Este documento discute o que é História e como os historiadores estudam o passado. A História estuda a vida em sociedade ao longo do tempo, analisando fontes históricas e usando teorias para reconstruir e compreender o passado. Isso serve para dar orientação no tempo e permitir uma análise crítica da realidade, evitando a aceitação acrítica de visões dominantes da História.
3. Esta pergunta na verdade deve ser
respondida em três etapas:
1. Devemos saber o que a História estuda.
2. Então, precisaremos entender como os
historiadores fazem esse estudo.
3. Para aí então responder para que serve
realizar esse estudo.
4. A) Os significados da palavra
História
História é uma palavra que pode assumir
diversos sentidos:
Narrativa: quando vamos
contar uma história (fictícia
ou real), falamos que
vamos contar uma História,
isso é, uma sucessão de
acontecimentos que se
desenrolam no tempo.
Uma História em
quadrinhos é uma narrativa
5. A) Os significados da palavra
História
História é uma palavra que pode assumir
diversos sentidos:
Passado vivido: quando nos referimos ao
Passado, a coisas que já aconteceram, nós
falamos que elas aconteceram na História.
Soldados lutando na 2ª
Guerra Mundial: um fato que
aconteceu na História
6. A) Os significados da palavra
História
História é uma palavra que pode assumir
diversos sentidos:
Estudo do Passado de
algo: quando nos
referimos ao estudo de
coisas que aconteceram
no passado, falamos que
estamos fazendo a
História daquela coisa.
7. Neste último sentido da palavra História
encontramos diversos estudos: História do
Sistema Solar, História da Evolução das
Espécies, História do Solo, etc..
Isso significa que todas essas histórias,
isto é, o estudo de tudo que aconteceu no
passado, é assunto para a “História dos
Historiadores”?
8. B) O que estuda a “História dos
Historiadores”?
A História não estuda o passado: seria impossível
uma única disciplina estudar tudo que já
aconteceu.
A História estuda a vida dos Homens e das
Mulheres – não de pessoas individualmente, mas
da vida em sociedade.
A História estuda as
transformações nessa
vida em sociedade ao
longo do tempo
Sociedade Indígena: sua história
é assunto para os Historiadores
9. Dizem algumas vezes que “A História é a ciência do
passado”. É, a meu ver, falar errado.
É verdade, ainda se chama de História todo estudo
da mudança no tempo. Este não é um hábito
perigoso, porque não engana ninguém. Existe,
nesse sentido, uma história do sistema solar, na
medida em que os astros que o compõem nem
sempre foram como os vemos hoje. Essa história do
sistema solar é assunto para a astronomia. Há uma
história das erupções vulcânicas que é muito
importante para o estudo da física do planeta Terra.
Essas histórias não pertencem à História dos
historiadores.
A História e a Humanidade
10. Há muito tempo nossos grandes historiadores nos
ensinaram a reconhecer: o objeto da história é, por
natureza, o homem. Digamos melhor: os Homens.
Por trás dos grandes vestígios que o historiador
estuda, artefatos, máquinas, textos ou instituições,
são os homens que os produziram que a História
quer entender.
“Ciência dos Homens”, dissemos. Isso é ainda muito
vago. É preciso acrescentar: “dos homens, no
tempo”. O historiador não pensa apenas o “humano”.
A atmosfera que se respira o pensamento do
historiador é a duração. Esse tempo verdadeiro é
perpétua mudança.
Adaptado de Marc Bloch, Apologia da História, p.52-55.
11. Mas como os historiadores fazem para
estudar a vida dos homens e mulheres
vivendo em sociedade e suas
transformações ao longo do tempo?
12. C) A Pesquisa Histórica
Nós não sabemos
automaticamente o
que aconteceu no
passado, precisamos
“reconstruí-lo”.
Esse processo de
descoberta do
passado exige uma
pesquisa, um trabalho
de investigação.
Historiador trabalhando
13. I) As Fontes Históricas
Os historiadores não podem observar diretamente
o seu objeto de estudo.
Para realizar suas pesquisas eles precisam buscar
vestígios deixados pelas pessoas que viveram no
lugar e na época que eles estudam – esses
vestígios são as fontes históricas.
14. O que pode servir de fonte
histórica?
“A diversidade dos testemunhos históricos é quase
infinita. Tudo que o homem diz ou escreve, tudo que
fabrica, tudo que toca pode e deve informar sobre ele.”
Marc Bloch, Apologia da História, p.79
15. Exemplos de Fontes Históricas
Documentos de registros
oficiais (certidões de
nascimento, morte,
casamento, propriedade,
etc.) ou de leis, ordens
dos governantes, entre
outros documentos
oficiais.
Livros de registros no
Arquivo Histórico de
Criciúma (SC) passam por
restauração: documentos
guardados em Arquivos são
importantíssimos para os
historiadores.
16. Exemplos de Fontes Históricas
Textos oficiais
de governos,
onde quer que
eles estejam
gravados.
Texto de Pirâmide Egípcia: são
alguns dos textos mais antigos
que se conhece, fundamentais
para entender a antiga
sociedade egípcia
17. Exemplos de Fontes Históricas
Textos literários
escritos na época
estudada, mesmo
que ficcionais.
Estantes de uma biblioteca:
Livros escritos em outras
sociedades podem nos ajudar
a entende-las.
18. Exemplos de Fontes Históricas
Cartas e textos
pessoais.
Cartas escritas por pessoas vivendo na sociedade
estudada pelo historiador são uma fonte muito
importante para conhecermos como elas pensavam
sobre diversos assuntos.
19. Exemplos de Fontes Históricas
Imagens, pinturas
ou fotografias da
época.
Pintura Rupestre encontrada no Piauí:
Imagens de uma época servem não apenas
para identificar aspectos presentes na
sociedade estudada mas também para
sabermos como as pessoas os representavam.
20. Canções e histórias
populares.
A história popular sobre Robin
Hood nos ajuda a entender a
sociedade na Inglaterra Medieval
Exemplos de Fontes Históricas
21. Relato oral de
pessoas que
viveram no período
estudado.
Historiador conversa com antigo
morador de uma comunidade: os
relatos mostram outro lados da
história, esquecidos pelos
“documentos oficiais”.
Exemplos de Fontes Históricas
22. Exemplos de Fontes Históricas
Sítios arqueológicos
Escavação arqueológica em Israel:
a arqueologia permite o
descobrimento de vestígios
materiais de cidades, aldeias,
fazendas, grandes ou pequenas
construções ou mesmo de
instrumentos do dia-a-dia de uma
antiga sociedade.
23. Exemplos de Fontes Históricas
Artefatos da cultura
material de um povo
(e suas inscrições)
encontrado nas
escavações.
Estela sepulcral romana achada na
Espanha: cada um dos achados de
uma escavação serve para nos
informar sobre sua sociedade. Alguns
trazem consigo inscrições, também
importantes para os historiadores.
24. Exemplos de Fontes Históricas
Restos mortais
encontrados em
escavações
Esqueletos humanos encontrados em uma
escavação: os restos mortais dos antigos
habitantes de uma sociedade podem nos
dar muitas informações (a posição dos
esqueletos nos informa sobre ritos
funerários, a composição dos ossos nos
informa sobre sua alimentação, etc..)
25. II) Teorias e Análise
Histórica
Apenas o estudo dessas
fontes simplesmente não nos
diz nada.
Para entender a vida em
sociedade o historiador precisa
da ajuda de idéias, hipóteses e
teorias que o ajudem a
entender aquelas fontes
históricas.
Weber, Marx e Durkheim: grandes pensadores sociais do
século XIX, cujas idéias foram importantes para desenvolver
nossos conhecimentos sobre as sociedades humanas.
26. O interrogatório das fontes
“Muitas pessoas e mesmo, parece, certos autores de
manuais fazem uma imagem surpreendentemente
cândida da marcha de nosso trabalho. No princípio,
diriam de bom grado, eram os documentos. O
historiador os reúne, lê, empenha-se em avaliar sua
autenticidade e veracidade. Depois do que, e
somente depois, os põe para funcionar... Uma
infelicidade apenas: nenhum historiador, jamais,
procedeu assim. Mesmo quando, eventualmente,
imagina fazê-lo.
27. Pois os textos ou os documentos arqueológicos,
mesmo os aparentemente mais claros e mais
complacentes, não falam senão quando sabemos
interrogá-los. (...) toda investigação histórica supõe,
desde seus primeiros passos, que a busca tenha uma
direção. No princípio, é o espírito. Nunca [em
nenhuma ciência,] a observação passiva gerou algo
de fecundo. Supondo, aliás, que ela seja possível.”
Marc Bloch, Apologia da História, p.78-79
28. “Como tudo muda no homem e no seu ambiente: como
o ponto de vista do qual analisa os fatos e o ânimo com
que realiza sua pesquisa variam incessantemente, dir-
se-ia que o passado muda com o presente; elementos
não percebidos se revelam nos fatos antigos; outras
idéias, outros sentimentos são estimulados pelos
mesmo nomes, pelos mesmos relatos; e o homem
percebe que, no espaço infinito aberto ao
conhecimento, tudo permanece constantemente
inesgotável e novo para a inteligência, sempre ativa e
sempre limitada.”
François Guizot
(em Fontana, História dos Homens, p.13-14)
História e Verdade
29. Mas para que serve realizar esse
esforço de análise de fontes históricas a
partir de teorias sobre a sociedade? Por
que devemos perder nosso tempo com
isso?
30. D) Para que serve estudar História:
I) cultura e orientação históricas
O estudo da História é parte da construção de uma
cultura histórica – que é todo o conhecimento que
possuímos sobre a experiência da vida humana
em sociedade.
Essa cultura histórica serve para entendermos e
julgarmos diferentes situações, para decidirmos
como devemos agir – isto é, serve para nos
orientarmos na vida em sociedade e em suas
transformações ao longo do tempo.
31. A orientação Histórica
Assim como nós nos orientamos no espaço, com o
objetivo de saber onde estamos, nós também nos
orientamos no tempo, para saber de onde nós viemos
e para onde nós estamos indo. Como nós não
ficamos parados e nos movemos pelo espaço, as
vezes nos perdemos e precisamos nos reorientar. O
mesmo ocorre no tempo. Orientação é o termo usado
para descrever a função da cultura histórica no
sentido amplo, e a história profissional contribui para
ela de sua maneira própria.
Adaptado de David Carr, “History as Orientation”, H&T 45, 2006, p.231
32. Memória e História: construções
“A História de um grupo é sua memória coletiva, e a
seu respeito, cumpre a mesma função que a memória
pessoal em relação a um indivíduo: dar-lhe um
sentido de identidade que o faz ser ele mesmo e não
outro. Entretanto, compreendemos mal a natureza de
nossa memória pessoal. Geralmente a consideramos
como um simples depósito de imagens da realidade
passado quando, ao contrário, os cientistas
estabeleceram que (...) a produção de uma
lembrança é um processo muito complexo. Isso
explica, talvez, que a mesma incompreensão se
estenda a nossa consideração da história.”
Josep Fontana, A História dos Homens, p.11.
33. Exemplos de
“formadores da cultura histórica”
Conversas e histórias contadas sobre algum
período da história (recente ou antigo)
Quadro Um conto do
Decamerão (1916) de
John William Waterhouse.
34. Exemplos de
“formadores da cultura histórica”
Os discursos de sacerdotes em cerimônias
religiosas, que muitas vezes fazem menção ao
passado.
Padre Católico conversa com
fiéis no meio de uma missa.
35. Exemplos de
“formadores da cultura histórica”
Filmes que
retratam um
período da História
Elizabeth: filme retrata a
Inglaterra do século XVI
36. Exemplos de
“formadores da cultura histórica”
Novelas de época
Sinha Moça: novela ambientada
no Brasil do século XIX
37. Exemplos de
“formadores da cultura histórica”
Romances
Históricos
Livro da série O
Imperador, narra
uma história que
se passa na
Roma Antiga.
38. Exemplos de
“formadores da cultura histórica”
Documentários que
tratam de assuntos
históricos.
Documentário História
do Rock and Roll, trata
de um dos mais
importantes movimentos
culturais do século XX
40. D) Para que serve estudar História:
II) análise crítica da realidade
Nossa cultura histórica é construída de diversas
maneiras – muitas delas estão fora de nosso
controle.
O estudo aprofundado e questionador da História
serve para criticarmos a visão que se impõe em
nossa sociedade da História – impedindo assim
que reproduzamos preconceitos, injustiças ou
interesses alheios sem sequer percebermos.
41. “Porque (...) todos os regimes fazem seus jovens
estudarem alguma história na escola? Não para
compreenderem sua sociedade ou como ela muda,
mas para aprová-la, orgulhar-se dela, serem ou
tornarem-se bons cidadãos dos EUA, da Espanha, de
Honduras ou do Iraque. E o mesmo é verdade para
causas ou movimentos. A história como inspiração e
ideologia tem uma tendência embutida a se tornar
mito de autojustificação. Não existe vendas para os
olhos mais perigosas que esta (...) É tarefa do
historiador tentar remover essas vendas, ou pelo
menos levantá-las um pouco de vez em quando (...).”
Eric Hobsbawn, Sobre História, p.47-48.
A tarefa da História
42.
43. A) Diferentes percepções do
tempo na História
A forma como as
pessoas de uma
sociedade percebem o
tempo é resultado de
sua vida social.
Assim, em diferentes
sociedades, as pessoas
pensam a passagem do
tempo de maneiras
diferentes.
44. Tempo da Natureza X Tempo do
Relógio
“A extensão do dia solar ditava, como ainda o faz no
campo, a jornada de trabalho. A iluminação artificial
era de má qualidade e expunha a perigos de
incêndio. Assim eram raras as profissões em que o
trabalho noturno era permitido.”
Geneviéve D’Haucourt
“À medida que o século XVII avança, a imagem do
mecanismo do relógio se expande, até que, com
Newton, toma conta do universo. E pela metade do
século XVIII o relógio já alcançara níveis mais
íntimos.”
E.P. Thompson
45. Calendário medieval
representando as atividades
agrícolas em cada um dos
meses:
A passagem do tempo nas
sociedades pré-capitalistas
era marcado pelas tarefas
cotidianas – que na maioria
dos casos estavam
condicionadas pelo clima e
pela natureza.
46. I) Calendários
Grande parte das
sociedades humanas criou
instrumentos para ajudá-
las a se localizar na
passagem do tempo.
Dependendo das
necessidades da
sociedade e de sua forma
de perceber o tempo,
calendários muito
diferentes foram criados.
Placa representando o Calendário Maia
50. II) Periodizações
Em seu trabalho de reconstrução do passado, os
Historiadores precisam determinar Períodos da
História, isto é, determinar fases, momentos da
história distintos entre si.
Esse trabalho de periodização sempre parte de um
ponto de vista, e muitas vezes serve à visões
etnocêntricas da história.
Divisão tradicional da História
51. Queda do Império Romano
em 476 marcaria o fim da
História Antiga e o início da
História Medieval
52. Invasão turca do
Império Bizantino,
em 1453 é
considerada o
marco do fim da
História Medieval e
início da História
Moderna.
54. Crítica à periodização tradicional
Podemos dizer que o fato de utilizarmos o calendário
cristão resulta de um processo que se originou na
conquista da América pelos europeus. O poder passou
a ser exercido por descendentes de europeus
sustentados por instituições e modelos europeus. Por
isso podemos dizer que o tempo (o calendário, a
periodização) que utilizamos também é, até hoje, uma
expressão da cultura do colonizador.
Nesse processo de colonização, herdamos também
uma divisão da história de acordo com os grandes
marcos ou eventos valorizados pela história cultural da
Europa Ocidental.
55. Podemos questionar os critérios utilizados nos recortes
adotados por essa divisão clássica. A queda do Império
Romano, por exemplo, não é um evento marcante para
os chineses ou para as civilizações da América pré-
Colombiana. É importante, por isso, ter em mente que
as periodizações, embora nos ajudem a compreender a
história, refletem determinado poder político, econômico
e cultural, que se expressa nas datas e temas
escolhidos para serem estudados. Trata-se de uma
visão centrada nos interesses europeus – o
eurocentrismo.
Claudio Vicentino e Gianpaolo Dorigo,
História Geral e do Brasil, v.1, 2011, p.21
56. Imperador chinês Hongwu:
Para a história chinesa,
assim como para todo o
resto do mundo fora da
Europa, a periodização
tradicional não faz qualquer
sentido.
57. B) A história dos
vencedores
A narrativa histórica que é construída em uma
sociedade sempre privilegia o ponto de vista e
os interesses dos grupos que conseguiram se
sobrepor aos outros ao longo da história.
Essa “História dos Vencedores” serve para
justificar a dominação de certos grupos e a
situação atual da sociedade.
Cabe a quem estuda a História não se deixar
levar pela força dessa “História dos vencedores”,
encarando-a criticamente.
58. “Quem controla o passado controla o futuro:
quem controla o presente controla o passado”
George Orwell, 1984
59. Funcionário inglês é
servido por indianos:
Os europeus, ao
conquistarem o resto
do Planeta entre os
séculos XVI e XIX
impuseram uma visão
eurocêntrica da
História, como se
apenas a História
Européia fosse
importante.
60. Não existem “povos sem história”
[No processo de integração do mundo] “um importante
papel coube à Europa, pequena península ao largo
das vastas extensões territoriais da Ásia. (...) O mundo
de 1400 já estava repleto de ligações e conexões
regionais, mas a subseqüente expansão dos europeus
através dos oceanos levou as redes regionais a uma
orquestração mundial, sujeitando-as a um ritmo de
âmbito global.
Impulsionados por essas forças em direção a
atividades convergentes, povos de diversas origens e
constituição social foram levados a tomar parte na
construção de um mundo comum. Tais povos incluíam
os mercadores marítimos europeus e a soldadesca de
várias nacionalidades, mas também os nativos
americanos, os africanos e os asiáticos.
61. Nesse processo, as sociedades e culturas de todos
esses povos sofreram grandes mudanças. Tais
mudanças afetaram não somente os povos
assinalados como portadores da “verdadeira” história
mas também os povos que os antropólogos
denominaram “primitivos” e que têm sido estudados
freqüentemente como sobreviventes intactos de um
passado atemporal. Os processos globais
desencadeados pela expansão européia constituem
também a histórias deles. Não existe, assim,
“ancestrais contemporâneos”, povo algum sem história
(...)”
Eric Wolf, A Europa e os povos sem história, p.459-460.
62. I) A História dos
“Grandes Homens”
Dentro desta “História dos
Vencedores”, é muito
comum a visão de que as
transformações na História
são fruto da ação de
grandes homens, que por
causa de seus méritos e
qualidades individuais
fizeram grandes realizações.
Capa de livro que destaca a realização de grandes
homens como fundamental para a História.
63. “A história universal, a história do que o homem
completou no mundo é, na realidade, a história dos
grandes homens que trabalharam na Terra. Eles
foram os condutores, os modeladores, os padrões e,
num largo sentido, os criadores de tudo que a massa
geral dos homens procurou fazer ou atingir. E a alma
da história da humanidade pode ser considerada
como sendo a história desses grandes homens.”
T. Carlyle, Os heróis e o culto dos heróis, p.9
64. O líder da resistência gaulesa,
Vercingetorix, se rende ao
general romano Julio César:
Segundo a concepção tradicional
da história, grandes nomes como
César é que definiriam os rumos
da História.
65. Perguntas de um operário
que lê, Bertold Brecht
Quem construiu Tebas, a das sete
portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as
pedras?
Babilônia, tantas vezes destruída,
Quem outras tantas a reconstruiu?
Em que casas da Lima Dourada
moravam seus obreiros?
No dia em que ficou pronta a Muralha
da China para onde foram os seus
pedreiros?
A grande Roma está cheia de arcos de
triunfo. Quem os ergueu?
Sobre quem triunfaram os Césares?
A tão cantada Bizâncio só tinha palácios
Para os seus habitantes?
Até a legendária Atlântida
Na noite em que o mar a engoliu
Viu afogados gritar por seus escravos.
O jovem Alexandre conquistou as
Índias
Sozinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao
seu serviço?
Quando a sua armada se afundou
Filipe de Espanha chorou.
E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete
anos
Quem mais a ganhou?
Em cada página uma vitória.
Quem cozinhava os festins?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?
Tantas histórias
Quantas perguntas
66. O povo ataca a prisão
da Bastilha, durante a
Revolução Francesa:
Na verdade, o povo
comum também faz
história, e não só em
momentos críticos
como esse, mas
mesmo no dia-a-dia.
67. II) Nacionalismo e
História Nacional
A profissionalização dos
Historiadores ocorreu no processo
de formação dos Estados-Nação,
no século XIX.
A Historiografia serviu, neste
contexto, para legitimar a nova
forma de organização do Poder,
identificando-o com a Nação – que
seria o corpo social singular e
legítimo por natureza.
Surgiram, assim, as Histórias
Nacionais, que buscavam criar uma
identidade histórica no passado
remoto dos Estados Modernos.
Trecho de A Liberdade
Guiando o Povo, de
Delacroix
68. Bismarck, primeiro imperador da Alemanha
moderna unificada no século XIX:
A necessidade de legitimar a formação dos
Estados Nacionais nesse período foi um
dos grandes motivos para a construção de
Histórias Nacionais – e a Alemanha, não
por acaso, teve grande destaque nesse
processo.
69. História: matéria-prima da ideologia
“A história é a matéria-prima para as ideologias
nacionalistas ou étnicas ou fundamentalistas (...). O
passado é um elemento essencial, talvez o elemento
essencial nessas ideologias. Se não há nenhuma
passado satisfatório sempre é possível inventá-lo.
De fato, na natureza das coisas não costuma haver
nenhum passado completamente satisfatório, porque
o fenômeno que essas ideologias pretendem
justificar não é antigo ou eterno mas historicamente
novo.
70. Poucas ideologias de intolerância estão baseadas
em simples mentiras ou ficções para as quais não há
nenhuma evidência. (...) O abuso ideológico mais
comum da história baseia-se antes em
anacronismos que em mentiras. (...)
Mito e invenção são essenciais à política de
identidade pela qual grupos de pessoas , ao se
definirem hoje por etnia, religião ou fronteiras
nacionais passadas ou presentes tentam encontrar
alguma certeza em um mundo incerto e instável
dizendo: ‘Somos diferentes e melhores do que os
Outros’.”
Eric Hobsbawn, Sobre História, p.17-19.
71. Identidade Nacional, Heróis e
legitimação de governos
“Heróis são símbolos poderosos, encarnações de
idéias e aspirações, pontos de referência (...). São por
isso, instrumentos eficazes para atingir a cabeça e o
coração dos cidadãos a serviço da legitimação de
regimes políticos. Não há regime que não promova o
culto de seus heróis e não possua seu panteão cívico.
Em alguns, os heróis surgiram quase espontaneamente
das lutas que precederam a nova ordem das coisas.
Em outros, de menor profundidade popular, foi
necessário maior esforço na escolha e na promoção da
figura do herói. É exatamente nesses últimos casos
que o herói é mais importante. A falta de envolvimento
real do povo (...) leva à tentativa de compensação, por
meio da mobilização simbólica.”
José Murilo de Carvalho, A formação das Almas, p.55
72. Representação de Tiradentes
aproximando-o de Jesus:
O culto da imagem de
Tiradentes foi estabelecido a
partir da Proclamação da
República, com o intuito de
legitimar o novo regime que
substituia a monarquia.
73. III) Modernidade
e a Idéia de Progresso
A partir do século XVIII, uma visão
muito influente da História é a que
identifica uma linha única de
progresso na História, pela qual
toda a humanidade passaria.
Não por acaso, o auge dessa
evolução era identificado com a
sociedade industrial e capitalista
da Europa – enquanto as
sociedades não-européias eram
identificadas com estágios
anteriores do desenvolvimento.
Arranha-céus de Frankfurt: a história
tradicional identificava a sociedade
moderna como superior às antigas
74. Empresa inglesa de trens em São Paulo, no século XIX:
O imperialismo muitas vezes é justificado por “trazer o
progresso” para “regiões atrasadas”. Esse discurso só é
possível graças a idéia de Progresso na História que
surgiu no século XVIII.
75. A ideologia por trás da idéia de
Progresso
[Surgiu] “uma visão evolutiva da história organizada em
função de um motor econômico, que apresentaria o
desenvolvimento do capitalismo ‘liberal’ como o ponto
máximo alcançado pela humanidade e, em
conseqüência, situaria todos os povos e todas as
civilizações dentro de um esquema único de
progresso, justificando, com isso, o domínio
imperialista dos europeus (...).
Ao definir como progressivo tudo o que conduz ao
capitalismo e à industrialização fabril. Esta visão da
história desqualificava qualquer formação alternativa
de organização como retrógada ou inviável (utópica).”
Josep Fontana, A História dos Homens, p.169-170
76. C) O outro lado da História:
Identidade e Memória dos oprimidos e
excluídos
Ao mesmo tempo que o
estudo da História e a
reconstrução do passado
podem servir aos interesses
dos poderosos, a resposta
dos oprimidos e excluídos
pode vir na mesma moeda.
O estudo do passado serve
para construir a consciência e
a identidade de grupos em
sua luta contra a injustiça e a
opressão.
Passeata dos Cem Mil, 1968,
Rio de Janeiro, contra a
Ditadura Militar.
78. História e Memória dos oprimidos
O lembrar e o esquecer definem a história e a história é
o campo no qual a humanidade compreende sua
temporalidade. E o tempo, por sua vez, é onde se
conserva o velho e se cria o novo, onde a política
adquire a sua materialidade. Será a compreensão
dessa temporalidade que demarcará os limites da ação
coletiva das pessoas em cada período da existência
humana. Esses limites são produtos da memória que
constroem o campo de significação da sua ação.
79. Confrontados com os livros de história eternizados nos
pavilhões dos museus repletos das gloriosas
lembranças dos vencedores da civilização, os cacos de
história perpetuados pela gente miúda da população
tornam-se pálidas molduras dos eventos e
personagens cuja indiscutível importância foi e sempre
será decisiva para o curso dos acontecimentos que
desembocaram no presente.
Raphael Millet, “Memória constituinte e movimento social”,
Revista Estudos Hum(e)anos
http://revista.estudoshumeanos.com/memoria-constituinte-e-movimento-social-licoes-de-um-museu-popular-por-raphael-millet/
80. D) Patrimônio e Memória
São considerados patrimônios
históricos ou culturais bens
materiais ou imateriais
intimamente relacionados com
a identidade, a cultura ou o
passado de uma coletividade.
Existe no Brasil um órgão do
Governo, o IPHAN, para
determinar e regular aquilo
que é considerado um
patrimônio.
Essa identificação e regulação
é objeto de diversos conflitos.
Teatro Municipal do Rio
de Janeiro, considerado
um patrimônio histórico
81. Graças às suas
construções históricas,
a cidade de Ouro Preto
é considerada
Patrimônio Cultural
brasileiro.
82. A capoeira, por se
tratar de um símbolo
importante da cultura
do povo brasileiro,
também é considerada
patrimônio cultural
brasileiro.