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          A FOTOGRAFIA COMO PAIXÃO EM CARTIER-BRESSON


Prof. Dr. Emanoel Francisco Pinto Barreto
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN
e.barreto@ufrnet.br


                                      RESUMO
Este ensaio aborda a obra de Henri Cartier-Bresson a partir da perspectiva “olhar do
fotógrafo”. Olhar como algo aquém, atitude aguçada por fato cuja carga dramática a
câmera enquadra e verte à condição de cena e, daí, a foto. Paixão disciplinada do captor
em participação discreta, pois não pode interferir e mistificar a cena. Bresson é visto
aqui, exatamente, sob o prisma da paixão – a mesma que impregna o núcleo discursivo
deste texto. Desde o mercado de Bali, com foto de mulher primal e seminua até Gandhi,
tentamos uma apreciação da capacidade significante e comovente de sua obra.

Palavras-chave: Bresson, fotografia, cena


       O trabalho de Henri Cartier-Bresson talvez se possa definir como um exercício
de placidez e dinâmica, distanciamento e imersão do olhar em instante passageiro,
conjura de arrebatamento e cerebralismo. Paixão seria, substantivamente, o termo que a
tudo isso englobaria. Aquela, de sentido weberiano, paradoxalmente metódica e
cambiante – “apaixonada a uma „causa‟, ao deus ou ao demônio que a inspira” (WEBER,
1968, p.106). Se não, como conseguir congelar em foto o momento preciso, aquela
eternidade pequena? Paixão como processo encantador o suficiente para atrair o olhar
inquisitorial ao fato transeunte, mas também disciplinadora desse mesmo olhar, que
obtura para aclarar: paixão como instantânea permanência, desfeita após para partir
rumo ao próximo fotograma. E depois outro e outro, em processo ao mesmo tempo
meta e mono – a se resolver sempre por não se resolver jamais.
       O gesto poético de Bresson é inesperadamente político: uma política acima, a
perplexa política do olhar. Captação da vida/existência em seu fragor ingênuo, curioso
ou trágico. O que virá depois daquele instante? E antes, o que o implicou? Como? Por
quê? Um fragmento de tempo, em conexão com um fragmento de espaço e temos o
momento decisivo exposto em imagem experienciada, evanescente, sem partido e sem-
causa. Vazia de palavras de ordem. O mundo por ele mesmo. “Os olhares captados pelo
fotógrafo expressam uma profunda solidão, o real desencanto dos despossuídos, uma
apatia que revela certa renúncia diante do peso da miséria (ASSOULINE, 2009, p. 92).”
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Seria, digamos, uma política da percepção, que tem a cena como discurso
impronunciado, mas veemente. Captado em sua consistência vívida de momento único.
Ao mesmo tempo total, completo e infinito. Momento sem significado intrínseco, mas
tornado a tal pelo olhar que o fez assim. Fragmento de vida, fato objetivo, argumento
não-formulado mas presente; existência interpelada pelo olhar do fotógrafo. Que com a
vida, esfinge, deblatera, sem esperar resposta que não o ícone resultante – ícone também
ele esfíngico ao olhar do leitor. É que, paradoxalmente, o objetivado só se torna objeto
pelo olhar subjetivo que o criou e nele acredita como coisa particular. Imagem virtual, já
existente no corolário do fotógrafo, ao ser flagrada no mundo vem ao encontro de si
mesma. Eis o momento decisivo.

                        Siempre he tenido una pasión por la pintura. Cuando era chico pintaba
                        todos los jueves, día en que no había clases, y los domingos, y
                        pensaba en la pintura los otros días. Tenía como muchos chicos una
                        cámara Brownie - box, pero solo la utilizaba cada tanto para llenar
                        pequeños álbumes con mis recuerdos de vacaciones. No fue sino
                        mucho más tarde que empecé a mirar mejor a través de la cámara,
                        entonces mi pequeño mundo se amplió y fue el fin de las fotos de
                        vacaciones (CARTIER-BRESSON, 2010)


       A pintura já o atraía, o gesto de documentar o mundo perpetrava aos poucos a
arte figurativa, o real captado em processo infante de estranhamento/descoberta. É que o
real figurado desvela de alguma forma a essência da coisa representada. Aborda
certezas duvidosas e certas dúvidas. Afinal, o representar é re-apresentar aquilo que se
apresenta comum, corrente, normal – ou seja: a cena é visível ao olhar inquiridor, mas
será imperceptível ao olho de quem apenas seja comum, corrente, normal. Sem
perplexidade o mundo é estático e desinteressante. Na fotografia de Bresson o mundo é
rápido e cada segundo conta. O tempo tem locução própria, e o espaço e seus habitantes
com ele dialogam. Resta saber o que dizem. E o que dizem é transcrito na imagem. A
vida e todas as suas digressões.


                        Parte significativa da obra de Cartier-Bresson pode ser interpretada
                        pela união que ele promoveu de dois recursos estéticos inovadores das
                        primeiras décadas do século XX: o instantâneo fotográfico e a
                        colagem pictórica. Embora a expressão “instante decisivo” tenha se
                        tornado a divisa de sua obra, o instantâneo foi apenas o meio que
                        Cartier-Bresson empregou para obter suas fotografias. O que elas
                        buscavam, e tantas vezes encontraram, era o feliz cruzamento no
                        mundo de dois ou mais acontecimentos similares e independentes um
                        do outro. É pela junção desses acontecimentos independentes que a
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                       fotografia se mostra e pode ser vista como uma colagem. E visto que
                       são captados de maneira rápida pela técnica do instantâneo
                       fotográfico, os procedimentos da colagem e do instantâneo se
                       encontram conjugados. Mas se a independência dos acontecimentos
                       responde, em grande parte, pelo aspecto de colagem que as fotografias
                       adquirem, já a similaridade entre eles movimenta rapidamente o olhar
                       do espectador entre um acontecimento e outro. Surge assim, no
                       interior da fotografia, um instante por ela simbolizado e diferente do
                       instante em que a fotografia foi tirada. Esse instante interno, que
                       necessita da técnica do instantâneo, mas não é ele mesmo o instante
                       técnico do disparo fotográfico, é parte fundamental de uma linguagem
                       que Cartier-Bresson formulou para a fotografia. Uma linguagem que
                       não apenas se vale do instantâneo, mas que também o significa
                       (TASSINARI, 2008, p. 9-10).


        Surge então uma outra forma do presente. O presente da vida e as suas
divagações, esse o mister de Bresson: fazê-los co-incidir na foto. E coincidem na
colagem pictórica. Pode ser na imagem da feirante seminua do mercado de Bali. Seios
suntuosos – que adornam nudez primal, despojada e majestosamente banal aos olhares
da feira – contrastam com descarnado ancião que lhe é perto. O torso ossudo próximo
ao luxuriante-corpo-fêmeo. Na mulher, à cabeça, um turbante branco é enfeite ligeiro,
contraponto de alvura à pele escura. Mas o cesto na cabeça não é adorno, é fardo.
Temos dois seres básicos em seu estado-de-natureza infausto. Uma espécie de inocência
tosca os une, a guiar a naturalização de sua tragédia. Escassez e viço convivendo nos
corpos de tais inocentes. Tão humanos, tão singelamente espécimes, tão ingenuamente
mansos; dois exemplares, dois viventes, dois de muitos viventes de um éden suarento,
ignaro e tórrido mostrado no universo cifrado da foto, feita em 1949. Podem-se intuir os
gritos do mercado, a vida plebe e rústica, o girar dum cotidiano eterno. Cotidiano
inculto, ironia que esculpiu improvável fêmea exuberante enquanto desbastava a vida de
outro, o infeliz mirrado. Detalhe: o olhar da moça, delicado, se espicha numa meia-volta
do corpo silvestre, olhar virado para o lado e para baixo. Ela vê além, olha para fora do
que está no enquadramento, portanto fora da vista do fotógrafo e, depois, do expectador
da foto. Aí a composição perfeita, mistério e feitiço da colagem pictórica. Bresson
entrecruza dois, três acontecimentos: a moça e o esquálido; a moça, o esquálido e o que
não é possível ver, mesmo supondo. Ela olha a algum ponto. Olha a alguém? Sem
perguntas. O importante é o olhar, não o olhado. Bresson captou candura no que era
agreste. A colagem pictórica está também em imagem tomada durante a cremação de
Gandhi, em 1948. Um homem, identificado por legenda de Bresson como sendo seu
secretário, observa as primeiras chamas da pira funerária. Aquele que se vai, e o que
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fica para testemunhar a sua obra. O olhar que se debruça sobre a pira é atônito e
inconsciente de que vivenciou um momento decisivo e acabara de entrar para a
eternidade daquele momento em instantâneo dramático.


                        A fórmula de Charles Baudelaire para o artista moderno, a da
                        apreensão do eterno no efêmero, se encaixa como uma luva na poética
                        de Cartier-Bresson. O instante que cada uma de suas fotografias
                        eterniza não é o simples instante do clique da câmera, mas um instante
                        grafado na própria fotografia, que dela não desgruda, e que estabelece
                        correspondências de toda sorte entre diferentes aspectos do mundo
                        (TASSINARI, 2008, p. 10)


       Da pintura, o surrealismo povoou expressiva parte de sua obra. Como em foto de
1948, em Pequim, quando figura quase espectral, vestida em negro, longa capa que lhe
chega aos pés, caminha em meio à bruma de rua deserta na Cidade Proibida. O
pavimento, em pedraria retangular, está molhado e reflete de forma baça a figura
daquele lêmure, ampliando o efeito de estranhamento. Chapéu preto completa o cenário
do corpo, nariz e boca encobertos por alvíssima máscara cirúrgica. Pronto. Um ponto de
luz, em contraste com a trevosa figura, habitava corpo sígnico que se movia em meio a
fog quase sinistro. O perfeito equilíbrio de formas e volumes, com imponente
construção ao fundo, trai o pintor naquele instante: mas a pequenez humana em
assimetria, confrontada à arquitetura, já é fotografia. Aí é o fotógrafo encontrando seu
momento decisivo. O fotojornalismo como expressão de um ato é ato ele mesmo de
expressão metalinguística.


                        Na fotografia existe um novo tipo de plasticidade, produto das linhas
                        instantâneas tecidas pelo movimento do objeto. O fotógrafo trabalha
                        em uníssono com o movimento, como se este fosse o desdobramento
                        natural da forma, como a vida se revela. No entanto, dentro do
                        movimento existe um instante no qual todos os elementos se movem
                        em equilíbrio. A fotografia deve intervir neste instante, tornando o
                        equilíbrio imóvel (CARTIER-BRESSON, 2010).


       Equilíbrio, portanto, não indica estaticidade, pelo menos não completamente.
Equilíbrio, no universo bressoniano, é a sutil conjugação de movimento, passagem e a
captura da exatidão que lhe foi atribuída. Equilíbrio como gesto malabar de mão que se
move, para impedir que caia ao chão haste retilínea apoiada tão-só na ponta de um dedo.
Equilíbrio, portanto, é gesto, inconstância, virtuose e mutação. Equilíbrio é instabilidade
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controlada. Por via de consequência equilíbrio é dinâmica. Momento que somente para,
maduro, quando a foto se completa. E mesmo assim ela sugere continuidade, pois toda –
boa – fotografia é um livro imenso, escandindo o olhar de aquém para dentro dela como
se ali houvesse profundidade e infinito, ou a partir dela para os lados, estabelecendo,
pelo imaginário, suas ligações e seus elos com o seu antes e o seu depois. Corrente.


                        O olhar do fotógrafo está sempre avaliando. Um fotógrafo pode captar
                        a coincidência de linhas simplesmente ao mover a cabeça uma fração
                        de milímetro. Pode modificar a perspectiva com um leve dobrar de
                        joelhos. Ao colocar a câmara próxima ou distante do objeto, o
                        fotógrafo pode desenhar um detalhe – ao qual toda a imagem pode
                        ficar subordinada ou ainda que tiranize quem faz a foto. De qualquer
                        modo, o fotógrafo compõe a foto na mesma duração de tempo que
                        leva para apertar o disparador, na velocidade de um ato reflexo
                        (CARTIER-BRESSON, 2010).


       Ou seja: fotografar é ato militante de viver o momento. O distanciamento maior
ou menor não liberta o fotógrafo da força centrípeta que o prende ao fato. O
distanciamento é técnico; a captura do instante emoção e paixão – e o envolve. A
realidade pode ser metamorfoseada ao ser clicada. O olhar compreensivo do fotógrafo,
ao observar cena da vida – p. ex. uma criança mendicante que brinca –, retira dali
momento precioso, jamais percebido pelo pequeno ator. O captor, que critica aquele
instante histórico da miséria lúdica, é agente heurístico do grande drama humano sobre
a face da Terra. E se a miséria é assim estetizada, essa mesma estética faz a denúncia do
que trabalhou em estado de arte. E isso inclui a vida e seu par antitético, a morte. O ser
humano flagrado em sua condição transeunte.


                        O retratista precisa estar convencido de que sua arte tem ligação
                        profunda com a morte. O retrato é o reflexo de uma coisa única,
                        fadada a desaparecer. Uma verdadeira luta contra o tempo. Entender
                        isso no momento de apertar o botão é ter consciência de tudo o que a
                        condição humana tem de efêmero e precário. No entanto, de todos os
                        tipos de fotos, os retratos são ao mais intemporais. É por isso que
                        Cartier-Bresson não os data, ou o faz de maneira fantasiosa, mas data
                        com exatidão suas fotos para reportagens, que são o reflexo de uma
                        situação específica no contexto preciso (ASSOULINE, 2009, p. 168).


       Mas, para buscar a imagem e paralisá-la, é preciso fugir à inércia do ficar. É
preciso uma nova compreensão do estar, indo. A militância da vida, nos primórdios de
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si, o levou à África. A Europa era, tornara-se mapa pequeno demais para o seu
caminhar. Queria ser incerto, porém não irresoluto. E assim foi. Início dos anos 1930.


                        Porque o idealista dentro dele se sente uma alma aventureira, porque
                        ele é de uma geração que se quer disponível para todas as partidas e
                        pronta para todas as novidades, porque ele sufoca nos limites do
                        Velho Continente, porque o espírito da época lhe parece subitamente
                        viciado e o dos lugares esclerosado [...] (ASSOULINE, 2009, p.56).

                        Quando não está caçando, tira suas primeiras fotos com uma máquina
                        que comprara antes de sua partida para a África, uma Krauss de
                        segunda mão, a tampa da objetiva fazendo as vezes de obturador [...]
                        Uma fotografia é particularmente forte. Tirada da parte de trás de uma
                        canoa, mostra três negros de costas remando seminus; porém, como
                        cada um faz um gesto diferente com o remo no ar e na água, a imagem
                        oferece o espetáculo raro de um movimento em três tempos
                        perfeitamente decomposto num único e mesmo plano (ASSOULINE,
                        2009, p.59).


       Começava aí a epopeia. Gilberte Brassaï, emigrado húngaro à França, fotógrafo,
acabara de publicar seu livro Paris à noite. A 15 de novembro de 1932 publica artigo no
L’Intransigeant (ASSOULINE, 2009, p. 66), em texto seminal que de alguma forma
anteciparia a visão bressoniana de fotografia:


                        Existe uma diferença fundamental entre a fotografia e a pintura. A
                        primeira constata, a segunda cria. A primeira é um documento e,
                        mesmo quando desprovida de qualquer interesse, continua sendo um
                        documento. A outra se baseia por inteiro na personalidade, e tudo
                        desmoronaria num monte de escombros se esta faltasse. [...] O que
                        atrai o fotógrafo é justamente a possibilidade de penetrar os
                        fenômenos, de apreender suas formas. Ah, presença impessoal! Eterno
                        incógnito! O mais humilde criado, o deslocado por excelência, que só
                        vive nas imagens latentes. Ele as persegue até seus últimos refúgios,
                        as surpreende no que existe de mais positivo, material e verdadeiro
                        nelas. Quanto a saber se é preciso conceder-lhe o tão comprometido
                        nome de “artista”, realmente, isso não tem nenhuma, mas nenhuma
                        importância (ASSOULINE, 2009, p. 67).


       “Quanto a Cartier-Bresson, seu estado de espírito se resume a uma dessas
fórmulas cujo segredo ele detém: „Fazemos uma pintura ao tirarmos uma foto‟”
(ASSOULINE, 2009, p. 67). Foto e pintura, em sua diversidade, formam, contudo, um
vértice: buscam prender o tempo que corre no homem para que o tempo, essa entidade
proustiana, não seja coisa perdida e inutilmente buscada, mas um cotidiano salvado de
naufrágio. Especialmente na foto, que é um ser nervoso, o tempo se aninha, a história se
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recompõe, a retina social reencontra seus fantasmas mais ilustres e descobre os mais
indistinguíveis caminhantes. Encontramos o Homem. A fotografia é uma emanação da
vida. A fotografia mede forças com a morte. E vence, de alguma forma, vence.
       Essa condição proustiana, que epidermicamente aqui mencionamos, pode ser
encontrada nele mesmo quando diz:


                       [A fotografia é] imagem diferente da que temos o hábito de ver,
                       singular e contudo verdadeira, e que, em virtude disso, é para nós
                       duplamente cativante, pois nos surpreende, nos arrebata dos nossos
                       hábitos e, simultaneamente, nos faz entrar em nós mesmos ao nos
                       recordar uma impressão (PROUST, apud BRASSAÏ, p. 49).


       “A única viagem verdadeira, a única fonte da juventude, não estaria em dirigir-
se para novas paisagens mas, com outros olhos, ver o universo com olhos de outros”
(PROUST, apud BRASSAÏ, p. 49). Essa tentativa de copiar a vida aduz à foto a
sensação de seu inverso, a presuntiva e vindoura ausência da vida, o vazio; pior que
isso, a vida em processo de esvaecimento no homem e, deste, no mundo. A fotografia
registrando a queda. Ninguém melhor que o autor de Em busca do tempo perdido para
expressar isso e ao mesmo tempo enaltecer a fotografia – que nunca praticou, mas à
qual era orgânica e apaixonadamente ligado:


                       Eu estava ali, ou melhor, ainda não estava, já que ela não o sabia. De
                       mim [...] havia apenas a testemunha, o observador, de chapéu e casaco
                       de viagem, o estranho que não é de casa, o fotógrafo que vem tirar um
                       clichê dos lugares que não serão mais vistos. O que, mecanicamente,
                       fez-se naquele momento em meus olhos quando percebi a minha avó,
                       foi na verdade uma fotografia (PROUST apud BRASSAÏ, 2009,
                       p.136).


       Bresson, a exemplo de Proust, o sabia muito bem: o fotógrafo precisa ser o
anônimo participante, o ator sem papel. Em cena, precisa não ser visto a fim de que o
drama não perca autenticidade. Visto, exercita uma espécie de pudor pelos outros, uma
vez que sua voz pode ser discurso contraditório, e seu clique equivalente a um atentado.


                       Nuestra tarea consiste en observar la realidad con la ayuda de ese
                       cuaderno de apuntes que es la cámara, fijándola pero sin manipularla
                       ni durante la toma, ni en el laboratorio mediante trucos, porque eso es
                       visto por quien sabe ver. En un reportaje fotográfico uno llega, como
                       el árbitro, para contar los golpes, como una especie de intruso,
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                       fatalmente. Hay que acercarse al sujeto con pie de plomo, incluso si se
                       trata de una naturaleza muerta. Hay que andar con guantes, pero
                       teniendo el ojo alerta. Sin precipitaciones, porque no se golpea el agua
                       antes de pescar. Nada de fotos con flash, por supuesto, aunque más no
                       sea que por respeto a la luz, aún cuando no esta. Porque sino el
                       fotógrafo sería alguien insoportablemente agresivo. Este oficio
                       depende hasta tal punto de las relaciones que se establecen con la
                       gente que una palabra puede estropearlo todo, y entonces los alvéolos
                       se cierran. No hay aquí sistema, salvo el hacerse olvidar y hacer
                       olvidar la cámara, que es siempre demasiado llamativa (CARTIER-
                       BRESSON, 2010).


       Tais cuidados, ritualizados, pôs em prática em sua entrevista com Gandhi, 30 de
janeiro de 1948, mesmo dia da morte do Mahatma. Num dos instantâneos, vertical, este
aparece enquadrado de forma a estar inclinado, levemente, para a esquerda, como se não
tivesse sido possível evitar o que aparentemente, só aparentemente, seria uma falha de
Bresson, um escorrego formal, um delicado desequilíbrio da figura central. Na verdade,
a Leica dialoga com o momento, participa daquela solenidade de luz e sombra. O
khaddar de Gandi, sutilmente, reluz. Há algo de santidade. O Mahatma, como a
vendedora, também olha para fora da foto e percebe-se que está falando a alguém.
Quem? Não importa. O não-fotografado personifica ator incognoscível, inescrito ao
texto visual, mas suposto e assim invisivelmente presente. Bresson conta:


                       Estou diante do último faquir da Índia. Ele está de cócoras sobre um
                       fino colchão de crina, e seu corpo magro está envolto por um tecido de
                       algodão branco. Ele me cumprimenta à maneira indiana, com as mãos
                       juntas, depois me estende a mão e me convida a ficar de cócoras à sua
                       frente. Esse faquir acolhedor é Gandhi. E o que ele conseguiu operar é
                       muito mais difícil do que atirar uma corda para o ar e esperar que
                       fique suspensa. Ele subtraiu à Coroa inglesa quatrocentos milhões de
                       súditos (ASSOULINE, 2009, p. 189).


       Na curta assertiva a percepção da imagem narrada alude à fotografia como
elemento retentor; já a foto do Mahatma, aqui como memento, é recordação ínfima e
grandiosa de uma vida toda.


                       Antes de deixá-lo, o fotógrafo lhe mostra o catálogo de sua [...]
                       exposição no Museu de Arte Moderna de Nova York. O Mahatma,
                       visivelmente bastante interessado, o folheia sem pressa. De repente ele
                       para, recua e olha fixamente para uma imagem.
                       – Qual o sentido dessa foto? – pergunta ele em inglês.
                       – O sentido não sei. Este e Paul Claudel, nosso grande poeta católico,
                       uma pessoa muito preocupada com o fim do último homem.
9


                       Caminhávamos por uma rua de aldeia perto de seu castelo de
                       Brangues quando cruzamos com um carro fúnebre vazio, mas
                       paramentado e puxado por cavalos. Adiantei o passo para ficar de
                       frente, com a igreja ao fundo. Ele se virou para olhá-lo e então... [...]
                       Seu interlocutor fica como que petrificado.
                       – A morte, a morte, a morte... – murmura por fim, apontando para a
                       foto. Não dirá mais nada. A audiência chega ao fim. Cartier-Bresson
                       parte no meio da tarde, com sua bicicleta. Menos de uma hora depois,
                       ao chegar em casa, ele é empurrado por pessoas que correm nas ruas,
                       em pânico, gritando a plenos pulmões: – Gandhi está morto! Mataram
                       Gandhi! (ASSOULINE, 2009, p. 190).


       Mahatma é morto, o corpo varado por três tiros. A vida de Gandhi agora estava
nos instantâneos. Nos de Bresson e em muitos outros, de muitos outros. As fotos ficam
como lembranças avatares, e cada uma registra momento de separação. As fotos dos
grandes mortos, de sua pessoa, do seu cortejo fúnebre, são um carpir, uma nênia que
alarma a perda. Mas voltemos à vida. Nesta, o olhar do fotógrafo busca o
acontecimento. Pode ser algo dotado de espontaneidade, o chamado fato de ação, que
tem começo, meio e fim. Mas pode ser, sem que com isso se perca sua essência
jornalística, fato construído pela composição – composição, não manipulação – do
momento decisivo. Bresson fazia isso sempre, apondo a uma imagem o seu fundo, o
homem e sua circunstância dilemática. Sem fundo, sem oposição, não há informação. E
mesmo no rosto em close há um fundo: aquilo que está por trás da expressão, da face. O
fotógrafo como o aquém dessa expressão-sentimento-fundo. A máquina, essa extensão
do retratista, captando o quê? Na verdade, ninguém sabe. Toda foto é uma manifestação
perplexa. Integrada ao fotografado, para realçá-lo do seu contexto; contexto que,
contudo, persiste, por insinuação. Mas é isso mesmo o que ele quer. O não-enquadrado
é parte da fotografia e do acontecimento. A foto flutua entre aquilo que mostra e aquilo
que elidiu.


                       [...] o acontecimento é inseparável de seu dispositivo de observação,
                       de maneira que a distinção entre o observador e o observado perde um
                       pouco de sua evidência. [...] Cada imagem é adquirida sobre um
                       número ilimitado de imagens virtuais (ainda que cada uma delas
                       esconda uma outra). [...] A representação da mídia de uma greve do
                       metrô é a imagem que lhe reflete a cidade, entendida como um fluxo
                       de circulações. A cidade se reflete na imagem de um pisoteado de
                       pedestres insólitos. De uma maneira geral, o que é acontecimento em
                       nossas sociedades (acidentes, catástrofes, delinqüência, terrorismo
                       etc.) revela destas sociedades a trama policial que é o seu inverso. A
                       tela – como superfície refletora – não é um acréscimo ao
10


                        acontecimento; ela o revela (no sentido fotográfico), revelando-se a
                        ela própria (MOUILLAUD, 2002, p. 66-67).


       O acontecimento, portanto, tem eiva de paixão, seja na documentação de fatos
que o senso comum já os recheie de tal, como na hipotética greve do metrô, seja na
câmara escura que todo fotógrafo deve trazer adrede a si. Porque, para expressar o
tempo em imagem é preciso esforço. A fotografia é essa expressão do tempo
transmutado à condição de figura. Na nossa tentativa de medir o tempo o marcamos em
segundos, minutos, horas. Mas temos também outras formas de medir o tempo, talvez as
mais singelas, e mais representativas do ato banal do estar vivo: muitas vezes falamos
em momentos e em instantes. Mas, quantos segundos tem um momento? Um instante
dura quantos minutos? Não importa. Momento ou instante são uma forma
desapercebida – porque trivial – de nos referirmos à cambial, mecânica, negligente ou
tensa passagem da vida. Um presente contínuo e suportável desde que não estejamos em
situação de espera. O minuto busca o tempo. O momento está preso à vida, é tempo em
sua forma de emoção. Ninguém espera por outro trinta momentos ou sessenta instantes.
Mas no infinitesimal interstício que une as ações que desenvolvemos durante a espera,
quando a continuidade repetida dessas ações se transforma em tédio, quando o tédio
cede lugar à angústia, quando a angústia chega a desespero, aí chega o momento, o
instante a nos dizer para não esperar jamais. O momento é o tempo sensível. Na
fotografia, então, é o precioso minuto não medido, é o instante primoroso, aquele
curtíssimo período sem tempo quantificado, mas à espreita. A espreita, na fotografia, é o
momento escandido da espera. E isso não cansa. É a espera consensual ao que virá. E
afinal vem o clique, conduzindo pela luz, à caverna escura da máquina, um excerto de
mundo. É quando o tempo-momento é recolhido e poeticamente arquivado, pois toda
fotografia tem essa intenção poética, mesmo quando impregnada da poética da desgraça
ou movida pelo burlesco.
        A condução deste texto nos leva aqui a entender o sentido profundamente
humano e humanista de Bresson, aliado à sua percepção da História. Esta vai além da
simples atualidade, é algo complexo, dramático. O resultante da História é um
estruturante/estruturado da vida coletiva e da microvida individual. Influi no destino das
massas, das elites e no fado do desempregado. Assim, é tão importante a captação das
imagens de Gandhi, Matisse, Claudel, Satre, a vida na Costa do Marfim, México, a
Guerra Civil Espanhola, a coroação do Rei George VI, a Libertação de Paris ou as
11


ruínas da Alemanha (ASSOULINE, 2009, p. 171) quanto visões do povo, anônimos
percorrendo ruas, paisagens de gente amontoada, dor e fastio do viver, olhares alegres,
visões boas do cotidiano.
       A semântica bressoniana oscila entre o local deslocado de sua condição de
particularidade para o universal, que por isso mesmo ali está presente. Bresson registra
tais processos em cada foto-microcosmo. O potencial de historicidade é encontrado no
instantâneo, funcionando o fotógrafo como sujeito participante, uma vez que a
historicidade “não é apenas alguma coisa na qual nos „metemos‟ como quem veste uma
roupa. Nós somos historicidade, somos tempo e espaço” (HELLER 1993, p. 14).
       A importância de se assumir como agente de historicidade lhe foi mencionada
em abril de 1947 pelo amigo Robert Capa, em Nova Iorque, quando Bresson encerrava
ali exposição que durara dois meses.


                       – Desconfie dos rótulos. Eles tranqüilizam, mas as pessoas se aferram
                       a eles e depois você não conseguirá mais se livrar. Vão pôr em você o
                       pequeno fotógrafo surrealista... Você estará perdido, se tornará
                       preciosista e maneirista. Continue o seu caminho, mas sob o rótulo do
                       fotojornalista, e guarde o resto no fundo do coração. É isso que
                       agradará você sempre que entrar em contato com o que acontece no
                       mundo (ASSOULINE, 2009, p. 170).


       Com a superação da influência do surrealismo ampliou-se o olhar, ingressando
completamente na historicidade. Poderoso exemplo está em foto de 1948 quando da
débâcle da China Nacionalista, cuja legenda assim dizia:


                       Shanghai, dezembro de 1948. A corrida do ouro. À porta dos bancos
                       do Bund, filas enormes se formaram e invadiram as ruas vizinhas,
                       interrompendo todo o tráfico. Cerca de dez pessoas morreriam na
                       desordem. O Kuomintang decidira distribuir reservas de ouro,
                       quarenta gramas por cabeça. Algumas pessoas esperaram mais de 24
                       horas para tentar trocar seus papéis-moedas. A ordem era debilmente
                       mentida por uma polícia cujos equipamentos desconjuntados eram
                       remanescentes dos diversos exércitos que, ao longo de quinze anos,
                       haviam se interessado pela China (ASSOULINE, 2009, p. 205).


       A foto é impressionante. Para entendê-la recuemos no tempo e façamos nossa
reinserção virtual à época, ao drama circunstanciado e suas manifestações de crueza
histórica e humana, com a derribada abrupta de um mundo milenar, uma sociedade em
ruínas. Esse artifício nos permitirá a percepção, mais que isso, a sensação, o leitmotiv,
12


da performance bressoniana: a fixação da época em um momento, pois fotografia é
contexto. E como momento, como tempo emocionado de um e de outro lados, torna-se
expressão; é troca, pois é além e é aquém: do fotógrafo para a cena, desta para a foto e
da foto para o aquém/além final – nós.
       A fotografia-cena mostra uma sinergia de desesperados que se engalfinham em
processo de encaixe, como se fora um balé grotesco. A foto tem movimento, ação,
angústia emplastrada a corpos e faces que se oprimem. Seu tom de baixa luminosidade é
dantesco, escuro como se o ar estivesse encardido. Um pouco acima, ao fundo, dois
homens, de costas para a fila, olham-na com olhar de estranhamento como se também
não fizessem parte daquela corrente de desgraçados. A fila vem da esquerda para a
direita. Os braços estendidos, o côncavo/convexo de corpos encastoados, que se
empurram em bricolagem medonha, dirigem a linha do olhar. A imagem tem ritmo e
movimento, desespero e um vago sentimento de que tudo aquilo resultaria em vão. Ali
estavam apenas condenados.
       Suas fotos são efetivamente o que sugere seu Images à la sauvette, ou seja:
imagens colhidas à espreita, atitude furtiva e leoparda. O fotógrafo tenso espera, com a
paciência do momento, que o mundo perfile determinada cena. Mas a composição não
está no mundo, está dentro dele, fotógrafo. É preciso esperar que o ato se defina para ser
transposto à condição de fato. Assim, percebe-se em toda a sua obra a presença da
composição perfeita; do detalhe ao amplo, do grumo à totalidade. A obra Images à la
sauvette revela em título um estado de espírito de lancinante poesia porque poesia
experienciada. Foi vertido para o inglês à condição de The decisive moment, fórmula o
mais próximo possível ao estado de espírito bressoniano. E foi essa a predominância
que se fez. Não lhe tirou a grandeza, apenas o fez mais jornalístico. Talvez o exemplo
mais forte dessa práxis sauvette seja a foto de duas lésbicas, em 1934, México.


                        Uma noite, Cartier-Bresson comparece a uma pequena recepção na
                        casa de uma personalidade cuja garçonnière seu amigo Tonio Salazar
                        decorara. A tequila corria solta. Apenas Cartier-Bresson se abstém de
                        beber, consumido por uma disenteria amebiana. Para fugir do tédio,
                        ele visita a casa com o pintor, perde-se no labirinto de seus aposentos.
                        No andar de cima, eles ouvem um leve ruído, e então...
                        – Tive bastante sorte. Só precisei empurrar a porta. Duas lésbicas
                        faziam amor. Era de uma voluptuosidade, de uma sensualidade... Não
                        víamos seus rostos. Era maravilhoso, o amor físico em sua plenitude.
                        Tonio segurou uma lâmpada, fotografei várias vezes... Não havia nada
                        de obsceno. Eu nunca as teria feito posar. Questão de pudor
                        (ASSOULINE, 2009, p. 93).
13




       À obscuridade do ambiente une-se o obscurecimento buscado por quem se sabia
praticante de ato de licença, satisfação física de idílio interdito. A porta, entreaberta; a
lâmpada, improvisada; jamais o flash, com sua luz gritante, luz que levaria aquele ato à
condição de indecência e ultraje, tudo compôs a psique da foto.


                        La falta de definición del elemento central de la composición,
                        consecuencia del movimiento y de la baja velocidad de obturación,
                        provoca tensión en nuestra mirada. Los torsos y extremidades
                        entrecruzadas de las anónimas protagonistas sumados a la ocultación
                        de sus rostros acrecienta la sensación de caos formal en la escena.
                        Estos cuerpos reflejan una luz intensa que contrasta con las partes más
                        oscuras de la toma y aumentan la tensión. Por otra parte, la aparición
                        casi fantasmagórica y desproporcionada de una supuesta mano cerca
                        del vértice inferior derecho junto a la ocultación de los rostros es un
                        claro ejemplo de elementos que aumentan la tensión compositiva
                        (FABREGAT, 2010).


       A foto tem algo de sigilo cúmplice. Mulheres sem rosto a se arder em privativo
fragor. Alcova e corpos enroscados. A luz, luz modesta, luz que é quase réstia, é
elemento formal forte e decisivo. Temperada pelo olhar do mago, ressalta o branco dos
corpos combinado à clara padronagem floral do lençol onde se abraçam. Dele partem
lampejos. Assim, foi obtida e ressaltada luminância sutil, quase fluorescente. Fagulhas
exalando a essência daquele ato a confessor silencioso e absolvente. Uma mulher cobre
a outra, mas não tem o corpo curvilíneo da femme fatale. A inexistência de beleza
corporal estonteante atira para longe qualquer intenção de gratuidade nesse erotismo. A
baixa velocidade do obturador amplia o efeito impressionista – o movimento das mãos
da mulher que está embaixo, e tenta despir a parceira de seus trajes íntimos.
Despojamento e entrega são a marca desse encontro de intensa e cândida malícia.
Mulheres sáficas e sem rosto. O anonimato desfeito tiraria daquele momento sua
essência de segredo para se transformar em escândalo e não era esse o caso. O fato de o
captor haver ajustado a velocidade do obturador indica como, cerebral e
apaixonadamente, elaborou aquele momento; como parou, calibrou a máquina,
posicionou-se e enquadrou, contribuindo na consumação de rito sigiloso. Após, saiu.
       Bresson dizia, na apresentação de The decisive moment, em 1952:
14


                      El fotógrafo no puede ser un espectador pasivo, no puede ser
                      realmente lúcido si no está implicado en el acontecimiento. La
                      memoria es muy importante, la memoria de cada foto tomada al
                      galope, a la misma velocidad que el acontecimiento; durante el trabajo
                      uno debe estar seguro de no haber dejado agujeros, de haber
                      expresado todo, porque después será demasiado tarde; no se podrá
                      hacer desandar el tiempo (CARTIER-BRESSON, 2010).


       “Não se poderá desandar o tempo”. Essa a essência e a consciência do captor,
seu gesto, sua obra, sua arte poético-jornalística. Consciência a sabença de estar
imergido    num   tempo   histórico   e   existencial,   nessa   relação   de    contradita
complementaridade entre a vida na polis e a vida enquanto estar e ser. Sua obra se
constitui em corolário e ilação. O primeiro como aspecto cerebral, argumentativo,
sintático: o homem preso às teias políticas de coordenação e subordinação no mundo; o
segundo eminentemente poético, estimativo, avaliação aproximada do que virá, o devir
dos outros e o seu próprio devir àquele encadeado. Seu trabalho, em todo o grande
momento decisivo de sua vida, foi de inquietação permanente e de equilíbrio que não
buscava permanecer. Apenas estar. Estar na hora certa e em certas horas em que era
preciso estar.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ASSOULINE, Pierre. Cartier-Bresson: O Olhar do século. Porto Alegre: L&PM,
2009.

BRASSAÏ, Gilbert. Proust e a fotografia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.

CARTIER-Bresson,         Henri.     El     momento     decisivo.  Disponível     em:
<http://fotojornalismojf.files.wordpress.com/2007/09/el-momento-decisivo.pdf> Acesso
em: 20 jun 2010.

FABREGAT, Hugo Doménech. Banco de datos: análisis de la imagen fotográfica.
Disponível       em:         <http://www.analisisfotografia.uji.es/root2/pdf/Cartier-
Bresson%20(1934).pdf> Acesso em: 20 jun. 2010.

HELLER, Agnes. Uma teoria da história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993.

MOUILLAUD, Maurice; PORTO, Sergio Dayrell (orgs). O jornal: da forma ao sentido.
2. ed. Brasília: editora Universidade de Brasília, 2002.
15


TASSINARI, Alberto. Henri Cartier-Bresson: o instante radiante. In: MAMMI,
Lorenzo; SCHWARCZ, Lilia Moritz (org). 8 X Fotografia: Ensaios. Companhia das
Letras, 2008.

WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. São Paulo: Cultrix, 1968.

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A fotografia como paixão em Cartier-Bresson

  • 1. 1 A FOTOGRAFIA COMO PAIXÃO EM CARTIER-BRESSON Prof. Dr. Emanoel Francisco Pinto Barreto Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN e.barreto@ufrnet.br RESUMO Este ensaio aborda a obra de Henri Cartier-Bresson a partir da perspectiva “olhar do fotógrafo”. Olhar como algo aquém, atitude aguçada por fato cuja carga dramática a câmera enquadra e verte à condição de cena e, daí, a foto. Paixão disciplinada do captor em participação discreta, pois não pode interferir e mistificar a cena. Bresson é visto aqui, exatamente, sob o prisma da paixão – a mesma que impregna o núcleo discursivo deste texto. Desde o mercado de Bali, com foto de mulher primal e seminua até Gandhi, tentamos uma apreciação da capacidade significante e comovente de sua obra. Palavras-chave: Bresson, fotografia, cena O trabalho de Henri Cartier-Bresson talvez se possa definir como um exercício de placidez e dinâmica, distanciamento e imersão do olhar em instante passageiro, conjura de arrebatamento e cerebralismo. Paixão seria, substantivamente, o termo que a tudo isso englobaria. Aquela, de sentido weberiano, paradoxalmente metódica e cambiante – “apaixonada a uma „causa‟, ao deus ou ao demônio que a inspira” (WEBER, 1968, p.106). Se não, como conseguir congelar em foto o momento preciso, aquela eternidade pequena? Paixão como processo encantador o suficiente para atrair o olhar inquisitorial ao fato transeunte, mas também disciplinadora desse mesmo olhar, que obtura para aclarar: paixão como instantânea permanência, desfeita após para partir rumo ao próximo fotograma. E depois outro e outro, em processo ao mesmo tempo meta e mono – a se resolver sempre por não se resolver jamais. O gesto poético de Bresson é inesperadamente político: uma política acima, a perplexa política do olhar. Captação da vida/existência em seu fragor ingênuo, curioso ou trágico. O que virá depois daquele instante? E antes, o que o implicou? Como? Por quê? Um fragmento de tempo, em conexão com um fragmento de espaço e temos o momento decisivo exposto em imagem experienciada, evanescente, sem partido e sem- causa. Vazia de palavras de ordem. O mundo por ele mesmo. “Os olhares captados pelo fotógrafo expressam uma profunda solidão, o real desencanto dos despossuídos, uma apatia que revela certa renúncia diante do peso da miséria (ASSOULINE, 2009, p. 92).”
  • 2. 2 Seria, digamos, uma política da percepção, que tem a cena como discurso impronunciado, mas veemente. Captado em sua consistência vívida de momento único. Ao mesmo tempo total, completo e infinito. Momento sem significado intrínseco, mas tornado a tal pelo olhar que o fez assim. Fragmento de vida, fato objetivo, argumento não-formulado mas presente; existência interpelada pelo olhar do fotógrafo. Que com a vida, esfinge, deblatera, sem esperar resposta que não o ícone resultante – ícone também ele esfíngico ao olhar do leitor. É que, paradoxalmente, o objetivado só se torna objeto pelo olhar subjetivo que o criou e nele acredita como coisa particular. Imagem virtual, já existente no corolário do fotógrafo, ao ser flagrada no mundo vem ao encontro de si mesma. Eis o momento decisivo. Siempre he tenido una pasión por la pintura. Cuando era chico pintaba todos los jueves, día en que no había clases, y los domingos, y pensaba en la pintura los otros días. Tenía como muchos chicos una cámara Brownie - box, pero solo la utilizaba cada tanto para llenar pequeños álbumes con mis recuerdos de vacaciones. No fue sino mucho más tarde que empecé a mirar mejor a través de la cámara, entonces mi pequeño mundo se amplió y fue el fin de las fotos de vacaciones (CARTIER-BRESSON, 2010) A pintura já o atraía, o gesto de documentar o mundo perpetrava aos poucos a arte figurativa, o real captado em processo infante de estranhamento/descoberta. É que o real figurado desvela de alguma forma a essência da coisa representada. Aborda certezas duvidosas e certas dúvidas. Afinal, o representar é re-apresentar aquilo que se apresenta comum, corrente, normal – ou seja: a cena é visível ao olhar inquiridor, mas será imperceptível ao olho de quem apenas seja comum, corrente, normal. Sem perplexidade o mundo é estático e desinteressante. Na fotografia de Bresson o mundo é rápido e cada segundo conta. O tempo tem locução própria, e o espaço e seus habitantes com ele dialogam. Resta saber o que dizem. E o que dizem é transcrito na imagem. A vida e todas as suas digressões. Parte significativa da obra de Cartier-Bresson pode ser interpretada pela união que ele promoveu de dois recursos estéticos inovadores das primeiras décadas do século XX: o instantâneo fotográfico e a colagem pictórica. Embora a expressão “instante decisivo” tenha se tornado a divisa de sua obra, o instantâneo foi apenas o meio que Cartier-Bresson empregou para obter suas fotografias. O que elas buscavam, e tantas vezes encontraram, era o feliz cruzamento no mundo de dois ou mais acontecimentos similares e independentes um do outro. É pela junção desses acontecimentos independentes que a
  • 3. 3 fotografia se mostra e pode ser vista como uma colagem. E visto que são captados de maneira rápida pela técnica do instantâneo fotográfico, os procedimentos da colagem e do instantâneo se encontram conjugados. Mas se a independência dos acontecimentos responde, em grande parte, pelo aspecto de colagem que as fotografias adquirem, já a similaridade entre eles movimenta rapidamente o olhar do espectador entre um acontecimento e outro. Surge assim, no interior da fotografia, um instante por ela simbolizado e diferente do instante em que a fotografia foi tirada. Esse instante interno, que necessita da técnica do instantâneo, mas não é ele mesmo o instante técnico do disparo fotográfico, é parte fundamental de uma linguagem que Cartier-Bresson formulou para a fotografia. Uma linguagem que não apenas se vale do instantâneo, mas que também o significa (TASSINARI, 2008, p. 9-10). Surge então uma outra forma do presente. O presente da vida e as suas divagações, esse o mister de Bresson: fazê-los co-incidir na foto. E coincidem na colagem pictórica. Pode ser na imagem da feirante seminua do mercado de Bali. Seios suntuosos – que adornam nudez primal, despojada e majestosamente banal aos olhares da feira – contrastam com descarnado ancião que lhe é perto. O torso ossudo próximo ao luxuriante-corpo-fêmeo. Na mulher, à cabeça, um turbante branco é enfeite ligeiro, contraponto de alvura à pele escura. Mas o cesto na cabeça não é adorno, é fardo. Temos dois seres básicos em seu estado-de-natureza infausto. Uma espécie de inocência tosca os une, a guiar a naturalização de sua tragédia. Escassez e viço convivendo nos corpos de tais inocentes. Tão humanos, tão singelamente espécimes, tão ingenuamente mansos; dois exemplares, dois viventes, dois de muitos viventes de um éden suarento, ignaro e tórrido mostrado no universo cifrado da foto, feita em 1949. Podem-se intuir os gritos do mercado, a vida plebe e rústica, o girar dum cotidiano eterno. Cotidiano inculto, ironia que esculpiu improvável fêmea exuberante enquanto desbastava a vida de outro, o infeliz mirrado. Detalhe: o olhar da moça, delicado, se espicha numa meia-volta do corpo silvestre, olhar virado para o lado e para baixo. Ela vê além, olha para fora do que está no enquadramento, portanto fora da vista do fotógrafo e, depois, do expectador da foto. Aí a composição perfeita, mistério e feitiço da colagem pictórica. Bresson entrecruza dois, três acontecimentos: a moça e o esquálido; a moça, o esquálido e o que não é possível ver, mesmo supondo. Ela olha a algum ponto. Olha a alguém? Sem perguntas. O importante é o olhar, não o olhado. Bresson captou candura no que era agreste. A colagem pictórica está também em imagem tomada durante a cremação de Gandhi, em 1948. Um homem, identificado por legenda de Bresson como sendo seu secretário, observa as primeiras chamas da pira funerária. Aquele que se vai, e o que
  • 4. 4 fica para testemunhar a sua obra. O olhar que se debruça sobre a pira é atônito e inconsciente de que vivenciou um momento decisivo e acabara de entrar para a eternidade daquele momento em instantâneo dramático. A fórmula de Charles Baudelaire para o artista moderno, a da apreensão do eterno no efêmero, se encaixa como uma luva na poética de Cartier-Bresson. O instante que cada uma de suas fotografias eterniza não é o simples instante do clique da câmera, mas um instante grafado na própria fotografia, que dela não desgruda, e que estabelece correspondências de toda sorte entre diferentes aspectos do mundo (TASSINARI, 2008, p. 10) Da pintura, o surrealismo povoou expressiva parte de sua obra. Como em foto de 1948, em Pequim, quando figura quase espectral, vestida em negro, longa capa que lhe chega aos pés, caminha em meio à bruma de rua deserta na Cidade Proibida. O pavimento, em pedraria retangular, está molhado e reflete de forma baça a figura daquele lêmure, ampliando o efeito de estranhamento. Chapéu preto completa o cenário do corpo, nariz e boca encobertos por alvíssima máscara cirúrgica. Pronto. Um ponto de luz, em contraste com a trevosa figura, habitava corpo sígnico que se movia em meio a fog quase sinistro. O perfeito equilíbrio de formas e volumes, com imponente construção ao fundo, trai o pintor naquele instante: mas a pequenez humana em assimetria, confrontada à arquitetura, já é fotografia. Aí é o fotógrafo encontrando seu momento decisivo. O fotojornalismo como expressão de um ato é ato ele mesmo de expressão metalinguística. Na fotografia existe um novo tipo de plasticidade, produto das linhas instantâneas tecidas pelo movimento do objeto. O fotógrafo trabalha em uníssono com o movimento, como se este fosse o desdobramento natural da forma, como a vida se revela. No entanto, dentro do movimento existe um instante no qual todos os elementos se movem em equilíbrio. A fotografia deve intervir neste instante, tornando o equilíbrio imóvel (CARTIER-BRESSON, 2010). Equilíbrio, portanto, não indica estaticidade, pelo menos não completamente. Equilíbrio, no universo bressoniano, é a sutil conjugação de movimento, passagem e a captura da exatidão que lhe foi atribuída. Equilíbrio como gesto malabar de mão que se move, para impedir que caia ao chão haste retilínea apoiada tão-só na ponta de um dedo. Equilíbrio, portanto, é gesto, inconstância, virtuose e mutação. Equilíbrio é instabilidade
  • 5. 5 controlada. Por via de consequência equilíbrio é dinâmica. Momento que somente para, maduro, quando a foto se completa. E mesmo assim ela sugere continuidade, pois toda – boa – fotografia é um livro imenso, escandindo o olhar de aquém para dentro dela como se ali houvesse profundidade e infinito, ou a partir dela para os lados, estabelecendo, pelo imaginário, suas ligações e seus elos com o seu antes e o seu depois. Corrente. O olhar do fotógrafo está sempre avaliando. Um fotógrafo pode captar a coincidência de linhas simplesmente ao mover a cabeça uma fração de milímetro. Pode modificar a perspectiva com um leve dobrar de joelhos. Ao colocar a câmara próxima ou distante do objeto, o fotógrafo pode desenhar um detalhe – ao qual toda a imagem pode ficar subordinada ou ainda que tiranize quem faz a foto. De qualquer modo, o fotógrafo compõe a foto na mesma duração de tempo que leva para apertar o disparador, na velocidade de um ato reflexo (CARTIER-BRESSON, 2010). Ou seja: fotografar é ato militante de viver o momento. O distanciamento maior ou menor não liberta o fotógrafo da força centrípeta que o prende ao fato. O distanciamento é técnico; a captura do instante emoção e paixão – e o envolve. A realidade pode ser metamorfoseada ao ser clicada. O olhar compreensivo do fotógrafo, ao observar cena da vida – p. ex. uma criança mendicante que brinca –, retira dali momento precioso, jamais percebido pelo pequeno ator. O captor, que critica aquele instante histórico da miséria lúdica, é agente heurístico do grande drama humano sobre a face da Terra. E se a miséria é assim estetizada, essa mesma estética faz a denúncia do que trabalhou em estado de arte. E isso inclui a vida e seu par antitético, a morte. O ser humano flagrado em sua condição transeunte. O retratista precisa estar convencido de que sua arte tem ligação profunda com a morte. O retrato é o reflexo de uma coisa única, fadada a desaparecer. Uma verdadeira luta contra o tempo. Entender isso no momento de apertar o botão é ter consciência de tudo o que a condição humana tem de efêmero e precário. No entanto, de todos os tipos de fotos, os retratos são ao mais intemporais. É por isso que Cartier-Bresson não os data, ou o faz de maneira fantasiosa, mas data com exatidão suas fotos para reportagens, que são o reflexo de uma situação específica no contexto preciso (ASSOULINE, 2009, p. 168). Mas, para buscar a imagem e paralisá-la, é preciso fugir à inércia do ficar. É preciso uma nova compreensão do estar, indo. A militância da vida, nos primórdios de
  • 6. 6 si, o levou à África. A Europa era, tornara-se mapa pequeno demais para o seu caminhar. Queria ser incerto, porém não irresoluto. E assim foi. Início dos anos 1930. Porque o idealista dentro dele se sente uma alma aventureira, porque ele é de uma geração que se quer disponível para todas as partidas e pronta para todas as novidades, porque ele sufoca nos limites do Velho Continente, porque o espírito da época lhe parece subitamente viciado e o dos lugares esclerosado [...] (ASSOULINE, 2009, p.56). Quando não está caçando, tira suas primeiras fotos com uma máquina que comprara antes de sua partida para a África, uma Krauss de segunda mão, a tampa da objetiva fazendo as vezes de obturador [...] Uma fotografia é particularmente forte. Tirada da parte de trás de uma canoa, mostra três negros de costas remando seminus; porém, como cada um faz um gesto diferente com o remo no ar e na água, a imagem oferece o espetáculo raro de um movimento em três tempos perfeitamente decomposto num único e mesmo plano (ASSOULINE, 2009, p.59). Começava aí a epopeia. Gilberte Brassaï, emigrado húngaro à França, fotógrafo, acabara de publicar seu livro Paris à noite. A 15 de novembro de 1932 publica artigo no L’Intransigeant (ASSOULINE, 2009, p. 66), em texto seminal que de alguma forma anteciparia a visão bressoniana de fotografia: Existe uma diferença fundamental entre a fotografia e a pintura. A primeira constata, a segunda cria. A primeira é um documento e, mesmo quando desprovida de qualquer interesse, continua sendo um documento. A outra se baseia por inteiro na personalidade, e tudo desmoronaria num monte de escombros se esta faltasse. [...] O que atrai o fotógrafo é justamente a possibilidade de penetrar os fenômenos, de apreender suas formas. Ah, presença impessoal! Eterno incógnito! O mais humilde criado, o deslocado por excelência, que só vive nas imagens latentes. Ele as persegue até seus últimos refúgios, as surpreende no que existe de mais positivo, material e verdadeiro nelas. Quanto a saber se é preciso conceder-lhe o tão comprometido nome de “artista”, realmente, isso não tem nenhuma, mas nenhuma importância (ASSOULINE, 2009, p. 67). “Quanto a Cartier-Bresson, seu estado de espírito se resume a uma dessas fórmulas cujo segredo ele detém: „Fazemos uma pintura ao tirarmos uma foto‟” (ASSOULINE, 2009, p. 67). Foto e pintura, em sua diversidade, formam, contudo, um vértice: buscam prender o tempo que corre no homem para que o tempo, essa entidade proustiana, não seja coisa perdida e inutilmente buscada, mas um cotidiano salvado de naufrágio. Especialmente na foto, que é um ser nervoso, o tempo se aninha, a história se
  • 7. 7 recompõe, a retina social reencontra seus fantasmas mais ilustres e descobre os mais indistinguíveis caminhantes. Encontramos o Homem. A fotografia é uma emanação da vida. A fotografia mede forças com a morte. E vence, de alguma forma, vence. Essa condição proustiana, que epidermicamente aqui mencionamos, pode ser encontrada nele mesmo quando diz: [A fotografia é] imagem diferente da que temos o hábito de ver, singular e contudo verdadeira, e que, em virtude disso, é para nós duplamente cativante, pois nos surpreende, nos arrebata dos nossos hábitos e, simultaneamente, nos faz entrar em nós mesmos ao nos recordar uma impressão (PROUST, apud BRASSAÏ, p. 49). “A única viagem verdadeira, a única fonte da juventude, não estaria em dirigir- se para novas paisagens mas, com outros olhos, ver o universo com olhos de outros” (PROUST, apud BRASSAÏ, p. 49). Essa tentativa de copiar a vida aduz à foto a sensação de seu inverso, a presuntiva e vindoura ausência da vida, o vazio; pior que isso, a vida em processo de esvaecimento no homem e, deste, no mundo. A fotografia registrando a queda. Ninguém melhor que o autor de Em busca do tempo perdido para expressar isso e ao mesmo tempo enaltecer a fotografia – que nunca praticou, mas à qual era orgânica e apaixonadamente ligado: Eu estava ali, ou melhor, ainda não estava, já que ela não o sabia. De mim [...] havia apenas a testemunha, o observador, de chapéu e casaco de viagem, o estranho que não é de casa, o fotógrafo que vem tirar um clichê dos lugares que não serão mais vistos. O que, mecanicamente, fez-se naquele momento em meus olhos quando percebi a minha avó, foi na verdade uma fotografia (PROUST apud BRASSAÏ, 2009, p.136). Bresson, a exemplo de Proust, o sabia muito bem: o fotógrafo precisa ser o anônimo participante, o ator sem papel. Em cena, precisa não ser visto a fim de que o drama não perca autenticidade. Visto, exercita uma espécie de pudor pelos outros, uma vez que sua voz pode ser discurso contraditório, e seu clique equivalente a um atentado. Nuestra tarea consiste en observar la realidad con la ayuda de ese cuaderno de apuntes que es la cámara, fijándola pero sin manipularla ni durante la toma, ni en el laboratorio mediante trucos, porque eso es visto por quien sabe ver. En un reportaje fotográfico uno llega, como el árbitro, para contar los golpes, como una especie de intruso,
  • 8. 8 fatalmente. Hay que acercarse al sujeto con pie de plomo, incluso si se trata de una naturaleza muerta. Hay que andar con guantes, pero teniendo el ojo alerta. Sin precipitaciones, porque no se golpea el agua antes de pescar. Nada de fotos con flash, por supuesto, aunque más no sea que por respeto a la luz, aún cuando no esta. Porque sino el fotógrafo sería alguien insoportablemente agresivo. Este oficio depende hasta tal punto de las relaciones que se establecen con la gente que una palabra puede estropearlo todo, y entonces los alvéolos se cierran. No hay aquí sistema, salvo el hacerse olvidar y hacer olvidar la cámara, que es siempre demasiado llamativa (CARTIER- BRESSON, 2010). Tais cuidados, ritualizados, pôs em prática em sua entrevista com Gandhi, 30 de janeiro de 1948, mesmo dia da morte do Mahatma. Num dos instantâneos, vertical, este aparece enquadrado de forma a estar inclinado, levemente, para a esquerda, como se não tivesse sido possível evitar o que aparentemente, só aparentemente, seria uma falha de Bresson, um escorrego formal, um delicado desequilíbrio da figura central. Na verdade, a Leica dialoga com o momento, participa daquela solenidade de luz e sombra. O khaddar de Gandi, sutilmente, reluz. Há algo de santidade. O Mahatma, como a vendedora, também olha para fora da foto e percebe-se que está falando a alguém. Quem? Não importa. O não-fotografado personifica ator incognoscível, inescrito ao texto visual, mas suposto e assim invisivelmente presente. Bresson conta: Estou diante do último faquir da Índia. Ele está de cócoras sobre um fino colchão de crina, e seu corpo magro está envolto por um tecido de algodão branco. Ele me cumprimenta à maneira indiana, com as mãos juntas, depois me estende a mão e me convida a ficar de cócoras à sua frente. Esse faquir acolhedor é Gandhi. E o que ele conseguiu operar é muito mais difícil do que atirar uma corda para o ar e esperar que fique suspensa. Ele subtraiu à Coroa inglesa quatrocentos milhões de súditos (ASSOULINE, 2009, p. 189). Na curta assertiva a percepção da imagem narrada alude à fotografia como elemento retentor; já a foto do Mahatma, aqui como memento, é recordação ínfima e grandiosa de uma vida toda. Antes de deixá-lo, o fotógrafo lhe mostra o catálogo de sua [...] exposição no Museu de Arte Moderna de Nova York. O Mahatma, visivelmente bastante interessado, o folheia sem pressa. De repente ele para, recua e olha fixamente para uma imagem. – Qual o sentido dessa foto? – pergunta ele em inglês. – O sentido não sei. Este e Paul Claudel, nosso grande poeta católico, uma pessoa muito preocupada com o fim do último homem.
  • 9. 9 Caminhávamos por uma rua de aldeia perto de seu castelo de Brangues quando cruzamos com um carro fúnebre vazio, mas paramentado e puxado por cavalos. Adiantei o passo para ficar de frente, com a igreja ao fundo. Ele se virou para olhá-lo e então... [...] Seu interlocutor fica como que petrificado. – A morte, a morte, a morte... – murmura por fim, apontando para a foto. Não dirá mais nada. A audiência chega ao fim. Cartier-Bresson parte no meio da tarde, com sua bicicleta. Menos de uma hora depois, ao chegar em casa, ele é empurrado por pessoas que correm nas ruas, em pânico, gritando a plenos pulmões: – Gandhi está morto! Mataram Gandhi! (ASSOULINE, 2009, p. 190). Mahatma é morto, o corpo varado por três tiros. A vida de Gandhi agora estava nos instantâneos. Nos de Bresson e em muitos outros, de muitos outros. As fotos ficam como lembranças avatares, e cada uma registra momento de separação. As fotos dos grandes mortos, de sua pessoa, do seu cortejo fúnebre, são um carpir, uma nênia que alarma a perda. Mas voltemos à vida. Nesta, o olhar do fotógrafo busca o acontecimento. Pode ser algo dotado de espontaneidade, o chamado fato de ação, que tem começo, meio e fim. Mas pode ser, sem que com isso se perca sua essência jornalística, fato construído pela composição – composição, não manipulação – do momento decisivo. Bresson fazia isso sempre, apondo a uma imagem o seu fundo, o homem e sua circunstância dilemática. Sem fundo, sem oposição, não há informação. E mesmo no rosto em close há um fundo: aquilo que está por trás da expressão, da face. O fotógrafo como o aquém dessa expressão-sentimento-fundo. A máquina, essa extensão do retratista, captando o quê? Na verdade, ninguém sabe. Toda foto é uma manifestação perplexa. Integrada ao fotografado, para realçá-lo do seu contexto; contexto que, contudo, persiste, por insinuação. Mas é isso mesmo o que ele quer. O não-enquadrado é parte da fotografia e do acontecimento. A foto flutua entre aquilo que mostra e aquilo que elidiu. [...] o acontecimento é inseparável de seu dispositivo de observação, de maneira que a distinção entre o observador e o observado perde um pouco de sua evidência. [...] Cada imagem é adquirida sobre um número ilimitado de imagens virtuais (ainda que cada uma delas esconda uma outra). [...] A representação da mídia de uma greve do metrô é a imagem que lhe reflete a cidade, entendida como um fluxo de circulações. A cidade se reflete na imagem de um pisoteado de pedestres insólitos. De uma maneira geral, o que é acontecimento em nossas sociedades (acidentes, catástrofes, delinqüência, terrorismo etc.) revela destas sociedades a trama policial que é o seu inverso. A tela – como superfície refletora – não é um acréscimo ao
  • 10. 10 acontecimento; ela o revela (no sentido fotográfico), revelando-se a ela própria (MOUILLAUD, 2002, p. 66-67). O acontecimento, portanto, tem eiva de paixão, seja na documentação de fatos que o senso comum já os recheie de tal, como na hipotética greve do metrô, seja na câmara escura que todo fotógrafo deve trazer adrede a si. Porque, para expressar o tempo em imagem é preciso esforço. A fotografia é essa expressão do tempo transmutado à condição de figura. Na nossa tentativa de medir o tempo o marcamos em segundos, minutos, horas. Mas temos também outras formas de medir o tempo, talvez as mais singelas, e mais representativas do ato banal do estar vivo: muitas vezes falamos em momentos e em instantes. Mas, quantos segundos tem um momento? Um instante dura quantos minutos? Não importa. Momento ou instante são uma forma desapercebida – porque trivial – de nos referirmos à cambial, mecânica, negligente ou tensa passagem da vida. Um presente contínuo e suportável desde que não estejamos em situação de espera. O minuto busca o tempo. O momento está preso à vida, é tempo em sua forma de emoção. Ninguém espera por outro trinta momentos ou sessenta instantes. Mas no infinitesimal interstício que une as ações que desenvolvemos durante a espera, quando a continuidade repetida dessas ações se transforma em tédio, quando o tédio cede lugar à angústia, quando a angústia chega a desespero, aí chega o momento, o instante a nos dizer para não esperar jamais. O momento é o tempo sensível. Na fotografia, então, é o precioso minuto não medido, é o instante primoroso, aquele curtíssimo período sem tempo quantificado, mas à espreita. A espreita, na fotografia, é o momento escandido da espera. E isso não cansa. É a espera consensual ao que virá. E afinal vem o clique, conduzindo pela luz, à caverna escura da máquina, um excerto de mundo. É quando o tempo-momento é recolhido e poeticamente arquivado, pois toda fotografia tem essa intenção poética, mesmo quando impregnada da poética da desgraça ou movida pelo burlesco. A condução deste texto nos leva aqui a entender o sentido profundamente humano e humanista de Bresson, aliado à sua percepção da História. Esta vai além da simples atualidade, é algo complexo, dramático. O resultante da História é um estruturante/estruturado da vida coletiva e da microvida individual. Influi no destino das massas, das elites e no fado do desempregado. Assim, é tão importante a captação das imagens de Gandhi, Matisse, Claudel, Satre, a vida na Costa do Marfim, México, a Guerra Civil Espanhola, a coroação do Rei George VI, a Libertação de Paris ou as
  • 11. 11 ruínas da Alemanha (ASSOULINE, 2009, p. 171) quanto visões do povo, anônimos percorrendo ruas, paisagens de gente amontoada, dor e fastio do viver, olhares alegres, visões boas do cotidiano. A semântica bressoniana oscila entre o local deslocado de sua condição de particularidade para o universal, que por isso mesmo ali está presente. Bresson registra tais processos em cada foto-microcosmo. O potencial de historicidade é encontrado no instantâneo, funcionando o fotógrafo como sujeito participante, uma vez que a historicidade “não é apenas alguma coisa na qual nos „metemos‟ como quem veste uma roupa. Nós somos historicidade, somos tempo e espaço” (HELLER 1993, p. 14). A importância de se assumir como agente de historicidade lhe foi mencionada em abril de 1947 pelo amigo Robert Capa, em Nova Iorque, quando Bresson encerrava ali exposição que durara dois meses. – Desconfie dos rótulos. Eles tranqüilizam, mas as pessoas se aferram a eles e depois você não conseguirá mais se livrar. Vão pôr em você o pequeno fotógrafo surrealista... Você estará perdido, se tornará preciosista e maneirista. Continue o seu caminho, mas sob o rótulo do fotojornalista, e guarde o resto no fundo do coração. É isso que agradará você sempre que entrar em contato com o que acontece no mundo (ASSOULINE, 2009, p. 170). Com a superação da influência do surrealismo ampliou-se o olhar, ingressando completamente na historicidade. Poderoso exemplo está em foto de 1948 quando da débâcle da China Nacionalista, cuja legenda assim dizia: Shanghai, dezembro de 1948. A corrida do ouro. À porta dos bancos do Bund, filas enormes se formaram e invadiram as ruas vizinhas, interrompendo todo o tráfico. Cerca de dez pessoas morreriam na desordem. O Kuomintang decidira distribuir reservas de ouro, quarenta gramas por cabeça. Algumas pessoas esperaram mais de 24 horas para tentar trocar seus papéis-moedas. A ordem era debilmente mentida por uma polícia cujos equipamentos desconjuntados eram remanescentes dos diversos exércitos que, ao longo de quinze anos, haviam se interessado pela China (ASSOULINE, 2009, p. 205). A foto é impressionante. Para entendê-la recuemos no tempo e façamos nossa reinserção virtual à época, ao drama circunstanciado e suas manifestações de crueza histórica e humana, com a derribada abrupta de um mundo milenar, uma sociedade em ruínas. Esse artifício nos permitirá a percepção, mais que isso, a sensação, o leitmotiv,
  • 12. 12 da performance bressoniana: a fixação da época em um momento, pois fotografia é contexto. E como momento, como tempo emocionado de um e de outro lados, torna-se expressão; é troca, pois é além e é aquém: do fotógrafo para a cena, desta para a foto e da foto para o aquém/além final – nós. A fotografia-cena mostra uma sinergia de desesperados que se engalfinham em processo de encaixe, como se fora um balé grotesco. A foto tem movimento, ação, angústia emplastrada a corpos e faces que se oprimem. Seu tom de baixa luminosidade é dantesco, escuro como se o ar estivesse encardido. Um pouco acima, ao fundo, dois homens, de costas para a fila, olham-na com olhar de estranhamento como se também não fizessem parte daquela corrente de desgraçados. A fila vem da esquerda para a direita. Os braços estendidos, o côncavo/convexo de corpos encastoados, que se empurram em bricolagem medonha, dirigem a linha do olhar. A imagem tem ritmo e movimento, desespero e um vago sentimento de que tudo aquilo resultaria em vão. Ali estavam apenas condenados. Suas fotos são efetivamente o que sugere seu Images à la sauvette, ou seja: imagens colhidas à espreita, atitude furtiva e leoparda. O fotógrafo tenso espera, com a paciência do momento, que o mundo perfile determinada cena. Mas a composição não está no mundo, está dentro dele, fotógrafo. É preciso esperar que o ato se defina para ser transposto à condição de fato. Assim, percebe-se em toda a sua obra a presença da composição perfeita; do detalhe ao amplo, do grumo à totalidade. A obra Images à la sauvette revela em título um estado de espírito de lancinante poesia porque poesia experienciada. Foi vertido para o inglês à condição de The decisive moment, fórmula o mais próximo possível ao estado de espírito bressoniano. E foi essa a predominância que se fez. Não lhe tirou a grandeza, apenas o fez mais jornalístico. Talvez o exemplo mais forte dessa práxis sauvette seja a foto de duas lésbicas, em 1934, México. Uma noite, Cartier-Bresson comparece a uma pequena recepção na casa de uma personalidade cuja garçonnière seu amigo Tonio Salazar decorara. A tequila corria solta. Apenas Cartier-Bresson se abstém de beber, consumido por uma disenteria amebiana. Para fugir do tédio, ele visita a casa com o pintor, perde-se no labirinto de seus aposentos. No andar de cima, eles ouvem um leve ruído, e então... – Tive bastante sorte. Só precisei empurrar a porta. Duas lésbicas faziam amor. Era de uma voluptuosidade, de uma sensualidade... Não víamos seus rostos. Era maravilhoso, o amor físico em sua plenitude. Tonio segurou uma lâmpada, fotografei várias vezes... Não havia nada de obsceno. Eu nunca as teria feito posar. Questão de pudor (ASSOULINE, 2009, p. 93).
  • 13. 13 À obscuridade do ambiente une-se o obscurecimento buscado por quem se sabia praticante de ato de licença, satisfação física de idílio interdito. A porta, entreaberta; a lâmpada, improvisada; jamais o flash, com sua luz gritante, luz que levaria aquele ato à condição de indecência e ultraje, tudo compôs a psique da foto. La falta de definición del elemento central de la composición, consecuencia del movimiento y de la baja velocidad de obturación, provoca tensión en nuestra mirada. Los torsos y extremidades entrecruzadas de las anónimas protagonistas sumados a la ocultación de sus rostros acrecienta la sensación de caos formal en la escena. Estos cuerpos reflejan una luz intensa que contrasta con las partes más oscuras de la toma y aumentan la tensión. Por otra parte, la aparición casi fantasmagórica y desproporcionada de una supuesta mano cerca del vértice inferior derecho junto a la ocultación de los rostros es un claro ejemplo de elementos que aumentan la tensión compositiva (FABREGAT, 2010). A foto tem algo de sigilo cúmplice. Mulheres sem rosto a se arder em privativo fragor. Alcova e corpos enroscados. A luz, luz modesta, luz que é quase réstia, é elemento formal forte e decisivo. Temperada pelo olhar do mago, ressalta o branco dos corpos combinado à clara padronagem floral do lençol onde se abraçam. Dele partem lampejos. Assim, foi obtida e ressaltada luminância sutil, quase fluorescente. Fagulhas exalando a essência daquele ato a confessor silencioso e absolvente. Uma mulher cobre a outra, mas não tem o corpo curvilíneo da femme fatale. A inexistência de beleza corporal estonteante atira para longe qualquer intenção de gratuidade nesse erotismo. A baixa velocidade do obturador amplia o efeito impressionista – o movimento das mãos da mulher que está embaixo, e tenta despir a parceira de seus trajes íntimos. Despojamento e entrega são a marca desse encontro de intensa e cândida malícia. Mulheres sáficas e sem rosto. O anonimato desfeito tiraria daquele momento sua essência de segredo para se transformar em escândalo e não era esse o caso. O fato de o captor haver ajustado a velocidade do obturador indica como, cerebral e apaixonadamente, elaborou aquele momento; como parou, calibrou a máquina, posicionou-se e enquadrou, contribuindo na consumação de rito sigiloso. Após, saiu. Bresson dizia, na apresentação de The decisive moment, em 1952:
  • 14. 14 El fotógrafo no puede ser un espectador pasivo, no puede ser realmente lúcido si no está implicado en el acontecimiento. La memoria es muy importante, la memoria de cada foto tomada al galope, a la misma velocidad que el acontecimiento; durante el trabajo uno debe estar seguro de no haber dejado agujeros, de haber expresado todo, porque después será demasiado tarde; no se podrá hacer desandar el tiempo (CARTIER-BRESSON, 2010). “Não se poderá desandar o tempo”. Essa a essência e a consciência do captor, seu gesto, sua obra, sua arte poético-jornalística. Consciência a sabença de estar imergido num tempo histórico e existencial, nessa relação de contradita complementaridade entre a vida na polis e a vida enquanto estar e ser. Sua obra se constitui em corolário e ilação. O primeiro como aspecto cerebral, argumentativo, sintático: o homem preso às teias políticas de coordenação e subordinação no mundo; o segundo eminentemente poético, estimativo, avaliação aproximada do que virá, o devir dos outros e o seu próprio devir àquele encadeado. Seu trabalho, em todo o grande momento decisivo de sua vida, foi de inquietação permanente e de equilíbrio que não buscava permanecer. Apenas estar. Estar na hora certa e em certas horas em que era preciso estar. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ASSOULINE, Pierre. Cartier-Bresson: O Olhar do século. Porto Alegre: L&PM, 2009. BRASSAÏ, Gilbert. Proust e a fotografia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005. CARTIER-Bresson, Henri. El momento decisivo. Disponível em: <http://fotojornalismojf.files.wordpress.com/2007/09/el-momento-decisivo.pdf> Acesso em: 20 jun 2010. FABREGAT, Hugo Doménech. Banco de datos: análisis de la imagen fotográfica. Disponível em: <http://www.analisisfotografia.uji.es/root2/pdf/Cartier- Bresson%20(1934).pdf> Acesso em: 20 jun. 2010. HELLER, Agnes. Uma teoria da história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1993. MOUILLAUD, Maurice; PORTO, Sergio Dayrell (orgs). O jornal: da forma ao sentido. 2. ed. Brasília: editora Universidade de Brasília, 2002.
  • 15. 15 TASSINARI, Alberto. Henri Cartier-Bresson: o instante radiante. In: MAMMI, Lorenzo; SCHWARCZ, Lilia Moritz (org). 8 X Fotografia: Ensaios. Companhia das Letras, 2008. WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. São Paulo: Cultrix, 1968.