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A CONVENÇÃO 169 DA OIT SOBRE POVOS INDÍGENAS E TRIBAIS: ORIGEM,
          CONTEÚDO E MECANISMOS DE SUPERVISÃO E APLICAÇÃO
               The ILO Indigenous and Tribal Peoples Convention, 1989 (n.º 169):
                 origin, content and mechanisms for oversight and enforcement
                                           Rosane Freire Lacerda∗
                                        __________________________
                                                       Resumo
             Há vinte anos a Conferência-Geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT)
adotava a Convenção 109 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes, texto incorporado
pelo sistema jurídico brasileiro cinco anos atrás. Apesar de sua importância, a Convenção é ainda
bastante desconhecida no país. Um desconhecimento não apenas sobre o seu conteúdo, mas também
sobre os mecanismos destinados à sua supervisão e aplicação. O presente artigo visa oferecer uma
pequena contribuição ao suprimento de tais lacunas. Num primeiro momento são abordados alguns
aspectos relativos à própria OIT – suas origens, configuração e envolvimento com a temática indígena,
sobretudo a partir da Convenção 107. Num segundo momento passa-se a tratar especificamente da
Convenção 169, enfocando-se o seu conteúdo e os mecanismos existentes para a supervisão e controle
de sua aplicação pelos Países. Na última parte do trabalho, é abordada a situação da Convenção em
relação ao Brasil, especialmente no tocante aos trâmites percorridos para a sua aprovação, e o seu
significado em face dos direitos indígenas reconhecidos no plano da Constituição Federal de 1988.
                                 __________________________________
                                                  Palavras-chave
Direitos indígenas no Brasil – Direito Internacional dos Povos indígenas – Convenção 169 da
                     OIT – Mecanismos de supervisão e implementação
                        ___________________________________
                                                       Abstract
Twenty years ago the General Conference of the International Labor Organization (ILO) adopted the
Convention 109 on Indigenous and Tribal Peoples in Independent Countries, text incorporated by
Brazilian legal system five years ago. Despite its importance, the Convention is still quite unknown in
the country. Ignorance not only on it’s content, but also on the mechanisms for their supervision and
enforcement. This article aims to provide a small contribution to filling those gaps. At first addressed
some aspects of the ILO – it’s origins, setting and involvement with indigenous issues, particularly
from the Convention 107. Second is to address specifically the Convention 169, focusing on its content
and the existing mechanisms for oversight and control of their implementation by countries. In the last
part of the work, is addressed the situation of the Convention in relation to Brazil, especially in the
manner traveled for its adoption, and its significance in the face of indigenous rights recognized in the
Constitution of 1988.
                               _____________________________________
                                                      Keywords
Indigenous rights in Brazil – International law of indigenous peoples – ILO Convention 1989
                 (n.º169) – Mechanisms of supervision and implementation




∗
  Professora Assistente de Direito Público da Universidade Federal de Goiás – Campus Jataí, Mestre em Direito, Estado e
Constituição pela Universidade de Brasília – UnB e advogada especialista em Direitos Indígenas. E-mail: <
rosane.lacerda@terra.com.br >.

                                                                                                                          1
Sumário
1. Introdução: A Organização Internacional do Trabalho e os Direitos Indígenas. (p.3)
2. A Convenção 107. (p.4)
3. A Convenção 169. (p.8)
       3.1. Conteúdo. (p.8)
       a) “Política Geral”. (p.9)
       b) “Terras”. (p.12)
       c) “Contratação e condições de emprego”. (p.15)
       d) “Indústrias rurais”. (p.16)
       e) “Seguridade social e saúde”. (p.16)
       f) “Educação e meios de comunicação”. (p.17)
       g) “Contatos e cooperação através das fronteiras”. (p.18)
       h) “Administração”. (p.19)
       i) “Disposições gerais”. (p.19)
       j) “Disposições finais”. (p.19)
       3.2. Supervisão e Controle de aplicação. (p.20)
       a) Instrumentos Disponíveis. (p.20)
       b) Possibilidades de Participação. (p.23)
4. O Brasil e a Convenção 169. (p.23)
       4.1. O processo de ratificação. (p.24)
       4.2. Significado da Convenção 169 da OIT no Marco Constitucional Brasileiro de 1988. (p.26)
5. Conclusão (p.31)
Referências Bibliográficas (p.32)




                                                                                                2
1. Introdução: A Organização Internacional do Trabalho e os Direitos Indígenas.

               A Organização Internacional do Trabalho (OIT) constitui o mais antigo dos 15
organismos especializados da Organização das Nações Unidas (ONU). Foi instituída em 1919
pela Conferência de Paz que se estabeleceu ao fim da Primeira Grande Guerra, e teve sua
criação motivada, entre outras, pelo reconhecimento da predominância de condições
desumanas e degradantes nas relações de trabalho. Em 1946, ano seguinte à criação da ONU,
a OIT foi vinculada a esta, constituindo-se no seu primeiro organismo especializado.

               Sediada em Genebra – Suíça, a OIT é composta atualmente por 183 países-
membros, de todos os continentes, reunidos numa estrutura tripartite, única no sistema das
Nações Unidas: além dos representantes governamentais, conta também com a participação
das instituições representativas dos setores patronal e laboral.

               Do leque de atividades da OIT sobressai-se pela sua importância e alcance o
estabelecimento das Normas Internacionais do Trabalho - NIT, e o gerenciamento do
sistema de controle e aplicação das mesmas pelos Estados-Membros. As NITs compõem
elementos de forte influência nos países, como por exemplo na elaboração legislativa, na
formulação de políticas para as matérias tratadas, e na orientação de decisões judiciais. Entre
as NITs destacam-se as Convenções Internacionais do Trabalho, tratados internacionais
adotados pela Conferência-Geral da organização, que estabelecem normas mínimas relativas a
temas específicos e são de cumprimento obrigatório pelos países que as ratificam. O sistema
de supervisão e controle de aplicação das NITs é formado predominantemente pelo envio de
“Memórias” regulares pelos estados e sua apreciação.

               O interesse da OIT para com a questão indígena surgiu nos primeiros estudos que
efetuou em 1921. À época a organização constatou, entre as chamadas “populações nativas”
das colônias européias, a sujeição a condições desumanas de trabalho. Eram populações
obrigadas a abandonar suas terras ancestrais “para converter-se em trabalhadores sazonais,
migrantes, em condições de servidão ou a domicilio e, por conseguinte, expostos às formas de
exploração no trabalho” (OIT, 2004). Segundo Fergus Mackay (1999:146) 1, em 1926 a
Organização formou um Comitê de Especialistas para investigar as condições de trabalho de
tais populações e, diante do panorama encontrado, reconheceu a necessidade de estender a sua




   1
      Fergus Mackay é especialista nas áreas de direitos humanos e direitos dos povos indígenas, e coordenador do Programa
Legal e de Direitos Humanos do Reino Unido.

                                                                                                                        3
ação protetiva aos trabalhadores indígenas. Dessa preocupação resultou, em 1930, a adoção da
Convenção n.º 29 sobre Trabalho Forçoso2.

              Mais tarde, já vinculada à ONU, a OIT retomou os seus estudos sobre o tema dos
trabalhadores indígenas, coordenando de 1952 até 1972 o Programa Indigenista Andino,
desenvolvido na Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. Como
parte do programa publicou, em 1953, o livro “Populações Indígenas: Condições de Vida e de
Trabalho das Populações Aborígenes nos Paises Independentes”. Ainda durante o programa,
em 1957, a organização adotou a sua primeira Convenção sobre Populações Indígenas e
Tribais, a chamada Convenção 107.

2. A Convenção 107.

              Apesar de configurar um instrumento normativo da OIT, a Convenção 107
contou, para a sua elaboração, com o apoio decisivo de “outros organismos do sistema das
Nações Unidas” (OIT, 2004). Segundo Marco Antônio Barbosa, tais organismos foram a
Food and Agriculture Organization at the United Nations (FAO), a United Nations
Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) e a Organização Mundial da
Saúde (OMS) (BARBOSA, 2001:225)3.

              Como bem lembrado por Barbosa (2001:226), inexistia à época um movimento
indígena organizado e que se fizesse presente nas discussões em Genebra. Contudo, o autor
observa ter havido nos anos 1950 uma certa presença de indígenas Norte-Americanos e,
sobretudo, de oriundos da Bolívia, resultando daí que a Convenção 107 tenha sido
“notoriamente inspirada na América do Sul”, uma vez que “suscitada pelos sindicatos
bolivianos cuja população é majoritariamente indígena e que era explorada na extração
mineraria” (BARBOSA, 2001:226.). Ainda segundo o autor, outro fator para a feição latino-
americana da Convenção 107 teria sido a influência exercida pelo antropólogo brasileiro
Darcy Ribeiro, “em razão de seu empenho e devido ao seu alto status dentro do SPI (Serviço
de Proteção ao Índio)”. O grau de respeitabilidade exercido por Ribeiro teria deixado a
marca, distinta para os padrões da época, de uma postura progressista do Brasil relativamente
à proteção internacional das populações indígenas (BARBOSA, 2001:226).

              A Convenção 107 sobre populações indígenas e tribais em países independentes
consistiu então no primeiro tratado internacional relativo especificamente à temática indígena.
   2
      A Convenção sobre Trabalho Forçoso se encontra ratificada atualmente por 173 países, inclusive o Brasil.
   3
      Além do envolvimento da Organização das Nações Unidas (ONU) e daqueles seus organismos (FAO, UNESCO e
OMS), o preâmbulo da Convenção 169 da OIT (§ 8.º) menciona ter recebido também a colaboração do Instituto Indigenista
Interamericano (III), organismo vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA).

                                                                                                                        4
Desde a sua adoção pela Conferência Geral da OIT, em 1957, até a adoção da convenção
revisora em 1989, a Convenção 107 foi ratificada por 27 países-membros4.

               Denominada “Convenção sobre a Proteção e Integração das Populações
Indígenas e outras Populações Tribais e Semitribais de Países Independentes”, a Convenção
107 objetivou por um lado, a proteção das populações indígenas contra atos de discriminação
étnico-racial no âmbito das relações trabalhistas e afins. Por outro, presa à visão etnocêntrica
predominante à época, assumiu o propósito de integrá-las aos padrões sócio-culturais da
comunidade nacional dos respectivos Estados. Apesar de os direitos indígenas passarem a ser
objeto de proteção em diploma internacional específico, a identidade indígena permanecia
concebida como passageira, tendo em vista a perspectiva da integração.

               Promulgada no Brasil pelo Decreto n.º 58.824, de 14 de julho de 1966, a
Convenção 107 norteou em grande parte a elaboração da Lei n.º 6.001, de 19 de dezembro de
1973, o “Estatuto do Índio”, ainda em vigor. Exemplos desta influência são encontrados de
modo enfático tanto nos dispositivos relacionados à integração dos índios à comunhão
nacional, quanto naqueles que, negando autonomia aos povos e comunidades indígenas,
reservam ao Estado todo o poder decisório em matérias de interesse direto de tais grupos.

               No primeiro caso, pode se destacar a adoção do propósito de preservação dos
indígenas e sua “integração progressiva e harmoniosa” à comunhão nacional (E.I., art. 1.º,
caput); a sua discriminação entre as categorias de “isolados”, “em vias de integração” e
“integrados” (art. 4.º); a sujeição dos “índios e comunidades indígenas ainda não integrados”
ao regime tutelar (art. 7.º), sendo considerados nulos os atos praticados sem assistência do
órgão indigenista (art. 8.º); a consideração das “peculiaridades” culturais relativas à
“qualificação do nome, prenome e filiação” nos registros civis apenas dos “índios não
integrados” (art. 12); a fiscalização das condições de trabalho pelo órgão indigenista apenas
no caso de indígenas “não integrados” (art. 16, § 2.º); a perspectiva de uma educação
“orientada para a integração na comunhão nacional mediante processo de gradativa
compreensão dos problemas gerais e valores da sociedade nacional” (art. 50); e a utilização
do “grau de integração do silvícola” como parâmetro para a aplicação de pena decorrente de
sentença penal condenatória (art. 56).

   4
     1958: Haiti, Cuba, República Dominicana, Índia, El Salvador, Bélgica e Ghana; 1959: Egito, República Árabe Síria,
Costa Rica e México; 1960: Argentina, Paquistão, Peru e Portugal; 1962: Tunísia; 1965: Bolívia, Malawi e Brasil; 1969:
Paraguai, Colômbia e Equador; 1971: Panamá; 1972: Bangladesh; 1976: Angola; 1977: Guiné-Bissau; 1986: Iraque. (Fonte:
< http://www.ilo.org/ilolex/english/convdisp1.htm > Acesso em: 20.mai.2009.). Conforme previsto no art. 36, 1. “b” da
Convenção 107, a abertura à ratificação pelos países Membros encerrou-se na data da entrada em vigor do texto convencional
revisor – a Convenção 169.

                                                                                                                        5
No segundo caso, a completa ausência de possibilidade de participação consultiva
ou decisória das comunidades e povos indígenas é expressa de modo mais visível, no Estatuto
do Índio, nos “programas e projetos tendentes a beneficiar as comunidades indígenas” onde
se admite, no máximo, a sua “colaboração” já na fase executória (art. 2.º, VII); na intervenção
em terra indígena por decreto do Presidente da República, entre outros por motivo de
“segurança nacional”, de “realização de obras públicas que interessem ao desenvolvimento
nacional” e de “exploração de riquezas do subsolo de relevante interesse para a segurança e
o desenvolvimento nacional” (art. 20, §1.º); na atribuição, ao órgão indigenista oficial, da
gestão do Patrimônio Indígena (art. 42); e no alijamento das comunidades indígenas da
discussão e definição acerca de projetos de exploração de riquezas do subsolo (art. 45) ou de
corte de madeira nas terras que ocupam (art. 46).

           Nas décadas de 1960 e 1970, embora mantivesse a sua importância como
instrumento de proteção aos direitos indígenas, a Convenção 107 passou por um processo
crescente de críticas tanto do movimento indígena em ascensão, quanto de antropólogos,
indigenistas e entidades de Direitos Humanos de diversos países. Apontavam-se as
consequências negativas da perspectiva integracionista, condenava-se o pressuposto
etnocêntrico da integração como único futuro possível para os indígenas, e denunciava-se
como prática de dominação colonial o monopólio estatal sobre as decisões relativas a temas
de interesse indígena, em substituição à possibilidade de participação dos próprios grupos
étnicos. Como observa Marco Antônio Barbosa, a Convenção 107, ao se pautar pelo
pressuposto da inexorabilidade do desaparecimento dos povos indígenas enquanto grupos
distintos demonstra uma abordagem, verbis:

                       paternalista, etnocêntrica, evolucionista e em desacordo com as mais recentes
                       pesquisas antropológicas porque ela considera como atrasados os beneficiários de
                       sua proteção que devem ser ajudados para evoluir até o ponto em que, devido a tal
                       ajuda e evolução, devem deixar de existir enquanto grupo específico. (BARBOSA,
                       2001:225)

           Ainda segundo aquele autor, foi de grande importância em 1971 a posição
assumida por Martinez Cobo, ao defender a revisão da Convenção 107, e ao apresentar
propostas inovadoras, o que lhe valeu o reconhecimento como referência para a questão
indígena contemporânea no cenário internacional (BARBOSA, 2001:226).

           O crescimento das críticas à Convenção 107 acabou por levar a ONU a iniciar um
estudo mais detalhado sobre a realidade dos povos indígenas e tribais. Uma contribuição
decisiva à proposta de revisão foi oferecida pelo Grupo de Trabalho sobre Populações


                                                                                                      6
Indígenas (GTPI), da Subcomissão sobre Minorias e Discriminação, da Comissão de Direitos
Humanos da ONU (BARBOSA, 2001:226). Essa contribuição veio, sobretudo, do projeto de
declaração sobre os direitos dos Povos Indígenas, cuja preparação o GTPI havia iniciado em
1985, e que contava com forte presença indígena em seu processo de discussão5.

              Em 1986, a Reunião de Peritos convocada pelo Conselho de Administração da
OIT chegou à conclusão de que “o enfoque integracionista do Convênio era obsoleto e de que
sua aplicação era prejudicial no mundo moderno” (OIT, 2004). Tal conclusão motivou o
Conselho de Administração da OIT a inscrever na Ordem do Dia da Conferência
Internacional do Trabalho, o tema da revisão da Convenção 107. A revisão foi assim objeto de
discussão pela Conferência nos anos de 1988 e 1989. Além das conclusões da Comissão de
Peritos, contou-se também com as contribuições das organizações indígenas e do Grupo de
Trabalho das Nações Unidas sobre populações indígenas, criado em 1982.

              Fergus Mackay observa que, apesar da importância da participação indígena no
processo de discussão que resultou na Convenção revisora, o texto final da Convenção 169
não contou com o apoio unânime dos povos indígenas, tendo sido logo no início objeto de
duras críticas por muitos deles, “sobre todo en lo que respecta a los términos de la libre
determinación (o la falta de éstos); las disposiciones sobre tierras, territórios, recursos y
reubicación; niveles de consentimiento y ausência de participación indígena significativa en
el processo de revisión” (MACKAY, 1999:147).

              Tais críticas resultaram na “Resolución de los Pueblos Indígenas en la Reunión
Preparatória – Ginebra, 1989”, onde se propôs boicotar a Convenção (MACKAY,
1999:148). O motivo central da insatisfação estaria, segundo Mackay, na comparação da
Convenção com os termos, mais avançados, do Projeto de Declaração dos Direitos dos Povos
Indígenas, à época já em curso na ONU. O texto final da Convenção 169 já era visto, então,
como uma “declaração mínima de direitos indígenas” (MACKAY, 1999:147), aquém dos
avanços já obtidos nas Nações Unidas no tocante ao Projeto de Declaração.

              Contudo, a proposta de boicote não prosperou, prevalecendo a posição dos povos
e organizações indígenas que avaliaram o significativo avanço trazido pela Convenção em
relação às normas internas vigentes em seus países. Para estes povos, diz Mackay (1999:147),

   5
      O Projeto de Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas teve o seu texto aprovado pelo
Conselho de Direitos Humanos da ONU em 29 de junho de 2006, sendo submetido à Assembléia Geral em 13 de setembro de
2007 quando foi aprovado por 144 votos a favor, contra quatro votos pela rejeição e 11 abstenções. No âmbito da
Organização dos Estados Americanos (OEA) tramita desde a década de 1980, inicialmente por sugestão da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), a discussão em torno do Projeto de Declaração Americana sobre os Direitos
dos Povos Indígenas.

                                                                                                                  7
“la ratificación del Convenio n.º 169 sería un paso adelante hacia la protección de sus
derechos, puesto que las leyes nacionales están actualmente por debajo de los estándares,
sin poseer mecanismos reales de exigibilidad, y son hasta hostiles”.

               Por fim, na seção de junho de 1989, a Conferência adotou como Convenção
Revisora a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais, cuja ratificação vem contando,
desde então, com o apoio das seguintes organizações indígenas internacionais: Conferência
Circumpolar Inuit; Conselho Nacional de Juventude Indígena; Conselho Sámi e Conselho
Mundial dos Povos Indígenas, além das organizações e povos de diversos países que ainda
não a ratificaram (MACKAY, 1999:147).

               Apesar de revista, a Convenção 107 permanece ratificada por 18 países, tendo
sido denunciada por aqueles que ratificaram a Convenção 169. Assim como não pode mais ser
objeto de novas ratificações desde a adoção da convenção revisora, a Convenção 107 também
não pode ser objeto de denúncia automática pelos países que a ratificaram. Segundo o art. 36,
1. “a”, da Convenção, a denúncia por estes países só é possível como conseqüência direta e
imediata da ratificação da Convenção 169. Evita-se, assim, a possibilidade de um País
Membro da OIT vir a retroceder em matéria de proteção, abrindo mão dos compromissos
mínimos constantes da própria convenção já revisada.

3. A Convenção 169.

               Adotada em 27 de junho de 1989 em Genebra, Suíça, pela 76ª Seção da
Conferência Geral da OIT, a Convenção 169 – denominada “Convenção sobre os Povos
Indígenas e Tribais, 1989” – entrou em vigor em 05 de setembro de 1991, doze meses após o
registro de sua segunda ratificação, efetuada pelo México (05.09.1990)6. Até o momento, a
Convenção 169 conta com a assinatura de 20 países7.

               3.1. Conteúdo

               Com um total de 44 artigos, a Convenção 169 da OIT tem o seu conteúdo dividido
em uma parte preambular e nove partes temáticas específicas, relativas a: política geral (arts.
1.º a 12); terras (arts. 13 a 19); contratação e condições de emprego (art. 20); indústrias
rurais (arts. 21 a 23); seguridade social e saúde (arts. 24 e 25); educação e meios de
comunicação (arts. 26 a 31); contatos e cooperação através das fronteiras (art. 32), e

    6
       Conforme o art. 38, 2, do texto convencional, a sua entrada em vigor havia sido determinada para doze meses após o
registro, pelo Diretor-Geral do Secretariado da OIT, das ratificações de dois países Membros da organização.
    7
      1990: Noruega e México; 1991: Colômbia e Bolívia; 1993: Costa Rica e Paraguai; 1994: Peru; 1995: Honduras; 1996:
Dinamarca e Guatemala; 1998: Países Baixos, Ilhas Fidji e Equador; 2000: Argentina; 2002: Venezuela, Dominica e Brasil;
2007: Espanha e Nepal; e 2008: Chile. Fonte: < http://www.ilo.org/ilolex/english/convdisp1.htm >.Acesso em: 20.mai.2009.

                                                                                                                       8
administração (art. 33), além daquelas que tratam de disposições gerais (arts. 34 e 35) e
disposições finais (arts. 36 a 44).

            Segue-se uma síntese comentada de cada um destes capítulos. Antes, porém, cabe
observar que no Brasil as atenções em torno da Convenção 169 permanecem restritas ao meio
indigenista e aos poucos advogados e membros do Ministério Público com atuação direta na
questão. Neste circuito os estudos sobre a Convenção 169 têm privilegiado o conhecimento
do teor do texto convencional e a sua transmissão para as comunidades e organizações
indígenas. Ainda não há no país uma literatura jurídica voltada para a interpretação do alcance
dos seus dispositivos, ou para a divulgação dos mecanismos de supervisão e controle de sua
aplicação pelo Estado. Provavelmente tal produção se desenvolverá na medida em que tais
mecanismos forem sendo utilizados.

            Neste contexto, optou-se aqui por trazer à tona, na síntese de cada capítulo, notas
com alguns dos comentários e interpretações de Fergus Mackay (1999). É ainda importante
considerar a observação desse autor, de que o texto da Convenção 169 possibilita uma
margem considerável de flexibilidade interpretativa, que pode levar a conclusões tanto
avançadas quanto restritivas de sentido. “El texto del Convenio n.º 169”, diz Mackay
(1999:149), “es de alguna manera impreciso, y permite interpretaciones flexibles de sus
disposiciones”. Assim sendo, “puede ser interpretado de una forma bastante abierta,
ampliando el alcance de sus disposiciones, o de manera restrictiva, logrando efectos
inversos”. Com esta observação, o autor alerta para a importância de que “los pueblos
indígenas participen en todo proceso que implica su interpretación, en especial en la
Comisión de Expertos, a fin de asegurar la interpretación más favorable de las normas allí
contenidas” (MACKAY, 1999:149).

            a) “Política Geral”

            O principal paradigma adotado pela Convenção 169 reside no reconhecimento das
instituições culturais e formas de vida próprias dos povos indígenas e tribais como elementos
a serem respeitados pelos Estados Membros. Invertendo o modelo integracionista até então
adotado, a Convenção 169 tem como perspectiva o direito de tais povos a continuarem
mantendo as suas identidades próprias, através do fortalecimento de suas especificidades
culturais, lingüísticas e religiosas. Além disso, adota também como princípio a ser observado
pelos Estados Membros, o respeito às “aspirações desses povos a assumir o controle de suas
próprias instituições e formas de vida e seu desenvolvimento econômico” (Preâmbulo, § 5),
ou seja, o reconhecimento do princípio da autonomia dos Povos Indígenas e Tribais.
                                                                                             9
O reconhecimento do caráter perene das identidades culturais próprias e o
estabelecimento do princípio da autonomia de tais povos é trabalhado mais detalhadamente no
capítulo referente à “política geral”. Estes aspectos são tão relevantes que, defende Mackay
(1999:150), “al leer una disposición del Convenio en particular, debería hacerse una
constante referencia a los principios generales de participación , consulta y respeto por la
cultura e instituciones indígenas, así como a otros artículos relacionados con éstas”.

               Também em caráter introdutório a Convenção define os seus dois beneficiários –
os povos indígenas e os povos tribais em Países Independentes. Os Povos Indígenas (art. 1.º,
§ 1, “b”) são entendidos como aqueles possuidores de uma vinculação histórica com as
populações existentes no país à época da colonização, e que mantenham, ainda que
parcialmente, instituições próprias no âmbito social, econômico, cultural e político. Já os
Povos Tribais (art. 1.º, § 1, “a”) são considerados como aqueles que, embora culturalmente
distintos e regidos ainda que parcialmente por modos próprios de vida, não possuem
necessariamente uma vinculação histórica com ancestrais residentes no país na época da
colonização ou do estabelecimento das fronteiras estatais. Para ambas as categorias a
Convenção 169 elege como “critério fundamental” de determinação de pertencimento a uma
ou outra, a “consciência da identidade indígena ou tribal” (art. 1.º, § 2), ou seja, o critério da
auto-identificação étnica8. Observa também a Convenção, quanto ao uso do termo “povos”,
não guardar o mesmo sentido jurídico que o contido no direito internacional, ou seja, não deve
ser interpretado como reconhecimento de um suposto direito de independência frente aos
Estados onde se localizem (art. 1.º, § 3.).

               Com base em tais pressupostos a Convenção estabelece diversos elementos de sua
política geral. Primeiro, a responsabilidade dos Governos em desenvolver, com a
participação de tais povos, ações permanentes e coordenadas de proteção (art. 2.º, § 1.),
adotando medidas que: a) garantam iguais direitos e oportunidades em relação à população
não-indígena (art. 2.º, § 2, “a”.); b) ponham em prática os direitos sociais, econômicos e
culturais e o respeito a sua identidade social e cultural (art. 2.º, § 2, “b”.); c) auxiliem tais
povos na eliminação das diferenças sócio-econômicas em relação aos demais membros da
população, “de maneira compatível com suas aspirações e formas de vida” (art. 2.º, § 2, “c”).



    8
      Segundo MACKAY (1999:158), “la autoidentificación es de extrema importancia debido a la facultad que tiene una
entidad externa – el Estado, las Naciones Unidas o la OIT, por ejemplo – para definir un individuo o pueblo como indígena
o no indígena, lo cual equivale a la facultad de denegar sus derechos a tal individuo o pueblo. (…) La necesidad y
conveniencia de esta definición deberá ser cuestionada a la luz de las demandas consistentes de los pueblos indígenas, de
que son sólo ellos quienes tienes el derecho de definirse a si mismos.”

                                                                                                                       10
Reconhece também aos povos indígenas e tribais o direito de gozo dos direitos
humanos, liberdades fundamentais (art. 3.º, § 1.) e direitos de cidadania (art. 4.º, § 3.); e a
necessidade de medidas especiais de salvaguarda de suas pessoas, instituições, bens, culturas
e meio ambiente (art. 4.º, § 1.). Adiante, remete às instituições em geral a tarefa de relacionar-
se com tais povos reconhecendo-lhes e protegendo-lhes os valores e práticas sociais, culturais,
religiosos e espirituais (art. 5.º, § 1.).

                No que se refere mais especificamente ao relacionamento dos governos com estes
Povos, a Convenção estabelece dois importantes princípios. Primeiro que sejam sempre
consultados “através de suas instituições representativas” em caso de “medidas legislativas
ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente” (art. 6.º, § 1, “a”). Segundo, que seja
garantida a sua livre participação em todas as instâncias decisórias nas matérias relativas às
políticas e programas que lhes digam respeito (art. 6.º, § 1, “b”)9. Além disso, cobra dos
governos, como suporte para a participação plena dos povos indígenas, o estabelecimento de
meios capazes de auxiliar no desenvolvimento de suas instituições e iniciativas próprias (art.
6.º, § 1, “c”.), e que as consultas10 aos mesmos sejam efetuadas “com boa fé e de maneira
apropriada às circunstâncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o
consentimento acerca das medidas propostas”11 (art. 6.º, § 2).

                Com base em tais princípios, a Convenção 169 estabelece que frente aos projetos
de desenvolvimento que afetem o seu modo de vida e suas terras, devem os Governos
respeitar a tais povos os direitos de escolha de suas próprias prioridades e de participação na
formulação, aplicação e avaliação de tais projetos (art. 7.º, § 1.12); a priorização, no seu
planejamento, da melhoria das condições e níveis de vida, trabalho, saúde e educação das
comunidades (art. 7.º, § 2.); a elaboração de estudos dos impactos sociais, espirituais,




    9
       Na interpretação de Mackay (1999:152.), a referência a meios de participação “pelo menos na mesma medida que
outros setores da população” (art. 6.º, § 1, “b”), significa que “los pueblos indígenas tienen el derecho a medios especiales
de representación directa que no son otorgado necesariamente a otros ciudadanos”.
    10
       A respeito de tais consultas, Mackay (1999:153) observa que: a) devem ser feitas previamente à adoção de quaisquer
medidas legislativas e administrativas; b) estão também “sujetas a la supervisión de la OIT, las que pueden ser puestas en
cuestión por los pueblos indígenas si violan el art. 6.º en general o alguna cláusula específica del mismo”.
    11
       Segundo Mackay (1999:154) “causa mucha desilusión por decir lo menos, que la OIT optara por un estándar débil –
‘con el objeto de lograr el consentimiento’ – en vez de un consentimiento expresado libremente y con pleno conocimiento
…” Defende então (p. 152.) que o dispositivo deve ser interpretado no sentido de que “no se requiere que se llegue a un
acuerdo o consentimiento, a menos que lograr dicho acuerdo o consentimiento fuera el objetivo de las consultas”.
    12
       A respeito do significado do art. 7,§ 1 para a autonomia dos Povos Indígenas, comenta MACKAY (1999:153-154) que
“esta disposición reconoce que los pueblos indígenas tienen derecho a alguna forma de autogobierno en relación a sus
instituciones y en la determinación de la dirección y alcance de su desarrollo económico, social y cultural. El alcance
preciso de dicha autonomía se determina en relación, entre otros, a: las disposiciones de participación; las disposiciones
sobre servicios de salud (art. 25(1)) (…); educación (art. 27 (2) (3)) (…); formación vocacional (art. 22(3)) (…); y
especialmente aquéllos vinculados con tierras y territorios (arts. 13-19) y las instituciones indígenas (arts. 7(1), 8(2) y 9).”

                                                                                                                             11
culturais e ambientais sobre as mesmas, cujos resultados devem ser considerados
fundamentais para efeitos de execução dos projetos de desenvolvimento (art. 7.º, § 3.).

               Com relação à proteção ambiental dos territórios indígenas e tribais, a
Convenção determina aos Governos que adotem medidas não de modo unilateral e
impositivo, mas “em cooperação” (art. 7.º, § 4) com tais povos.

               Outro ponto abordado é o da relação entre as formas jurídicas próprias dos
Povos Indígenas e Tribais e os sistemas jurídicos dos Estados. Aqui o princípio
estabelecido pela Convenção 169 é o do reconhecimento da aplicabilidade dos costumes e do
direito consuetudinário daqueles povos, sempre que compatíveis “com os direitos
fundamentais definidos pelo sistema jurídico nacional” e com “os direitos humanos
internacionalmente reconhecidos” (art. 8.º, § 2)13. Tendo em vista essa compatibilidade,
reconhece a possibilidade de aplicação das instituições penais próprias dos povos indígenas e
tribais na repressão aos delitos praticados pelos membros de suas comunidades. Não obstante
essa possibilidade estabelece que na hipótese de sujeição judicial de indivíduo sob acusação
de ato delituoso, deve-se levar em consideração os costumes de seu povo “a respeito do
assunto” (art. 9.º, § 2). E, na hipótese de aplicação de sanção penal pelo Estado, as suas
características econômicas, sociais e culturais, devendo-se ainda “dar preferência a tipos de
punição outros que o encarceramento” (art. 10, § 2).

               Ainda no capítulo “política geral” a Convenção exige dos Estados a proibição de
imposição aos membros desses povos, de prestação de serviços pessoais obrigatórios (art. 11);
a garantia de mecanismos de proteção contra a violação de direitos; a legitimidade para o
ingresso em procedimentos legais de defesa desses direitos, pessoalmente ou através de seus
organismos representativos; e a garantia de intérpretes ou outros meios eficazes de
comunicação e de compreensão em procedimentos legais (art. 12).

               Em relação aos demais capítulos, o texto convencional traz, em síntese, as
seguintes disposições normativas a serem observadas pelos Estados signatários:

               b) “Terras”.

               A Convenção trata da natureza dos direitos territoriais a serem reconhecidos aos
Povos Indígenas e Tribais (arts 13 e 14), da proteção e administração dos recursos naturais

     13
        Segundo MACKAY (1999:154.), “El Convenio no reconoce un derecho para crear sistemas legales autónomos
indígenas. Sin embargo, si una comunidad indígena creara su propio sistema legal autónomo, parecería que los arts. 7(1) y
8(2) requerirían que el Estado justificara cualquier interferencia con su existencia.(…) El requisito de conformidad con el
sistema jurídico nacional es desalentador ya que obstaculiza seriamente el desarrollo y funcionamiento efectivo de las
instituciones indígenas”.

                                                                                                                         12
existentes nas terras indígenas (art. 15), das possibilidades, condições e conseqüências do
translado das populações indígenas de suas terras (art. 16), das possibilidades e limites da
transmissibilidade dos direitos territoriais (art. 17), das sanções às violações dos direitos
territoriais (art. 18) e, por fim, dos direitos de ampliação territorial e de acesso a programas de
desenvolvimento econômico (art. 19).

               A respeito deste capítulo, vale anotar a observação de Mackay (1999:154), de que:

                               ... las disposiciones del Convenio n.º 169 sobre tierras, territorios y recursos han sido
                               criticadas justificadamente por los pueblos indígenas por ser inadecuadas. Sin
                               embargo, estas disposiciones contienen numerosas protecciones importantes,
                               además de las que se encuentran en el derecho internacional y en algunos sistemas
                               legales internos.

               Apesar da simples denominação de “terras” dada ao capítulo, a Convenção
trabalha com um conceito mais amplo, de territorialidade. Assim, explica que o termo “terras”
deverá “incluir o conceito de territórios, o que abrange a totalidade do habitat das regiões
que os povos interessados ocupam ou utilizam de alguma outra forma” (art. 13, § 2), ou seja,
não apenas o local de ocupação física efetiva e permanente, mas também aquele conjunto
ambiental, paisagístico, cultural e histórico que vincula territorialmente determinado povo14.

               Dois princípios apontados pela Convenção devem ser dotados na aplicação de
todo o capítulo relativo às terras indígenas. Primeiro o de que os Governos devem sempre
respeitar a importância da relação cultural, espiritual e coletiva que os povos indígenas e
tribais possuem com as terras que ocupam (art. 13, § 1); segundo, o princípio da não remoção
dos índios dessas terras (art. 16), a não ser em situações excepcionais e em que haja o seu
consentimento livre e com pleno conhecimento de causa (art. 16, § 2), garantido o direito de
retorno às terras terminadas as causas da remoção (art. 16, § 3).

               A Convenção orienta para o reconhecimento dos direitos de posse e de
propriedade sobre as terras tradicionalmente ocupadas, e para a necessidade de que seja
protegido, “nos casos apropriados” 15, o direito de utilização dos povos indígenas sobre terras
de ocupação tradicional também ocupadas por terceiros. Destaca, aí, a importância de uma
atenção especial à situação dos povos nômades e agricultores itinerantes (art. 14, § 1), a


   14
        MACKAY (1999:155) observa, contudo, que “esta definición está formulada en tiempo presente – ‘ocupan’ y
‘utilizan’ – y por tanto, no incluye reclamos históricos, o disputas sobre tierras y territorios, aunque podría abarcar a las
tierras recientemente ocupadas o utilizadas que los pueblos indígenas no estén ocupando actualmente o a las que se haya
denegado su acceso. Además, los pueblos indígenas no tienen que probar la ocupación inmemorial de tierras y territorios; es
suficiente que la ocupación sea reciente o actual.”
     15
        Para MACKAY (1999:156), “lo que significa exactamente ‘en los casos apropiados’ no está claro, aunque pueden
informar al respecto las estipulaciones sobre protección y fortalecimiento de las prácticas de subsistencia en el art. 23, y el
reconocimiento del control indígena sobre las tierras que ellos ‘utilizan’ (art. 7 (1)).”

                                                                                                                           13
necessidade de adoção de medidas de determinação de tais terras e de proteção efetiva dos
direitos sobre as mesmas (art. 14, § 2), e que sejam criados “procedimentos adequados”16 para
a solução das reivindicações territoriais dos povos indígenas (art. 14, § 3).

                No caso dos recursos naturais existentes nas terras indígenas, a Convenção
estabelece que a participação indígena na sua utilização, administração e conservação são
direitos a serem especialmente protegidos pelos Países (art. 15, § 1.º). Assim, orienta os
Governos a só autorizar a pesquisa ou a exploração dos recursos do subsolo (principalmente
minerais), após consulta antecipada aos povos afetados, avaliando-se os impactos que possam
sofrer com a exploração. Além disso, estabelece os direitos de participação desses povos,
                                      17
“sempre que for possível”                  , nos benefícios econômicos aí gerados, e de indenização por
danos decorrentes das mesmas atividades (art. 15, § 2.º).

                Em caso de remoção excepcional dos indígenas de suas terras, e não sendo
possível obter o seu consentimento, a Convenção determina que sejam seguidos
procedimentos específicos definidos pela legislação do País, que incluam consultas públicas
onde se garanta a participação de representação indígena (art. 16, § 4.º). Além disso, diante da
eventual impossibilidade de retorno às terras, a Convenção reconhece aos povos afetados
tanto o direito de compensação em terras de qualidade ao menos equivalente, quanto o direito
de indenização em dinheiro ou em bens (art. 16, § 5.º).

                A Convenção 169 também estabelece que os Países devam respeitar as formas
próprias de transmissão de direitos territoriais entre os membros da comunidade (art. 17, §
1.º), e até mesmo que os povos indígenas possam alienar tais direitos a terceiros, dependo de
consulta aos mesmos quanto a serem capazes para tal ato (art. 17, § 2.º)18. Diante disso,
determina que os Países adotem medidas que impeçam a terceiros de má-fé a utilização tanto
    16
       MACKAY (1999:156) considera que “no resulta satisfactorio que el único requisito sobre la adjudicación de
reclamos de tierras sea la existencia de ‘procedimientos adecuados’, debido sobre todo a la historia de abusos sobre los
derechos de tierras indígenas y los reclamos en las cortes nacionales que exigen procedimientos adecuados y garantías para
todos los que los preceden. Este requisito provee sin embargo los medios para cuestionar la validez de procedimientos de
reclamos de tierras en la Comisión de Expertos.”
    17
       O emprego desta condicionante pela Convenção é também objeto de dura crítica por Fergus MACKAY (1999:157):
“El Estado tiene el poder de ser el único en decidir el sentido de la frase ‘donde sea posible’. Esto significa básicamente que,
sujeto a una consulta de buena fe, el Estado puede decidir cuando los pueblos indígenas pueden compartir los beneficios de
la explotación de sus recursos en sus tierras. (…) Esta disposición es sin duda una de las más inadecuadas y cuestionables
del Convenio. No puede dar cuenta de los efectos devastadores que tienen las actividades de explotación de recursos en
muchos aspectos de la vida de los pueblos indígenas y su bienestar. No es una coincidencia que muchas de las peticiones
presentadas por los pueblos indígenas ante las instancias de reclamo a nivel internacional se refieran a violaciones de
derechos humanos directamente atribuibles a las llamadas actividades de desarrollo en sus territorios, o en lugares
aledaños. (…) resulta difícil ver cómo esta disposición se relaciona con el art. 13 (1), que requiere un reconocimiento y
respeto debido a la especial relación espiritual y cultural que los pueblos indígenas tienen con sus tierras y territorios.”
    18
       Conforme proposto pela Emenda n.º 1-CCJ ao Projeto de Decreto do Senado n.º 34/1993, que discutiu naquela Casa a
aprovação do texto da Convenção 169 da OIT, aprovou o Plenário em 19 de junho de 2002 a inaplicabilidade no Brasil, por
motivo constitucional, das possibilidades previstas na Convenção de propriedade das terras de ocupação tradicional pelos
Povos Indígenas e de sua alienação a terceiros.

                                                                                                                            14
dos costumes indígenas quanto do seu desconhecimento das leis, para se apropriarem ou
esbulharem a posse de tais terras (art. 17, § 3). Entre tais medidas estaria a previsão de
punições legais contra a invasão e o uso ilegal das terras indígenas por terceiros (art. 18).

            Ainda quanto aos direitos territoriais, a Convenção 169 da OIT determina que
sejam alocadas novas terras quando da insuficiência das disponíveis – inclusive em razão do
crescimento populacional (art. 19, “a”) – bem como que se garanta aos indígenas o acesso aos
meios necessários para o desenvolvimento das terras que já possuam (art. 19, “b”). Tais
necessidades deverão ser satisfeitas através dos programas agrários nacionais, “em condições
equivalentes às desfrutadas por outros setores da população” (art. 19, caput).

            c) “Contratação e condições de emprego”.

            Neste capítulo a Convenção 169 da OIT orienta os governos dos Estados
signatários a adotarem medidas especiais visando a proteção eficaz dos trabalhadores
pertencentes aos Povos Indígenas e Tribais, no sentido de se evitar o tratamento
discriminatório dos mesmos em relação aos trabalhadores em geral, especialmente quanto a:
acesso ao emprego, promoção e ascensão; igualdade de remuneração; assistência médica e
social, segurança e higiene no trabalho; seguridade social e demais benefícios; programas de
habitação; direito de associação, e de atividades sindicais; e direito a celebrar convênios
coletivos com empregadores ou com organizações patronais.

            Em relação aos “trabalhadores sazonais, eventuais e migrantes empregados na
agricultura ou em outras atividades, bem como os empregados por empreiteiros de mão-de-
obra” (art. 20, § 3, “a”), a Convenção determina que sejam adotadas medidas especiais
visando o acesso à mesma proteção conferida aos trabalhadores não-indígenas dessas
categorias e setores. Estabelece também que “sejam plenamente informados dos seus direitos
de acordo com a legislação trabalhista e dos recursos de que dispõem” (art. 20, § 3, “a”).

            As medidas especiais, ainda de acordo com a Convenção 169, devem ter em vista
a proteção dos trabalhadores indígenas contra condições de trabalho insalubres, sobretudo em
razão de “exposição a pesticidas ou a outras substâncias tóxicas” (art. 20, § 3,”b”); contra
“sistemas de contratação coercitivos, incluindo-se todas as formas de servidão por dívidas”
(art. 20, § 3, “c”); contra a discriminação em razão de gênero e contra o acossamento sexual.

            Por fim, o texto determina que os Países devam providenciar a criação de
“serviços adequados de inspeção do trabalho” (art. 20, § 4), com vistas ao monitoramento do
cumprimento da Convenção em relação a este capítulo em específico.

                                                                                                15
d) “Indústrias rurais”.

            Aqui a Convenção 169 trata de medidas básicas a serem implementadas pelos
Estados signatários quanto ao desenvolvimento, pelos povos indígenas, de atividades
econômicas sejam especializadas, sejam tradicionais. O texto enfatiza inicialmente o direito
de acesso dos povos indígenas aos meios de formação profissional “pelo menos iguais
àqueles dos demais cidadãos” (art. 21). Neste sentido, vê como necessária a adoção de
medidas de incentivo à participação voluntária de indígenas em programas de formação
profissional de aplicação geral. Contudo, determina que devam ser colocados à disposição dos
indígenas, com a participação de seus Povos, “programas e meios especiais de formação”
profissional, que atendam as “necessidades especiais” destes, e que estejam baseados “no
entorno econômico, nas condições sociais e culturais e nas necessidades concretas dos povos
interessados” (art. 22, §§ 2 e 3).

            Por outro lado a Convenção 169 estabelece que os Estados reconheçam como
“fatores importantes da manutenção da cultura, da autosuficiência e do desenvolvimento
econômico dos povos indígenas”, a serem fortalecidas e fomentadas com a participação destes
povos, atividades como “o artesanato, as indústrias rurais e comunitárias e as atividades
tradicionais e relacionadas com a economia de subsistência, tais como a caça, a pesca com
armadilhas e a colheita” (art. 23, § 1).

            Coloca, por fim, a necessidade de que os Estados, ao prestarem assistência técnica
e financeira, levem “em conta as técnicas tradicionais e as características culturais desses
povos e a importância do desenvolvimento sustentado e eqüitativo” (art. 23, § 2).

            e) “Seguridade social e saúde”.

            Primeiramente, estabelece a Convenção que os benefícios da seguridade social
assegurados à população em geral devam estar também postos à disposição dos povos
indígenas, sem discriminação. Em seguida, afirma que os Povos Indígenas e Tribais devem
gozar, nos Estados onde residam, de um “nível máximo possível de saúde física e mental”,
seja através de serviços em saúde “adequados” a serem prestados diretamente pelos Estados,
seja através da garantia, por estes, dos meios que permitam aos povos indígenas “organizar e
prestar tais serviços sob a sua própria responsabilidade e controle” (art. 25, § 1).

            A Convenção determina a priorização da organização dos serviços em saúde no
“nível comunitário”, a garantia da participação dos Povos Indígenas e Tribais no seu
“planejamento e administração”, e a necessidade de que em tais serviços sejam consideradas

                                                                                           16
as “condições econômicas, geográficas, sociais e culturais” indígenas, bem como “seus
métodos de prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais” (art. 25, § 2). Orienta
também para que o sistema de assistência sanitária dê prioridade ao “atendimento primário à
saúde”, e à formação e emprego de agentes pertencentes às próprias comunidades,
garantindo-se, porém, a existência de “estreitos vínculos com os demais níveis de assistência
sanitária” (art. 25, § 3). Por fim, estabelece a necessidade de coordenação das ações em saúde
com “as demais medidas econômicas e culturais que sejam adotadas no país” (art. 25, § 4).

           f) “Educação e meios de comunicação”.

           Aqui a Convenção 169 inicia orientando os Estados signatários a possibilitarem
aos povos indígenas o acesso a todos os níveis da educação escolar, “pelo menos em
condições de igualdade com o restante da comunidade nacional” (art. 26). Prevê também a
oferta de uma educação escolar indígena específica através de dois planos. O primeiro, no
âmbito dos próprios Estados, através de programas específicos a serem desenvolvidos e
aplicados com a participação indígena, e que tenham por objetivo “responder às suas
necessidades particulares”, devendo “abranger a sua história, seus conhecimentos e
técnicas, seus sistemas de valores e todas suas demais aspirações sociais, econômicas e
culturais” (art. 27, §1). E o segundo, no âmbito de “instituições e meios de educação”
criados pelos próprios povos beneficiários, devendo estes considerar as “normas mínimas
estabelecidas pela autoridade competente em consulta com esses povos” (art. 27, § 3).

           Referindo-se à educação infantil, a Convenção estabelece como objetivo a
transmissão de “conhecimentos gerais e aptidões que lhes permitam participar plenamente e
em condições de igualdade na vida de sua própria comunidade e na da comunidade
nacional” (art. 29). Pautando pela necessidade de preservação das línguas indígenas, o texto
convencional estabelece o objetivo da alfabetização dos alunos indígenas na língua materna
de suas comunidades, garantindo-se também a adoção de medidas destinadas ao aprendizado
e domínio “da língua nacional ou uma das línguas oficiais do país” (art. 28, §2).

           Também no plano educacional a Convenção 169 da OIT inclui como obrigação
dos Estados a adoção de medidas visando assegurar aos Povos Indígenas e Tribais o
conhecimento de seus direitos e obrigações quanto às relações de trabalho, atividades
econômicas, educação, saúde, serviços sociais e direitos derivados do próprio texto
convencional, seja através de traduções escritas, seja através da “utilização dos meios de
comunicação de massa nas línguas desses povos” (art. 30, §2).


                                                                                           17
Por fim, ainda no capítulo “Educação e meios de comunicação” o texto
convencional orienta os Estados a adotarem medidas educativas de eliminação dos
preconceitos dos diversos setores sociais contra os Povos Indígenas e Tribais, sobretudo
através dos livros de História e demais materiais didáticos.

                g) “Contatos e cooperação através das fronteiras”.

                O tema, ausente na Convenção 107, emergiu a partir da crescente visibilidade das
insatisfações de povos indígenas divididos geograficamente em razão do estabelecimento das
fronteiras nacionais. A Convenção revisora estabelece que os Estados devam assegurar a estes
povos, medidas tais como acordos ou tratados, que lhes possibilitem o trânsito através das
fronteiras, a fim de que venham a ser estabelecidas ou mantidas as relações internas entre
comunidades e indivíduos, sejam do mesmo povo ou de povos distintos, para o
desenvolvimento de atividades de âmbito econômico, social, cultural, espiritual e ambiental.

                Trata-se de determinação relevante dada a quantidade de povos que vivenciam a
realidade transfronteiriça, a exemplo dos Guarani – separados pelas fronteiras entre
Argentina, Brasil, Bolívia e Paraguai, dos Yanomami – vivendo entre o Brasil e a Venezuela,
dos Mohawk – entre os EUA e o Canadá, dos Karen – entre as fronteiras da Tailândia e
Myanmar, dos Kuna – entre Colômbia e Panamá, dos San – divididos pelas fronteiras de
Botswana, Namíbia e África do Sul, e tantos outros. Muitas atividades de interesse comum a
tais povos têm sido embaraçadas em razão da desconsideração, pelos sistemas de proteção das
fronteiras internacionais, a tais realidades específicas.

                Cabe observar como exemplos de mecanismos interfronteiriços possíveis aqueles
que têm possibilitado o desenvolvimento das atividades de interesse comum de um mesmo
povo indígena, como o caso dos Inuit19, habitantes tradicionais do Círculo Polar Ártico que
engloba o Alaska (EUA), norte do Canadá, Groenlândia e Chukotka (Rússia), reunidos em
torno da Conferência Circumpolar Inuit, e dos Sámi20, divididos entre as fronteiras da
Finlândia, Noruega, Rússia e Suécia, que se articulam através do Conselho Sámi. Note-se

    19
       Denominados pejorativamente pelos colonizadores como “esquimó” ou “comedores de carne crua”, os Inuit, que hoje
somam cerca de 150 mil indígenas, encontram-se desde 1977 articulados em torno da Conferência Circumpolar Inuit (ICC),
organização não-governamental internacional, voltada para a promoção da unidade de sua identidade própria em termos de
cultura, língua materna (o Inuktitut), modo de vida tradicional, e garantia de direitos no plano internacional. Para informações
sobre a Inuit Circumpolar Conference (ICC), consultar a Web Site nos endereços < http://www.inuit.org/ > e <
http://www.inuitcircumpolar.com/ >.
    20
       Os Sámi consistem em aproximadamente 133 mil indígenas, habitantes tradicionais da região onde hoje se constituem
04 países: Finlândia, Noruega, Rússia e Suécia. Desde 1957 os interesses comuns às comunidades Sámi são articulados pelo
Conselho Nórdico Sámi, organização não-governamental internacional, com atuação nos territórios daqueles quatro países,
onde busca a promoção dos direitos e interesses do Povo Sámi, a consolidação do sentimento de afinidade daquele povo, o
reconhecimento de sua identidade nacional e manutenção de seus direitos sociais, econômicos e culturais. Para mais
informações sobre o Conselho Nórdico Sámi, consultar < http://www.saamicouncil.net/?deptid=1113 >.

                                                                                                                            18
ainda, ao longo dos anos, o surgimento de organizações de povos indígenas diversos com
interesses regionais comuns, a exemplo da Coordenação das Organizações Indígenas da
Cuenca Amazônica (Coica), que articula nove organizações indígenas regionais da bacia
amazônica, situadas no Brasil, Equador, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Suriname, Peru
e Venezuela21, e, mais recentemente (2006), a Coordenação Andina de Organizações
Indígenas (CAOI), integrada por organizações do Equador, Bolívia, Peru e Colômbia.

              h) “Administração”.

              Aqui a Convenção determina aos Estados signatários que garantam a existência de
instituições governamentais específicas e devidamente aparelhadas para “administrar os
programas que afetam os povos interessados” (art. 33, §1). Diferentemente da Convenção
107, a 169 determina que se garanta a participação dos povos indígenas no “planejamento,
coordenação, execução e avaliação” de tais programas no âmbito administrativo (art. 33, §
2.º, ”a”.). Estabelece também o direito de participação indígena tanto na formulação de
propostas legislativas, quanto no controle da aplicação das medidas legislativas adotadas.

              i) “Disposições gerais”.

              A Convenção reconhece a necessidade de flexibilidade, ou seja, que na adoção
das medidas previstas leve-se em consideração “as condições próprias de cada país” (art.
34), e que a sua aplicação não revista em prejuízo aos direitos já garantidos aos Povos
Indígenas e Tribais através de “outras convenções e recomendações, instrumentos
internacionais, tratados, ou leis, laudos, costumes ou acordos nacionais” (art. 35).

              j) “Disposições finais”.

              Neste nono e último capítulo a Convenção 169 dispõe sobre os trâmites
específicos a serem adotados pelos países-membros e pelo Diretor-Geral do Secretariado
Internacional do Trabalho a fim de que a Convenção possa entrar em vigor nos respectivos
países, possa ser pelos mesmos denunciada, ou ainda objeto de revisão, total ou parcial, pela
Conferência Geral da Organização. Reconhece a OIT situações em que:

                             Tal vez el poder legislativo tenga que adoptar los tratados para que pasen a formar
                             parte de la legislación nacional. En consecuencia, sería de desear que la aprobación
                             estuviese a cargo del parlamento u otro órgano legislativo. Una vez obtenida tal
                             aprobación, el poder ejecutivo del país (el gobierno) también deberá aprobar el
                             instrumento. (OIT, 2003:71.)



    21
       Para mais informações sobre a Coordinadora de las Organizaciones Indígenas de la Cuenca Amazônica (COICA), vide
< http://www.coica.org.ec/ >.

                                                                                                                   19
No caso do Brasil, como veremos adiante, o texto da Convenção 169 foi
submetido ao Congresso Nacional, onde após uma longa e exaustiva tramitação foi aprovado
através do Decreto Legislativo n.º 143/02. A Promulgação pelo Presidente da República,
porém, só foi efetuada mais de um ano após o Registro formal da Ratificação, em Genebra.

               Outro aspecto importante a ser considerado é quanto à faculdade de denúncia de
que dispõem os países. Segundo o art. 39, a denúncia só poder ser utilizada ao final de um
período mínimo de dez anos de vigência no Estado Membro. Uma vez efetuada, há ainda o
período de um ano para que os seus efeitos se produzam. Findo este prazo de um ano após o
decênio de vigência, sem que o país haja efetuado a denúncia, fica automaticamente renovada
a ratificação por outro decênio, findo o qual é possível ao Estado proceder da mesma forma
que no período anterior (denúncia após um ano ou renovação automática).

               A Convenção 169 da OIT permanecerá aberta a ratificações pelos países-membros
da Organização, até a data da entrada em vigor de uma eventual convenção revisora (art. 43).
A necessidade e conveniência de tal revisão poderá ser encaminhada pelo Conselho de
Administração do Secretariado da OIT junto à Conferência Geral do Trabalho, após avaliação
sobre o andamento da aplicação da Convenção 169 (art. 42).

               3.2. Supervisão e Controle de aplicação

               a) Instrumentos Disponíveis

               As normas Internacionais e Convênios adotados pela OIT têm a sua aplicação
supervisionada e controlada por um sistema interno. Conforme Kreimer (1999:20), a OIT “no
                                                                                                  22
creó ningún mecanismo independiente para estimular su cumplimiento”                                    . O sistema
processa-se mediante a apresentação de instrumentos escritos, todos previstos na Constituição
da OIT, consistentes em: (a) “Memórias” periódicas ou relatos dos Estados Membros acerca
do cumprimento da Convenção ratificada (arts. 22 e 23); (b) “Reclamações” de entidades
patronais ou de empregados acerca do cumprimento insatisfatório das convenções pelos
Estados Membros (arts. 24 e 25); (c) “Queixas” de Estados Membros, de delegado da
Conferência Internacional do Trabalho ou do próprio Conselho da Administração (art. 26); ou
(d) pedidos de “Interpretação” por governos quanto a dúvidas sobre o significado de termos
de alguma Convenção ou Recomendação (art. 37-1).




  22
       Kreimer atua, desde 1989, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da OEA.

                                                                                                               20
No caso das “Memórias”, são previstos dois prazos para a sua apresentação pelos
Governos: a) anualmente, no caso das oito Convenções declaradas pela OIT como
fundamentais23; e b) a cada cinco anos, quando se trate das demais Convenções.

               Conforme o art. 22 da Constituição da OIT, a forma e os itens a serem objeto de
relato avaliativo pelos Governos devem ser aqueles previstos pelo Conselho de Administração
da Organização, através dos denominados “Formulários de Memória”, especificamente
aprovados para cada Convenção em particular. O Formulário relativo à Convenção 169 sobre
Povos Indígenas e Tribais foi aprovado pelo Conselho de Administração da OIT em 1990, e
compõe-se de 65 itens que devem ser objeto de resposta pelos Governos.

               Em conformidade com a estrutura tripartite da Organização, estabelece a
Constituição da OIT (art. 23, § 2.º) que os Governos devem enviar cópias das Memórias às
organizações representativas dos trabalhadores e dos empregadores. Mas não prevê que tais
cópias sejam também enviadas às representações dos povos indígenas ou tribais, nem que
estes sejam consultados pelos Governos quando da redação de suas Memórias. Contudo, o
item VIII do Formulário de Memória relativo à Convenção 169 sugere-se expressamente aos
Governos que, ao elaborarem suas Memórias, o façam consultando tais povos 24.

               As Memórias periódicas enviadas pelos Governos são apresentadas perante a
Comissão de Peritos em Aplicação de Convenções e Recomendações. Trata-se de um
colegiado formado por 20 especialistas independentes, com atuação no campo jurídico e
social, que se reúne anualmente para examinar as Memórias. Os resultados de tais exames são
objeto de publicação em um Informe específico (“Informe III - Parte 1A”)25.

   23
        A Organização Internacional do Trabalho declara como fundamentais as seguintes Convenções: n.º 29 (1930) que
dispõe sobre a eliminação do trabalho forçoso ou obrigatório; n.º 87 (1948) que estabelece o direito de livre organização a
trabalhadores e empregadores; n.º 98 (1949) que trata dos direitos sindicais e de negociação coletiva; n.º 100 (1951) que trata
da igualdade de remuneração entre homens e mulheres; n.º 105 (1957) sobre abolição do trabalho forçoso; n.º 111 (1958)
sobre eliminação de toda discriminação em matéria de emprego e ocupação; n.º 138 (1973) sobre a abolição do trabalho
infantil; e n.º 182 (1999) sobre a eliminação das piores formas de trabalho infantil.
     24
        “Aunque no es requisito indispensable, el Governo puede considerar provechoso consultar a las organizações de los
pueblos indígenas y tribales del país, a través de sus instituciones tradicionales en el caso de que existan, acerca d e las
medidas tomadas para dar efecto al presente Convenio, y asimismo cuando prepare las memorias relativas a su aplicación.
(...)”. Formulario de Memória relativo al Convenio sobre Pueblos Indígenas y Tribales, 1989 (n.º 169) Parte IX –
Disposiciones Generales, p. 11. Disponível em: < http://www.ilo.org/ilolex/spanish/reportforms/pdf/22s169.pdf > (Acesso
em: 25.mai.2009).
     25
        No recente relatório, apresentado em 2009, a Comissão de Peritos concluiu de modo geral que “en el mercado de
trabajo persisten las desigualdades basadas en la etnia así como prácticas discriminatorias contra los pueblos indígenas y
tribales, los miembros de las minorías étnicas y los trabajadores migrantes. La discriminación basada en la casta sigue
siendo muy frecuente en una serie de países. Las mujeres que pertenecen a esos grupos a menudo son
desproporcionadamente vulnerables a la discriminación. La Comisión toma nota de que para que los procesos de desarrollo
tengan éxito y para alcanzar la justicia social para todos, es indispensable luchar contra la discriminación que afecta a esos
grupos, y contra las desigualdades de las que son víctimas en lo que respecta la formación, la educación y el empleo,
especialmente en el contexto actual de resurgimiento del racismo y la intolerancia, incluida la intolerancia religiosa”.
Especificamente em relação ao cumprimento da Convenção 169, a Comissão avalia como um dos pontos mais problemáticos
a não implementação das consultas às comunidades indígenas: “el establecimiento de mecanismos apropiados y eficaces

                                                                                                                            21
Além de ensejar a apresentação das Memórias quinquenais exigidas dos Estados
que a ratificaram, a Convenção 169 é passível também do oferecimento de “Reclamações”
pelas organizações patronais ou de trabalhadores. Neste caso, constitui-se um comitê tripartite
formado por membros do Conselho de Administração, cabendo ao comitê proceder ao exame
da reclamação, e devolução do caso ao Conselho de Administração, para adoção de
conclusões. O informe do comitê acerca da Reclamação é então tornado público, devendo a
Comissão de Peritos, a partir das Conclusões do Conselho de Administração, dar seguimento
ao diálogo com o governo em questão para a solução do caso. Até o momento somam 106 as
reclamações apresentadas, das quais 15 são relativas ao cumprimento da Convenção 16926.

               No caso do procedimento de “Queixa” previsto no art. 26 da Constituição da OIT,
não há registro, até o momento, de que tenha sido utilizado seja em relação à Convenção 107,
seja em relação à Convenção 169.

               Quanto às “Interpretações” que podem ser solicitadas pelos Estados Membros
acerca do teor das Convenções ou de Recomendações OIT, têm o seu locus próprio de
resolução na Corte Internacional de Justiça, em Haia (37-1 da Constituição da OIT). Na
prática, as dúvidas dos Estados têm sido levadas diretamente à própria OIT, cuja opinião,
quando necessita ser dada formalmente, é publicada em Boletim Oficial através de
Memorando, ou através de carta não publicada, ao governo que requereu a interpretação.

               Ainda no que diz respeito ao sistema de supervisão e controle de aplicação,
importa destacar a observação de Kreimer (1999:21) acerca da possibilidade de apresentação,
perante os sistemas de proteção de direitos humanos da OEA ou da ONU, de casos de
violações à Convenção:


para la consulta y participación de los pueblos indígenas y tribales en relación con las cuestiones que les conciernen es la
piedra angular del Convenio, aunque sigue siendo uno de los principales desafíos que plantea la aplicación del Convenio en
una serie de países. Debido a los grandes retos a los que actualmente tienen que hacer frente los pueblos indígenas y
tribales, incluidos la regularización de la propiedad de la tierra, la salud, la educación, y el aumento de la explotación de
los recursos naturales, la participación de los pueblos indígenas y tribales en estos y otros ámbitos que les afectan
directamente, es un elemento fundamental para garantizar la equidad y la paz social a través de la inclusión y el diálogo”
(CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DEL TRABAJO, Informe General – 98ª Reunion : 34 e 731).
Disponível em: < http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---ed_norm/---relconf/documents/meetingdocument/
wcms_103488.pdf > (Acesso em: 25.maio.2009).
    26
       Segundo dados da Web Site da OIT (http://www.ilo.org/ilolex/english/repframeE.htm), as Reclamações por
descumprimento da Convenção foram apresentadas contra a Argentina (uma reclamação, pela Unión de Trabajadores de la
Educación de Río Negro), Bolívia (uma, pela Central Obrera Boliviana), Brasil (uma, pelo Sindicato de Engenheiros do DF),
Colômbia (duas, pela Central Unitária de Trabajadores e pela Asociación Médica Sindical Colombiana), Dinamarca (uma,
pela Confederação Nacional de Sindicatos da Groenlândia), Ecuador (uma, pela Confederación Ecuatoriana de
Organizaciones Sindicales Libres), Guatemala (uma, pela Federación de Trabajadores del Campo y la Ciudad), México (seis
reclamações, pelas seguintes organizações: Sindicato de Trabajadores de la Industria Metálica, Acero, Hierro, Conexos y
Similares, Sindicato de Trabajadores de la Universidad Autónoma de México, Sindicato Independiente de Trabajadores de la
Jornada, Sindicato de Académicos del Instituto Nacional de Antropología e Historia, Frente Auténtico del Trabajo, Sindicato
Radical de Trabajadores del Metal y Similares, e Sindicato Nacional de Trabajadores de la Educación) e Peru (uma, pela
Confederación General de Trabajadores del Perú). (Acesso em: 25.maio.2009).

                                                                                                                         22
Estos organismos pueden analizar comunicaciones alegando violaciones al
                              Convenio 169, cuando dichas situaciones se conectan o son componente de
                              violaciones a los derechos reconocidos en los instrumentos interamericanos (e.g. la
                              Declaración y Convención Americana sobre Derechos Humanos). En efecto, el
                              Convenio 169 ha sido explícitamente definido por la propia OIT y por las Naciones
                              Unidas como un convenio de derechos humanos, y por consiguiente es de aplicación
                              por los mecanismos de derechos humanos de las Naciones Unidas, y los de la OEA.


               b) Possibilidades de Participação.

               Em razão da estrutura tripartite da OIT, a participação no sistema de supervisão e
controle da aplicação das suas normas e convenções é garantida unicamente aos governos e
representantes patronais e laborais. Mesmo no caso específico da Convenção 169, não há
hipótese prevista de assento oficial dos povos indígenas na estrutura da organização, nem de
utilização, em nome próprio, dos instrumentos acima mencionados.

               Há, contudo, a possibilidade de outras formas de participação por parte dos povos
beneficiários. A primeira, através do envio de “informações” à OIT, seja através das
organizações ou laborais ou patronais, seja em nome próprio dos povos indígenas e tribais.

               A segunda forma possível de participação se dá através da presença em reuniões
da OIT: a) como representantes de um dos membros da estrutura tripartite (governos,
empregadores ou trabalhadores); e b) como representantes das Organizações Não-
Governamentais Internacionais credenciadas na “Lista Especial” da OIT. Tal lista é formada
por cerca de 160 ONGs Internacionais, de todos os continentes27, entre as quais figuram a
Anistia Internacional (IA), a Associação mundial de juristas (WJA), a Cáritas Internacional, o
Centro Internacional para os Direitos Humanos e Desenvolvimento Democrático (ICHRDD),
a Comissão Internacional de Juristas (ICJ), o Conselho Mundial de Igrejas (WCC), a
Cooperação Internacional para o Desenvolvimento e a Solidariedade (CIDSE), e a Survival
International, entre outras. Na mesma qualidade de ONG’s Internacionais estão também na
lista especial da OIT o Conselho Nórdico Sáme, a Associação Indígena Mundial, o Grupo
Internacional de Trabalho sobre Assuntos Indígenas (IWGIA) e o Conselho Mundial dos
Povos Indígenas (WCIP).

               Acerca de tais canais de interlocução, vale lembrar a observação de Mackay (item
3.1), da importância da participação dos povos indígenas, sobretudo junto à Comissão de
Peritos, a fim de assegurar a interpretação mais favorável das normas da Convenção.

4. O Brasil e a Convenção 169.

    27
       Relação das ONGs Internacionais presentes na Lista Especial da OIT disponível in: <
http://www.ilo.org/public/spanish/bureau/exrel/civil/ngo/index.htm > (Acesso em: 30.maio.2009).

                                                                                                              23
4.1. O processo de ratificação.

               No Brasil, a discussão em torno da ratificação da Convenção 169 consumiu nove
anos a mais do que o total de três utilizado para a sua formulação, análise e aprovação pela
Conferência-Geral da OIT.

               Em 1991, no âmbito do Executivo Federal, o texto foi analisado por uma
Comissão Tripartite, que concluiu inexistirem obstáculos jurídicos à sua ratificação. Assim,
em 16 de julho daquele ano o então Presidente Collor de Mello enviou ao Congresso Nacional
a Mensagem n.º 367, submetendo ao Legislativo a apreciação da matéria.

               Só em 24 de março de 1993 a Comissão de Relações Exteriores da Câmara
aprovou a Mensagem, por unanimidade, nos termos do Parecer do Relator, Deputado Luiz
Ghushiken (PT/SP), resultando daí a proposição do Projeto de Decreto Legislativo (PDC)
n.º 237/93. Em 14 de abril daquele ano, acolhendo-se o Parecer do Relator Deputado Fábio
Feldman (PSDB/SP), o PDC 237/93, recebeu aprovação unânime da Comissão de Defesa do
Consumidor, Meio Ambiente e Minorias. Na seqüência, em 30 de junho, foi também
aprovado por unanimidade pela Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ),
conforme parecer do Deputado Átila Lins (PPS/AM). Submetido ao Plenário da Câmara, o
PDC 237/93 foi aprovado em turno único na sessão de 17 de agosto de 1993. Dias depois, em
25 de agosto, o PDC foi remetido ao Senado Federal, onde se transformou no Projeto de
Decreto do Senado (PDS) n.º 34/93. Daí em diante, o texto da Convenção 169 enfrentou os
mais diversos obstáculos para a sua aprovação.

               Submetido inicialmente à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, o
PDS 34/93 foi aprovado, em 11 de maio de 1994, conforme parecer do então Senador Jarbas
Passarinho (PFL/PA). Enviado em seguida à apreciação da Comissão de Constituição, Justiça
e Cidadania (CCJC), foi novamente aprovado, em 20 de setembro de 1995, conforme parecer
do Senador Romero Jucá (PSDB/RR). Contudo, poucos dias depois, argumentando haverem
“novas ponderações” por parte do Governo Federal, o Senador por Roraima apresentou o
Requerimento n.º 1.304 / 199528 (aprovado em 04.10.95) solicitando reexame da Convenção
por ambas as Comissões do Senado (CCJ e CRE) onde o texto já havia sido aprovado.

               Retornando à CCJC, o texto da Convenção 169 da OIT recebeu em 18 de abril de
1996, parecer contrário do Relator, Senador Bernardo Cabral (PFL/AM), e os votos em

   28
       “Justificação. Tendo em vista divergência e a lacuna existente entre os pareceres da CRE e CCJ com relação aos
artigos 14, 16, 17, e 32 da Convenção n.º 169 e pela CCJ para que possa analisar com maior profundidade dos artigos
mencionados. – Senador Romero Jucá”.

                                                                                                                        24
separado da Senadora Benedita da Silva (PT/RJ) e do Senador Artur da Távola (PSDB/SP),
ambos pela sua aprovação.

           Em 16 de março de 1999, antes de uma manifestação final da CCJC, o PDS 34/93
foi retirado de pauta a requerimento do Relator Bernardo Cabral e enviado à Comissão de
Relações Exteriores e Defesa Nacional. Na CRE, em 26 de maio de 1999, o Projeto obteve
voto favorável do Relator, Senador Tião Viana (PT/AC), por representar “um grande avanço
do Governo brasileiro no sentido de assegurar às populações indígenas do Brasil o efetivo
direito à integridade, à cidadania e ao desenvolvimento moral, cultural e econômico.”
Seguindo o voto do Relator, a Comissão aprovou o Projeto, apesar das abstenções dos
senadores Mozarildo Cavalcanti (PFL/RR) e Lúdio Coelho (PSDB/MS).

           Em 06 de dezembro de 2000 o PDS 34/93 finalmente recebeu a aprovação da
Comissão de Constituição e Justiça do Senado, acatando-se o parecer do Relator, Senador
Romeu Tuma (PFL/SP), que se reportou ao “forte teor humanista” da Convenção, ao fato de
reafirmar “princípios éticos estabelecidos pela Carta Magna” Brasileira, e de reconhecer aos
índios “parcela de responsabilidade e de direito que lhe cabe no projeto nacional”. Atribuiu,
por fim, à Convenção em relação aos povos indígenas, “importância comparável àquela
atribuída à Declaração Universal dos Direitos do Homem”. Na ocasião aprovou-se também a
Emenda n.º 1 – CCJ, pela qual foram introduzidos ao PDS 34/1993 mais dois artigos: o
primeiro (art. 2.º), informando que "no caso do Brasil, a expressão ‘procedimentos
adequados estabelecidos pela legislação nacional’, (...) refere-se às disposições do art. 231,
caput e § 5º da Constituição Federal”. O Segundo (art. 3.º), esclarecendo a inaplicabilidade,
no caso do Brasil, “em face do estabelecido nos arts. 20, inciso XI e 231, § 2.º da
Constituição Federal”, da previsão de direitos de propriedade dos indígenas sobre as terras
tradicionalmente ocupadas e de sua alienação para fora da comunidade.

           O PDS 34/1993 foi então enviado ao Plenário do Senado, onde só foi submetido a
votação no dia 19 de junho de 2002, quando foi aprovado, juntamente com a Emenda n.º 1 -
CCJ. No dia seguinte foi editado o Decreto Legislativo n.º 143, de 20 de junho de 2002, que
aprovou os termos da Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais em Países
Independentes. Em 25 de julho daquele ano o Governo Brasileiro efetuou registro do
instrumento de ratificação junto ao Diretor-Geral do Secretariado Internacional do Trabalho
da OIT, em Genebra. Nos termos do art. 38 da Convenção 169, o seu cumprimento
obrigatório pelo País ocorreria um ano após este registro, ou seja, em 25 de julho de 2003.
Contudo, foi apenas quase nove meses após esta data, em 19 de abril de 2004, que a

                                                                                           25
Convenção veio a ser promulgada pelo Presidente da República, com a edição do Decreto n.º
5.051, publicado no DOU em 20.04.2004.

                   Os Passos para a Aprovação da Convenção 169 da OIT pelo Brasil
16.07.1991   Mensagem (n.º 367) do Presidente da República ao Congresso Nacional.
24.03.1993   Aprovação da Mensagem pela Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Início da tramitação do Projeto de Decreto
             Legislativo da Câmara (PDC) n.º 237/93.
14.04.1993   Aprovação do PDC 237/93 na Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias.
30.06.1993   Aprovação do PDC 237/93 na Comissão de Constituição, Justiça e Redação.
17.08.1993   Aprovação do PDC n.º 237/93 no Plenário da Câmara.
25.08.1993   Remessa ao Senado. Transformação em PDS n.º 34/93.
11.05.1994   Aprovação do PDS 34/93 pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE)
20.09.1995   Aprovação do PDS 34/93 pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ)
04.10.1995   Aprovação do requerimento n.º 1.304 / 1995, do Senador Romero Jucá, pelo reexame do PDS 34/93 na CRE e na CCJ.
18.04.1996   Parecer do Relator Bernardo Cabral (CCJ), contrário à aprovação do PDS 34/93.
             Votos em separado dos Senadores Benedita da Silva e Artur da Távola, pela aprovação do PDS 34/93
16.03.1999   Relator Bernardo Cabral retira o PDS 34/93 da pauta de votações da CCJ e o envia à CRE.
25.05.1999   Aprovação do PDS 34/93 pela CRE.
26.12.2000   Aprovação do PDS 34/93 pela CCJ.
19.06.2002   Aprovação do PDS 34/93 pelo Plenário do Senado Federal
20.06.2002   Edição do Decreto Legislativo n.º 143, aprovando o texto da Convenção 169 da OIT.
25.07.2002   Registro da Ratificação pelo Governo Brasileiro, em Genebra.
25.07.2003   Início do prazo p/ cumprimento obrigatório (art.38 da Convenção 169)
19.04.2004   Promulgação da Convenção 169 pelo Presidente da República (Dec. 5.051, de 19.04.2004)
20.04.2004   Publicação do Dec. 5.051 no Diário Oficial da União.


               4.2. Significado da Convenção 169 da OIT no Marco Constitucional
Brasileiro de 1988.
               Promulgada em 06 de outubro de 1988, a atual Constituição Federal Brasileira
antecede em oito meses a adoção, pela Conferência Internacional do Trabalho, do texto da
Convenção 169 da OIT. Comparando-se o teor de ambos os textos, não é difícil perceber que
as propostas que resultaram no Texto Constitucional de 1988 em matéria de direitos indígenas
revelaram estar, em muitos aspectos, em estreita sintonia com as avançadas discussões que
pautaram a definição do texto da Convenção 169, adotado meses depois.

               Este fato evidencia, sem sombra de dúvidas, que tanto a Carta Constitucional
brasileira de 1988 quanto a Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais
refletiram, ao mesmo tempo e de modo bastante expressivo, as fortes influências de um
movimento indígena cada vez mais presente nos fóruns nacionais e internacionais de
discussão, bem como as contribuições cada vez mais qualificadas dos segmentos indigenistas,



                                                                                                                                26
com suporte num conhecimento profundo da realidade indígena e alinhado aos mais
avançados conceitos e análises de cunho antropológico.

            Assim, ao ser adotado em 1989 pela Conferência Internacional do Trabalho, o
texto da Convenção 169 não trouxe nenhum avanço ou impacto realmente significante em
relação ao que já havia sido adotado pelo Constituinte Originário brasileiro de 1988. Como
observa Marco Antônio Barbosa (2001:227), verbis,

               Frente ao direito brasileiro, relativo às populações indígenas, a Convenção 169, grosso modo,
               não apresenta grandes inovações, posto que não podemos nos esquecer da Constituição
               brasileira de 1988 que ultrapassou os pontos mais criticados da antiga Convenção 107 e agora
               também superados pela Convenção 169 (...). A Constituição brasileira antes mesmo da
               Convenção em apreço já extirpara de nosso sistema jurídico objetivos injustos, inatingíveis e
               indesejáveis pelas populações indígenas, como por exemplo a sua assimilação.

            Assim, pode se dizer que os avanços políticos verificados no âmbito da
elaboração da Convenção 169 ocorreram de modo concomitante àqueles que ensejaram a
aprovação das disposições relativas aos povos indígenas na Constituição Brasileira de 1988.
Esta sintonia entre o conteúdo da Convenção revisional e o Texto Constitucional brasileiro de
1988 correspondente aos direitos indígenas, pode ser percebida em diversas passagens.

            Veja-se inicialmente quanto aos direitos culturais, sociais, políticos e
econômicos. A Convenção estabelece que os Estados devam: reconhecer e proteger “os
valores e práticas sociais, culturais religiosos e espirituais próprios dos povos” indígenas;
considerar a natureza não apenas individual, mas também coletiva de seus problemas;
respeitar-lhes a “integridade dos valores, práticas e instituições” (art. 5.º); consultá-los
através de suas “instituições representativas” (art. 6.º, “a”); reconhecer-lhes o “direito de
escolher suas próprias prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento, na
medida em que ele afete a suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual” (art. 7.º§1);
avaliar “a incidência social, espiritual e cultural” que possam sofrer com atividades de
desenvolvimento (art. 7.º, §3); considerar, na aplicação da legislação nacional, “seus costumes
ou seu direito consuetudinário” (art. 8.º, §1); levar em conta, no atendimento à saúde, “as
suas condições econômicas, geográficas, sociais e culturais, bem como os seus métodos de
prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais” (art. 25, §2). São disposições
contempladas pela Constituição Federal de 1988, quando afirma que “são reconhecidos aos
índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, (…), competindo à
União (…), proteger e fazer respeitar todos os seus bens” (CF/88, art. 231, caput.).

            Ainda relativamente aos direitos de ordem cultural, a Convenção 169 da OIT
dispõe que os programas em educação para os povos indígenas e tribais “deverão abranger a
                                                                                                         27
sua história, seus conhecimentos e técnicas, seus sistemas de valores e todas suas demais
aspirações sociais, econômicas e culturais” (art. 27, §1); que os governos deverão
reconhecer-lhes o direito “de criarem suas próprias instituições e meios de educação” (art.
27, §3); e que “sempre que for viável, dever-se-á ensinar às crianças (…) a ler e escrever na
sua própria língua indígena ou na língua mais comumente falada no grupo a que pertençam”
(art. 28 §1). Esta preocupação da Convenção com o respeito a processos educacionais e
conteúdos próprios dos povos indígenas é também contemplada pelo Texto Constitucional
Brasileiro de 1988, quando determina que “o ensino fundamental regular será ministrado em
língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas
línguas maternas e processos próprios de aprendizagem” (CF/88, art. 210, § 2.º).

            Veja-se agora em relação aos direitos territoriais. Aqui a Convenção determina
que se deva “respeitar a importância especial que para as culturas e valores espirituais dos
povos interessados possui a sua relação com as terras (...) e, particularmente, os aspectos
coletivos dessa relação” (art. 13 §1), e que se deve ter em conta também “o conceito de
territórios” representando “a totalidade do habitat das regiões que os povos interessados
ocupam ou utilizam de alguma outra forma” (art. 13 §2). Estas determinações da Convenção
169 encontram ressonância na CF de 1988, no conceito que este estabelece de terras
tradicionalmente ocupadas pelos índios: aquelas por eles “habitadas em caráter
permanente”, “utilizadas para suas atividades produtivas”, “imprescindíveis à preservação
dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar” e “necessárias a sua reprodução física
e cultural” tudo isso “segundo seus usos, costumes e tradições” (art. 231, § 1.º).

            Determina também a Convenção que se deve “reconhecer aos povos interessados
os direitos de propriedade e de posse sobre as terras que tradicionalmente ocupam” (art. 14
§1). Embora a Constituição Brasileira não permita a possibilidade de propriedade indígena
sobre as terras tradicionalmente ocupadas, em razão de se tratarem de propriedade da União
Federal (CF/88, art. 20, inc. XI), o fato é que tais terras “destinam-se a sua posse permanente”
(art. 231. § 2.º). Além disso, tal direito de posse permanente indígena sobre as terras
tradicionalmente ocupadas é, conforme a Constituição Federal, um direito originário (CF/88,
art. 231, caput) e imprescritível (CF/88, art. 231, § 4.º).

            Ainda no tocante a direitos territoriais, a Convenção 169 trata da adoção de
medidas visando “determinar as terras” tradicionalmente ocupadas “e garantir a proteção
efetiva dos seus direitos de propriedade e posse” (art. 14 §2). Aqui vale lembrar que a


                                                                                             28
Constituição de 1988 dispõe expressamente que se trata de dever da União Federal demarcar e
proteger as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas (CF/88, art. 231, caput).

           Outro ponto a ser observado refere-se à determinação da Convenção 169 de que
“os povos interessados não deverão ser transladados das terras que ocupam” (art. 16, §1), e
de que sempre que possível, “deverão ter o direito de voltar a suas terras tradicionais assim
que deixarem de existir as causas que motivaram seu translado e reassentamento” (art. 16,
§3). A Constituição Federal de 1988 trata deste tipo de preocupação, vedando expressamente
esta possibilidade de remoção ou translado, exceto “em caso de catástrofe ou epidemia que
ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País” situações em que se
exige, respectivamente, o "referendum" ou a deliberação do Congresso Nacional, “garantido,
em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco” (art. 231, § 5.º)

           Afinidades entre as disposições da Convenção 169 e da CF/88 são encontradas
ainda no que diz respeito aos recursos naturais existentes nas terras de ocupação tradicional
indígena. Para a Convenção, os direitos dos povos indígenas a esses recursos “deverão ser
especialmente protegidos”, e abrangem a sua participação na “utilização, administração e
conservação” desses recursos (art. 15 §1º). A Constituição Brasileira, por sua vez, assegura
caber aos indígenas “o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos”
existentes nas terras que tradicionalmente ocupam (CF/88, art. 231, § 2.º).

           No que se refere aos recursos naturais do subsolo, incluindo minérios, cuja
propriedade “pertencer ao Estado”, determina a Convenção 169 que os governos deverão
proceder à consulta prévia dos povos indígenas a serem afetados pela sua exploração, a fim de
se dimensionar os prejuízos aos seus interesses. Determina também que “os povos
interessados deverão participar sempre que for possível dos benefícios que essas atividades
produzam, e receber indenização equitativa por qualquer dano que possam sofrer como
resultado dessas atividades” (art. 15§ 2). No caso do Brasil, cujas “jazidas, em lavra ou não,
e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade
distinta da do solo, para efeito de exploração, e pertencem à União” (CF/88, art.176, caput),
a Constituição Federal estabeleceu como condição para a exploração de tais riquezas a
autorização do Congresso Nacional (art. 49, inc. XVI), e o atendimento a “condições
específicas” (art. 176, § 1.º) a serem estabelecidas em lei ordinária que, entre outras coisas,
deve dispor sobre o modo como devem ser ouvidas as comunidades indígenas afetadas e de
que modo deve ocorrer a sua “participação nos resultados da lavra”, direitos esses
constitucionalmente assegurados (CF/88, art. 231, § 3.º).

                                                                                            29
A Convenção 169 da OIT estabelece também que os Estados devem “impedir que
pessoas alheias a esses povos possam se aproveitar dos costumes dos mesmos ou do
desconhecimento das leis por parte dos seus membros para se arrogarem a propriedade, a
posse ou o uso das terras a eles pertencentes” (art. 17 §3), devendo a lei “prever sanções
apropriadas contra toda intrusão” ou “contra todo uso” não autorizados das mesmas terras
por terceiros (art. 18). A este respeito a Constituição Federal de 1988, além de declarar as
terras indígenas como inalienáveis e indisponíveis, (CF/88, art. 231, § 4.º), também declara
como “nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a
ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das
riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”(CF/88, art. 231, § 6.º).

               Por fim, a Convenção 169 estabelece que “os povos interessados deverão ter
proteção contra a violação de seus direitos, e poder iniciar procedimentos legais, seja
pessoalmente, seja mediante os seus organismos representativos, para assegurar o respeito
efetivo desses direitos” (art. 12). Também aqui é evidente a sintonia com o que definiu o
Constituinte Originário de 1988. Além de delegar à União Federal o dever de proteger e fazer
respeitar todos os bens indígenas (art. 231, caput da CF/88), a Constituição Federal coloca
entre as funções institucionais do Ministério Público a defesa judicial dos “direitos e
interesses das populações indígenas” (art. 129, inc. V), reconhecendo também que “os índios,
suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de
seus direitos e interesses” (art. 232).

               Assim, como observa o advogado indigenista brasileiro Paulo M. Guimarães29,

                              O disposto no atual Texto Constitucional, em vigor desde 5 de outubro de 1988, (...)
                              já contemplava as normas aprovadas na Convenção 169 em junho do ano seguinte,
                              especialmente no que tange ao usufruto das riquezas naturais de suas terras, à
                              consulta sobre a exploração mineral em terras indígenas e a participação dos
                              benefícios que as atividades produzirem. Somente a referência contida no artigo 14
                              da Convenção, no sentido de aos povos interessados ser reconhecida a propriedade
                              das terras que tradicionalmente ocupam, não vigorará no Brasil, tendo em vista o
                              disposto no art. 20, XI, do Texto Constitucional, que dispõe serem as terras
                              indígenas bens da União (GUIMRARÃES, 2000:542-543.).

               É de se observar, por fim, que no que se refere à lei indigenista brasileira em vigor
desde 1973 – a Lei 6.001, de 19 de dezembro de 1973 (Estatuto do Índio), a Convenção 169
da OIT, também apresenta vários pontos de contato, a exemplo do peso da auto-identificação
pelo indivíduo e comunidade indígena, do reconhecimento das sansões penais aplicadas pela
comunidade conforme suas tradições culturais, e a ênfase dada ao cumprimento das penas em
   29
      Paulo Guimarães atua desde 1982 como assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), órgão vinculado
à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

                                                                                                                     30
A Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas
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A Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas

  • 1. A CONVENÇÃO 169 DA OIT SOBRE POVOS INDÍGENAS E TRIBAIS: ORIGEM, CONTEÚDO E MECANISMOS DE SUPERVISÃO E APLICAÇÃO The ILO Indigenous and Tribal Peoples Convention, 1989 (n.º 169): origin, content and mechanisms for oversight and enforcement Rosane Freire Lacerda∗ __________________________ Resumo Há vinte anos a Conferência-Geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT) adotava a Convenção 109 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes, texto incorporado pelo sistema jurídico brasileiro cinco anos atrás. Apesar de sua importância, a Convenção é ainda bastante desconhecida no país. Um desconhecimento não apenas sobre o seu conteúdo, mas também sobre os mecanismos destinados à sua supervisão e aplicação. O presente artigo visa oferecer uma pequena contribuição ao suprimento de tais lacunas. Num primeiro momento são abordados alguns aspectos relativos à própria OIT – suas origens, configuração e envolvimento com a temática indígena, sobretudo a partir da Convenção 107. Num segundo momento passa-se a tratar especificamente da Convenção 169, enfocando-se o seu conteúdo e os mecanismos existentes para a supervisão e controle de sua aplicação pelos Países. Na última parte do trabalho, é abordada a situação da Convenção em relação ao Brasil, especialmente no tocante aos trâmites percorridos para a sua aprovação, e o seu significado em face dos direitos indígenas reconhecidos no plano da Constituição Federal de 1988. __________________________________ Palavras-chave Direitos indígenas no Brasil – Direito Internacional dos Povos indígenas – Convenção 169 da OIT – Mecanismos de supervisão e implementação ___________________________________ Abstract Twenty years ago the General Conference of the International Labor Organization (ILO) adopted the Convention 109 on Indigenous and Tribal Peoples in Independent Countries, text incorporated by Brazilian legal system five years ago. Despite its importance, the Convention is still quite unknown in the country. Ignorance not only on it’s content, but also on the mechanisms for their supervision and enforcement. This article aims to provide a small contribution to filling those gaps. At first addressed some aspects of the ILO – it’s origins, setting and involvement with indigenous issues, particularly from the Convention 107. Second is to address specifically the Convention 169, focusing on its content and the existing mechanisms for oversight and control of their implementation by countries. In the last part of the work, is addressed the situation of the Convention in relation to Brazil, especially in the manner traveled for its adoption, and its significance in the face of indigenous rights recognized in the Constitution of 1988. _____________________________________ Keywords Indigenous rights in Brazil – International law of indigenous peoples – ILO Convention 1989 (n.º169) – Mechanisms of supervision and implementation ∗ Professora Assistente de Direito Público da Universidade Federal de Goiás – Campus Jataí, Mestre em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília – UnB e advogada especialista em Direitos Indígenas. E-mail: < rosane.lacerda@terra.com.br >. 1
  • 2. Sumário 1. Introdução: A Organização Internacional do Trabalho e os Direitos Indígenas. (p.3) 2. A Convenção 107. (p.4) 3. A Convenção 169. (p.8) 3.1. Conteúdo. (p.8) a) “Política Geral”. (p.9) b) “Terras”. (p.12) c) “Contratação e condições de emprego”. (p.15) d) “Indústrias rurais”. (p.16) e) “Seguridade social e saúde”. (p.16) f) “Educação e meios de comunicação”. (p.17) g) “Contatos e cooperação através das fronteiras”. (p.18) h) “Administração”. (p.19) i) “Disposições gerais”. (p.19) j) “Disposições finais”. (p.19) 3.2. Supervisão e Controle de aplicação. (p.20) a) Instrumentos Disponíveis. (p.20) b) Possibilidades de Participação. (p.23) 4. O Brasil e a Convenção 169. (p.23) 4.1. O processo de ratificação. (p.24) 4.2. Significado da Convenção 169 da OIT no Marco Constitucional Brasileiro de 1988. (p.26) 5. Conclusão (p.31) Referências Bibliográficas (p.32) 2
  • 3. 1. Introdução: A Organização Internacional do Trabalho e os Direitos Indígenas. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) constitui o mais antigo dos 15 organismos especializados da Organização das Nações Unidas (ONU). Foi instituída em 1919 pela Conferência de Paz que se estabeleceu ao fim da Primeira Grande Guerra, e teve sua criação motivada, entre outras, pelo reconhecimento da predominância de condições desumanas e degradantes nas relações de trabalho. Em 1946, ano seguinte à criação da ONU, a OIT foi vinculada a esta, constituindo-se no seu primeiro organismo especializado. Sediada em Genebra – Suíça, a OIT é composta atualmente por 183 países- membros, de todos os continentes, reunidos numa estrutura tripartite, única no sistema das Nações Unidas: além dos representantes governamentais, conta também com a participação das instituições representativas dos setores patronal e laboral. Do leque de atividades da OIT sobressai-se pela sua importância e alcance o estabelecimento das Normas Internacionais do Trabalho - NIT, e o gerenciamento do sistema de controle e aplicação das mesmas pelos Estados-Membros. As NITs compõem elementos de forte influência nos países, como por exemplo na elaboração legislativa, na formulação de políticas para as matérias tratadas, e na orientação de decisões judiciais. Entre as NITs destacam-se as Convenções Internacionais do Trabalho, tratados internacionais adotados pela Conferência-Geral da organização, que estabelecem normas mínimas relativas a temas específicos e são de cumprimento obrigatório pelos países que as ratificam. O sistema de supervisão e controle de aplicação das NITs é formado predominantemente pelo envio de “Memórias” regulares pelos estados e sua apreciação. O interesse da OIT para com a questão indígena surgiu nos primeiros estudos que efetuou em 1921. À época a organização constatou, entre as chamadas “populações nativas” das colônias européias, a sujeição a condições desumanas de trabalho. Eram populações obrigadas a abandonar suas terras ancestrais “para converter-se em trabalhadores sazonais, migrantes, em condições de servidão ou a domicilio e, por conseguinte, expostos às formas de exploração no trabalho” (OIT, 2004). Segundo Fergus Mackay (1999:146) 1, em 1926 a Organização formou um Comitê de Especialistas para investigar as condições de trabalho de tais populações e, diante do panorama encontrado, reconheceu a necessidade de estender a sua 1 Fergus Mackay é especialista nas áreas de direitos humanos e direitos dos povos indígenas, e coordenador do Programa Legal e de Direitos Humanos do Reino Unido. 3
  • 4. ação protetiva aos trabalhadores indígenas. Dessa preocupação resultou, em 1930, a adoção da Convenção n.º 29 sobre Trabalho Forçoso2. Mais tarde, já vinculada à ONU, a OIT retomou os seus estudos sobre o tema dos trabalhadores indígenas, coordenando de 1952 até 1972 o Programa Indigenista Andino, desenvolvido na Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. Como parte do programa publicou, em 1953, o livro “Populações Indígenas: Condições de Vida e de Trabalho das Populações Aborígenes nos Paises Independentes”. Ainda durante o programa, em 1957, a organização adotou a sua primeira Convenção sobre Populações Indígenas e Tribais, a chamada Convenção 107. 2. A Convenção 107. Apesar de configurar um instrumento normativo da OIT, a Convenção 107 contou, para a sua elaboração, com o apoio decisivo de “outros organismos do sistema das Nações Unidas” (OIT, 2004). Segundo Marco Antônio Barbosa, tais organismos foram a Food and Agriculture Organization at the United Nations (FAO), a United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) (BARBOSA, 2001:225)3. Como bem lembrado por Barbosa (2001:226), inexistia à época um movimento indígena organizado e que se fizesse presente nas discussões em Genebra. Contudo, o autor observa ter havido nos anos 1950 uma certa presença de indígenas Norte-Americanos e, sobretudo, de oriundos da Bolívia, resultando daí que a Convenção 107 tenha sido “notoriamente inspirada na América do Sul”, uma vez que “suscitada pelos sindicatos bolivianos cuja população é majoritariamente indígena e que era explorada na extração mineraria” (BARBOSA, 2001:226.). Ainda segundo o autor, outro fator para a feição latino- americana da Convenção 107 teria sido a influência exercida pelo antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro, “em razão de seu empenho e devido ao seu alto status dentro do SPI (Serviço de Proteção ao Índio)”. O grau de respeitabilidade exercido por Ribeiro teria deixado a marca, distinta para os padrões da época, de uma postura progressista do Brasil relativamente à proteção internacional das populações indígenas (BARBOSA, 2001:226). A Convenção 107 sobre populações indígenas e tribais em países independentes consistiu então no primeiro tratado internacional relativo especificamente à temática indígena. 2 A Convenção sobre Trabalho Forçoso se encontra ratificada atualmente por 173 países, inclusive o Brasil. 3 Além do envolvimento da Organização das Nações Unidas (ONU) e daqueles seus organismos (FAO, UNESCO e OMS), o preâmbulo da Convenção 169 da OIT (§ 8.º) menciona ter recebido também a colaboração do Instituto Indigenista Interamericano (III), organismo vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA). 4
  • 5. Desde a sua adoção pela Conferência Geral da OIT, em 1957, até a adoção da convenção revisora em 1989, a Convenção 107 foi ratificada por 27 países-membros4. Denominada “Convenção sobre a Proteção e Integração das Populações Indígenas e outras Populações Tribais e Semitribais de Países Independentes”, a Convenção 107 objetivou por um lado, a proteção das populações indígenas contra atos de discriminação étnico-racial no âmbito das relações trabalhistas e afins. Por outro, presa à visão etnocêntrica predominante à época, assumiu o propósito de integrá-las aos padrões sócio-culturais da comunidade nacional dos respectivos Estados. Apesar de os direitos indígenas passarem a ser objeto de proteção em diploma internacional específico, a identidade indígena permanecia concebida como passageira, tendo em vista a perspectiva da integração. Promulgada no Brasil pelo Decreto n.º 58.824, de 14 de julho de 1966, a Convenção 107 norteou em grande parte a elaboração da Lei n.º 6.001, de 19 de dezembro de 1973, o “Estatuto do Índio”, ainda em vigor. Exemplos desta influência são encontrados de modo enfático tanto nos dispositivos relacionados à integração dos índios à comunhão nacional, quanto naqueles que, negando autonomia aos povos e comunidades indígenas, reservam ao Estado todo o poder decisório em matérias de interesse direto de tais grupos. No primeiro caso, pode se destacar a adoção do propósito de preservação dos indígenas e sua “integração progressiva e harmoniosa” à comunhão nacional (E.I., art. 1.º, caput); a sua discriminação entre as categorias de “isolados”, “em vias de integração” e “integrados” (art. 4.º); a sujeição dos “índios e comunidades indígenas ainda não integrados” ao regime tutelar (art. 7.º), sendo considerados nulos os atos praticados sem assistência do órgão indigenista (art. 8.º); a consideração das “peculiaridades” culturais relativas à “qualificação do nome, prenome e filiação” nos registros civis apenas dos “índios não integrados” (art. 12); a fiscalização das condições de trabalho pelo órgão indigenista apenas no caso de indígenas “não integrados” (art. 16, § 2.º); a perspectiva de uma educação “orientada para a integração na comunhão nacional mediante processo de gradativa compreensão dos problemas gerais e valores da sociedade nacional” (art. 50); e a utilização do “grau de integração do silvícola” como parâmetro para a aplicação de pena decorrente de sentença penal condenatória (art. 56). 4 1958: Haiti, Cuba, República Dominicana, Índia, El Salvador, Bélgica e Ghana; 1959: Egito, República Árabe Síria, Costa Rica e México; 1960: Argentina, Paquistão, Peru e Portugal; 1962: Tunísia; 1965: Bolívia, Malawi e Brasil; 1969: Paraguai, Colômbia e Equador; 1971: Panamá; 1972: Bangladesh; 1976: Angola; 1977: Guiné-Bissau; 1986: Iraque. (Fonte: < http://www.ilo.org/ilolex/english/convdisp1.htm > Acesso em: 20.mai.2009.). Conforme previsto no art. 36, 1. “b” da Convenção 107, a abertura à ratificação pelos países Membros encerrou-se na data da entrada em vigor do texto convencional revisor – a Convenção 169. 5
  • 6. No segundo caso, a completa ausência de possibilidade de participação consultiva ou decisória das comunidades e povos indígenas é expressa de modo mais visível, no Estatuto do Índio, nos “programas e projetos tendentes a beneficiar as comunidades indígenas” onde se admite, no máximo, a sua “colaboração” já na fase executória (art. 2.º, VII); na intervenção em terra indígena por decreto do Presidente da República, entre outros por motivo de “segurança nacional”, de “realização de obras públicas que interessem ao desenvolvimento nacional” e de “exploração de riquezas do subsolo de relevante interesse para a segurança e o desenvolvimento nacional” (art. 20, §1.º); na atribuição, ao órgão indigenista oficial, da gestão do Patrimônio Indígena (art. 42); e no alijamento das comunidades indígenas da discussão e definição acerca de projetos de exploração de riquezas do subsolo (art. 45) ou de corte de madeira nas terras que ocupam (art. 46). Nas décadas de 1960 e 1970, embora mantivesse a sua importância como instrumento de proteção aos direitos indígenas, a Convenção 107 passou por um processo crescente de críticas tanto do movimento indígena em ascensão, quanto de antropólogos, indigenistas e entidades de Direitos Humanos de diversos países. Apontavam-se as consequências negativas da perspectiva integracionista, condenava-se o pressuposto etnocêntrico da integração como único futuro possível para os indígenas, e denunciava-se como prática de dominação colonial o monopólio estatal sobre as decisões relativas a temas de interesse indígena, em substituição à possibilidade de participação dos próprios grupos étnicos. Como observa Marco Antônio Barbosa, a Convenção 107, ao se pautar pelo pressuposto da inexorabilidade do desaparecimento dos povos indígenas enquanto grupos distintos demonstra uma abordagem, verbis: paternalista, etnocêntrica, evolucionista e em desacordo com as mais recentes pesquisas antropológicas porque ela considera como atrasados os beneficiários de sua proteção que devem ser ajudados para evoluir até o ponto em que, devido a tal ajuda e evolução, devem deixar de existir enquanto grupo específico. (BARBOSA, 2001:225) Ainda segundo aquele autor, foi de grande importância em 1971 a posição assumida por Martinez Cobo, ao defender a revisão da Convenção 107, e ao apresentar propostas inovadoras, o que lhe valeu o reconhecimento como referência para a questão indígena contemporânea no cenário internacional (BARBOSA, 2001:226). O crescimento das críticas à Convenção 107 acabou por levar a ONU a iniciar um estudo mais detalhado sobre a realidade dos povos indígenas e tribais. Uma contribuição decisiva à proposta de revisão foi oferecida pelo Grupo de Trabalho sobre Populações 6
  • 7. Indígenas (GTPI), da Subcomissão sobre Minorias e Discriminação, da Comissão de Direitos Humanos da ONU (BARBOSA, 2001:226). Essa contribuição veio, sobretudo, do projeto de declaração sobre os direitos dos Povos Indígenas, cuja preparação o GTPI havia iniciado em 1985, e que contava com forte presença indígena em seu processo de discussão5. Em 1986, a Reunião de Peritos convocada pelo Conselho de Administração da OIT chegou à conclusão de que “o enfoque integracionista do Convênio era obsoleto e de que sua aplicação era prejudicial no mundo moderno” (OIT, 2004). Tal conclusão motivou o Conselho de Administração da OIT a inscrever na Ordem do Dia da Conferência Internacional do Trabalho, o tema da revisão da Convenção 107. A revisão foi assim objeto de discussão pela Conferência nos anos de 1988 e 1989. Além das conclusões da Comissão de Peritos, contou-se também com as contribuições das organizações indígenas e do Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre populações indígenas, criado em 1982. Fergus Mackay observa que, apesar da importância da participação indígena no processo de discussão que resultou na Convenção revisora, o texto final da Convenção 169 não contou com o apoio unânime dos povos indígenas, tendo sido logo no início objeto de duras críticas por muitos deles, “sobre todo en lo que respecta a los términos de la libre determinación (o la falta de éstos); las disposiciones sobre tierras, territórios, recursos y reubicación; niveles de consentimiento y ausência de participación indígena significativa en el processo de revisión” (MACKAY, 1999:147). Tais críticas resultaram na “Resolución de los Pueblos Indígenas en la Reunión Preparatória – Ginebra, 1989”, onde se propôs boicotar a Convenção (MACKAY, 1999:148). O motivo central da insatisfação estaria, segundo Mackay, na comparação da Convenção com os termos, mais avançados, do Projeto de Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, à época já em curso na ONU. O texto final da Convenção 169 já era visto, então, como uma “declaração mínima de direitos indígenas” (MACKAY, 1999:147), aquém dos avanços já obtidos nas Nações Unidas no tocante ao Projeto de Declaração. Contudo, a proposta de boicote não prosperou, prevalecendo a posição dos povos e organizações indígenas que avaliaram o significativo avanço trazido pela Convenção em relação às normas internas vigentes em seus países. Para estes povos, diz Mackay (1999:147), 5 O Projeto de Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas teve o seu texto aprovado pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU em 29 de junho de 2006, sendo submetido à Assembléia Geral em 13 de setembro de 2007 quando foi aprovado por 144 votos a favor, contra quatro votos pela rejeição e 11 abstenções. No âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA) tramita desde a década de 1980, inicialmente por sugestão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), a discussão em torno do Projeto de Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas. 7
  • 8. “la ratificación del Convenio n.º 169 sería un paso adelante hacia la protección de sus derechos, puesto que las leyes nacionales están actualmente por debajo de los estándares, sin poseer mecanismos reales de exigibilidad, y son hasta hostiles”. Por fim, na seção de junho de 1989, a Conferência adotou como Convenção Revisora a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais, cuja ratificação vem contando, desde então, com o apoio das seguintes organizações indígenas internacionais: Conferência Circumpolar Inuit; Conselho Nacional de Juventude Indígena; Conselho Sámi e Conselho Mundial dos Povos Indígenas, além das organizações e povos de diversos países que ainda não a ratificaram (MACKAY, 1999:147). Apesar de revista, a Convenção 107 permanece ratificada por 18 países, tendo sido denunciada por aqueles que ratificaram a Convenção 169. Assim como não pode mais ser objeto de novas ratificações desde a adoção da convenção revisora, a Convenção 107 também não pode ser objeto de denúncia automática pelos países que a ratificaram. Segundo o art. 36, 1. “a”, da Convenção, a denúncia por estes países só é possível como conseqüência direta e imediata da ratificação da Convenção 169. Evita-se, assim, a possibilidade de um País Membro da OIT vir a retroceder em matéria de proteção, abrindo mão dos compromissos mínimos constantes da própria convenção já revisada. 3. A Convenção 169. Adotada em 27 de junho de 1989 em Genebra, Suíça, pela 76ª Seção da Conferência Geral da OIT, a Convenção 169 – denominada “Convenção sobre os Povos Indígenas e Tribais, 1989” – entrou em vigor em 05 de setembro de 1991, doze meses após o registro de sua segunda ratificação, efetuada pelo México (05.09.1990)6. Até o momento, a Convenção 169 conta com a assinatura de 20 países7. 3.1. Conteúdo Com um total de 44 artigos, a Convenção 169 da OIT tem o seu conteúdo dividido em uma parte preambular e nove partes temáticas específicas, relativas a: política geral (arts. 1.º a 12); terras (arts. 13 a 19); contratação e condições de emprego (art. 20); indústrias rurais (arts. 21 a 23); seguridade social e saúde (arts. 24 e 25); educação e meios de comunicação (arts. 26 a 31); contatos e cooperação através das fronteiras (art. 32), e 6 Conforme o art. 38, 2, do texto convencional, a sua entrada em vigor havia sido determinada para doze meses após o registro, pelo Diretor-Geral do Secretariado da OIT, das ratificações de dois países Membros da organização. 7 1990: Noruega e México; 1991: Colômbia e Bolívia; 1993: Costa Rica e Paraguai; 1994: Peru; 1995: Honduras; 1996: Dinamarca e Guatemala; 1998: Países Baixos, Ilhas Fidji e Equador; 2000: Argentina; 2002: Venezuela, Dominica e Brasil; 2007: Espanha e Nepal; e 2008: Chile. Fonte: < http://www.ilo.org/ilolex/english/convdisp1.htm >.Acesso em: 20.mai.2009. 8
  • 9. administração (art. 33), além daquelas que tratam de disposições gerais (arts. 34 e 35) e disposições finais (arts. 36 a 44). Segue-se uma síntese comentada de cada um destes capítulos. Antes, porém, cabe observar que no Brasil as atenções em torno da Convenção 169 permanecem restritas ao meio indigenista e aos poucos advogados e membros do Ministério Público com atuação direta na questão. Neste circuito os estudos sobre a Convenção 169 têm privilegiado o conhecimento do teor do texto convencional e a sua transmissão para as comunidades e organizações indígenas. Ainda não há no país uma literatura jurídica voltada para a interpretação do alcance dos seus dispositivos, ou para a divulgação dos mecanismos de supervisão e controle de sua aplicação pelo Estado. Provavelmente tal produção se desenvolverá na medida em que tais mecanismos forem sendo utilizados. Neste contexto, optou-se aqui por trazer à tona, na síntese de cada capítulo, notas com alguns dos comentários e interpretações de Fergus Mackay (1999). É ainda importante considerar a observação desse autor, de que o texto da Convenção 169 possibilita uma margem considerável de flexibilidade interpretativa, que pode levar a conclusões tanto avançadas quanto restritivas de sentido. “El texto del Convenio n.º 169”, diz Mackay (1999:149), “es de alguna manera impreciso, y permite interpretaciones flexibles de sus disposiciones”. Assim sendo, “puede ser interpretado de una forma bastante abierta, ampliando el alcance de sus disposiciones, o de manera restrictiva, logrando efectos inversos”. Com esta observação, o autor alerta para a importância de que “los pueblos indígenas participen en todo proceso que implica su interpretación, en especial en la Comisión de Expertos, a fin de asegurar la interpretación más favorable de las normas allí contenidas” (MACKAY, 1999:149). a) “Política Geral” O principal paradigma adotado pela Convenção 169 reside no reconhecimento das instituições culturais e formas de vida próprias dos povos indígenas e tribais como elementos a serem respeitados pelos Estados Membros. Invertendo o modelo integracionista até então adotado, a Convenção 169 tem como perspectiva o direito de tais povos a continuarem mantendo as suas identidades próprias, através do fortalecimento de suas especificidades culturais, lingüísticas e religiosas. Além disso, adota também como princípio a ser observado pelos Estados Membros, o respeito às “aspirações desses povos a assumir o controle de suas próprias instituições e formas de vida e seu desenvolvimento econômico” (Preâmbulo, § 5), ou seja, o reconhecimento do princípio da autonomia dos Povos Indígenas e Tribais. 9
  • 10. O reconhecimento do caráter perene das identidades culturais próprias e o estabelecimento do princípio da autonomia de tais povos é trabalhado mais detalhadamente no capítulo referente à “política geral”. Estes aspectos são tão relevantes que, defende Mackay (1999:150), “al leer una disposición del Convenio en particular, debería hacerse una constante referencia a los principios generales de participación , consulta y respeto por la cultura e instituciones indígenas, así como a otros artículos relacionados con éstas”. Também em caráter introdutório a Convenção define os seus dois beneficiários – os povos indígenas e os povos tribais em Países Independentes. Os Povos Indígenas (art. 1.º, § 1, “b”) são entendidos como aqueles possuidores de uma vinculação histórica com as populações existentes no país à época da colonização, e que mantenham, ainda que parcialmente, instituições próprias no âmbito social, econômico, cultural e político. Já os Povos Tribais (art. 1.º, § 1, “a”) são considerados como aqueles que, embora culturalmente distintos e regidos ainda que parcialmente por modos próprios de vida, não possuem necessariamente uma vinculação histórica com ancestrais residentes no país na época da colonização ou do estabelecimento das fronteiras estatais. Para ambas as categorias a Convenção 169 elege como “critério fundamental” de determinação de pertencimento a uma ou outra, a “consciência da identidade indígena ou tribal” (art. 1.º, § 2), ou seja, o critério da auto-identificação étnica8. Observa também a Convenção, quanto ao uso do termo “povos”, não guardar o mesmo sentido jurídico que o contido no direito internacional, ou seja, não deve ser interpretado como reconhecimento de um suposto direito de independência frente aos Estados onde se localizem (art. 1.º, § 3.). Com base em tais pressupostos a Convenção estabelece diversos elementos de sua política geral. Primeiro, a responsabilidade dos Governos em desenvolver, com a participação de tais povos, ações permanentes e coordenadas de proteção (art. 2.º, § 1.), adotando medidas que: a) garantam iguais direitos e oportunidades em relação à população não-indígena (art. 2.º, § 2, “a”.); b) ponham em prática os direitos sociais, econômicos e culturais e o respeito a sua identidade social e cultural (art. 2.º, § 2, “b”.); c) auxiliem tais povos na eliminação das diferenças sócio-econômicas em relação aos demais membros da população, “de maneira compatível com suas aspirações e formas de vida” (art. 2.º, § 2, “c”). 8 Segundo MACKAY (1999:158), “la autoidentificación es de extrema importancia debido a la facultad que tiene una entidad externa – el Estado, las Naciones Unidas o la OIT, por ejemplo – para definir un individuo o pueblo como indígena o no indígena, lo cual equivale a la facultad de denegar sus derechos a tal individuo o pueblo. (…) La necesidad y conveniencia de esta definición deberá ser cuestionada a la luz de las demandas consistentes de los pueblos indígenas, de que son sólo ellos quienes tienes el derecho de definirse a si mismos.” 10
  • 11. Reconhece também aos povos indígenas e tribais o direito de gozo dos direitos humanos, liberdades fundamentais (art. 3.º, § 1.) e direitos de cidadania (art. 4.º, § 3.); e a necessidade de medidas especiais de salvaguarda de suas pessoas, instituições, bens, culturas e meio ambiente (art. 4.º, § 1.). Adiante, remete às instituições em geral a tarefa de relacionar- se com tais povos reconhecendo-lhes e protegendo-lhes os valores e práticas sociais, culturais, religiosos e espirituais (art. 5.º, § 1.). No que se refere mais especificamente ao relacionamento dos governos com estes Povos, a Convenção estabelece dois importantes princípios. Primeiro que sejam sempre consultados “através de suas instituições representativas” em caso de “medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente” (art. 6.º, § 1, “a”). Segundo, que seja garantida a sua livre participação em todas as instâncias decisórias nas matérias relativas às políticas e programas que lhes digam respeito (art. 6.º, § 1, “b”)9. Além disso, cobra dos governos, como suporte para a participação plena dos povos indígenas, o estabelecimento de meios capazes de auxiliar no desenvolvimento de suas instituições e iniciativas próprias (art. 6.º, § 1, “c”.), e que as consultas10 aos mesmos sejam efetuadas “com boa fé e de maneira apropriada às circunstâncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas propostas”11 (art. 6.º, § 2). Com base em tais princípios, a Convenção 169 estabelece que frente aos projetos de desenvolvimento que afetem o seu modo de vida e suas terras, devem os Governos respeitar a tais povos os direitos de escolha de suas próprias prioridades e de participação na formulação, aplicação e avaliação de tais projetos (art. 7.º, § 1.12); a priorização, no seu planejamento, da melhoria das condições e níveis de vida, trabalho, saúde e educação das comunidades (art. 7.º, § 2.); a elaboração de estudos dos impactos sociais, espirituais, 9 Na interpretação de Mackay (1999:152.), a referência a meios de participação “pelo menos na mesma medida que outros setores da população” (art. 6.º, § 1, “b”), significa que “los pueblos indígenas tienen el derecho a medios especiales de representación directa que no son otorgado necesariamente a otros ciudadanos”. 10 A respeito de tais consultas, Mackay (1999:153) observa que: a) devem ser feitas previamente à adoção de quaisquer medidas legislativas e administrativas; b) estão também “sujetas a la supervisión de la OIT, las que pueden ser puestas en cuestión por los pueblos indígenas si violan el art. 6.º en general o alguna cláusula específica del mismo”. 11 Segundo Mackay (1999:154) “causa mucha desilusión por decir lo menos, que la OIT optara por un estándar débil – ‘con el objeto de lograr el consentimiento’ – en vez de un consentimiento expresado libremente y con pleno conocimiento …” Defende então (p. 152.) que o dispositivo deve ser interpretado no sentido de que “no se requiere que se llegue a un acuerdo o consentimiento, a menos que lograr dicho acuerdo o consentimiento fuera el objetivo de las consultas”. 12 A respeito do significado do art. 7,§ 1 para a autonomia dos Povos Indígenas, comenta MACKAY (1999:153-154) que “esta disposición reconoce que los pueblos indígenas tienen derecho a alguna forma de autogobierno en relación a sus instituciones y en la determinación de la dirección y alcance de su desarrollo económico, social y cultural. El alcance preciso de dicha autonomía se determina en relación, entre otros, a: las disposiciones de participación; las disposiciones sobre servicios de salud (art. 25(1)) (…); educación (art. 27 (2) (3)) (…); formación vocacional (art. 22(3)) (…); y especialmente aquéllos vinculados con tierras y territorios (arts. 13-19) y las instituciones indígenas (arts. 7(1), 8(2) y 9).” 11
  • 12. culturais e ambientais sobre as mesmas, cujos resultados devem ser considerados fundamentais para efeitos de execução dos projetos de desenvolvimento (art. 7.º, § 3.). Com relação à proteção ambiental dos territórios indígenas e tribais, a Convenção determina aos Governos que adotem medidas não de modo unilateral e impositivo, mas “em cooperação” (art. 7.º, § 4) com tais povos. Outro ponto abordado é o da relação entre as formas jurídicas próprias dos Povos Indígenas e Tribais e os sistemas jurídicos dos Estados. Aqui o princípio estabelecido pela Convenção 169 é o do reconhecimento da aplicabilidade dos costumes e do direito consuetudinário daqueles povos, sempre que compatíveis “com os direitos fundamentais definidos pelo sistema jurídico nacional” e com “os direitos humanos internacionalmente reconhecidos” (art. 8.º, § 2)13. Tendo em vista essa compatibilidade, reconhece a possibilidade de aplicação das instituições penais próprias dos povos indígenas e tribais na repressão aos delitos praticados pelos membros de suas comunidades. Não obstante essa possibilidade estabelece que na hipótese de sujeição judicial de indivíduo sob acusação de ato delituoso, deve-se levar em consideração os costumes de seu povo “a respeito do assunto” (art. 9.º, § 2). E, na hipótese de aplicação de sanção penal pelo Estado, as suas características econômicas, sociais e culturais, devendo-se ainda “dar preferência a tipos de punição outros que o encarceramento” (art. 10, § 2). Ainda no capítulo “política geral” a Convenção exige dos Estados a proibição de imposição aos membros desses povos, de prestação de serviços pessoais obrigatórios (art. 11); a garantia de mecanismos de proteção contra a violação de direitos; a legitimidade para o ingresso em procedimentos legais de defesa desses direitos, pessoalmente ou através de seus organismos representativos; e a garantia de intérpretes ou outros meios eficazes de comunicação e de compreensão em procedimentos legais (art. 12). Em relação aos demais capítulos, o texto convencional traz, em síntese, as seguintes disposições normativas a serem observadas pelos Estados signatários: b) “Terras”. A Convenção trata da natureza dos direitos territoriais a serem reconhecidos aos Povos Indígenas e Tribais (arts 13 e 14), da proteção e administração dos recursos naturais 13 Segundo MACKAY (1999:154.), “El Convenio no reconoce un derecho para crear sistemas legales autónomos indígenas. Sin embargo, si una comunidad indígena creara su propio sistema legal autónomo, parecería que los arts. 7(1) y 8(2) requerirían que el Estado justificara cualquier interferencia con su existencia.(…) El requisito de conformidad con el sistema jurídico nacional es desalentador ya que obstaculiza seriamente el desarrollo y funcionamiento efectivo de las instituciones indígenas”. 12
  • 13. existentes nas terras indígenas (art. 15), das possibilidades, condições e conseqüências do translado das populações indígenas de suas terras (art. 16), das possibilidades e limites da transmissibilidade dos direitos territoriais (art. 17), das sanções às violações dos direitos territoriais (art. 18) e, por fim, dos direitos de ampliação territorial e de acesso a programas de desenvolvimento econômico (art. 19). A respeito deste capítulo, vale anotar a observação de Mackay (1999:154), de que: ... las disposiciones del Convenio n.º 169 sobre tierras, territorios y recursos han sido criticadas justificadamente por los pueblos indígenas por ser inadecuadas. Sin embargo, estas disposiciones contienen numerosas protecciones importantes, además de las que se encuentran en el derecho internacional y en algunos sistemas legales internos. Apesar da simples denominação de “terras” dada ao capítulo, a Convenção trabalha com um conceito mais amplo, de territorialidade. Assim, explica que o termo “terras” deverá “incluir o conceito de territórios, o que abrange a totalidade do habitat das regiões que os povos interessados ocupam ou utilizam de alguma outra forma” (art. 13, § 2), ou seja, não apenas o local de ocupação física efetiva e permanente, mas também aquele conjunto ambiental, paisagístico, cultural e histórico que vincula territorialmente determinado povo14. Dois princípios apontados pela Convenção devem ser dotados na aplicação de todo o capítulo relativo às terras indígenas. Primeiro o de que os Governos devem sempre respeitar a importância da relação cultural, espiritual e coletiva que os povos indígenas e tribais possuem com as terras que ocupam (art. 13, § 1); segundo, o princípio da não remoção dos índios dessas terras (art. 16), a não ser em situações excepcionais e em que haja o seu consentimento livre e com pleno conhecimento de causa (art. 16, § 2), garantido o direito de retorno às terras terminadas as causas da remoção (art. 16, § 3). A Convenção orienta para o reconhecimento dos direitos de posse e de propriedade sobre as terras tradicionalmente ocupadas, e para a necessidade de que seja protegido, “nos casos apropriados” 15, o direito de utilização dos povos indígenas sobre terras de ocupação tradicional também ocupadas por terceiros. Destaca, aí, a importância de uma atenção especial à situação dos povos nômades e agricultores itinerantes (art. 14, § 1), a 14 MACKAY (1999:155) observa, contudo, que “esta definición está formulada en tiempo presente – ‘ocupan’ y ‘utilizan’ – y por tanto, no incluye reclamos históricos, o disputas sobre tierras y territorios, aunque podría abarcar a las tierras recientemente ocupadas o utilizadas que los pueblos indígenas no estén ocupando actualmente o a las que se haya denegado su acceso. Además, los pueblos indígenas no tienen que probar la ocupación inmemorial de tierras y territorios; es suficiente que la ocupación sea reciente o actual.” 15 Para MACKAY (1999:156), “lo que significa exactamente ‘en los casos apropiados’ no está claro, aunque pueden informar al respecto las estipulaciones sobre protección y fortalecimiento de las prácticas de subsistencia en el art. 23, y el reconocimiento del control indígena sobre las tierras que ellos ‘utilizan’ (art. 7 (1)).” 13
  • 14. necessidade de adoção de medidas de determinação de tais terras e de proteção efetiva dos direitos sobre as mesmas (art. 14, § 2), e que sejam criados “procedimentos adequados”16 para a solução das reivindicações territoriais dos povos indígenas (art. 14, § 3). No caso dos recursos naturais existentes nas terras indígenas, a Convenção estabelece que a participação indígena na sua utilização, administração e conservação são direitos a serem especialmente protegidos pelos Países (art. 15, § 1.º). Assim, orienta os Governos a só autorizar a pesquisa ou a exploração dos recursos do subsolo (principalmente minerais), após consulta antecipada aos povos afetados, avaliando-se os impactos que possam sofrer com a exploração. Além disso, estabelece os direitos de participação desses povos, 17 “sempre que for possível” , nos benefícios econômicos aí gerados, e de indenização por danos decorrentes das mesmas atividades (art. 15, § 2.º). Em caso de remoção excepcional dos indígenas de suas terras, e não sendo possível obter o seu consentimento, a Convenção determina que sejam seguidos procedimentos específicos definidos pela legislação do País, que incluam consultas públicas onde se garanta a participação de representação indígena (art. 16, § 4.º). Além disso, diante da eventual impossibilidade de retorno às terras, a Convenção reconhece aos povos afetados tanto o direito de compensação em terras de qualidade ao menos equivalente, quanto o direito de indenização em dinheiro ou em bens (art. 16, § 5.º). A Convenção 169 também estabelece que os Países devam respeitar as formas próprias de transmissão de direitos territoriais entre os membros da comunidade (art. 17, § 1.º), e até mesmo que os povos indígenas possam alienar tais direitos a terceiros, dependo de consulta aos mesmos quanto a serem capazes para tal ato (art. 17, § 2.º)18. Diante disso, determina que os Países adotem medidas que impeçam a terceiros de má-fé a utilização tanto 16 MACKAY (1999:156) considera que “no resulta satisfactorio que el único requisito sobre la adjudicación de reclamos de tierras sea la existencia de ‘procedimientos adecuados’, debido sobre todo a la historia de abusos sobre los derechos de tierras indígenas y los reclamos en las cortes nacionales que exigen procedimientos adecuados y garantías para todos los que los preceden. Este requisito provee sin embargo los medios para cuestionar la validez de procedimientos de reclamos de tierras en la Comisión de Expertos.” 17 O emprego desta condicionante pela Convenção é também objeto de dura crítica por Fergus MACKAY (1999:157): “El Estado tiene el poder de ser el único en decidir el sentido de la frase ‘donde sea posible’. Esto significa básicamente que, sujeto a una consulta de buena fe, el Estado puede decidir cuando los pueblos indígenas pueden compartir los beneficios de la explotación de sus recursos en sus tierras. (…) Esta disposición es sin duda una de las más inadecuadas y cuestionables del Convenio. No puede dar cuenta de los efectos devastadores que tienen las actividades de explotación de recursos en muchos aspectos de la vida de los pueblos indígenas y su bienestar. No es una coincidencia que muchas de las peticiones presentadas por los pueblos indígenas ante las instancias de reclamo a nivel internacional se refieran a violaciones de derechos humanos directamente atribuibles a las llamadas actividades de desarrollo en sus territorios, o en lugares aledaños. (…) resulta difícil ver cómo esta disposición se relaciona con el art. 13 (1), que requiere un reconocimiento y respeto debido a la especial relación espiritual y cultural que los pueblos indígenas tienen con sus tierras y territorios.” 18 Conforme proposto pela Emenda n.º 1-CCJ ao Projeto de Decreto do Senado n.º 34/1993, que discutiu naquela Casa a aprovação do texto da Convenção 169 da OIT, aprovou o Plenário em 19 de junho de 2002 a inaplicabilidade no Brasil, por motivo constitucional, das possibilidades previstas na Convenção de propriedade das terras de ocupação tradicional pelos Povos Indígenas e de sua alienação a terceiros. 14
  • 15. dos costumes indígenas quanto do seu desconhecimento das leis, para se apropriarem ou esbulharem a posse de tais terras (art. 17, § 3). Entre tais medidas estaria a previsão de punições legais contra a invasão e o uso ilegal das terras indígenas por terceiros (art. 18). Ainda quanto aos direitos territoriais, a Convenção 169 da OIT determina que sejam alocadas novas terras quando da insuficiência das disponíveis – inclusive em razão do crescimento populacional (art. 19, “a”) – bem como que se garanta aos indígenas o acesso aos meios necessários para o desenvolvimento das terras que já possuam (art. 19, “b”). Tais necessidades deverão ser satisfeitas através dos programas agrários nacionais, “em condições equivalentes às desfrutadas por outros setores da população” (art. 19, caput). c) “Contratação e condições de emprego”. Neste capítulo a Convenção 169 da OIT orienta os governos dos Estados signatários a adotarem medidas especiais visando a proteção eficaz dos trabalhadores pertencentes aos Povos Indígenas e Tribais, no sentido de se evitar o tratamento discriminatório dos mesmos em relação aos trabalhadores em geral, especialmente quanto a: acesso ao emprego, promoção e ascensão; igualdade de remuneração; assistência médica e social, segurança e higiene no trabalho; seguridade social e demais benefícios; programas de habitação; direito de associação, e de atividades sindicais; e direito a celebrar convênios coletivos com empregadores ou com organizações patronais. Em relação aos “trabalhadores sazonais, eventuais e migrantes empregados na agricultura ou em outras atividades, bem como os empregados por empreiteiros de mão-de- obra” (art. 20, § 3, “a”), a Convenção determina que sejam adotadas medidas especiais visando o acesso à mesma proteção conferida aos trabalhadores não-indígenas dessas categorias e setores. Estabelece também que “sejam plenamente informados dos seus direitos de acordo com a legislação trabalhista e dos recursos de que dispõem” (art. 20, § 3, “a”). As medidas especiais, ainda de acordo com a Convenção 169, devem ter em vista a proteção dos trabalhadores indígenas contra condições de trabalho insalubres, sobretudo em razão de “exposição a pesticidas ou a outras substâncias tóxicas” (art. 20, § 3,”b”); contra “sistemas de contratação coercitivos, incluindo-se todas as formas de servidão por dívidas” (art. 20, § 3, “c”); contra a discriminação em razão de gênero e contra o acossamento sexual. Por fim, o texto determina que os Países devam providenciar a criação de “serviços adequados de inspeção do trabalho” (art. 20, § 4), com vistas ao monitoramento do cumprimento da Convenção em relação a este capítulo em específico. 15
  • 16. d) “Indústrias rurais”. Aqui a Convenção 169 trata de medidas básicas a serem implementadas pelos Estados signatários quanto ao desenvolvimento, pelos povos indígenas, de atividades econômicas sejam especializadas, sejam tradicionais. O texto enfatiza inicialmente o direito de acesso dos povos indígenas aos meios de formação profissional “pelo menos iguais àqueles dos demais cidadãos” (art. 21). Neste sentido, vê como necessária a adoção de medidas de incentivo à participação voluntária de indígenas em programas de formação profissional de aplicação geral. Contudo, determina que devam ser colocados à disposição dos indígenas, com a participação de seus Povos, “programas e meios especiais de formação” profissional, que atendam as “necessidades especiais” destes, e que estejam baseados “no entorno econômico, nas condições sociais e culturais e nas necessidades concretas dos povos interessados” (art. 22, §§ 2 e 3). Por outro lado a Convenção 169 estabelece que os Estados reconheçam como “fatores importantes da manutenção da cultura, da autosuficiência e do desenvolvimento econômico dos povos indígenas”, a serem fortalecidas e fomentadas com a participação destes povos, atividades como “o artesanato, as indústrias rurais e comunitárias e as atividades tradicionais e relacionadas com a economia de subsistência, tais como a caça, a pesca com armadilhas e a colheita” (art. 23, § 1). Coloca, por fim, a necessidade de que os Estados, ao prestarem assistência técnica e financeira, levem “em conta as técnicas tradicionais e as características culturais desses povos e a importância do desenvolvimento sustentado e eqüitativo” (art. 23, § 2). e) “Seguridade social e saúde”. Primeiramente, estabelece a Convenção que os benefícios da seguridade social assegurados à população em geral devam estar também postos à disposição dos povos indígenas, sem discriminação. Em seguida, afirma que os Povos Indígenas e Tribais devem gozar, nos Estados onde residam, de um “nível máximo possível de saúde física e mental”, seja através de serviços em saúde “adequados” a serem prestados diretamente pelos Estados, seja através da garantia, por estes, dos meios que permitam aos povos indígenas “organizar e prestar tais serviços sob a sua própria responsabilidade e controle” (art. 25, § 1). A Convenção determina a priorização da organização dos serviços em saúde no “nível comunitário”, a garantia da participação dos Povos Indígenas e Tribais no seu “planejamento e administração”, e a necessidade de que em tais serviços sejam consideradas 16
  • 17. as “condições econômicas, geográficas, sociais e culturais” indígenas, bem como “seus métodos de prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais” (art. 25, § 2). Orienta também para que o sistema de assistência sanitária dê prioridade ao “atendimento primário à saúde”, e à formação e emprego de agentes pertencentes às próprias comunidades, garantindo-se, porém, a existência de “estreitos vínculos com os demais níveis de assistência sanitária” (art. 25, § 3). Por fim, estabelece a necessidade de coordenação das ações em saúde com “as demais medidas econômicas e culturais que sejam adotadas no país” (art. 25, § 4). f) “Educação e meios de comunicação”. Aqui a Convenção 169 inicia orientando os Estados signatários a possibilitarem aos povos indígenas o acesso a todos os níveis da educação escolar, “pelo menos em condições de igualdade com o restante da comunidade nacional” (art. 26). Prevê também a oferta de uma educação escolar indígena específica através de dois planos. O primeiro, no âmbito dos próprios Estados, através de programas específicos a serem desenvolvidos e aplicados com a participação indígena, e que tenham por objetivo “responder às suas necessidades particulares”, devendo “abranger a sua história, seus conhecimentos e técnicas, seus sistemas de valores e todas suas demais aspirações sociais, econômicas e culturais” (art. 27, §1). E o segundo, no âmbito de “instituições e meios de educação” criados pelos próprios povos beneficiários, devendo estes considerar as “normas mínimas estabelecidas pela autoridade competente em consulta com esses povos” (art. 27, § 3). Referindo-se à educação infantil, a Convenção estabelece como objetivo a transmissão de “conhecimentos gerais e aptidões que lhes permitam participar plenamente e em condições de igualdade na vida de sua própria comunidade e na da comunidade nacional” (art. 29). Pautando pela necessidade de preservação das línguas indígenas, o texto convencional estabelece o objetivo da alfabetização dos alunos indígenas na língua materna de suas comunidades, garantindo-se também a adoção de medidas destinadas ao aprendizado e domínio “da língua nacional ou uma das línguas oficiais do país” (art. 28, §2). Também no plano educacional a Convenção 169 da OIT inclui como obrigação dos Estados a adoção de medidas visando assegurar aos Povos Indígenas e Tribais o conhecimento de seus direitos e obrigações quanto às relações de trabalho, atividades econômicas, educação, saúde, serviços sociais e direitos derivados do próprio texto convencional, seja através de traduções escritas, seja através da “utilização dos meios de comunicação de massa nas línguas desses povos” (art. 30, §2). 17
  • 18. Por fim, ainda no capítulo “Educação e meios de comunicação” o texto convencional orienta os Estados a adotarem medidas educativas de eliminação dos preconceitos dos diversos setores sociais contra os Povos Indígenas e Tribais, sobretudo através dos livros de História e demais materiais didáticos. g) “Contatos e cooperação através das fronteiras”. O tema, ausente na Convenção 107, emergiu a partir da crescente visibilidade das insatisfações de povos indígenas divididos geograficamente em razão do estabelecimento das fronteiras nacionais. A Convenção revisora estabelece que os Estados devam assegurar a estes povos, medidas tais como acordos ou tratados, que lhes possibilitem o trânsito através das fronteiras, a fim de que venham a ser estabelecidas ou mantidas as relações internas entre comunidades e indivíduos, sejam do mesmo povo ou de povos distintos, para o desenvolvimento de atividades de âmbito econômico, social, cultural, espiritual e ambiental. Trata-se de determinação relevante dada a quantidade de povos que vivenciam a realidade transfronteiriça, a exemplo dos Guarani – separados pelas fronteiras entre Argentina, Brasil, Bolívia e Paraguai, dos Yanomami – vivendo entre o Brasil e a Venezuela, dos Mohawk – entre os EUA e o Canadá, dos Karen – entre as fronteiras da Tailândia e Myanmar, dos Kuna – entre Colômbia e Panamá, dos San – divididos pelas fronteiras de Botswana, Namíbia e África do Sul, e tantos outros. Muitas atividades de interesse comum a tais povos têm sido embaraçadas em razão da desconsideração, pelos sistemas de proteção das fronteiras internacionais, a tais realidades específicas. Cabe observar como exemplos de mecanismos interfronteiriços possíveis aqueles que têm possibilitado o desenvolvimento das atividades de interesse comum de um mesmo povo indígena, como o caso dos Inuit19, habitantes tradicionais do Círculo Polar Ártico que engloba o Alaska (EUA), norte do Canadá, Groenlândia e Chukotka (Rússia), reunidos em torno da Conferência Circumpolar Inuit, e dos Sámi20, divididos entre as fronteiras da Finlândia, Noruega, Rússia e Suécia, que se articulam através do Conselho Sámi. Note-se 19 Denominados pejorativamente pelos colonizadores como “esquimó” ou “comedores de carne crua”, os Inuit, que hoje somam cerca de 150 mil indígenas, encontram-se desde 1977 articulados em torno da Conferência Circumpolar Inuit (ICC), organização não-governamental internacional, voltada para a promoção da unidade de sua identidade própria em termos de cultura, língua materna (o Inuktitut), modo de vida tradicional, e garantia de direitos no plano internacional. Para informações sobre a Inuit Circumpolar Conference (ICC), consultar a Web Site nos endereços < http://www.inuit.org/ > e < http://www.inuitcircumpolar.com/ >. 20 Os Sámi consistem em aproximadamente 133 mil indígenas, habitantes tradicionais da região onde hoje se constituem 04 países: Finlândia, Noruega, Rússia e Suécia. Desde 1957 os interesses comuns às comunidades Sámi são articulados pelo Conselho Nórdico Sámi, organização não-governamental internacional, com atuação nos territórios daqueles quatro países, onde busca a promoção dos direitos e interesses do Povo Sámi, a consolidação do sentimento de afinidade daquele povo, o reconhecimento de sua identidade nacional e manutenção de seus direitos sociais, econômicos e culturais. Para mais informações sobre o Conselho Nórdico Sámi, consultar < http://www.saamicouncil.net/?deptid=1113 >. 18
  • 19. ainda, ao longo dos anos, o surgimento de organizações de povos indígenas diversos com interesses regionais comuns, a exemplo da Coordenação das Organizações Indígenas da Cuenca Amazônica (Coica), que articula nove organizações indígenas regionais da bacia amazônica, situadas no Brasil, Equador, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Suriname, Peru e Venezuela21, e, mais recentemente (2006), a Coordenação Andina de Organizações Indígenas (CAOI), integrada por organizações do Equador, Bolívia, Peru e Colômbia. h) “Administração”. Aqui a Convenção determina aos Estados signatários que garantam a existência de instituições governamentais específicas e devidamente aparelhadas para “administrar os programas que afetam os povos interessados” (art. 33, §1). Diferentemente da Convenção 107, a 169 determina que se garanta a participação dos povos indígenas no “planejamento, coordenação, execução e avaliação” de tais programas no âmbito administrativo (art. 33, § 2.º, ”a”.). Estabelece também o direito de participação indígena tanto na formulação de propostas legislativas, quanto no controle da aplicação das medidas legislativas adotadas. i) “Disposições gerais”. A Convenção reconhece a necessidade de flexibilidade, ou seja, que na adoção das medidas previstas leve-se em consideração “as condições próprias de cada país” (art. 34), e que a sua aplicação não revista em prejuízo aos direitos já garantidos aos Povos Indígenas e Tribais através de “outras convenções e recomendações, instrumentos internacionais, tratados, ou leis, laudos, costumes ou acordos nacionais” (art. 35). j) “Disposições finais”. Neste nono e último capítulo a Convenção 169 dispõe sobre os trâmites específicos a serem adotados pelos países-membros e pelo Diretor-Geral do Secretariado Internacional do Trabalho a fim de que a Convenção possa entrar em vigor nos respectivos países, possa ser pelos mesmos denunciada, ou ainda objeto de revisão, total ou parcial, pela Conferência Geral da Organização. Reconhece a OIT situações em que: Tal vez el poder legislativo tenga que adoptar los tratados para que pasen a formar parte de la legislación nacional. En consecuencia, sería de desear que la aprobación estuviese a cargo del parlamento u otro órgano legislativo. Una vez obtenida tal aprobación, el poder ejecutivo del país (el gobierno) también deberá aprobar el instrumento. (OIT, 2003:71.) 21 Para mais informações sobre a Coordinadora de las Organizaciones Indígenas de la Cuenca Amazônica (COICA), vide < http://www.coica.org.ec/ >. 19
  • 20. No caso do Brasil, como veremos adiante, o texto da Convenção 169 foi submetido ao Congresso Nacional, onde após uma longa e exaustiva tramitação foi aprovado através do Decreto Legislativo n.º 143/02. A Promulgação pelo Presidente da República, porém, só foi efetuada mais de um ano após o Registro formal da Ratificação, em Genebra. Outro aspecto importante a ser considerado é quanto à faculdade de denúncia de que dispõem os países. Segundo o art. 39, a denúncia só poder ser utilizada ao final de um período mínimo de dez anos de vigência no Estado Membro. Uma vez efetuada, há ainda o período de um ano para que os seus efeitos se produzam. Findo este prazo de um ano após o decênio de vigência, sem que o país haja efetuado a denúncia, fica automaticamente renovada a ratificação por outro decênio, findo o qual é possível ao Estado proceder da mesma forma que no período anterior (denúncia após um ano ou renovação automática). A Convenção 169 da OIT permanecerá aberta a ratificações pelos países-membros da Organização, até a data da entrada em vigor de uma eventual convenção revisora (art. 43). A necessidade e conveniência de tal revisão poderá ser encaminhada pelo Conselho de Administração do Secretariado da OIT junto à Conferência Geral do Trabalho, após avaliação sobre o andamento da aplicação da Convenção 169 (art. 42). 3.2. Supervisão e Controle de aplicação a) Instrumentos Disponíveis As normas Internacionais e Convênios adotados pela OIT têm a sua aplicação supervisionada e controlada por um sistema interno. Conforme Kreimer (1999:20), a OIT “no 22 creó ningún mecanismo independiente para estimular su cumplimiento” . O sistema processa-se mediante a apresentação de instrumentos escritos, todos previstos na Constituição da OIT, consistentes em: (a) “Memórias” periódicas ou relatos dos Estados Membros acerca do cumprimento da Convenção ratificada (arts. 22 e 23); (b) “Reclamações” de entidades patronais ou de empregados acerca do cumprimento insatisfatório das convenções pelos Estados Membros (arts. 24 e 25); (c) “Queixas” de Estados Membros, de delegado da Conferência Internacional do Trabalho ou do próprio Conselho da Administração (art. 26); ou (d) pedidos de “Interpretação” por governos quanto a dúvidas sobre o significado de termos de alguma Convenção ou Recomendação (art. 37-1). 22 Kreimer atua, desde 1989, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da OEA. 20
  • 21. No caso das “Memórias”, são previstos dois prazos para a sua apresentação pelos Governos: a) anualmente, no caso das oito Convenções declaradas pela OIT como fundamentais23; e b) a cada cinco anos, quando se trate das demais Convenções. Conforme o art. 22 da Constituição da OIT, a forma e os itens a serem objeto de relato avaliativo pelos Governos devem ser aqueles previstos pelo Conselho de Administração da Organização, através dos denominados “Formulários de Memória”, especificamente aprovados para cada Convenção em particular. O Formulário relativo à Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais foi aprovado pelo Conselho de Administração da OIT em 1990, e compõe-se de 65 itens que devem ser objeto de resposta pelos Governos. Em conformidade com a estrutura tripartite da Organização, estabelece a Constituição da OIT (art. 23, § 2.º) que os Governos devem enviar cópias das Memórias às organizações representativas dos trabalhadores e dos empregadores. Mas não prevê que tais cópias sejam também enviadas às representações dos povos indígenas ou tribais, nem que estes sejam consultados pelos Governos quando da redação de suas Memórias. Contudo, o item VIII do Formulário de Memória relativo à Convenção 169 sugere-se expressamente aos Governos que, ao elaborarem suas Memórias, o façam consultando tais povos 24. As Memórias periódicas enviadas pelos Governos são apresentadas perante a Comissão de Peritos em Aplicação de Convenções e Recomendações. Trata-se de um colegiado formado por 20 especialistas independentes, com atuação no campo jurídico e social, que se reúne anualmente para examinar as Memórias. Os resultados de tais exames são objeto de publicação em um Informe específico (“Informe III - Parte 1A”)25. 23 A Organização Internacional do Trabalho declara como fundamentais as seguintes Convenções: n.º 29 (1930) que dispõe sobre a eliminação do trabalho forçoso ou obrigatório; n.º 87 (1948) que estabelece o direito de livre organização a trabalhadores e empregadores; n.º 98 (1949) que trata dos direitos sindicais e de negociação coletiva; n.º 100 (1951) que trata da igualdade de remuneração entre homens e mulheres; n.º 105 (1957) sobre abolição do trabalho forçoso; n.º 111 (1958) sobre eliminação de toda discriminação em matéria de emprego e ocupação; n.º 138 (1973) sobre a abolição do trabalho infantil; e n.º 182 (1999) sobre a eliminação das piores formas de trabalho infantil. 24 “Aunque no es requisito indispensable, el Governo puede considerar provechoso consultar a las organizações de los pueblos indígenas y tribales del país, a través de sus instituciones tradicionales en el caso de que existan, acerca d e las medidas tomadas para dar efecto al presente Convenio, y asimismo cuando prepare las memorias relativas a su aplicación. (...)”. Formulario de Memória relativo al Convenio sobre Pueblos Indígenas y Tribales, 1989 (n.º 169) Parte IX – Disposiciones Generales, p. 11. Disponível em: < http://www.ilo.org/ilolex/spanish/reportforms/pdf/22s169.pdf > (Acesso em: 25.mai.2009). 25 No recente relatório, apresentado em 2009, a Comissão de Peritos concluiu de modo geral que “en el mercado de trabajo persisten las desigualdades basadas en la etnia así como prácticas discriminatorias contra los pueblos indígenas y tribales, los miembros de las minorías étnicas y los trabajadores migrantes. La discriminación basada en la casta sigue siendo muy frecuente en una serie de países. Las mujeres que pertenecen a esos grupos a menudo son desproporcionadamente vulnerables a la discriminación. La Comisión toma nota de que para que los procesos de desarrollo tengan éxito y para alcanzar la justicia social para todos, es indispensable luchar contra la discriminación que afecta a esos grupos, y contra las desigualdades de las que son víctimas en lo que respecta la formación, la educación y el empleo, especialmente en el contexto actual de resurgimiento del racismo y la intolerancia, incluida la intolerancia religiosa”. Especificamente em relação ao cumprimento da Convenção 169, a Comissão avalia como um dos pontos mais problemáticos a não implementação das consultas às comunidades indígenas: “el establecimiento de mecanismos apropiados y eficaces 21
  • 22. Além de ensejar a apresentação das Memórias quinquenais exigidas dos Estados que a ratificaram, a Convenção 169 é passível também do oferecimento de “Reclamações” pelas organizações patronais ou de trabalhadores. Neste caso, constitui-se um comitê tripartite formado por membros do Conselho de Administração, cabendo ao comitê proceder ao exame da reclamação, e devolução do caso ao Conselho de Administração, para adoção de conclusões. O informe do comitê acerca da Reclamação é então tornado público, devendo a Comissão de Peritos, a partir das Conclusões do Conselho de Administração, dar seguimento ao diálogo com o governo em questão para a solução do caso. Até o momento somam 106 as reclamações apresentadas, das quais 15 são relativas ao cumprimento da Convenção 16926. No caso do procedimento de “Queixa” previsto no art. 26 da Constituição da OIT, não há registro, até o momento, de que tenha sido utilizado seja em relação à Convenção 107, seja em relação à Convenção 169. Quanto às “Interpretações” que podem ser solicitadas pelos Estados Membros acerca do teor das Convenções ou de Recomendações OIT, têm o seu locus próprio de resolução na Corte Internacional de Justiça, em Haia (37-1 da Constituição da OIT). Na prática, as dúvidas dos Estados têm sido levadas diretamente à própria OIT, cuja opinião, quando necessita ser dada formalmente, é publicada em Boletim Oficial através de Memorando, ou através de carta não publicada, ao governo que requereu a interpretação. Ainda no que diz respeito ao sistema de supervisão e controle de aplicação, importa destacar a observação de Kreimer (1999:21) acerca da possibilidade de apresentação, perante os sistemas de proteção de direitos humanos da OEA ou da ONU, de casos de violações à Convenção: para la consulta y participación de los pueblos indígenas y tribales en relación con las cuestiones que les conciernen es la piedra angular del Convenio, aunque sigue siendo uno de los principales desafíos que plantea la aplicación del Convenio en una serie de países. Debido a los grandes retos a los que actualmente tienen que hacer frente los pueblos indígenas y tribales, incluidos la regularización de la propiedad de la tierra, la salud, la educación, y el aumento de la explotación de los recursos naturales, la participación de los pueblos indígenas y tribales en estos y otros ámbitos que les afectan directamente, es un elemento fundamental para garantizar la equidad y la paz social a través de la inclusión y el diálogo” (CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DEL TRABAJO, Informe General – 98ª Reunion : 34 e 731). Disponível em: < http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---ed_norm/---relconf/documents/meetingdocument/ wcms_103488.pdf > (Acesso em: 25.maio.2009). 26 Segundo dados da Web Site da OIT (http://www.ilo.org/ilolex/english/repframeE.htm), as Reclamações por descumprimento da Convenção foram apresentadas contra a Argentina (uma reclamação, pela Unión de Trabajadores de la Educación de Río Negro), Bolívia (uma, pela Central Obrera Boliviana), Brasil (uma, pelo Sindicato de Engenheiros do DF), Colômbia (duas, pela Central Unitária de Trabajadores e pela Asociación Médica Sindical Colombiana), Dinamarca (uma, pela Confederação Nacional de Sindicatos da Groenlândia), Ecuador (uma, pela Confederación Ecuatoriana de Organizaciones Sindicales Libres), Guatemala (uma, pela Federación de Trabajadores del Campo y la Ciudad), México (seis reclamações, pelas seguintes organizações: Sindicato de Trabajadores de la Industria Metálica, Acero, Hierro, Conexos y Similares, Sindicato de Trabajadores de la Universidad Autónoma de México, Sindicato Independiente de Trabajadores de la Jornada, Sindicato de Académicos del Instituto Nacional de Antropología e Historia, Frente Auténtico del Trabajo, Sindicato Radical de Trabajadores del Metal y Similares, e Sindicato Nacional de Trabajadores de la Educación) e Peru (uma, pela Confederación General de Trabajadores del Perú). (Acesso em: 25.maio.2009). 22
  • 23. Estos organismos pueden analizar comunicaciones alegando violaciones al Convenio 169, cuando dichas situaciones se conectan o son componente de violaciones a los derechos reconocidos en los instrumentos interamericanos (e.g. la Declaración y Convención Americana sobre Derechos Humanos). En efecto, el Convenio 169 ha sido explícitamente definido por la propia OIT y por las Naciones Unidas como un convenio de derechos humanos, y por consiguiente es de aplicación por los mecanismos de derechos humanos de las Naciones Unidas, y los de la OEA. b) Possibilidades de Participação. Em razão da estrutura tripartite da OIT, a participação no sistema de supervisão e controle da aplicação das suas normas e convenções é garantida unicamente aos governos e representantes patronais e laborais. Mesmo no caso específico da Convenção 169, não há hipótese prevista de assento oficial dos povos indígenas na estrutura da organização, nem de utilização, em nome próprio, dos instrumentos acima mencionados. Há, contudo, a possibilidade de outras formas de participação por parte dos povos beneficiários. A primeira, através do envio de “informações” à OIT, seja através das organizações ou laborais ou patronais, seja em nome próprio dos povos indígenas e tribais. A segunda forma possível de participação se dá através da presença em reuniões da OIT: a) como representantes de um dos membros da estrutura tripartite (governos, empregadores ou trabalhadores); e b) como representantes das Organizações Não- Governamentais Internacionais credenciadas na “Lista Especial” da OIT. Tal lista é formada por cerca de 160 ONGs Internacionais, de todos os continentes27, entre as quais figuram a Anistia Internacional (IA), a Associação mundial de juristas (WJA), a Cáritas Internacional, o Centro Internacional para os Direitos Humanos e Desenvolvimento Democrático (ICHRDD), a Comissão Internacional de Juristas (ICJ), o Conselho Mundial de Igrejas (WCC), a Cooperação Internacional para o Desenvolvimento e a Solidariedade (CIDSE), e a Survival International, entre outras. Na mesma qualidade de ONG’s Internacionais estão também na lista especial da OIT o Conselho Nórdico Sáme, a Associação Indígena Mundial, o Grupo Internacional de Trabalho sobre Assuntos Indígenas (IWGIA) e o Conselho Mundial dos Povos Indígenas (WCIP). Acerca de tais canais de interlocução, vale lembrar a observação de Mackay (item 3.1), da importância da participação dos povos indígenas, sobretudo junto à Comissão de Peritos, a fim de assegurar a interpretação mais favorável das normas da Convenção. 4. O Brasil e a Convenção 169. 27 Relação das ONGs Internacionais presentes na Lista Especial da OIT disponível in: < http://www.ilo.org/public/spanish/bureau/exrel/civil/ngo/index.htm > (Acesso em: 30.maio.2009). 23
  • 24. 4.1. O processo de ratificação. No Brasil, a discussão em torno da ratificação da Convenção 169 consumiu nove anos a mais do que o total de três utilizado para a sua formulação, análise e aprovação pela Conferência-Geral da OIT. Em 1991, no âmbito do Executivo Federal, o texto foi analisado por uma Comissão Tripartite, que concluiu inexistirem obstáculos jurídicos à sua ratificação. Assim, em 16 de julho daquele ano o então Presidente Collor de Mello enviou ao Congresso Nacional a Mensagem n.º 367, submetendo ao Legislativo a apreciação da matéria. Só em 24 de março de 1993 a Comissão de Relações Exteriores da Câmara aprovou a Mensagem, por unanimidade, nos termos do Parecer do Relator, Deputado Luiz Ghushiken (PT/SP), resultando daí a proposição do Projeto de Decreto Legislativo (PDC) n.º 237/93. Em 14 de abril daquele ano, acolhendo-se o Parecer do Relator Deputado Fábio Feldman (PSDB/SP), o PDC 237/93, recebeu aprovação unânime da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias. Na seqüência, em 30 de junho, foi também aprovado por unanimidade pela Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ), conforme parecer do Deputado Átila Lins (PPS/AM). Submetido ao Plenário da Câmara, o PDC 237/93 foi aprovado em turno único na sessão de 17 de agosto de 1993. Dias depois, em 25 de agosto, o PDC foi remetido ao Senado Federal, onde se transformou no Projeto de Decreto do Senado (PDS) n.º 34/93. Daí em diante, o texto da Convenção 169 enfrentou os mais diversos obstáculos para a sua aprovação. Submetido inicialmente à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, o PDS 34/93 foi aprovado, em 11 de maio de 1994, conforme parecer do então Senador Jarbas Passarinho (PFL/PA). Enviado em seguida à apreciação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC), foi novamente aprovado, em 20 de setembro de 1995, conforme parecer do Senador Romero Jucá (PSDB/RR). Contudo, poucos dias depois, argumentando haverem “novas ponderações” por parte do Governo Federal, o Senador por Roraima apresentou o Requerimento n.º 1.304 / 199528 (aprovado em 04.10.95) solicitando reexame da Convenção por ambas as Comissões do Senado (CCJ e CRE) onde o texto já havia sido aprovado. Retornando à CCJC, o texto da Convenção 169 da OIT recebeu em 18 de abril de 1996, parecer contrário do Relator, Senador Bernardo Cabral (PFL/AM), e os votos em 28 “Justificação. Tendo em vista divergência e a lacuna existente entre os pareceres da CRE e CCJ com relação aos artigos 14, 16, 17, e 32 da Convenção n.º 169 e pela CCJ para que possa analisar com maior profundidade dos artigos mencionados. – Senador Romero Jucá”. 24
  • 25. separado da Senadora Benedita da Silva (PT/RJ) e do Senador Artur da Távola (PSDB/SP), ambos pela sua aprovação. Em 16 de março de 1999, antes de uma manifestação final da CCJC, o PDS 34/93 foi retirado de pauta a requerimento do Relator Bernardo Cabral e enviado à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Na CRE, em 26 de maio de 1999, o Projeto obteve voto favorável do Relator, Senador Tião Viana (PT/AC), por representar “um grande avanço do Governo brasileiro no sentido de assegurar às populações indígenas do Brasil o efetivo direito à integridade, à cidadania e ao desenvolvimento moral, cultural e econômico.” Seguindo o voto do Relator, a Comissão aprovou o Projeto, apesar das abstenções dos senadores Mozarildo Cavalcanti (PFL/RR) e Lúdio Coelho (PSDB/MS). Em 06 de dezembro de 2000 o PDS 34/93 finalmente recebeu a aprovação da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, acatando-se o parecer do Relator, Senador Romeu Tuma (PFL/SP), que se reportou ao “forte teor humanista” da Convenção, ao fato de reafirmar “princípios éticos estabelecidos pela Carta Magna” Brasileira, e de reconhecer aos índios “parcela de responsabilidade e de direito que lhe cabe no projeto nacional”. Atribuiu, por fim, à Convenção em relação aos povos indígenas, “importância comparável àquela atribuída à Declaração Universal dos Direitos do Homem”. Na ocasião aprovou-se também a Emenda n.º 1 – CCJ, pela qual foram introduzidos ao PDS 34/1993 mais dois artigos: o primeiro (art. 2.º), informando que "no caso do Brasil, a expressão ‘procedimentos adequados estabelecidos pela legislação nacional’, (...) refere-se às disposições do art. 231, caput e § 5º da Constituição Federal”. O Segundo (art. 3.º), esclarecendo a inaplicabilidade, no caso do Brasil, “em face do estabelecido nos arts. 20, inciso XI e 231, § 2.º da Constituição Federal”, da previsão de direitos de propriedade dos indígenas sobre as terras tradicionalmente ocupadas e de sua alienação para fora da comunidade. O PDS 34/1993 foi então enviado ao Plenário do Senado, onde só foi submetido a votação no dia 19 de junho de 2002, quando foi aprovado, juntamente com a Emenda n.º 1 - CCJ. No dia seguinte foi editado o Decreto Legislativo n.º 143, de 20 de junho de 2002, que aprovou os termos da Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes. Em 25 de julho daquele ano o Governo Brasileiro efetuou registro do instrumento de ratificação junto ao Diretor-Geral do Secretariado Internacional do Trabalho da OIT, em Genebra. Nos termos do art. 38 da Convenção 169, o seu cumprimento obrigatório pelo País ocorreria um ano após este registro, ou seja, em 25 de julho de 2003. Contudo, foi apenas quase nove meses após esta data, em 19 de abril de 2004, que a 25
  • 26. Convenção veio a ser promulgada pelo Presidente da República, com a edição do Decreto n.º 5.051, publicado no DOU em 20.04.2004. Os Passos para a Aprovação da Convenção 169 da OIT pelo Brasil 16.07.1991 Mensagem (n.º 367) do Presidente da República ao Congresso Nacional. 24.03.1993 Aprovação da Mensagem pela Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Início da tramitação do Projeto de Decreto Legislativo da Câmara (PDC) n.º 237/93. 14.04.1993 Aprovação do PDC 237/93 na Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias. 30.06.1993 Aprovação do PDC 237/93 na Comissão de Constituição, Justiça e Redação. 17.08.1993 Aprovação do PDC n.º 237/93 no Plenário da Câmara. 25.08.1993 Remessa ao Senado. Transformação em PDS n.º 34/93. 11.05.1994 Aprovação do PDS 34/93 pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) 20.09.1995 Aprovação do PDS 34/93 pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) 04.10.1995 Aprovação do requerimento n.º 1.304 / 1995, do Senador Romero Jucá, pelo reexame do PDS 34/93 na CRE e na CCJ. 18.04.1996 Parecer do Relator Bernardo Cabral (CCJ), contrário à aprovação do PDS 34/93. Votos em separado dos Senadores Benedita da Silva e Artur da Távola, pela aprovação do PDS 34/93 16.03.1999 Relator Bernardo Cabral retira o PDS 34/93 da pauta de votações da CCJ e o envia à CRE. 25.05.1999 Aprovação do PDS 34/93 pela CRE. 26.12.2000 Aprovação do PDS 34/93 pela CCJ. 19.06.2002 Aprovação do PDS 34/93 pelo Plenário do Senado Federal 20.06.2002 Edição do Decreto Legislativo n.º 143, aprovando o texto da Convenção 169 da OIT. 25.07.2002 Registro da Ratificação pelo Governo Brasileiro, em Genebra. 25.07.2003 Início do prazo p/ cumprimento obrigatório (art.38 da Convenção 169) 19.04.2004 Promulgação da Convenção 169 pelo Presidente da República (Dec. 5.051, de 19.04.2004) 20.04.2004 Publicação do Dec. 5.051 no Diário Oficial da União. 4.2. Significado da Convenção 169 da OIT no Marco Constitucional Brasileiro de 1988. Promulgada em 06 de outubro de 1988, a atual Constituição Federal Brasileira antecede em oito meses a adoção, pela Conferência Internacional do Trabalho, do texto da Convenção 169 da OIT. Comparando-se o teor de ambos os textos, não é difícil perceber que as propostas que resultaram no Texto Constitucional de 1988 em matéria de direitos indígenas revelaram estar, em muitos aspectos, em estreita sintonia com as avançadas discussões que pautaram a definição do texto da Convenção 169, adotado meses depois. Este fato evidencia, sem sombra de dúvidas, que tanto a Carta Constitucional brasileira de 1988 quanto a Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais refletiram, ao mesmo tempo e de modo bastante expressivo, as fortes influências de um movimento indígena cada vez mais presente nos fóruns nacionais e internacionais de discussão, bem como as contribuições cada vez mais qualificadas dos segmentos indigenistas, 26
  • 27. com suporte num conhecimento profundo da realidade indígena e alinhado aos mais avançados conceitos e análises de cunho antropológico. Assim, ao ser adotado em 1989 pela Conferência Internacional do Trabalho, o texto da Convenção 169 não trouxe nenhum avanço ou impacto realmente significante em relação ao que já havia sido adotado pelo Constituinte Originário brasileiro de 1988. Como observa Marco Antônio Barbosa (2001:227), verbis, Frente ao direito brasileiro, relativo às populações indígenas, a Convenção 169, grosso modo, não apresenta grandes inovações, posto que não podemos nos esquecer da Constituição brasileira de 1988 que ultrapassou os pontos mais criticados da antiga Convenção 107 e agora também superados pela Convenção 169 (...). A Constituição brasileira antes mesmo da Convenção em apreço já extirpara de nosso sistema jurídico objetivos injustos, inatingíveis e indesejáveis pelas populações indígenas, como por exemplo a sua assimilação. Assim, pode se dizer que os avanços políticos verificados no âmbito da elaboração da Convenção 169 ocorreram de modo concomitante àqueles que ensejaram a aprovação das disposições relativas aos povos indígenas na Constituição Brasileira de 1988. Esta sintonia entre o conteúdo da Convenção revisional e o Texto Constitucional brasileiro de 1988 correspondente aos direitos indígenas, pode ser percebida em diversas passagens. Veja-se inicialmente quanto aos direitos culturais, sociais, políticos e econômicos. A Convenção estabelece que os Estados devam: reconhecer e proteger “os valores e práticas sociais, culturais religiosos e espirituais próprios dos povos” indígenas; considerar a natureza não apenas individual, mas também coletiva de seus problemas; respeitar-lhes a “integridade dos valores, práticas e instituições” (art. 5.º); consultá-los através de suas “instituições representativas” (art. 6.º, “a”); reconhecer-lhes o “direito de escolher suas próprias prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento, na medida em que ele afete a suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual” (art. 7.º§1); avaliar “a incidência social, espiritual e cultural” que possam sofrer com atividades de desenvolvimento (art. 7.º, §3); considerar, na aplicação da legislação nacional, “seus costumes ou seu direito consuetudinário” (art. 8.º, §1); levar em conta, no atendimento à saúde, “as suas condições econômicas, geográficas, sociais e culturais, bem como os seus métodos de prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais” (art. 25, §2). São disposições contempladas pela Constituição Federal de 1988, quando afirma que “são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, (…), competindo à União (…), proteger e fazer respeitar todos os seus bens” (CF/88, art. 231, caput.). Ainda relativamente aos direitos de ordem cultural, a Convenção 169 da OIT dispõe que os programas em educação para os povos indígenas e tribais “deverão abranger a 27
  • 28. sua história, seus conhecimentos e técnicas, seus sistemas de valores e todas suas demais aspirações sociais, econômicas e culturais” (art. 27, §1); que os governos deverão reconhecer-lhes o direito “de criarem suas próprias instituições e meios de educação” (art. 27, §3); e que “sempre que for viável, dever-se-á ensinar às crianças (…) a ler e escrever na sua própria língua indígena ou na língua mais comumente falada no grupo a que pertençam” (art. 28 §1). Esta preocupação da Convenção com o respeito a processos educacionais e conteúdos próprios dos povos indígenas é também contemplada pelo Texto Constitucional Brasileiro de 1988, quando determina que “o ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem” (CF/88, art. 210, § 2.º). Veja-se agora em relação aos direitos territoriais. Aqui a Convenção determina que se deva “respeitar a importância especial que para as culturas e valores espirituais dos povos interessados possui a sua relação com as terras (...) e, particularmente, os aspectos coletivos dessa relação” (art. 13 §1), e que se deve ter em conta também “o conceito de territórios” representando “a totalidade do habitat das regiões que os povos interessados ocupam ou utilizam de alguma outra forma” (art. 13 §2). Estas determinações da Convenção 169 encontram ressonância na CF de 1988, no conceito que este estabelece de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios: aquelas por eles “habitadas em caráter permanente”, “utilizadas para suas atividades produtivas”, “imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar” e “necessárias a sua reprodução física e cultural” tudo isso “segundo seus usos, costumes e tradições” (art. 231, § 1.º). Determina também a Convenção que se deve “reconhecer aos povos interessados os direitos de propriedade e de posse sobre as terras que tradicionalmente ocupam” (art. 14 §1). Embora a Constituição Brasileira não permita a possibilidade de propriedade indígena sobre as terras tradicionalmente ocupadas, em razão de se tratarem de propriedade da União Federal (CF/88, art. 20, inc. XI), o fato é que tais terras “destinam-se a sua posse permanente” (art. 231. § 2.º). Além disso, tal direito de posse permanente indígena sobre as terras tradicionalmente ocupadas é, conforme a Constituição Federal, um direito originário (CF/88, art. 231, caput) e imprescritível (CF/88, art. 231, § 4.º). Ainda no tocante a direitos territoriais, a Convenção 169 trata da adoção de medidas visando “determinar as terras” tradicionalmente ocupadas “e garantir a proteção efetiva dos seus direitos de propriedade e posse” (art. 14 §2). Aqui vale lembrar que a 28
  • 29. Constituição de 1988 dispõe expressamente que se trata de dever da União Federal demarcar e proteger as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas (CF/88, art. 231, caput). Outro ponto a ser observado refere-se à determinação da Convenção 169 de que “os povos interessados não deverão ser transladados das terras que ocupam” (art. 16, §1), e de que sempre que possível, “deverão ter o direito de voltar a suas terras tradicionais assim que deixarem de existir as causas que motivaram seu translado e reassentamento” (art. 16, §3). A Constituição Federal de 1988 trata deste tipo de preocupação, vedando expressamente esta possibilidade de remoção ou translado, exceto “em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País” situações em que se exige, respectivamente, o "referendum" ou a deliberação do Congresso Nacional, “garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco” (art. 231, § 5.º) Afinidades entre as disposições da Convenção 169 e da CF/88 são encontradas ainda no que diz respeito aos recursos naturais existentes nas terras de ocupação tradicional indígena. Para a Convenção, os direitos dos povos indígenas a esses recursos “deverão ser especialmente protegidos”, e abrangem a sua participação na “utilização, administração e conservação” desses recursos (art. 15 §1º). A Constituição Brasileira, por sua vez, assegura caber aos indígenas “o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos” existentes nas terras que tradicionalmente ocupam (CF/88, art. 231, § 2.º). No que se refere aos recursos naturais do subsolo, incluindo minérios, cuja propriedade “pertencer ao Estado”, determina a Convenção 169 que os governos deverão proceder à consulta prévia dos povos indígenas a serem afetados pela sua exploração, a fim de se dimensionar os prejuízos aos seus interesses. Determina também que “os povos interessados deverão participar sempre que for possível dos benefícios que essas atividades produzam, e receber indenização equitativa por qualquer dano que possam sofrer como resultado dessas atividades” (art. 15§ 2). No caso do Brasil, cujas “jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração, e pertencem à União” (CF/88, art.176, caput), a Constituição Federal estabeleceu como condição para a exploração de tais riquezas a autorização do Congresso Nacional (art. 49, inc. XVI), e o atendimento a “condições específicas” (art. 176, § 1.º) a serem estabelecidas em lei ordinária que, entre outras coisas, deve dispor sobre o modo como devem ser ouvidas as comunidades indígenas afetadas e de que modo deve ocorrer a sua “participação nos resultados da lavra”, direitos esses constitucionalmente assegurados (CF/88, art. 231, § 3.º). 29
  • 30. A Convenção 169 da OIT estabelece também que os Estados devem “impedir que pessoas alheias a esses povos possam se aproveitar dos costumes dos mesmos ou do desconhecimento das leis por parte dos seus membros para se arrogarem a propriedade, a posse ou o uso das terras a eles pertencentes” (art. 17 §3), devendo a lei “prever sanções apropriadas contra toda intrusão” ou “contra todo uso” não autorizados das mesmas terras por terceiros (art. 18). A este respeito a Constituição Federal de 1988, além de declarar as terras indígenas como inalienáveis e indisponíveis, (CF/88, art. 231, § 4.º), também declara como “nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”(CF/88, art. 231, § 6.º). Por fim, a Convenção 169 estabelece que “os povos interessados deverão ter proteção contra a violação de seus direitos, e poder iniciar procedimentos legais, seja pessoalmente, seja mediante os seus organismos representativos, para assegurar o respeito efetivo desses direitos” (art. 12). Também aqui é evidente a sintonia com o que definiu o Constituinte Originário de 1988. Além de delegar à União Federal o dever de proteger e fazer respeitar todos os bens indígenas (art. 231, caput da CF/88), a Constituição Federal coloca entre as funções institucionais do Ministério Público a defesa judicial dos “direitos e interesses das populações indígenas” (art. 129, inc. V), reconhecendo também que “os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses” (art. 232). Assim, como observa o advogado indigenista brasileiro Paulo M. Guimarães29, O disposto no atual Texto Constitucional, em vigor desde 5 de outubro de 1988, (...) já contemplava as normas aprovadas na Convenção 169 em junho do ano seguinte, especialmente no que tange ao usufruto das riquezas naturais de suas terras, à consulta sobre a exploração mineral em terras indígenas e a participação dos benefícios que as atividades produzirem. Somente a referência contida no artigo 14 da Convenção, no sentido de aos povos interessados ser reconhecida a propriedade das terras que tradicionalmente ocupam, não vigorará no Brasil, tendo em vista o disposto no art. 20, XI, do Texto Constitucional, que dispõe serem as terras indígenas bens da União (GUIMRARÃES, 2000:542-543.). É de se observar, por fim, que no que se refere à lei indigenista brasileira em vigor desde 1973 – a Lei 6.001, de 19 de dezembro de 1973 (Estatuto do Índio), a Convenção 169 da OIT, também apresenta vários pontos de contato, a exemplo do peso da auto-identificação pelo indivíduo e comunidade indígena, do reconhecimento das sansões penais aplicadas pela comunidade conforme suas tradições culturais, e a ênfase dada ao cumprimento das penas em 29 Paulo Guimarães atua desde 1982 como assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), órgão vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). 30