1. O fazer do psicólogo e a Síndrome de Down:
uma revisão de literatura
Débora Silva Guedes Folly
Maria do Rosário de Fátima Rodrigues
A literatura a respeito das intervenções psicológicas com portadores da SD
é escassa, sendo mais comuns trabalhos produzidos pela área da Fonoaudiologia
e da Fisioterapia, enfocando a linguagem e a motricidade. Entretanto, dentre os
trabalhos da Psicologia, ressaltam-se aqueles que enfatizam atendimento psi-
cológico a familiares (GUIMARÃES, 2006; PETEAN & SUGUIHURA, 2005;
SILVA & DESSEN, 2003).
A Psicologia pode auxiliar no desenvolvimento da pessoa com SD, tendo
como objetivos, de curto, médio e longo prazo a aprendizagem de estratégias
tanto por profissionais, quanto por familiares e pelos próprios portadores para
a promoção do desenvolvimento. Assim, a intervenção pode ocorrer de várias
maneiras. Uma delas é o aconselhamento genético, no qual os familiares são
abordados antes, durante e depois da consulta com o geneticista, para facilitar o
vínculo com a equipe e a compreensão de ambos diante da síndrome. As famílias
que não conhecem a SD ficam apreensivas com as doenças que a acompanham,
e querem saber mais detalhes sobre ela. Geralmente, o que sabem foi visto na
televisão e outros meios de comunicação, e uma intervenção explicativa, bem
como a troca de experiências com profissionais, ajudaria a tranquilizar as famílias.
Outro trabalho é feito logo após o nascimento do bebê, que consiste no acom-
panhamento da família, durante o momento da notícia, diante do parecer que
o pediatra solicita ao geneticista, pedindo confirmação da suspeita da síndrome
(MICHELETTO, 2004).
Segundo Sunelaitis, Arruda e Marcom (2007), muitas mães recebem
sozinhas a notícia, sem mesmo a presença do marido. Muitas vezes, a SD não é
detectada no pré-natal e a notícia pode causar grande impacto, com consequentes
sentimentos de negação, culpa e medo. Não existe uma receita a ser seguida na
hora de comunicar aos pais o diagnóstico, mas aspectos a serem considerados,
com o propósito de amenizar o possível impacto, pois a adaptação do filho ide-
Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23
2. alizado para o real é um processo que demanda tempo e pode ser vivenciada de
forma conflituosa, podendo ser considerada uma vivência marcante para todos os
elementos da família. Assim, é importante informar aos pais correta e claramente
sobre a SD, com respeito, sem iludir, tampouco omitir, como provavelmente será
o desenvolvimento da criança. Para isso, o profissional deve estar atualizado no
que diz respeito à síndrome, de modo a ter condições de fornecer informações
suficientes para aquela etapa da vida, de forma gradativa e constante, até que
a família esteja esclarecida e disponível para acolher seu mais novo integrante.
Os mesmos autores afirmam ainda que cada família tem uma história de
vida única e, consequentemente, suas necessidades também são únicas. Portanto,
é preciso que o profissional desenvolva a capacidade de ouvi-la sobre seus medos,
dúvidas e demandas. É interessante comunicar-lhe sobre os recursos disponíveis
na comunidade, os possíveis locais onde possa buscar apoio diante de intercor-
rências e subsídios que a auxiliem nessa caminhada. O profissional também pode
ajudá-la a reconhecer suas forças e potencialidades, bem como suas fragilidades
e necessidades, assim como ressaltar seu importante papel.
Micheletto (2004), diante das possibilidades de intervenção, acredita ser
profícuo o trabalho com o grupo de pais, seja fazendo reunião com eles, psicólogos
e outros especialistas, para a troca de informação e a orientação sobre estimulação
precoce, proporcionando crescimento e reforçando vínculos entre a família e os
vários profissionais que precisam intervir com a criança.
Serapompa e Maia (2006), em um contexto de intervenção multiprofis-
sional junto às pessoas com SD, demonstram que é interessante o diálogo entre
os profissionais das diversas áreas envolvidas, assim como entre estes, a família e
a criança. Dessa forma, é possível avaliar de maneira mais completa a criança e
planejar treinos de habilidades, uma vez que cada profissional percebe as pecu-
liaridades e necessidades referentes a sua área. Os profissionais podem elaborar
juntos estratégias em torno de tarefas motoras, perceptuais e cognitivas, para
estimularem a criança, apresentando os desafios, em ordem crescente quanto ao
grau de complexidade. Também devem planejar e ampliar as possibilidades de
desenvolvimento da criança, criando condições favoráveis para várias formas de
expressão e aprendizagem. Importa ainda a avaliação dos resultados da inter-
venção e para que, se julgarem necessário, reverem as práticas adotadas.
Outra forma de intervenção, que está em crescimento, como explica
Althausen (2006), é o atendimento clínico com a participação de animais, cha-
mado de Atividade Assistida por Animais (ATT). A autora fez uma pesquisa
10 Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23
3. com adolescentes com SD e cães e percebeu que o cachorro interagia com os
adolescentes de acordo com o comportamento deles. Com as reações dos cães,
os adolescentes ficavam mais espontâneos e se expressavam melhor, revelando
alguns sentimentos e facilitando assim a intervenção da psicóloga.
A psicóloga Maria Izabel Valente, coordenadora dos projetos Nascer-Down
e Aprendiz-Down, de Curitiba, possui experiência clínica no atendimento a
pessoas com SD e seus familiares. Em entrevista concedida a Guimarães (2006),
Maria Izabel comenta que não existe uma fórmula ou uma abordagem específicas
para intervir com esse público, porque são muitas as variáveis e as particulari-
dades envolvidas no desenvolvimento do portador. Ela ensina que o profissional
deve estar bem informado para desenvolver um bom trabalho, acolher os pais e
orientá-los, no momento em que eles procuram ajuda. É preciso estar atento e
disponível para perceber e atender naquilo que for melhor para a criança e sua
família. Na intervenção direta com o portador, é viável reconhecer e respeitar
o potencial de cada um, nem superestimando e tampouco subestimando, mas
fortalecendo-o para que seja capaz de enfrentar e superar os obstáculos, estimu-
lando-o de acordo com o que consegue desempenhar melhor. É preciso reavaliar
constantemente, considerando os fatores externos, e reunir-se com os profissionais
que lidam diretamente com o portador para discutir sobre sua evolução escolar.
Diante do expressivo número de pessoas com SD e da importante con-
tribuição que o psicólogo pode oferecer, nesta pesquisa questionou-se sobre as
intervenções psicológicas descritas nos trabalhos sobre SD, na Biblioteca Virtual
de Psicologia, nos últimos cinco anos (2003-2008). A partir desta revisão de
literatura buscou-se identificar as temáticas tratadas, analisar os objetivos apre-
sentados, averiguar quais os tipos de pesquisas identificados e discriminar a
intervenção do psicólogo nestes trabalhos.
Método
A presente pesquisa é do tipo bibliográfico, por utilizar material já escrito,
especialmente no formato de artigo científico.
Para a realização desta pesquisa bibliográfica, a base de dados, Biblioteca
Virtual de Psicologia (www.bvs-psi.org.br), foi acessada entre fevereiro e junho
de 2008, sendo utilizada para busca a expressão “síndrome de Down”. Dos
trabalhos encontrados foram selecionados 39 que condiziam com os seguintes
critérios: todos aqueles escritos em língua portuguesa e que foram publicados
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4. entre 2003 e 2008, em revistas de psicologia. Também foram analisados os artigos
publicados em revistas de saúde e educação, que tratam de temas estudados pela
Psicologia, tais como: relações sociais, comunicação, desenvolvimento, cognição,
entre outros. Após a leitura dos trabalhos, foram criadas categorias dos temas,
dos objetivos, dos tipos de pesquisa e do fazer do psicólogo junto à SD, de acordo
com os conteúdos encontrados e com os objetivos desta revisão. Em seguida,
os dados foram organizados em tabelas, cada uma de acordo com um objetivo
deste estudo, com suas respectivas frequências e porcentagens. Por fim, foi feita
a análise dos dados mais frequentes, seguida da discussão.
Resultados
A Tabela 1 apresenta a frequência e a porcentagem dos temas encontrados
nos trabalhos lidos.
Tabela 1 – Temáticas dos trabalhos sobre síndrome de Down
Temáticas Freqüência Porcentagem
Família 8 20,51%
Linguagem 8 20,51%
Cognição 7 17,95%
Aspectos Sociais 6 15,38%
Afetividade 4 10,26%
Intervenção 4 10,26%
Professor 2 5,13%
Total 7 39 100%
De acordo com a Tabela 1, observa-se que os temas mais frequentes se
relacionam à família e linguagem, com o total de 41,02 %, e os dois temas apa-
recem na mesma frequência, seguidos da cognição, dos aspectos sociais, afetividade
e intervenção, ambos na mesma frequência, e professor.
Na categoria família constam, predominantemente, trabalhos que enfocam
as mães, seguidos daqueles sobre irmãos, genitores, interações e luto familiar. Em
linguagem, encontram-se pesquisas sobre consciência fonológica, comunicação
verbal e não-verbal, bem como representação lúdica e gráfica. A categoria cognição
inclui trabalhos relacionados à motricidade, aprendizagem da leitura, plasticidade
cerebral, desempenho sociocognitivo, memória e noção de tempo. Os aspectos
sociais contemplam as representações e significados da síndrome, avaliação da
qualidade de vida, do cotidiano, bioética e programa de benefícios. Em afetividade,
12 Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23
5. são encontrados trabalhos a respeito de valores e crenças de pais e professores,
educação sexual e percepções de jovens com SD sobre relacionamento amoroso.
A categoria intervenção mostra pesquisas que apresentam ações de psicólogos em
ambiente clínico, trabalhos com auxílio de cães, ações de equipe multidisciplinar
e de fisioterapeutas em contexto de hidroterapia. No tópico professor, constam
artigos sobre sentimentos e concepções dos professores e suas dificuldades em
ensinar crianças com a síndrome.
Na Tabela 2, a seguir, constam os objetivos dos trabalhos sobre SD, junto
com a frequência em que apareceram e suas respectivas porcentagens.
Tabela 2 – Objetivos dos trabalhos sobre síndrome de Down
Objetivos Freqüência Porcentagem
Descrição 16 41,03%
Comparação 7 17,95%
Relação 7 17,95%
Avaliação 6 15,38%
Estudo Teórico 3 7,69%
Total 5 39 100%
Conforme a Tabela 2, o objetivo mais frequente dos trabalhos foi o de
descrição, que representou 41,03% do total. Logo após ficaram os de comparação e
relação, que apareceram na mesma frequência, seguidos de avaliação e estudo teórico.
Na categoria descrição, encontram-se trabalhos sobre a percepção das mães
a respeito do diagnóstico que recebem no hospital de terem um filho com SD, as
razões de os pais não aceitarem facilmente o fato de terem tido um filho diferente
do idealizado, o acolhimento e a inclusão, as interações familiares, a convivência
com irmãos mais velhos e a influência que o discurso médico e leigo sobre a
SD causam na sociedade. Outros aspectos e situações que são descritos passam
pela aprendizagem da leitura, a dificuldade de professores do ensino regular
para ensinar crianças com SD, a educação sexual, a percepção dos jovens sobre
relacionar-se amorosamente, o trabalho com adolescentes utilizando-se de cães
na intervenção, as representações sobre a inserção profissional, o cotidiano de
um adulto, e a expectativa clínica de uma psicóloga no atendimento de pessoas
com SD e seus familiares.
Na categoria comparação, constam pesquisas sobre aspectos específicos
de crianças com e sem a síndrome; por exemplo, adolescentes com a SD e
adolescentes com deficiência mental advinda de outras etiologias, bem como a
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6. comparação entre a percepção de professores e familiares sobre crianças com SD.
Nessa categoria, há trabalhos variados, tais como aqueles que versam sobre as
formas de comunicação expressiva, mecanismos de memória implícita e explícita,
e formação de módulos na aquisição de habilidades motoras. Outros contemplam
as interações genitores-crianças, como também valores e crenças de famílias e
professoras sobre aspectos do desenvolvimento.
Na categoria relação, observaram-se artigos que relacionam o fenômeno
a outra variável, como, por exemplo, a ocorrência de nascimentos de crianças
com SD de mães com mais de 40 anos, a comunicação não-verbal e verbal, os
gestos e a linguagem oral em gêmeos, a noção de tempo articulada à memória
e causalidade, a forma de a criança organizar a brincadeira e o desenho e, final-
mente, a relação entre a opinião de pais e profissionais.
A avaliação englobou trabalhos sobre o nível de adaptação psicossocial
de mães que têm filhos com SD, consciência fonológica, imagem corporal e
qualidade de vida de pessoas portadoras da síndrome. Ainda foram avaliados
aspectos metodológicos, como o tempo da observação de uma intervenção, para
se fazer a análise da pragmática de crianças, e aspectos sociais, como a avaliação
do desempenho de um Programa de Benefícios.
Na categoria estudo teórico, de menor frequência, foram encontradas pes-
quisas sobre linguagem em bebês, processos cognitivos e plasticidade cerebral,
bem como a hidroterapia como uma técnica de tratamento.
Abaixo, a Tabela 3 mostra quais foram os tipos de pesquisas dos trabalhos
sobre SD e em que frequência e porcentagem apareceram.
Tabela 3 – Tipos de pesquisas dos trabalhos sobre síndrome de Down
Tipos de pesquisa Freqüência Porcentagem
Pesquisa de Campo 30 76,9%
Pesquisa Bibliográfica 3 7,69%
Pesquisa Documental 3 7,69%
Estudo de Caso 3 7,69%
Total 4 39 100%
De acordo com a Tabela 3, dentre os trabalhos lidos, quanto aos meios
de investigação, o tipo mais utilizado foi a pesquisa de campo. Neste, foram fei-
tas entrevistas, preenchimento de questionários com perguntas abertas e/ou
fechadas, gravação de conversas e filmagem de algumas situações, para coleta
de informações.
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7. As categorias pesquisa bibliográfica, pesquisa documental e estudo de caso apa-
receram na mesma frequência. Relacionados à primeira, foram encontrados
trabalhos que tiveram como base de dados livros e artigos científicos. Quanto à
segunda, as pesquisas foram feitas em prontuários de um Centro de Assistência
Odontológica a Excepcionais, de um Laboratório de Genética Humana e
Citogenética e em registros de benefícios oferecidos por um Programa de
Benefícios por Incapacidade. Finalmente, na categoria estudo de caso, observaram-
se trabalhos sobre o desenvolvimento de uma criança, especificamente no aspecto
linguístico, sobre a noção de tempo em dois adolescentes, e a percepção de uma
jovem sobre ser portadora da SD.
Finalmente, na Tabela 4, estão relacionados os trabalhos que foram encon-
trados sobre a intervenção do psicólogo junto a SD.
Tabela 4 – Intervenção do psicólogo nos trabalhos sobre síndrome de Down
Intervenção do Psicólogo Freqüência Porcentagem
Atendimento psicológico 1 2,56%
Psicólogo em equipe multiprofissional 1 2,56%
Atendimento com auxílio de animais 1 2,56%
Sem intervenção 36 92%
Total 39 100%
A Tabela 4 mostra que três trabalhos apresentaram a intervenção psicoló-
gica em um contexto no qual havia a presença de pessoas com SD. Um conta a
experiência de uma psicóloga no atendimento a pessoas com SD e seus familiares.
No outro, cita-se a presença do psicólogo em uma equipe multiprofissional, sem
que suas ações sejam descritas particularmente, mas como um dos participantes
da equipe que planejavam e executavam o atendimento. O último é relativo
ao atendimento com auxílio de um cão, nos moldes das denominadas Terapias
Assistidas por Animais (TAA)1.
Os dados apresentados serão brevemente discutidos a seguir.
1 A Terapia Assistida por Animais é realizada em uma variedade de ambientes por profissionais
especialmente treinados, em associação com animais, que obedecem a critérios específicos. Segundo
Althausen (2006), promove benefícios à motivação, educação, recreação e/ou terapia, melhorando
a qualidade de vida.
Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23 15
8. Discussão
De modo geral, os resultados indicaram, quanto ao tema, que a família
e a linguagem predominaram nos estudos sobre a SD, listados neste trabalho. A
respeito da família, todos os trabalhos apresentaram, em diferentes aspectos, as
repercussões que o nascimento ou pertencimento de um membro com SD causam
no funcionamento ou dinâmica familiar. Por exemplo, Sunelaitis et al. (2007)
descrevem que os pais ficam decepcionados quando recebem o diagnóstico e
lutam para elaborar a perda do filho que até então havia sido imaginado como
um bebê ideal. Silva e Dessen (2006) explicam que os genitores esperam que,
futuramente, seus filhos sejam independentes, terminem a faculdade e façam
qualquer esporte que escolherem. As mães, por sua vez, sentem necessidade de
adaptar o comportamento dos familiares ao comportamento da criança, tendendo
a dirigir todas as atividades do(a) filho(a). Além deles, os irmãos também passam
por transformações com a chegada do novo membro familiar. Segundo Petean
e Suguihura (2005), os irmãos mais velhos adquirem mais responsabilidades,
auxiliando os pais a cuidarem da higiene, alimentação, relações sociais e atividades
de cunho intelectual e/ou escolar.
A predominância deste tema nos trabalhos lidos condiz com a importância
da família no desenvolvimento dos seus membros. Percebe-se que por ela ser
um sistema complexo, formado por subsistemas que se influenciam, a saber:
marido-esposa, genitores-criança e irmãos, a idéia é que estas relações, entre si
e no todo, influenciarão o desenvolvimento infantil. Nesse caso, não basta que
apenas a criança seja tomada como foco de intervenção, porque os membros da
família são seus principais cuidadores, ocupando aí um lugar central em qualquer
projeto de intervenção conjunta.
Sobre a linguagem, que apareceu na mesma proporção da categoria famí-
lia, Danielski (2001) afirma ser este o tema central, em se tratando da SD. As
pesquisas sobre consciência fonológica, comunicação verbal e não-verbal, bem
como representação lúdica e gráfica, citadas nesta revisão, retratam os desafios
relativos ao desenvolvimento da linguagem, a saber: integridade anatomofun-
cional e motora, vontade de comunicar concomitante à atividade de escuta, e
capacidade de simbolização e abstração progressiva.
Dentre estes trabalhos, apesar de alguns estarem publicados em revistas
de Psicologia, observa-se que as áreas de atuação são predominantemente da
Fonoaudiologia e o entendimento e o tratamento da linguagem se dão sob refe-
16 Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23
9. rências de outras áreas, como a Linguística, por exemplo. Entretanto, mesmo
em situações de terapia fonoaudiológica, ressalta-se que a metade deles está
fundamentada na epistemologia genética. Assim, observou-se não somente a
predominância dessa concepção na formação e/ou preferência dos autores destes
trabalhos, mas também a importância desta teoria para a intervenção psicoló-
gica, bem como a percepção da ausência de outros enfoques teóricos da própria
Psicologia, no entendimento e intervenção no fenômeno da linguagem.
Após o tema, serão abordados alguns aspectos relativos à análise dos
objetivos dos trabalhos. Dentre estes, o mais frequente foi o de descrição. Nestes,
foram descritas desde as percepções familiares, em várias situações, passando
por contextos escolares, em situação de aprendizagem formal e informal, até a
inserção de jovens e adultos em contextos sociais mais amplos. Sobre essas des-
crições, ressalta-se que a percepção mais investigada foi a materna. Sobre este
dado, há concordância com a literatura. O subsistema mãe-criança, de acordo
com Silva e Dessen (2006), é o que tem sido mais investigado na literatura.
Segundo Brito e Dessen (1999), o papel do pai no desenvolvimento da criança
com deficiência, por exemplo, é um aspecto que tem sido pouco enfatizado, já
que durante as últimas décadas tem se dado maior importância para o papel da
mãe, em detrimento do pai.
Os objetivos dos trabalhos descritivos, que são a maioria, seguem a pre-
dominância dos temas familiares. Nestes, observou-se o foco sobre a mãe como
a principal cuidadora da criança. Tal dado pode estar demonstrando o recorte
da pesquisa, como também a sobrecarga da mãe em relação aos cuidados com a
criança tida como deficiente. Nesse caso, as descrições sobre a realidade vivenciada
pelas mães apontam para a necessidade de apoio profissional, especialmente por
parte da Psicologia.
A seguir, serão feitas algumas observações sobre os tipos de pesquisas
encontrados que, por sua vez, se relacionam com os objetivos de descrição, pois
a pesquisa de campo apareceu como predominante nos trabalhos lidos. Segundo
Gil (2002), o estudo de campo busca o aprofundamento das questões que serão
investigadas, por meio de várias técnicas para coletar informações sobre a amostra
estudada. Em relação aos trabalhos lidos, observou-se a utilização de entrevistas,
preenchimento de questionários com perguntas abertas e/ou fechadas, gravação
de conversas e filmagem, o que condiz com a exemplificação do autor sobre as
formas de coleta de dados, em uma pesquisa de campo. Pelo fato de ser possí-
vel a utilização de técnicas diversas, na coleta de dados, durante a pesquisa de
Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23 17
10. campo, as informações colhidas tendem a ser mais fidedignas, considerando a
importância da presença do pesquisador no local em que ocorrem os fenôme-
nos pesquisados, o que favorece a experiência direta deste e a expressão dos
participantes da amostra com as questões de estudo. Assim, se considerarmos a
presença do pesquisador em campo, pode-se inferir que este, de certa forma, já
está influenciando a realidade pesquisada.
Entretanto, esta influência não tem o caráter interventivo, pois, na pes-
quisa de campo, não há manipulação de variáveis. Nesse sentido, é possível
pensar no desafio profissional entre a descrição da realidade e as possibilidades
de intervenção. Este dado ainda sugere que o objeto de estudo, SD, apesar de
ser historicamente antigo, como foco de investigação é recente. Por exemplo,
sobre a família, que foi um dos temas mais recorrentes deste trabalho, Silva e
Dessen (2006) descrevem que os dados atuais refletem a inconsistência existente
na área e sugerem a necessidade de mais pesquisas, visando o planejamento de
programas de educação familiar. Portanto, ressalta-se a importância da construção
de modelos interventivos, a partir dos dados advindos da descrição da realidade.
Finalmente, sobre a intervenção do psicólogo em contexto de pessoas com
SD, as pesquisas mostram sua ação em ambiente clínico, junto à equipe multi-
disciplinar e ao trabalho com auxílio de cães, nos moldes das denominadas TAA.
Segundo Guimarães (2006), é importante dar apoio e informação aos pais
de crianças com SD, assim como fazer palestras para os professores, informando
sobre os aspectos específicos do seu desenvolvimento e aprendizagem. Para a
terapia com as crianças com SD, não há uma abordagem específica, porque
são muitas as particularidades que influenciam no resultado das intervenções.
O profissional precisa estar disponível e atento às necessidades da criança e da
família e utilizar as técnicas e teorias da ciência psicológica, de acordo com a
demanda apresentada pela pessoa ou pelo grupo atendido.
Serapompa e Maia (2006), ao relatarem sobre o atendimento de uma equipe
multiprofissional, com a presença de um psicólogo, que atendia uma criança com
SD, enfatizaram que os profissionais das diversas áreas comunicavam-se sobre o
planejamento da intervenção e repensavam suas práticas conforme os resultados
obtidos, de tal maneira que chegassem a um consenso no planejamento, nos
rumos teóricos e práticos da intervenção a ser efetuada.
Finalmente, o trabalho realizado com o auxílio de cães, por Althausen
(2006), demonstra que a presença do animal pode facilitar a expressão de senti-
mentos da pessoa atendida. Uma vez que o cachorro reage ao comportamento
18 Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23
11. humano por meio de uma comunicação não-verbal, estimulam-se ações e ver-
balizações, despertando espontaneidade nas atitudes das pessoas. Dessa forma,
pode-se dizer que o cão é como um coadjuvante do profissional.
Considera-se que este capítulo, com relação aos resultados, foi delineado
em correspondência aos objetivos específicos deste trabalho, ou seja, a identifi-
cação das temáticas, análise dos objetivos apresentados nos artigos, os tipos de
pesquisas e a discriminação da intervenção do psicólogo. A partir dos resultados
descritos, as considerações finais serão pontuadas a seguir.
Considerações finais
A revisão de literatura, realizada na Biblioteca Virtual de Psicologia, sobre
os trabalhos publicados entre 2003 e 2008, buscou encontrar, principalmente,
a existência de publicações sobre a intervenção do psicólogo junto ao contexto
de pessoas com SD.
A síntese dos principais resultados demonstra: a predominância da família
e da linguagem como temáticas tratadas; a prevalência de objetivos de pesquisa
descritivos, em consonância com os tipos de pesquisas, em sua maioria, de
campo; e, finalmente, a pouca representatividade da intervenção do psicólogo
nos trabalhos apresentados.
Inicialmente, a chegada de uma pessoa com SD pode proporcionar aos
outros membros da família sentimentos e atitudes peculiares em relação àqueles
percebidos em lares que não possuem alguém com deficiência. Primeiramente
porque, ao receber o diagnóstico da criança, seja durante a gravidez ou após o
parto, a família se depara com um membro diferente daquele que estava sendo
esperado. Depois, durante o crescimento e desenvolvimento da criança, são
necessários vários estímulos e cuidados extras, perpassando pela linguagem,
motricidade, cognição, entre outros aspectos, e exigindo, talvez, a intervenção
de uma equipe multiprofissional.
Nesse contexto, a família, com o auxílio da escola, deve agir com o apoio
dessa equipe, comunicando as evoluções da criança e suas necessidades emergen-
tes. Diante do percurso que a família faz, em situações de intervenção, percebe-
se a importância de um profissional da psicologia, inserido em um modelo de
intervenção.
Entretanto, a predominância de objetivos descritivos encontrados nos
trabalhos lidos, aliados à prevalência de pesquisas de campo, sinalizam que há
Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23 19
12. um modelo de intervenção ainda a ser construído. Sob esse aspecto, é importante
ressaltar o fato de a grande parte dos trabalhos contemplar a descrição das mães,
o que pode indicar a dificuldade de inserir os outros membros da família nas rela-
ções de cuidado e na metodologia da pesquisa. Esses dados terminam resultando
na pouca representatividade da intervenção do psicólogo diante deste público.
A problemática estudada foi sobre as maneiras como os psicólogos podem
intervir junto às pessoas com síndrome de Down. O limite deste trabalho foi
fornecer dados de uma revisão teórica atual, sem remeter às publicações mais
antigas e em outros idiomas. Acrescenta-se a isso a ausência de um tratamento
estatístico para os dados, que foram feitos somente descritivamente. Ressalta-se
ainda que a visão panorâmica dos textos foi efetivada sem o aprofundamento
das questões que neles eram tratadas.
Nesse sentido, sugere-se, em se tratando de pesquisas exploratórias, que
haja análises de fontes mais antigas e tratamento estatístico, de tal maneira
que se amplie a compreensão sobre a produção do conhecimento em relação a
esta temática. Enfatiza-se a importância do aprofundamento dos temas, de tal
forma que se possa avançar na construção de modelos teóricos e interventivos
da Psicologia, em relação à síndrome de Down.
Nessa construção, um aspecto a ser ressaltado é relativo à concepção de
linguagem que acompanha as intervenções realizadas pelos fonoaudiólogos.
Nesse sentido, observou-se que foi utilizada somente uma abordagem. Assim,
uma sugestão para futuros estudos se relaciona à contribuição da Psicologia, em
contextos de desenvolvimento linguístico de pessoas com SD.
Resumidamente, pode-se dizer que os resultados dos trabalhos apontaram
para a necessidade de, em complementação às pesquisas de campo, serem reali-
zadas mais investigações em uma perspectiva experimental, as quais apontarão,
supostamente, rumos de intervenção.
Resumo
O objetivo desta pesquisa foi realizar uma revisão de literatura sobre a síndrome
de Down, com foco no trabalho do psicólogo. A literatura a respeito das intervenções
psicológicas com portadores da síndrome de Down é escassa. Pesquisou-se no portal da
Biblioteca Virtual de Psicologia, por meio da expressão “síndrome de Down”, os trabalhos
publicados entre 2003 até 2008, perfazendo o total de 39 trabalhos. Foram criadas
categorias, de acordo com os objetivos específicos desta pesquisa, a saber, conhecer os
20 Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23
13. temas, os objetivos, os tipos de pesquisa e a intervenção do psicólogo junto à pessoas
com síndrome de Down. Os resultados indicaram a predominância da família e da
linguagem como temáticas tratadas, a prevalência de objetivos de pesquisa descritivos,
sendo as pesquisas, em sua maioria, de campo e, finalmente, a pouca representatividade
da intervenção do psicólogo.
Palavras-chave: síndrome de Down; intervenção; Psicologia.
Abstract
The objective of this research is to realize a revision of literature about Down syndrome,
as a focus in the psychological work. The literature concerning psychological interventions with
Down syndrome carrier is infrequent. It has been researched on the virtual Library of Psychology
portal, the expression “Down Syndrome”, the researches which were published between 2003 to
2008 performing the total of 39 researches, it has been created categories, in order with the specific
objectives of this research, to know, to be acquainted with the themes, the objectives, the kinds
of researches and the intervention of the psychologist with Down Syndrome carrier. The results
indicated an advantage of the family and of the language as treated thematic, prevalence of the
objectives of descriptive research; the researches are being in its majority of camp and finally, the
less representatives of intervention of the psychologist.
Keywords: Down syndrome; intervention; Psychology.
Resumen
El objetivo de está pesquisa fue con la finalidad de realizar una revisión de literatura
sobre el síndrome de Down, con enfoque en el trabajo de psicología. La literatura al respecto de las
intervenciones psicológicas con portadores del síndrome de Down es escaza. Se pesquiso en el sitio de
la Biblioteca Virtual de Psicología, por medio de la expresión «Síndrome de Down», los trabajos
publicados entre 2003 hasta 2008, completan el total de 39 trabajos. Fueron creadas categorías, de
acuerdo con los objetivos específicos de está pesquisa, como, conocer los temas, los objetivos, los tipos de
pesquisa y la intervención del psicólogo junto a las personas con síndrome de Down. Los resultados
indicaron la predominancia de la familia y del lenguaje como temas tratados, la prevalencia de
objetivos de la pesquisa descriptivos, siendo las pesquisas, en su mayoría, de campo y finalmente,
la poca representatividad de la intervención psicólogo.
Palabras clave: síndrome de Down; intervención; Psicología.
Psic. da Ed., São Paulo, 30, 1º sem. de 2010, pp. 9-23 21
14. Referências
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Débora Silva Guedes Folly
Centro Universitário do Leste de Minas Gerais.
E-mail: debora_folly@yahoo.com.br
Maria do Rosário de Fátima Rodrigues
Centro Universitário do Leste de Minas Gerais.
E-mail: rosariopsi@yahoo.com.br
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