de procedimentos do SUS. Transexuais, profissionais da rede pública de saúde As recomendações decorrentes da reunião so- que atuam com transexuais e pesquisadores que se bre o Processo Transexualizador no SUS refletem dedicam ao tema. os anseios do movimento social. Como efeito des-
  • 8. 1147 Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009 se processo, o grupo de trabalho da Coordenação implementação e qualificação dos serviços de aten- Geral de Alta Complexidade foi rearticulado, aco- ção a transexuais no SUS, prevendo credenciar, junto lhendo representantes de sociedades médicas, do ao Ministério da Saúde, Centros de Referência para Conselho Federal de Medicina, do Ministério Pú- a Atenção Integral ao Processo Transexualizador blico do Rio Grande do Sul, da Defensoria Pública do SUS, um por macrorregião. A definição dos ser- do DF, representante transexual da sociedade civil viços a serem credenciados deveria levar em consi- e representantes de áreas técnicas do Ministério da deração a existência de programas já existentes na Saúde. Nessa circunstância, foram analisadas a si- rede pública de saúde e a operacionalização dos ser- tuação atual da saúde dos transexuais e a assistên- viços seria organizada em rede integrada. cia dos mesmos nos serviços de saúde pública, a As discussões empreendidas no Seminário Na- fim de se definirem as diretrizes da assistência a cional Saúde da População GLBTT na Construção esse público sob a perspectiva da integralidade, da do SUS, em agosto de 2007, denunciam a atualida- equidade e da humanização da atenção, além de se de deste posicionamento por parte do Coletivo discutir a inclusão da cirurgia de transgenitaliza- Nacional de Transexuais, de pesquisadores e de ção nas tabelas de procedimentos do SUS. representantes do Comitê Técnico Saúde da Popu- As discussões técnicas subsequentes se orien- lação GLTB do Ministério da Saúde. Ainda que tam para a proposição de diretrizes comprometi- comemorando a decisão do Tribunal Regional Fe- das com a superação do estigma associado à con- deral da 4ª Região, o temor de transexuais frente à dição transexual, tendo como objetivo delimitar compulsória liberação das cirurgias no SUS con- os critérios para o acompanhamento a transexu- siste na falta de normatização do processo transe- ais no SUS, assim como definir as estratégias de xualizador em sua perspectiva integral, bem como avaliação, implementação e credenciamento de pela patologização de sua condição ser a porta de Centros de Referência de Assistência à População acesso ao sistema de saúde. Transexual no Brasil. Além disso, o combate à dis- Neste sentido, espera-se que o processo de in- criminação, que foi considerado fator determinante clusão do procedimento na tabela do SUS possa da condição de sofrimento de transexuais, foi con- levar adiante as recomendações coletivamente cons- templado como estratégia de promoção da saúde, truídas por profissionais de saúde, pesquisadores, não sendo mais a saúde de transexuais uma ques- do Coletivo Nacional de Transexuais e dos técnicos tão exclusivamente médico-cirúrgica21. Nesse con- do Ministério da Saúde envolvidos diretamente com texto, outros aspectos, como o uso do nome social a promoção da equidade na saúde deste segmento. nas unidades de saúde, tornaram-se uma estraté- gia de promoção de acesso aos serviços, benefici- ando diretamente transexuais e travestis, já que O debate atual sobre a trans-autonomia um dos principais fatores da exclusão do sistema é a própria precariedade no acolhimento. Embora a associação do diagnóstico de transexu- De qualquer modo, como efeito das recomen- alismo à redesignação sexual tenha viabilizado a dações oriundas da reunião sobre o Processo Tran- institucionalização do debate sobre a assistência sexualizador no SUS, as subsequentes discussões dessa clientela na rede pública de saúde, devemos internas do referido grupo de trabalho considera- considerar a complexidade que envolve compre- ram a pertinência de reformular e atualizar a mi- ender a condição transexual como uma anormali- nuta de portaria proposta em 2004, atendendo às dade, colocando em pauta o paradoxo de que, se demandas do segmento de transexuais pela inte- por um lado o diagnóstico torna legítima a de- gralidade da atenção no processo transexualiza- manda por redesignação sexual e possibilita o aces- dor, bem como à premente exigência de humani- so aos serviços de saúde, por outro é raiz de restri- zação e qualificação da atenção, para além da ques- ções sociais e estigma que afetam diversos níveis tão cirúrgica, embora sem dela prescindir. da vida desses indivíduos, reforçando sua condi- Neste sentido, e visando a garantir a universali- ção de exclusão social. dade e a integralidade na atenção à saúde desse seg- Como mencionado antes, o debate em torno mento populacional, optou-se pelo esboço de Di- da compreensão patologizante do fenômeno tran- retrizes do Ministério da Saúde para o Processo sexual tem sido largamente realizado nos dias de Transexualizador no SUS, processo este em discus- hoje, em especial por aqueles que se opõem a sua são quando da recente ação do Ministério Público definição como uma categoria psiquiátrica. Segun- Federal para a pronta inclusão da cirurgia de rede- do Butler25, podemos observar que há um campo signação sexual na tabela do SUS. Essas diretrizes de tensão entre aqueles que estão tentando obter esboçadas acompanham a proposta estratégica de autorização e assistência financeira para realizar a
  • 9. 1148 Arán M et al. cirurgia de transgenitalização e aqueles que consi- siderando que a mesma não é um conceito, mas deram que o diagnóstico deve ser eliminado com- uma prática socialmente condicionada; e de outro, pletamente, considerando que usuários transexu- há a argumentação que sugere que nesta situação a ais têm total condição de dispor sobre seu corpo. prática da trans-autonomia seria enfraquecida, ou Nesta discussão, para os defensores do transe- até mesmo comprometida, ao estar sujeita a deter- xualismo como categoria nosológica, entre os quais minado tipo de avaliação e enquadramento psi- estão alguns membros da comunidade LGBT, psi- quiátrico e psicológico. quiatras, psicólogos e pesquisadores, essa defini- No entanto, ao fazer uma revisão sobre os as- ção tem função de extrema importância, pois ga- pectos que constituem o transtorno de identidade rante o reconhecimento do direito do paciente tran- de gênero, podemos perceber que a definição do sexual de utilizar o serviço de saúde para realizar a diagnóstico reitera as interpretações normativas conversão sexual. Segundo esta posição, através do sobre o gênero masculino e o feminino de nossa diagnóstico psiquiátrico, o desejo de realizar a ci- sociedade, medicalizando as condutas desviantes a rurgia de transgenitalização e procedimentos afins partir das supostas “verdades” de cada sexo. Além pode ser concretizado a partir de uma necessidade disso, parte-se do pressuposto de que existe uma médica, possibilitando, assim, uma modalidade de identidade transexual universal, a qual é revestida exercício de autonomia25. A argumentação crítica de uma série de preconceitos, os quais invariavel- ao diagnóstico se baseia na tese de que a qualifica- mente afetam a vida desses indivíduos e interferem ção deste fenômeno não está relacionada a qual- na determinação de si. Assim, mesmo diante da quer alteração de função, mas à percepção de uma proposta de uma utilização puramente estratégica inadequação às normas de gênero. Para eles, a tran- do diagnóstico, podemos notar que o dilema refe- sexualidade deve ser compreendida como uma en- rente às consequências da definição da transexua- tre muitas possibilidades humanas de determina- lidade como uma desordem não se esgota – seja ção do próprio gênero, considerando que, quando pelos sacrifícios envolvidos em assumir a condição é associada a uma compreensão patológica, enfra- de doente, seja pelo risco de internalização de al- quece o que Butler25 denomina de trans-autono- guns desses aspectos patológicos. mia. Desse modo, questionam a avaliação médico- Portanto, consideramos de fundamental im- psicológica como condição de acesso ao tratamen- portância manter um campo de reflexão sobre o to, além de problematizarem as consequências ine- tema, a fim de promover um deslocamento que rentes à definição dessa condição como doença. permita aos serviços de assistência a pacientes tran- Observamos que existem duas formas diferen- sexuais acolher integralmente esses indivíduos, va- tes de abordar a questão da autonomia, que se lorizando sua diversidade e sem estar fixados ape- expressam na forma como cada uma compreende nas na exigência institucional de confirmação do a autodeterminação e a medicalização. De um lado, diagnóstico. há uma visão que admite a necessidade de condi- É importante levar sempre em conta que certos ções específicas para o exercício da autonomia ple- tipos de “identidade de gênero” parecem ser meras na, ou seja, que não é possível pressupor o exercí- falhas do desenvolvimento, ou impossibilidades cio da autonomia numa população que se encon- lógicas, porque não se conformam às normas da tra numa situação de extrema vulnerabilidade, con- inteligibilidade cultural vigente”7. Colaboradores M Arán, D Murta e T Lionço trabalharam em to- das as etapas do estudo e fizeram a revisão final do artigo. M Arán foi responsável pela concepção do artigo e escreveu as primeira e terceira partes em conjunto com D Murta. T Lionço escreveu a se- gunda parte.
  • 10. 1149 Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009 Referências 1. Brasil. Resolução nº 1.482 de 19 de setembro de 1997. 17. Resolução no 1652 de 2 de dezembro de 2002. Dispõe Autoriza, a título experimental, a realização de cirur- sobre a cirurgia de transgenitalização e revoga a Reso- gia de transgenitalização do tipo neocolpovulvoplas- lução CFM 1482/97. Diário Oficial da União 2002; 2 tia, neofaloplastia e ou procedimentos complemen- dez. tares sobre gônadas e caracteres sexuais secundários 18. Lionço T. Um olhar sobre a transexualidade a partir da como tratamento dos casos de transexualismo. Diá- perspectiva da tensionalidade somato-psíquica [tese]. rio Oficial da União 1997; 19 set. Brasília (DF): Instituto de Psicologia, Universidade 2. Arán M, Murta D, Zaidhaft S. Transexualidade: cor- de Brasília; 2006. po, subjetividade e saúde coletiva. Psicologia e Socie- 19. Zambrano E. Trocando os documentos: um estudo an- dade 2008; 20(1):70-79. tropológico sobre a cirurgia de troca de sexo [disserta- 3. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. I Jornada ção]. Porto Alegre (RS): Instituto de Filosofia e Ciên- Nacional sobre Transexualidade e Assistência Pública cias Humanas, UFRGS; 2003. no Brasil. Relatório final. [acessado 2006 jan 05]. Dis- 20. Ventura M. Transexualismo e respeito à autonomia: ponível em: http://www.ims.uerj.br/transexualidade um estudo bioético dos aspectos jurídicos e de saúde da saude/ “terapia para mudança de sexo” [dissertação]. Rio de 4. Murta D. A psiquiatrização da transexualidade: análise Janeiro (RJ): Escola Nacional de Saúde Pública, Fun- dos efeitos do diagnóstico de Transtorno de Identidade de dação Oswaldo Cruz; 2007. Gênero sobre as práticas de saúde [dissertação]. Rio de 21. Graner B, Stefanie A, Lionço T. Movimento GLBT e Janeiro (RJ): Instituto de Medicina Social, UERJ; 2007. transexualidade nas políticas públicas de saúde no 5. Arán M. A Transexualidade e a gramática normativa Brasil: idiossincrasias e sincronismos. In: Seminário do sistema sexo-gênero. Ágora - Estudos em Teoria Internacional Fazendo Gênero, 7; 2005; Florianópolis: psicanalítica 2006, 9(1):49 –63. UFSC. [acessado 2006 out 23]. Disponível em: http:/ 6. Foucault M. História da Sexualidade I. A vontade de /www.fazendogenero7.ufsc.br/artigos/G/Graner-Ste- saber. Rio de Janeiro: Graal; 1988. fanie-Lionco_16.pdf 7. Butler J. Problemas de gênero. Feminismo e subversão da 22. Ramos S. Violência e homossexualidade no Brasil: as identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2003. políticas públicas e o movimento homossexual. In: 8. Peixoto Jr. CA. Metamorfoses entre o sexual e o social: Grossi MP, Becker S, Losso JCM, Muller RCF, Porto uma leitura da teoria psicanalítica da perversão. Rio de RM, organizadoras. Movimentos sociais, educação e Janeiro: Civilização Brasileira; 1999. sexualidades. Rio de Janeiro: Garamond; 2005. 9. Von Krafft-Ebing R. Psychopathia sexualis: as histórias 23. Brasil. Portaria nº 2.227/GM de 14 de outubro de de caso. São Paulo: Martins Fontes; 2000. 2004. Dispõe sobre a constituição do Comitê Técni- 10. Bento B. A reinvenção do corpo. Sexualidade e gênero na co para a formulação da proposta de Política Nacio- experiência transexual. Rio de Janeiro: Garamond; 2006. nal de Saúde da População de Gays, Lésbicas, Trans- 11. Frignet H. O transexualismo. Rio de Janeiro: Compa- gêneros e Bissexuais – GLTB. Diário Oficial da União nhia de Freud; 2002. 2004; 14 out. 12. Money J. Sex reassignment as related to hermaprho- 24. Costa AM, Lionço T. Democracia e Gestão Participa- ditism and transsexualism. In: Green R, Money J, tiva: uma estratégia para a equidade na saúde? Saúde editors. Transsexualism and sex reassignment. Balti- e Sociedade 2006, 15(2):47-55. more: The Johns Hopkins Press; 1969. p. 91-114. 25. Butler J. Undoing Gender. New York/London: Rou- 13. Castel PH. Algumas reflexões para estabelecer a cro- tledge; 2004. nologia de “fenômeno transexual” (1910 – 1995). Re- vista Brasileira de História 2001, 21(41):77–111. 14. American Psychiatric Association. DSM – IV – TR. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Men- tais. Porto Alegre: Artmed; 2002. 15. Conselho Federal de Medicina. Protocolo no 1.529/79. [acessado 2006 abr 22]. Disponível em: http://www. portalmedico.org.br/pareceres/crmba/pareceres/1980/ 3_1980.htm 16. Conselho Federal de Medicina. Parecer e Proposta de Resolução PC/CFM/ no 39/97. [acessado 2006 abr 22]. Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/ Artigo apresentado em 04/12/2007 pareceres/cfm/1997/39_1997.htm Aprovado em 27/06/2008